Imprensa

Faltou Polícia no massacre da
CNN Brasil. Chamem a Polícia!

DANIEL LIMA - 28/05/2021

Os telespectadores que acompanharam ontem à noite na CNN Brasil o primeiro episódio do Caso Saul Klein provavelmente não se deram conta de que faltou uma peça essencial a qualquer análise isenta: a Polícia Civil de Barueri. A unilateralidade de reproduzir em padrão cinematográfico o apressado inquérito da promotora criminal Gabriela Manssur revela uma engrenagem de impedimento tácito ao contraditório. E quando o contraditório é espertamente subestimado, quando não violentado, chega-se ao estágio da barbárie informativa.  

Sugiro aos leitores que sigam meu raciocínio. E prestem atenção: a novamente âncora utilizada pela televisão, Ana Paula Banana, saiu de uma sessão de tratamento psiquiátrico para atacar Saul Klein. 

Antes disso, porém, observem com atenção que houve de fato, e comprovado, um estupro processual em forma de segredo de Justiça. Já em dezembro, quando do estouro do escândalo de mão única, com os 14 minutos no Fantástico e reportagens na Folha de S. Paulo e UOL, a transgressão se convertera em sensacionalismo. A Imprensa é livre e deve publicar mesmo tudo o que se lhe apresentar. O segredo da fonte dá respaldo a isso.  

Então, o que há de irregularidade? A desconfiança de que a promotora criminal Gabriela Manssur foi a autora do vazamento ganha impulso porque, na noite de ontem, a representante do Ministério Público Estadual participou como entrevistada da CNN Brasil. Ela abriu oficialmente o lacre da disseminação processual.   

Material superado  

O que a CNN Brasil apresentou ontem à noite é de pleno conhecimento deste jornalista desde dezembro do ano passado. É uma produção sofisticada em relação ao que o Fantástico exibiu na noite de 24 de dezembro. Uma dramatização com mais ênfase. O massacre recrudesceu.   

Agora o massacre é muito mais meticuloso e convincente. Mas a ausência da Polícia Civil que investiga o Caso Saul Klein faz muita diferença porque separa o joio do sensacionalismo do trigo da verdade factual. A Polícia Judiciária estabeleceria um divisor inesgotável de humanismo jogado às traças e de protecionismo elevado à enésima potência.  

A Polícia Civil não foi ouvida ou não rompeu o compromisso legal. Solução? Esperar o fim das investigações ou tratar tudo com equilíbrio entre as partes. Mas quem disse que o arregaço jornalístico esperaria se há muitos mais interesses em jogo do que imaginam os leitores? 

Somente acusadores  

Quando apenas o lado acusador tem vez, não existe a menor possibilidade de resistência dos fatos. Namoradas de cinco anos se tornam pobres estupradas. Sempre com respaldo argumentativo impotente a uma pitada de contraditório.  

Sem que as investigações da Polícia Civil sejam conhecidas oficialmente, qualquer avaliação é precipitada. Como tenho meios de saber o que está ocorrendo, e sei que a história não é bem assim por mais que pareça que é exatamente assim, é melhor ir devagar com o andor da manipulação. O santo da malandragem semântica -- quando não do sufocamento da realidade -- é de barro. 

A CNN Brasil foi tão eficiente em capturar os principais pontos do inquérito ministerial de Gabriela Manssur que cheguei à conclusão mais óbvia deste mundo: foi Gabriela Manssur, promotora que defende mulheres a qualquer preço, a principal mentora da narrativa. Tanto que -- possivelmente por descuido -- a CNN Brasil deixou de dar a Gabriela Manssur o devido crédito entre os profissionais que atuaram no conjunto de uma obra tão extraordinariamente sofisticada quanto escandalosamente unilateral.  A promotora criminal, de bom relacionamento com a emissora, não poderia deixar de aparecer como protagonista intelectual do episódio.  

Cadê as defensoras?  

