A Grande Mídia consorciada no objetivo de derrubar o presidente da República ou, em última instância, evitar que ele seja reeleito, perdeu uma grande oportunidade tanto ontem quanto hoje de produzir uma manchetíssima mais ou menos nos termos que coloco acima.
Afinal, se trata de respeitadíssima métrica anunciada todos os anos pela ONU (Organização das Nações Unidas. Seria demais esperar que, apesar de todas as trapalhadas de Jair Bolsonaro e de seus asseclas, a Grande Mídia deixasse de lado a fúria de um combate insano que transformou jornalistas em militantes partidários.
Tentei encaixar no título algo como “apesar de tudo”, mas a ditadura gráfica não abriu espaços suficientes para tanto.
Fica o registro e a complementação. Ou seja: apesar dos pesares dos desmatamentos que vêm do passado, o Meio Ambiente favoreceu o posicionamento do Brasil no ranking de qualidade de vida da ONU. Há piores endereços ambientais no mundo. Isso não é uma frase conformista. É apenas explicativa.
Esconde o principal
Como os leitores verão na sequência, o Brasil tem o melhor desempenho no IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) da temporada passada quando se trata do quesito meio ambiente.
Para não ser repetitivo, vou reproduzir trechos principais de dois jornais do Consórcio da Grande Mídia. O primeiro foi publicado na edição de ontem do jornal Valor Econômico, do Grupo Globo. O segundo na edição de hoje da Folha de S. Paulo. Ainda tratarei da edição de ontem do Jornal Nacional. Assinante do Estadão, juro que não encontrei a página que trata disso. Devo ter me perdido em meio aos papéis.
Meto minha mão de ombudsman não autorizado quando tenho tempo e a atuação da mídia me choca pelo viés nem sempre observado pelos leitores comuns de parcialidade implícita ou explicita.
A selvageria avaliativa de alguns idiotas das redes sociais jamais me intimidou. Muito antes das redes sociais, sob pressões severas, optei pelas evidências e provas materiais de que ninguém melhor que a Polícia Federal e a Polícia Civil para tratar do caso Celso Daniel sem esquisitices políticas patrocinadas pelo Palácio dos Bandeirantes -- então sob a batuta de Geraldo Alckmin.
Aquela sordidez político-criminal em forma de intervenção do Ministério Público Estadual abriu de vez as porteiras a conchavos entre petistas e tucanos. Um acordão geral ganhou a forma de metades da mesma laranja de interesses inconfessos.
Reportagem do Valor
Primeiramente, vamos à manchete e a alguns trechos da matéria do Valor Econômico, sob o título “Brasil perde cinco posições e aparece em 84ª no ranking global do IDH”:
Apesar de manter uma evolução contínua nas últimas décadas, o Brasil perdeu cinco posições no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) calculado pela Organização das Nações Unidas (ONU). De acordo com o relatório referente ao ano de 2019, o país passou da 79ª para a 84ª posição, atrás de vizinhos como Colômbia e Argentina. Desde 1990, o Brasil vem apresentando um crescimento anual médio de 0,77% em seu IDH. A queda na posição do ranking no ano passado é explicada pelo fato de outros países terem apresentado crescimento superior. O relatório – que está completando 30 anos – mostra o Brasil com uma pontuação de 0,765, em uma escala de que de 0 a 1. Quando mais próximo de 1, mais desenvolvido é o país em termos de expectativa de vida ao nascer, nível de escolaridade e de renda.
Reportagem do Valor
A reportagem do Valor Econômico somente chega à abordagem sobre o que supostamente mais interessaria no momento, dada a cobertura da Grande Mídia ao Meio Ambiente, quando chega o quinto parágrafo. Leiam:
Outra novidade trazida pelo relatório é uma adaptação do IDH para o nível de agressão ao meio ambiente praticado por cada país em seus respectivos processos de desenvolvimento. Os dados mostram que, em regra, nações com índices mais elevados agrediram mais a natureza. Para chegar a esse dado, o PNUD (Programa da ONU para o Desenvolvimento) associou o IDH às emissões de gás carbônico por habitante e à pegada de recursos naturais. Feita essa conta, mais de 50 países perdem o status de desenvolvimento humano muito alto, em um reflexo da dependência por combustíveis fósseis. Nesse cenário, o Brasil melhora em dez posições a sua classificação no ranking global, enquanto a China, por exemplo, apresenta um decréscimo de 16. Apesar de as queimadas na Amazônia aparecerem com destaque no documento, a exploração das riquezas naturais ainda representa pouco em termos de alavancagem do desenvolvimento – escreveu o Valor Econômico de ontem.
Reportagem da Folha
Vamos agora para a edição de hoje da Folha de S. Paulo. Leiam os principais trechos. A manchete da Folha segue com conotação negativa ao governo de plantão, embora retrate exatamente o ritmo dos antecessores nem sempre tratados equitativamente: “No primeiro ano de Bolsonaro, IDH avança lentamente”.
