Economia

Biguccinho repete pai e segue
manipulando setor imobiliário

DANIEL LIMA - 07/03/2022

Milton Bigucci Júnior segue a tradição e o modus-operandi do pai Milton Bigucci à frente do Clube dos Construtores do Grande ABC (Acigabc): trata a imprensa crédula e descuidada e principalmente os consumidores de produtos imobiliários com responsabilidade semelhante a de um pai que deixa o filho à beira do precipício. 

No caso, o precipício é a economia popular, levada no bico por dados fraudulentos. Entenda-se dados fraudulentos como a pirataria ética de subestimar a hierarquia de informações que realmente interessam, e a omissão de informações relevantes e que fazem a diferença entre a verdade e a meia-verdade, entre tantos vetores. 

O balanço anual do mercado imobiliário do Grande ABC que Milton Biguccinho apresentou é um escárnio quando o ponto referencial é a responsabilidade social.  

Ele, como o pai no passado, pega os dados estatísticos pelo colarinho do desrespeito e faz gato e sapato dos resultados finais. Em completo desacordo com a realidade econômica dos fatos. Para dano dos consumidores de informações que também são consumidores de produtos imobiliários.  

FALTA MINISTÉRIO PÚBLICO 

O sarapatel de dados confusos e misturados para driblar a plateia deveria ser levado em conta por instituições de olho em falcatruas, caso, por exemplo, do Ministério Público.  

O que o Clube dos Construtores tem feito ao longo dos anos é uma associação de descaso e escárnio. 

Trata-se de uma entidade que carrega o malabarismo semântico e manipulador em todos os metros quadrados da sede própria que detém em São Bernardo e que, por falta de representatividade própria, está alugada permanentemente a terceiros.  

Mais que isso: a Acigabc (identidade oficial do Clube dos Construtores) segue a viver de mesadas do Secovi, a entidade-mãe com sede na Capital. Ou seja: não tem representatividade institucional suficiente para distanciar-se das tetas da entidade central.  

VIVENDO DE MESADA  

O Clube dos Construtores é um puxadinho feito sob medida para levar ao público versões paralelas do mundo real. E quem paga o pato são os adquirentes de imóveis, levados a consumir fake news da pior espécie.  

Quem tiver o cuidado e o capricho de buscar declarações de representantes do Clube dos Construtores no próprio site da entidade ficará horrorizado com os cenários desenhados.  

O Grande ABC é um eterno paraíso imobiliário. Falta combinar, claro, com a prática.   

O comportamento institucional do Clube dos Construtores desagrada a maioria dos empresários do setor, que conhece bem o ritmo da chuva de complicações ditadas pela permanente quebra do PIB Geral do Grande ABC neste século. Como se não bastassem as duas últimas décadas do século passado. 

SANTAGUITA É EXCEÇÃO  

Mas o que se pode fazer se fraudar dados é prática recorrente tanto quanto a tradição de inutilidade do Clube dos Construtores, há mais de três décadas sob o controle da família Bigucci?  

É verdade que essa trajetória contou com emblemático intervalo de três anos de seriedade da gestão de Marcus Santaguita. O jovem empresário colocou ordem no barraco de manipulações despudoradas no campo estatístico. 

Como no ano passado, Milton Biguccinho escondeu os dados reais do comportamento do mercado imobiliário na região na temporada anterior, nesse caso de 2021. 

Vamos apresentar a versão oficial do Clube dos Construtores, que a Imprensa reproduziu praticamente sem opor qualquer resistência. Em seguida, trataremos de dar tratos à verdade dos fatos. É isso que se chama jornalismo. Em proteção aos interesses da sociedade. 

Vamos, portanto, às informações oficiais da Acigabc, o Clube dos Construtores. Não faremos qualquer mudança no texto. O título do material é sintomático: “Mercado imobiliário tem saldo positivo em 2021 no Grande ABC, com aumento de 60,4% nos lançamentos e 6,7% nas Vendas sobre Ofertas (VSO): 

CARTA DA ACIGABC 

Lançamentos – O total de lançamentos entre janeiro e dezembro de 2021 foi de 2.741 unidades, apresentando um aumento de 60,4% em relação ao mesmo período de 2020 (1.709 unidades). A cidade de São Bernardo do Campo liderou os lançamentos em 2021, com participação de 1.578 unidades lançadas, seguido por Santo André com 590 unidades, Diadema com 468 unidades e São Caetano do Sul com 105 unidades. 

