Este capítulo trata do que chamo de especificidades regionais parciais e está vinculadíssimo à atuação do Instituto Datafolha ao avaliar o governo Jair Bolsonaro e governadores do Estado no combate ao Coronavírus.
O que o Datafolha preparou em forma de estatísticas foi um mergulho parcial e mal-ajambrado. Com isso, levou aos leitores da Folha de S. Paulo e de outros veículos, sobretudo da Grande Mídia, um incompleto quadro de instâncias relevantes da Federação Nacional, enquanto contrapunha retrato pretensamente inteiro do governo federal.
Os leitores vão tomar conhecimento de que a questão relativa à pandemia do vírus chinês contou com tratamento não só parcial em detrimento do governo federal como, também, fraudulento ao se observar a atuação dos governadores de Estado.
Traduzindo a questão de forma contundente: o Datafolha levou ao público uma simbiose de imprecisão e parcialidade. Objetivamente, com baixa aderência técnica.
Ciência desprezada
A ciência foi jogada na lata do lixo. Prevaleceu, portanto, viés que convergiu para a satanização do governo federal, a mistificação de governos estaduais e o descaso com a metodologia cientifica da qual um instituto de pesquisas jamais deveria abrir mão.
Então, por que o fez? Possivelmente porque interesses cruzados e interligados aos tentáculos da Grande Mídia falam mais alto. Esparrama-se aos consumidores de informação sabugos indigestos como fonte de alimentação dos fanáticos.
Sempre com a ressalva de que a ordem cronológica de cada da pergunta apresentada aos entrevistados não aparece em nenhuma situação nas publicações da Folha de S. Paulo e tampouco nos inacessíveis arquivos do Instituto Datafolha, a avaliação do desempenho de Bolsonaro na pandemia segue a trilha da obscuridade.
Como em outros questionamentos, o enunciado exposto pela Folha de S. Paulo é bastante vago e pode esconder a literalidade apresentada a cada um dos entrevistados. E isso faz uma diferença enorme.
Números semelhantes
A Folha publicou apenas, ao se referir à questão: “Avaliação do desempenho de Bolsonaro na pandemia”, com as alternativas de “ruim/péssimo”, “ótimo/bom” e “regular”. O resultado de 50% de ruim/péssimo, 27% de ótimo/bom e de 22% de regular segue praticamente o mesmo ritmo numérico dos entrevistados que se manifestaram sobre aprovação e reprovação do governo federal, pontos já analisados nesta série.
A conclusão parece óbvia: aos eleitores que reprovam a atuação geral do governo, o desempenho na pandemia é ruim/péssimo. Diferentemente dos eleitores que aprovam em forma de ótimo/bom. Os que optaram por desempenho regular são 22%. Exatamente o contingente que se declarou dessa mesma forma à aprovação ou reprovação ao governo.
E onde aparece o buraco das especificidades regionais parciais? Na avaliação do governador do Estado do entrevistado. Ou seja: os 2.069 entrevistados divididos proporcionalmente pelas respectivas populações dos territórios brasileiros, além do Distrito Federal, foram ouvidos pelo Datafolha.
Há dois graves vetores que o Datafolha surrupiou: os dados individuais por Estado (divulgou-se apenas pelo conjunto de Estados de cada região) e a incompatibilidade de sustentar a robustez cientifica dos trabalhos.
Questões viciadas
As duas questões estão, portanto, tecnicamente viciadas. E imprestáveis. Individualmente, nenhum Estado da Federação e tampouco o Distrito Federal ganharam musculatura estatística suficiente para expor resultados.
A aplicação de 2.069 entrevistas contemplava a margem de erro de dois pontos percentuais para o conjunto do território nacional. Ora, diante disso, seria necessário que cada pedaço estadual do País, além do Distrito Federal, contasse com quantidade muito maior de entrevistados. Exatamente com peso representativo da margem de dois pontos percentuais dos 2.069 que resultaram em dados primários, ou seja, de aprovação ou reprovação dos governadores como um todo.
Portanto, o resultado da pesquisa que definiu contingente de 50% de entrevistados que optaram pelo “ótimo/bom”, 25% como “ruim/péssimo” e 24% como “regular”, só é válido para o bloco de governadores.
Margens desgarradas
A margem de erro para cada espaço geográfico estadual subiria às alturas porque o total de questionários aplicados individualmente em 27 territórios e no Distrito Federal não suportaria o limite de dois pontos percentuais. Imagine um número extravagante de margem de erro com dois dígitos e encontrará algo parecido à afronta científica.