O IDH no Brasil em 2019, o primeiro ano do governo Jair Bolsonaro, teve um leve aumento. Porém, o resultado é insuficiente para promover um avanço do país no ranking global. Pelo contrário: o Brasil perdeu cinco posições em um ano, saindo da 79ª colocação para 84ª entre 189 nações avaliadas. (...) O crescimento é lento e reflete especialmente desigualdades de gênero e de renda, como apontam outros indicadores formulados pelo PNUD. O ritmo vem derrubando o país no ranking global de forma continuada. – escreveu a Folha.
Reportagem da Folha
Afinal, onde aparece na reportagem da Folha de S. Paulo a abordagem sobre a posição do Brasil no IDH relativo ao Meio Ambiente? Somente no final do texto:
Pela primeira vez, o PNUD calculou o impacto do desenvolvimento humano no meio ambiente. Foi uma forma de tentar aferir o custo o custo ambiental do incremento na qualidade de vida das pessoas. A aplicação desse critério fez o IDH brasileiro cair para 0,710. A queda, porém, não ocorre no mesmo ritmo de outros países, o que significa que o desenvolvimento humano tem um menor custo ambiental no Brasil do que em outras nações. Levando-se em conta esse recorte, o Brasil subiria dez posições na tabela. A China, por exemplo, cairia 16 posições. No relatório do PNUD, o Brasil é citado por diversas vezes em relação à questão ambiental. O documento cita os incêndios no Pantanal neste ano e o desmatamento na Amazônia.
Jornal Nacional
Entre a leitura do Valor Econômico ontem de manhã e da Folha de S. Paulo desta manhã, passei pelo Jornal Nacional de ontem à noite. A cobertura do IDH foi igualmente parcial, recheada de meias verdades e de verdades dissimuladas, porque não agradam à casa, principal alvo do governo Bolsonaro. As Organizações Globo sentem no bolso as durezas do prélio. A legião de artistas que recebiam sem trabalhar está sendo dizimada por Bolsonaro. Acabou a festa de reserva de mercado. A Globo se dava ao luxo de manter na reserva dezenas de atores e atrizes enquanto o próximo trabalho não vinha. A concorrência que se danasse. Mas isso é outra história.
O que interessa é o que o Jornal Nacional fez ontem à noite com a novidade (sim, a questão ambiental é a grande novidade do ranking da ONU, mas o assunto foi tratado pela Grande Mídia com descaso porque os resultados não eram exatamente o que esperava) não passou de desprezo à inteligência alheia. Resumidamente, a edição deu destaque extraordinário, com direito a entrevistas e gráficos, aos dados negativos históricos do IDH nacional (mencionados como se de autoria exclusiva do atua presidente) e, discretamente, sem apetrechos que chamassem à atenção, e sem entrevistas complementares, à introdução do quesito Meio Ambiente no jogo jogado.
Mais Jornal Nacional
Resumo da ópera? O Jornal Nacional pratica um jornalismo tão inteligente quanto nefasto, na medida em que se utiliza da competência e fragilidades mais que estudas na área ética, para inocular nos telespectadores uma versão sempre incompleta, imprecisa, quando não mentirosa, do padrão desejado.
Os idiotas de sempre, que não sabem ler ou não têm caráter, vão dizer que estou a defender o governo de plantão em Brasília. Com perdão da expressão, esses babacas pensam com a própria cabeça inundada de besteiras ideológicas. Meu campo é o jornalismo profissional e independente. Desde sempre.
Mais Valor Econômico
Para completar, não custa recorrer a uma ampla reportagem do jornal Valor Econômico de 1º de dezembro, sob o título “Amazônia tem maior desmatamento em 12 anos”. O jornal, das Organizações Globo, escreveu o seguinte, em alguns trechos selecionados por mim e que não ferem os princípios e solidez do material:
O desmatamento na Amazônia foi de 11.088 quilômetros quadrados entre 1º de agosto de 2019 a 31 de julho de 2020. A alta é de 9,5% em relação ao período anterior. Em 2019 o desmatamento foi de 10.129 quilômetros quadrados, uma alta de 34% em relação ao período anterior e que correspondia a cinco meses de gestão do governo Michel Temer e sete meses da Presidência de Jair Bolsonaro. Agora, a alta no corte raso da floresta é responsabilidade integral deste governo.
Mais esclarecedor
Um gráfico inserido à reportagem e que expõe o desmatamento da Amazônia desde 2004 poderia ser traduzido na reportagem de ontem como linha auxiliar e esclarecedora do desprezo ao Meio Ambiente no País. Por exemplo: em 2004 a área desmatada correspondeu a 27.772 quilômetros quadrados (mais que o dobro do registrado na temporada 2019-2020). Em quase todos os anos imediatamente subsequentes os números são igualmente superiores. Em 2008, o desmatamento atingiu 12.911 quilômetros quadrados. Houve queda acentuada, a principalmente durante o governo Dilma Rousseff.
