Muito mais que trancos e barrancos. Acrescentem buracos e desfiladeiros. Estamos fechando a temporada de 2021 completando 32 anos de circulação da revista digital CapitalSocial. Por mais que se procure, ninguém vai encontrar algo que se assemelhe a esta publicação em qualquer região do País. Em qualquer plataforma de produção. Jornalismo fastfoodiano não tem espaço aqui. Perecibilidade é palavra proscrita aqui.
Agora, neste janeiro, daremos prosseguimento a uma saga que começou em março de 1990, quando saiu do prelo a edição inaugural da revista impressa LivreMercado. CapitalSocial é sucessora daquela publicação. Está no mercado de informação analítica desde 2001.LivreMercado/CapitalSocial são frutos da mesma cepa de inconformismo. E de esperança.
Baixamos nesta temporada média anual de produção editorial de CapitalSocial (contando a partir de primeiro de janeiro de 2009, já sem a companhia de LivreMercado) de 450 para 236 textos analíticos. Uma queda brutal que se explica num ato igualmente brutal. É aí que entram trancos, barrancos, buracos e desfiladeiros.
Ainda capengando
Estou ainda capengando em três dimensões corporais -- fisicamente, mentalmente e clinicamente -- para me recuperar do tiro no rosto, à queima roupa, naquele começo de tarde de primeiro de fevereiro num pet shop vizinho à minha residência.
Brinco com a tragédia (quando interlocutores perguntam como estou é difícil resistir à emoção) ao dizer que há um confronto monumental entre o estado intocável da integridade cognitiva (até prova em contrário dos maledicentes) e o restante daquilo que chamaríamos de corpo, de alma e de mente.
A mente não dá folga ao corpo que não responde como antes, por força de sequelas que médicos tentaram me esconder, mas exames e dores desnudaram. A alma saltita.
Saga permanente
Mas isso não interessa agora. Primeiro de fevereiro vem aí e pretendo revelar a autoanálise que tenho me imposto para tentar traduzir o que é a experiência de estar entre a vida e a morte num piscar de olhos. Deixemos para aquela data, portanto.
O que interessa mesmo é que, neste que é o último texto de CapitalSocial nesta temporada, conseguimos sustentar a essência da publicação, voltada ao escrutínio social, econômico e político do Grande ABC.
As 258 análises desta temporada (22 das quais antes de primeiro de fevereiro e as demais após o intervalo obrigatório de 30 dias de convalescença) provam que CapitalSocial segue como veículo regional sem seguidores.
Aqui não há espaço à informação rasa, circunstancial, sem conteúdo explicativo e interpretativo que leve em conta um contexto amplo e coerente.
Uma edição atrás da outra seguimos, rigorosamente, sem intervalo mínimo, o dogma de tornar CapitalSocial, como LivreMercado, muito mais que uma produção jornalística com prazo de validade dos insumos. A memória de CapitalSocial é elástica e desafiadora.
Um caso emblemático
Traduzindo tudo isso, que parece elogio em boca própria, em exemplo insofismável: o caso do julgamento do agora prefeito José Auricchio. Diferentemente de todas as mídias da região, CapitalSocial ingressou no assunto com a decisão editorial de clarear o horizonte de resolução do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
O mais incrível e surpreendente é que havia uma vereda imensa de definição dos magistrados e ninguém se dignou a orientar consumidores de informação sobre a tendência do resultado. Menos CapitalSocial. Só erramos no placar porque fomos generosos: ao invés de 6 a 1, deu 7 a 0 para Auricchio.
É claro que essa postura editorialmente resolutiva que se soma a tantas outras gera desconfiança de que haveria entre a publicação e o prefeito até então barrado do baile algo além do compromisso com a informação de valor agregado. Pura bobagem. Quem conhece os cromossomos de CapitalSocial sabe que não há coelho na toca.
Prefeito petista
Expor posicionamentos é uma característica inalienável de CapitalSocial, assim como o foi de LivreMercado. A mesma LivreMercado que circulou durante duas décadas e cuja parte do acervo já está incorporada a esta revista digital.
