Uma das diferenças que mantenho há muito tempo do prefeito Paulinho Serra é que ele faz muito marketing e eu faço jornalismo. Cada um na sua. Basta respeitar. Mas o respeito no sentido mais amplo do significado não pode incorporar a cara e o corpo de omissão. A sociedade consumidora de informação precisa ser respeitada.
Paulinho Serra é um festeiro. E isso custa muito caro para o futuro de Santo André. Ele esquece que o “gigantesco viveiro industrial” do Hino Oficial de Santo André foi para o brejo há muito tempo.
Prova são os empregos formais do setor de serviços que o prefeito comemora. Caindo pelas tabelas no ranking dos maiores municípios do Estado, Santo André segue sem rumo e sem prumo econômico. Os dados são insofismáveis.
Está nos jornais de hoje que o tucano comemora o saldo líquido de pouco mais de 500 empregos formais do setor de serviços em janeiro.
Paulinho Serra sempre perde a oportunidade de relativizar as supostas boas notícias. O setor de serviços de Santo André é predominantemente de salários baixos. Muito abaixo do setor industrial, que segue a registrar declínio em números absolutos e relativos, além de remuneração média.
É difícil conciliar o que chamaria de conceito de Desenvolvimento Econômico quando entre as pautas em exibição está o valor do emprego no sentido mais amplo possível.
Santo André é a capital do emprego de serviços do Grande ABC. Seria muito bom se o emprego de serviços em Santo André e na região como um todo não fosse de baixa qualidade.
Celso Daniel projetava há 25 anos que precisávamos encontrar alternativas para atenuar a desindustrialização. Não encontramos. Pior que isso: há prefeitos ao longo da história, como Paulinho Serra agora, que desfilam garbosamente no cordão dos ilusionistas.
Em dezembro de 2020 (os dados mais atualizados), o emprego de serviços em Santo André representava 57,07% do total do estoque com carteira assinada. Ou seja: de cada 100 empregos formais, 57 estavam nos serviços prevalecentemente de baixa remuneração.
Quem acreditava que São Caetano estaria na liderança desse ranking está enganado. Em São Caetano, de cada 100 empregos formais, 49,86% são de serviços. Pouco mais que os 44,35% de São Bernardo, os 33,84% de Mauá, os 27,37% de Ribeirão Pires, os 27,39% de Rio Grande da Serra e os 23,48% de Diadema.
A substituição gradativa e mortal de empregos industriais por empregos de serviços ajuda a explicar a quebra da mobilidade social no Grande ABC.
Perdemos a capacidade de gerar famílias de classe rica e classe média tradicional. Isso está fartamente documentado em estudos que produzi ao longo dos anos para LivreMercado e CapitalSocial.
É impossível encontrar um caminho de ramificações produtivas tendo do outro lado da linha do trem descarrilado um prefeito que insiste em dourar a pílula.
Paulinho Serra e seu entorno acham que a população engole marketing com farinha. Pode até engolir por determinado tempo. Mas a história prova que não se vive só de marketing.
As declarações de Paulinho Serra e do secretário de Desenvolvimento Econômico de Santo André nas páginas do Diário do Grande ABC de hoje são um atentado ao bom senso. Não é possível deixar de registrar os trechos mais relevantes.
A propósito das pouco mais de 500 vagas abertas no setor de serviços, Paulinho Serra disse exatamente o seguinte:
Com planejamento e gestão, Santo André conseguiu manter seu protagonismo socioeconômico, mesmo em meio à pandemia. Um desempenho que sagra a nossa cidade como uma das líderes em geração de emprego e renda. Resultado importante para a retomada econômica e para entender o perfil de investimentos que a cidade possui agora” – disse o prefeito.
Agora leiam o que disse o secretário Evandro Banzato:
Uma vez mais Santo André inicia o ano de 2022 com o pé direito, cumprindo aquele que é o nosso papel de promover o desenvolvimento, atrair investimentos capazes de gerar emprego e renda na cidade. Empregos que, inclusive, movimentam o Grande ABC. É a melhor injeção de ânimos que nós poderíamos ter”.
Anotaram bem as declarações do prefeito e do secretário de Santo André? Agora vejam o outro lado da questão.
A média salarial do setor de serviços em Santo André, sempre com carteira assinada, é de R$ 2.945,14 mil. Os números são de dezembro de 2020. Os números do Ministério do Trabalho de dezembro do ano passado ainda não foram publicados. Mas não alterarão praticamente nada porque os valores médios se movimentam lentamente para cima e para baixo.
Afinal, o que significa a média salarial de serviços de R$ 2.945,14 mil em Santo André? Significa que está 30,22% abaixo da média salarial do setor industrial, que, também em dezembro de 2020, registrava R$ 4.220,71 mil.
Para quem gosta e aprecia comparações intrarregional, ou seja, entre os municípios locais, o ranking do emprego de serviços coloca Santo André em terceiro lugar, abaixo dos R$ 3.398,94 de média em São Caetano e dos R$ 3.016,66 de São Bernardo. Já no salário médio industrial Santo André repete o terceiro lugar, só que de novo atrás de São Bernardo (R$ 5.896,10) e, agora, de Mauá (R$ 4.407,56).