O aumento gradativo, com oscilações, se dá a partir de 2014. Coincidentemente a partir da quebradeira econômica nacional, ditada pela estultice de acreditar que os milionários recursos com o mercado internacional de commodities seria eterno.
A Grande Mídia é muito ruim de memória. Trata-se de velha inconformidade embutida nas informações, principalmente dos jornais cada vez mais impactados pelas mídias sociais e pela crise econômica.
Reportagens mal-ajambrada
Querem um exemplo? As reportagens da Grande Mídia poderiam acrescentar que a posição do IDH do Brasil de 2019 é igual a de 2016, depois de quase 13 anos do governo petista.
O Brasil ocupava exatamente a 79ª posição com índice de 0,754 ponto. Abaixo portanto do 0,765 da temporada de 2019. Sempre com o adendo de que se introduziu nova métrica, a de Meio Ambiente, que, acreditem, altera a ordem classificatória do jogo pela qualidade de vida geral. Como não poderia deixar de ser, aliás.
Daí a configuração de erro crasso, porque politizado, da Grande Mídia ao não dar o devido destaque tanto à inovação da ONU quanto aos resultados do Brasil. Apesar dos pesares.
Jornal El País
Estou tão certo de que a Grande Mídia consorciada verde e amarela agiu deliberadamente no mesmo tom (Estadão e Globo, confiro agora, também seguiram a mesma trilha), que chamo o testemunho editorial do jornal El País, versão brasileira, para arrematar de vez a questão. Sob o título “Índice de Desenvolvimento Humano 2020 revela como o planeta sustenta os países ricos”, o El País acertou em cheio. Leiam alguns trechos da matéria:
A Noruega é o país mais desenvolvido do mundo, segundo o último Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) da ONU, que mede a prosperidade em função das condições de vida da população, assim como o acesso à educação e saúde. Mas, se a pressão sobre o planeta entrar nessa equação— com suas emissões do CO2 e o rastro deixado por seu consumo—, o país nórdico cai 15 posições na lista. A Islândia baixa 26 degraus, a Austrália, 72, e os Estados Unidos, 45. O maior baque cabe a Singapura (-92 posições) e Luxemburgo (-131). Em resumo, seus habitantes vivem comodamente à custa do meio ambiente. Na parte baixa da tabela, entretanto, os países mais pobres praticamente não mudam sua qualificação de desenvolvimento quando se leva em conta seu impacto ambiental, que é quase nulo, embora sejam os que mais sofram com as catástrofes climáticas. “Como mostra este relatório, nenhum país do mundo obteve um desenvolvimento humano muito alto sem exercer uma grande pressão sobre o planeta. Mas poderíamos ser a primeira geração a corrigir isso”, disse Achim Steiner, administrador do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) em um encontro virtual com jornalistas antes da apresentação do novo Índice de Desenvolvimento Humano 2020. No 30º aniversário deste documento que calcula a prosperidade dos países, o PNUD se propõe a redefinir o desenvolvimento. Não é a primeira vez. Sua criação, em 1990, representou uma revolução: o IDH procurava medir o progresso independentemente da renda, do PIB e de outros indicadores meramente econômicos. Desde então, ajustou o cálculo à desigualdade de suas sociedades e também à disparidade de gênero. Esses dois parâmetros ocasionam ligeiras mudanças nas posições da lista básica (condições de vida, educação e saúde). Agora, no entanto, a inclusão de indicadores relacionados ao impacto ambiental dos países ocasiona importantes variações na parte alta da tabela. “Atualmente há um espaço vazio entre alcançar o desenvolvimento humano alto e uma baixa pressão sobre o planeta”, observou Pedro Conceição, diretor do escritório do PNUD responsável por este estudo, na entrevista coletiva virtual. Nenhum país atinge uma prosperidade muito elevada sem impactar demais o meio ambiente, mas há bons exemplos. Um dos destacados pelos autores é a Costa Rica, que ocupa o 62º lugar entre 189 países no IDH tradicional, mas sobe 37 posições quando se leva em conta seu nível de emissões e o rastro ecológico de seu consumo. “Já aproveitou a energia hidrelétrica e descarbonizou em grande medida a produção de eletricidade”, observam. O Brasil, originalmente na 84ª posição no ranking de 189 países, sobe 10 degraus. O IDH tradicional do país foi calculado em 0,765, e o país caiu cinco posições em relação a 2018 – publicou El País.
Os botocudos do Grande ABC provavelmente ficarão em silêncio.
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13/11/2024 Diário: Plano Real que durou nove meses (33)