Comercialização – No acumulado entre janeiro e dezembro de 2021, foram comercializados 2.466 imóveis novos no Grande ABC. O resultado representa queda de 9,1% em relação às 2.712 unidades comercializadas em 2020, porém tínhamos uma oferta menor de imóveis na região em 2021, ou seja, se compararmos as vendas sobre oferta (VSO) em relação ao ano anterior, o saldo é positivo para o mercado do ABC. 

VSO (Venda Sobre Oferta) – A boa notícia ficou no indicador VSO, que apura a porcentagem de vendas em relação ao total de unidades ofertadas de janeiro a dezembro de 2021, atingindo a média de 15,5%, representando crescimento de 6,7% em relação à média de 14,0% do período anterior. 

VGV (Valor Geral de Vendas) – Entre janeiro e dezembro de 2021, o VGV movimentado nas cidades do ABCD totalizou R$ 1.165,300, volume 16,5% menor que o registrado em 2020, de R$ 1.396,400, valores atualizados pelo INCC-DI da Fundação Getúlio Vargas de dezembro de 2021. 

Oferta Final – As cidades do Grande ABC encerraram 2021 com a oferta de 1.199 unidades disponíveis para venda. Esta oferta é formada por imóveis na planta, em construção e prontos (estoque), lançados nos últimos 36 meses (janeiro de 2019 a dezembro de 2021). Houve um aumento de 14,5% em relação a dezembro de 2020, mês em que foram registradas 1.047 unidades não comercializadas. 

Conclusão – Apesar do impacto negativo da pandemia sobre a economia nacional, o setor imobiliário conseguiu manter um ritmo de crescimento. Os fatores que justificam essa análise foram a taxa de juros básicos em níveis baixos até o último trimestre de 2021, o “Fique em Casa”, aumentando ainda mais a procura por um imóvel durante a pandemia, e a grande demanda reprimida nos últimos anos. Tudo isso trouxe confiança para os empresários acreditarem no mercado, aumentando o número de lançamentos, e para os clientes, que se sentiram seguros para adquirir um imóvel. 

VAMOS AOS FATOS 

Expostas as vísceras manipulativas da direção do Clube dos Construtores num comunicado pessimamente redigido, porque confuso, vamos aos esclarecimentos que fundamentam a conclusão deste jornalista. 

A ênfase que o comunicado do Clube dos Construtores dá a uma vertente menos importante do mercado imobiliário, no caso o balanço de lançamentos, é estrategicamente dissimuladora. O que se pretende é mesmo esconder o principal. E o que o presidente Milton Biguccinho só engana a quem é incauto. 

Não bastasse a inversão de valores (o balanço de vendas é a base de sustentação de qualquer análise que se faça no setor imobiliário, conforme se verifica nos balanços do próprio Secovi, o Sindicato da Construção), o Clube dos Construtores se excede porque faz prestidigitações numéricas. 

Quando o comunicado afirma que no ano passado houve aumento de 60,4% nos lançamentos em relação a 2020 (2.741 unidades ante 1.709), faltou informar que a base de comparação despreza o passado como o passado é de fato.  

CAINDO PELAS TABELAS  

Afinal, em 2020, quando comparado ao ano anterior, 2019, houve queda de 59,5% nos lançamentos. Foram 4.215 unidades naquela temporada.  Tradução: os lançamentos registrados no ano passado ficaram 34,97% abaixo dos dados de 2019. Voltar ainda mais no tempo seria covardia porque as perdas se elevam.  

Outro aspecto relevante em relação ao conceito técnico de lançamentos é camuflado pelo Clube dos Construtores: lançamentos imobiliários não são um indicador confiável a ponto de construir uma via de sustentação dos negócios. 

Afinal, entre regularização do imóvel pretendido nas instâncias burocráticas e a entrega aos compradores há uma grande distância. E, em muitos casos, o que era previsão vira esfarelamento de expectativas. 

O que vale mesmo em qualquer balanço imobiliário como ponto de partida a análises (e é importante repetir) é o número de unidades vendidas.  

QUEDAS CUMULATIVAS  

E o Grande ABC do ano passado vendeu menos 9,1% em relação ao ano anterior. O Clube dos Construtores esconde que no caso o ano anterior a 2021 é o ano de 2020 que, por sua vez, acusara queda de vendas de 27,2% em relação à temporada de 2019. Que, por sua vez, também rateou. 