Para que os leitores mais céticos tenham a ideia do que vem por aí em forma de realidade dos fatos que a Polícia Civil de Barueri está apurando, basta lembrar que um bocado de mulheres jovens como a que se dizem vítimas também prestaram depoimentos e instalaram Saul Klein no oposto do que se apresentou ontem à noite. De monstro a príncipe é apenas um passo avaliativo individual. A diferença entre uma coisa e outra é que por traz das denunciantes está, na origem, uma ex-namorada vingativa, que perdeu o trono e a vida boa. Ana Paula Fogo Banana, ou Ana Banana, claro.  

Para a CNN Brasil, não existe Polícia Civil no Caso Saul Klein. Só fez citação àquela instituição limitando o tempo ao recebimento da denúncia de Gabriela Manssur. O recebimento da denúncia é a passada inicial de uma longa jornada. A CNN Brasil fez do primeiro passo o enredo de cabo a rabo. O segundo episódio nascerá turvo na interpretação dos fatos. Será apena um segundo tempo confirmador do massacre de mão única.   

Esperando a Polícia  

A linha reta de criminalização de Saul Klein já está traçada. Há muito o namorador da Barueri perdeu a batalha midiática, embora conte com expressiva parcela de apoiadores nas redes sociais. Muita gente não compreende como supostas vítimas eram tão vítimas a ponto de voltarem sempre ao matadouro.  

A guerra final travada na Polícia Civil, que investiga para valer e ouve os dois lados, essa guerra é outra coisa. Sei que sei porque me foi dado a saber que o futuro próximo da denúncia de Gabriela Manssur, assessorada por Ana Banana, deverá virar pó. Não resiste às fatualidades já apuradas pela Polícia Civil.  

Sugiro a quem já construiu juízo de valor sobre o Caso Saul Klein que não se precipite, embora reconheça que é muito pouco provável comedimento entre os mais fanáticos.  

O trabalho da CNN Brasil como peça acusatória emprestada à promotora criminal Gabriela Manssur, e suplementarmente à advogada feminista Gabriela Souza, foi perfeito como espetáculo televisivo. Aos olhos da Polícia Civil e do Judiciário, no futuro, o tiro sairá pela culatra caso se confirme o ritmo de investigações.  Materialidades condenatórias não aparecem no radar. São barreiras éticas e legais à espetacularização e ao sensacionalismo que dominam a mídia mais suscetível a grupos organizados de feministas, principalmente.  

Ataques insustentáveis  

Como sempre reitero nos textos do Caso Saul Klein, o que me move ao observar a situação com distanciamento emocional são dois pontos essenciais em qualquer situação semelhante: materialidade e contextualização das narrativas.  

Não existe no âmbito policial nada que dê sustentação ao apressado trabalho de Gabriela Manssur. E o Judiciário, que já se manifestou sobre o caso de forma provisória, descobriu logo que Saul Klein foi enredado por uma quadrilha organizada. Ana Paula Banana e a cafetina Marta Gomes da Silva fazem parte do grupo criminoso.  

Procurem na Internet, vasculhem na Internet, verifiquem na Internet: onde estava Saul Klein durante todos os anos em que foi engolfado pelos quadrilheiros? Não encontrarão nada. Saul Klein, profundamente depressivo, estava a nocaute. Mais que isso: nocauteado e subjugado por uma quadrilha de extorsionistas que contava com Ana Banana e Marta Gomes da Silva como principais personagens de dominação.  

Dominado em casa  

O Saul Klein de rosto inchado que se vê em algumas imagens do episódio da CNN Brasil (sempre cercado de mulheres alegres, muito alegres) era um homem aprisionado em sua própria casa. E, mais que isso: envenenado com a mistura de medicamentos e bebidas alcoólicas preparadas pelas algozes.  

O arrependimento programado de Ana Paula Banana ontem na CNN Brasil expõe mais que uma face teatral de quem faz um jogo pesado de vingança. Bem orientada, ela encaminha espécie de salvação ante desdobramentos que virão na esfera criminal como participante de uma organização criminosa.  