Não é somente isso que preocupa. Quando se pega pelo chifre de nova comparação o salário médio industrial das três maiores cidades da região, em São Bernardo a vantagem do salário médio do setor de transformação sobre o de serviços é de 48,83%, enquanto em Mauá alcança 46,53%.
Querem mais dados que preocupam quem não se deixa seduzir pelo marquetismo?.
Então vamos lá: quando se consideram os salários médios de todos os trabalhadores com carteira assinada dos sete municípios do Grande ABC, Santo André só está à frente de Ribeirão Pires e de Rio Grande da Serra.
Se você está surpreso é porque não tem acompanhado como deveria o andar da carruagem do Grande ABC que esmiuçamos deste março de 1990, quando criamos a revista LivreMercado. São 33 anos de janela quando se considera a nova marca de LivreMercado, este CapitalSocial.
O salário médio geral em Santo André em dezembro de 2020 não passava de R$ 3.116,65 mil. São Bernardo é a primeira colocada com R$ 3.869,27 mil (vantagem relativa de 22%), São Caetano em segundo com R$ 3.532,93 mil, Diadema em terceiro com R$ 3.406,30 mil e Mauá em quarto com R$ 3.268,78 mil.
O leitor já começou a notar que as mensagens positivistas do prefeito Paulinho Serra e do secretário Banzato não têm consistência?
E quando as mensagens são supostamente positivista, mas não têm lastro, se tornam um estorvo, uma chacota, uma aberração. Até porque não se trata de coisa recente.
A derrocada econômica de Santo André vem de longe, vem do século passado.
O prefeito Paulinho Serra foi advertido por este jornalista muito antes de tomar posse do primeiro mandato que não deveria cair na farra do triunfalismo, porque o triunfalismo é duplamente nocivo: ganha características de enganação e estabelece um divisor de águas de mediocridade. Sem contar que mexe com a psicologia social.
Afinal, na medida que fraudes numéricas são destiladas, a população interioriza sentimento de impotência individual que ganha a seguinte formulação: “Será que sou incompetente diante de tamanho avanço”. Avanço de mentira, de mentira. E altamente prejudicial a todos.
Em fevereiro deste ano analisei o comportamento do emprego com carteira assinada no ano passado. A criação de 37.014 postos recuperou parte dos 94 mil empregos destruídos a partir de 2015, quando se iniciou a recessão produzida pela política econômica do governo federal. Tudo depois de anos de ouro do governo Lula da Silva.
Não restringi os números ao Grande ABC. Abrangi o território elástico do G-22, o Clube dos Municípios Mais Poderosos do Estado de São Paulo, exceto a Capital. Santo André do eufórico Paulinho Serra e de seu secretário de Desenvolvimento Econômico, ficou aquém do esperado no ano passado.
Os números dos sete municípios do Grande ABC no ranking de produtividade (ou seja, a capacidade de somar carteiras assinadas às existentes ao fim de 2020) foram bem mais discretos que os concorrentes do G-22.
Santo André registrou avanço de 4,45%. Bem menos que os 7,96% de Mauá, os 5,51% de São Bernardo e um pouco menos que os 4,99% de São Caetano.
Naquela análise fiz até uma comparação para explicar a metodologia correta para aferir o comportamento do emprego.
Perguntei o que é maior para efeitos práticos -- os 8.557 empregos formais de saldo positivo em Santo André ou os 4.661 de Mogi das Cruzes? Acertou quem apontou Mogi das Cruzes, na Grande São Paulo. O estoque daquela município cresceu 4,84% no ano passado, frente a 2019, enquanto Santo André não passou de 4,45%.
Para completar reproduzo o título e os primeiros trechos do texto que publiquei nesta revista digital em novembro de 2016, ou seja, pouco antes da posse do prefeito. Está aí o que Paulinho Serra deveria ter seguido. Ele preferiu o caminho indicado pelos marqueteiros inconsequentes. Leiam:
Paulinho Serra sabe que Santo
André é uma grande encrenca
DANIEL LIMA - 24/11/2016
O prefeito eleito de Santo André sabe o tamanho da encrenca que o espera a partir de janeiro próximo. O diálogo que mantivemos durante quase uma hora, no escritório que ocupa no Bairro Jardim, não foi um voo rasante. Preferimos voo panorâmico. É impossível ir a detalhes durante tão pouco tempo. Mas a conversa foi suficiente para arrancar do novo prefeito uma promessa importante.
Trata-se do seguinte: Paulinho Serra não vai mais falar de Santo André com o entusiasmo típico de quem ganhou a eleição mais fácil da história, mas sim com a preocupação de quem sabe que a herança maldita das últimas administrações e o encalacramento econômico da ex-capital econômica da Província do Grande ABC são desafios demais para enfrentar durante pelo menos quatro anos. Exibir sorriso a todo instante soaria alheamento.
O ambiente econômico e social de Santo André não permite o que chamaria de tom comemorativo nas declarações de qualquer agente público ou privado. Até mesmo em respeito aos concidadãos de um Município órfão industrial e capenga nos setores de serviços de baixo valor agregado. Quem está a festejar muito é uma minoria de ricos com a vida resolvida e também um bando de hienas que riem da própria desgraça. Paulinho Serra precisa ser austero inclusive na postura pública.
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