Também é preciso lembrar que os 32 anos de CapitalSocial, absorvedores dos 19 anos de LivreMercado, não levam em conta algumas dezenas de textos que produzi para o Diário do Grande ABC e para a Agência Estado, que servia não só ao jornal O Estado de São Paulo e Jornal da Tarde mas a uma rede de mídias no País.
Esse acervo complementar não entra na contabilidade porque não eram de responsabilidade corporativa deste jornalista, embora o fosse de livre-arbítrio deste mesmo jornalista.
Um exemplo desse livre-arbítrio: em 1986, então na Agência Estado, preparei uma reportagem especial (a primeira no jornalismo do País) sobre a primeira administração petista no território nacional, com o operário Gilson Menezes à frente da Prefeitura de Diadema.
A reportagem saiu como manchetíssima (manchete das manchetes de primeira página) do então invejável Jornal da Tarde, do Grupo Estado, o jornal mais revolucionário feito pelos paulistas até então. Aquela reportagem está no acervo de CapitalSocial.
Celso vence Lula
Saberia o leitor responder quantas vezes, em agora 7.635 matérias do acervo de CapitalSocial (vamos tentar acrescentar algumas dezenas durante os próximos 15 dias de supostas férias) constam textos que tratam direta ou indiretamente de Celso Daniel? E de Lula da Silva? Quem o leitor acha que tem mais registros? Acertou quem respondeu Celso Daniel: são 1.090 ante 817 de Lula da Silva.
E Dilma Rousseff, quantas vezes aparece em matérias de CapitalSocial? 523. Muito mais que as 167 de Jair Bolsonaro, mas um pouco menos (533) que de Paulinho Serra e pouco mais (521) que de Orlando Morando.
Um dos temas-chave de CapitalSocial ao longo dos tempos não poderia deixar de aparecer com destaque no acervo de 32 anos: Rodoanel registra 433 matérias. Um pouco mais que “montadoras de veículos”, com 422, mas menos que “logística”, com 636 aparições e, vejam só, “competitividade” com 1.348 apontamentos.
Nesse ponto, cabe uma pausa antes de prosseguir com outros placares: “competitividade” expressa numericamente a abrangência, a inquietação, o inconformismo e tudo o mais da linha editorial de CapitalSocial com o futuro do Grande ABC.
Muito mandachuva
Um futuro que passa obrigatoriamente pela “Doença Holandesa”, expressão que define a dependência do Grande ABC e de São Bernardo em particular da indústria automotiva. Aparece 224 vezes no acervo de CapitalSocial. Mais que as 61 vezes de “sociedade desorganizada”, expressão que combate vendedores da farsa de que somos uma região de entrelaçamento social.
Talvez algum dia alguém decida fazer uma curadoria de verbetes e expressões que caracterizam a linha editorial de CapitalSocial também com a personalização de determinadas realidades e culturas. Um exemplo: “Complexo de Gata Borralheira”, que me levou a escrever um livro em 2002, aparece 307 vezes em quase oito mil textos de CapitalSocial. Perde feio para “mandachuvas”, que aparece 574 vezes, mas supera “mandachuvinhas”, com 222 apontamentos.
PIB avassalador
Possivelmente nada superaria em incidência editorial de CapitalSocial as três letras que, juntas, são nossa maior preocupação com o futuro dos sete municípios: “PIB”. Até agora há 1.333 registros.
Talvez nada como “PIB” seja tão escancaradamente definidor da essência de CapitalSocial, porque ficamos a cada temporada com o coração na mão até que saltem os números que medem a geração de riqueza regional, fonte definidora do futuro que há de chegar e do passado que já não é possível mudar.
Ficar com o coração na mão a cada vez que recorremos ao “PIB” não é força de expressão. Tanto que “cidadania” aparece em 1.155 textos, “solidariedade” em 274, “compromisso social” em 89 e “comprometimento social” em 73 textos.
CapitalSocial, legítima herdeira genético-editorial de LivreMercado, é a fermentação de um jornalismo intestinamente comprometido com a sociedade. Trinta e dois anos passaram rápidos. Nem nos piores momentos desta temporada duvidava desse momento de breve prestação de contas. Estaremos de volta na segunda semana de janeiro.
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13/11/2024 Diário: Plano Real que durou nove meses (33)