Mais que isso: posta-se também como vítima de Saul Klein, levando-o ao centro do escândalo. Segue rigorosamente o roteiro compartilhado com a promotora criminal Gabriela Manssur. Uma espécie de antessala de delação premiada. Quer escapar do contragolpe da legalidade instaurada nas investigações policiais. A psiquiatria, que Ana Banana tem frequentado, explica muitas coisas sobre a arrancada velocista rumo ao extremo oposto. De ré potencial a mocinha salvadora da pátria feminista.  

Estrutura impecável  

Há de se reconhecer que a estrutura do programa foi impecável. Um organograma corporativo que colocou Saul Klein no topo da hierarquia de criminalidade foi genial. Transmite credibilidade e, com isso, procura corrigir os profundos buracos que o enredo de Gabriela Manssur não resistem às investigações policiais. Fez-se uma nova leitura estratégica do Caso Saul Klein. Só faltou combinar com a Polícia Civil.  

Sugeriria à defesa de Saul Klein, fosse eu um leitor ou telespectador de primeira viagem, que se prepare para o pior após o episódio de ontem da CNN Brasil. Como não sou leitor de primeira viagem e tampouco o advogado André Boiani está distante dos acontecimentos que se verificam no âmbito da Polícia Civil, minha sugestão vai mesmo aos leitores apressados.  

Como Gabriela Manssur o foi em dezembro do ano passado: cuidado com o que dizem e escrevem nas redes sociais. Não caiam nas garras do direcionamento escandaloso à condenação de um homem que tem lá suas extravagâncias para as convenções sociais mais conservadoras, mas está longe de estar no topo de uma sociedade de estupros e abusos, quando não de gordofobia e racismo, como afirmaram ontem na CNN Brasil.  

Muito longe disso: são as mulheres do alto da hierarquia do Caso Saul Klein que estão numa enrascada. Afinal, por mais que abusem de narrativas enviesadas, nenhuma delas encaixa um golpe sequer que leve o desafeto a nocaute policial e judicial. Nem com a ajuda imensa da Grande Mídia cada vez mais convertida em tribunal de exceção, de assassinato social – como se o passado não fosse suficiente ao aprendizado. Nem dissimular isenção investigativa de verdade a Grande Mídia se presta mais. O espetáculo está em primeiro lugar.  

Jogo de time único  

Ou alguém tem coragem de defender essa mídia que está aí? Repararam o tempo que se disponibilizou à defesa de Saul Klein? E à médica Silvia Petrelli, que conhece muito mais as mulheres de Saul Klein do que uma profissional da área que integra os quadros de uma organização que sempre parte do pressuposto de que os homens, pobres homens, quaisquer homens, não valem nada.  

Para Silvia Petrelli, conceituada ginecologista de São Caetano que Saul Klein contratou para evitar doenças venéreas e outras patologias de quem adentrava os dois endereços domiciliares de que dispõe, não se deu espaço praticamente nenhum. A versão de que Saul Klein transmitia doenças a jovens já foi sumariamente negada nas investigações policiais pela doutora Silvia Petrelli. Com provas contundentes. Com prontuários médicos. A CNN Brasil deu a Silvia Petrelli e ao outro médico contratado por Saul Klein alguns míseros segundos. O massacre não poderia correr o risco de fracassar.  

A ausência da Polícia Civil no primeiro episódio da série da CNN Brasil tem o mesmo significado que transformar o futebol num jogo de uma única equipe. Para disfarçar, deixa-se o adversário entrar em campo com um zagueiro, um meio-campista e um atacante, como os médicos e o advogado de Saul Klein. E bote a bola para rolar com dezenas de câmeras a tomar todos os detalhes.  

Se o leitor considera tudo isso prova de maturidade jornalística no tratamento do Caso Saul Klein ou de qualquer outro acontecimento naturalmente polêmico, então o leitor não tem razão alguma de se ocupar com estas linhas.  Até o dia em que sentir na própria pele a dor de vítima de um assassinato social, que, em suma, é a impossibilidade de utilizar o direito inalienável de se defender de uma acusação com o respaldo de fatos comprováveis que resultam de contraditórios argumentativos e materiais.  



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