O que se estranha é que o Datafolha repetiu na mais recente pesquisa sobre esses tempos de Coronavírus e de estresse institucional no País o que fizera anteriormente, ou seja, omitiu dados relativos a cada governador.
A rota causa desconfiança de que governadores menos suscetíveis a aplausos da população foram preservados. Afinal, anteriormente, ainda contando com ganhos de imagem de Luiz Henrique Mandetta à frente do Ministério da Saúde, todos eles, os governadores, gozavam de alto prestígio. E o Datafolha, com os erros metodológicos e tudo, os retratou em números gerais.
O que não deixa de ser perturbador para quem acompanha lances políticos durante essa pandemia sanitária é a ausência de medição sistemática da atuação dos governadores com o respaldo de margem de erro compatível com as regras utilizadas no caso do governo federal.
Compartilhamento de decisões
Para que isso fosse possível, o número de entrevistados em cada Estado teria de dar salto quântico. O desgaste dos governadores João Doria e Wilson Witzel em São Paulo e no Rio de Janeiro talvez tenha levado o Datafolha a abandonar a empreitada.
Não se pode esquecer que, por determinação do Supremo Tribunal Federal, Estados e Municípios tornaram-se autônomos para lidar com o vírus chinês. Quem sabe o Datafolha fez de tudo para evitar constrangimentos democraticamente mais amplos do desempenho de governos estaduais em relação ao governo federal?
Ainda sobre a pandemia, o Datafolha do final de maio perguntou sobre a responsabilidade de Bolsonaro pelo avanço da epidemia. E dirigiu a mesma pergunta aos entrevistados tendo como alvo o governador do Estado. Enquanto 33% consideraram Bolsonaro “muito responsável”, 20% “um pouco responsável” e 45% “não é responsável”, os governadores foram contemplados, sempre em conjunto e jamais especificamente por cada pedaço da Federação, com 19% de “muito responsável”, 20% “um pouco responsável” e 58% “não é responsável”.
O confronto dos números parece não deixar dúvida quanto à proximidade de distribuição de peso de responsabilidades entre o presidente da República e vários governadores.
E os governadores?
No início da pandemia os dados eram contrastantemente desfavoráveis ao governo federal. Na medida em que as sequelas econômicas passaram a dividir mais espaço com a premência sanitária, observou-se distribuição menos desigual de comprometimento entre o chefe da Nação e a média geral dos comandantes dos governos estaduais.
Não é exagero lembrar mais uma vez e agora com mais substância e impacto que tanto o governador Doria quanto Witzel devem apresentar dados semelhantes ou próximo disso em relação ao governo de Jair Bolsonaro.
Afinal, não se deve esquecer que a média de avaliação dos governadores é fruto do conjunto dos entrevistados que representam todos os espaços territoriais do País. E que a avaliação por região, embora fragilizada também porque não obedece a regras estatísticas de dois pontos percentuais de margem de erro, coloca o Sudeste em situação desfavorável ante os demais territórios.
Fosse, portanto, o Instituto Datafolha mais zeloso com o equilíbrio de tratamento avaliativo, o governo federal e cada um dos Estados seguiriam a mesma cartilha metodológica, respeitando-se os dois pontos percentuais de margem de erro.
Resultados manipulados
A manipulação dos resultados é evidente porque ao tratar o todo (ou seja, os governadores como único bloco) coloca em igualdade de condições diferentes ações individuais dos comandantes estaduais. Cria-se, portanto, um desequilíbrio que beneficia os menos produtivos.
Tanto é verdade que a Folha de S. Paulo revela que nada menos de 68% entre os moradores do Sul do País consideraram “ótimo/bom” o desempenho dos governadores daqueles territórios ante a média nacional de 50%, enquanto 31% dos moradores do Sudeste se posicionaram com a resposta “ruim/péssimo”, acima da média nacional dos governadores de 25%. Não custa lembrar que Rio de Janeiro e São Paulo são Estados do Sudeste brasileiro.
Não custa lembrar, entretanto, que esses números despontam de uma impropriedade estatística: o número de entrevistados do Sul do País que participaram da pesquisa nacional não preenche as regras da margem de erro de dois pontos percentuais.
Como se observa, as especificidades regionais são incompletas em relação às exigências de um todo do governo federal e não tem o correspondente peso individual dos governos estaduais e do Distrito Federal. Por isso, qualquer comparação com Bolsonaro e também entre si, não conta com a base técnica sólida alardeada pelo Instituto Datafolha e por todos os veículos de comunicação que fazem de números falsos notícias também falsas.
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