Quando se tem como base o ano de 2019 e na outra ponta o ano de 2021, os números são elucidativos: 3.727 ante 2.466. Uma diferença negativa de 33,83% somente nesse período. Traduzindo: em dois anos, o Grande ABC perdeu um terço de vendas de imóveis novos.  

Diferentemente do Grande ABC que teve queda de quase 10% na venda de imóveis novos no ano passado, a Capital vizinha elevou os negócios em 29% ante 2020. Foram vendidas 66,1 mil unidades residenciais. 

A degringolada econômica do Grande ABC, raiz do comportamento do mercado imobiliário, se expressa no balanço dos últimos seis anos, entre 2016 e 2021: com o total de vendas de imóveis novos acumulado de 16.893 unidades, o Grande ABC registra apenas 25,55% do que a Capital comercializou no ano passado, apenas no ano passado.  

Repetindo: em seis anos, o mercado imobiliário do Grande ABC vendeu apenas 25% do que São Paulo vendeu em um ano.  

PARTICIPAÇÃO ÍNFIMA  

Os tempos áureos de esquartejamentos da verdade dos fatos, quando brincava de dados estatísticos que ele mesmo fabricava, o então presidente do Clube dos Construtores, Milton Bigucci pai, propagava aos quatro cantos que a participação relativa anual do mercado imobiliário do Grande ABC frente à Capital oscilava entre 25% e 30%. Uma distorção alucinante. 

Tanto é verdade que desde a contratação de uma empresa especializada no mercado imobiliário que também atende o Secovi (e que Milton Bigucci descartava no período de mandachuva), o desempenho real tem sido duramente explicitado.  

No ano passado, a participação relativa da região no conjunto do mercado formado pela Capital e pelos municípios locais (68.566 unidades) não passou de 3,60%, ou seja, 2.466 unidades frente a 66,1 mil da cidade de São Paulo. 

Traduzindo: de cada 100 imóveis novos vendidos no mapa específico que envolve São Paulo e os municípios da região, apenas 3,5% constaram dos negócios na região.  

FORA DO EIXO  

A população de São Paulo é quatro vezes maior que a soma dos sete municípios do Grande. O PIB do Grande ABC é cinco vezes menor que o PIB de São Paulo. A participação relativa da região no bolo imobiliário deveria ser, portanto, bem maior.  

Mas não o é porque cada vez mais o PIB não se traduz em consumo interno por conta de especificidades produtivas. Em São Paulo, o PIB é resultado de fontes de riqueza mais diversificadas e interiorizadas. 

Seria cômico não fosse trágica a nota oficial do Clube dos Construtores do Grande ABC que trata como “boa notícia” o indicador de Venda Sobre Ofertas, que atingiu a média anual de 15,5%, representando crescimento de 14,0% frente ao período anterior.  

Nada mais falso. O VSO é resultado direto do confronto de unidades ofertadas   versus unidades vendidas.  

MÁGICA DA VELOCIDADE  

Com a queda de ofertas em forma de lançamentos que não acompanham nem mesmo o raquitismo de vendas, é natural que quanto menos oferta, mais a velocidade de vendas estará consumada. 

Esse é o caso específico do Grande ABC. A oferta de imóveis novos no Grande ABC, segundo o boletim do Clube dos Construtores, registrou ao fim de 2021 o total de 1.199 unidades disponíveis para vendas.  

Quando se colocam luzes nesses números, a situação é ainda pior porque o conceito de oferta é formada por imóveis na planta, em construção e prontos (em estoque), lançados nos últimos 36 meses. 

Apenas a título de comparação, o balanço da Capital, segundo o Secovi, aponta que o ano de 2021 terminou com 65.865 unidades disponíveis para venda, o equivalente a 12 meses, considerando-se a média de comercialização mensal do ano (5.508 unidades).   

No Grande ABC, ano passado, foram comercializadas em média 205 unidades a cada 30 dias, equivalentes a menos de seis meses de imóveis disponível. Tradução dessa distância: faltam investimentos no mercado imobiliário da região porque há areia em excesso na engrenagem econômica, com perdas seguidas de riqueza produtiva e de renda.  

A Velocidade Sobre Venda, portanto, é um dos quesitos complicadores na região. Exatamente o contrário do que o Clube dos Construtores vende à sociedade como prova falsa de vitalidade dos negócios e dos investimentos no setor.



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