Economia

São Bernardo sofre mais com
Doença Holandesa Automotiva

DANIEL LIMA - 30/03/2022

Escrevi outro dia que é muito mais difícil ser prefeito de São Bernardo do que ser prefeito de Santo André. Aprofundei os conceitos de tal forma que não existiria santo capaz de contrariar os dados.  

Mas sou insistente e o leitor merece mais informação. Fui aos dados econômicos para confirmar o que a longevidade profissional me permitiria certa liberdade de especular. Até porque não especulo sem fundamentação. 

Convido o leitor a me acompanhar porque o que segue é bastante interessante. São Bernardo é uma embarcação em oceano bravio. Santo André é um barco em águas plácidas.  

A Doença Holandesa de São Bernardo ganha forma de turbilhão. A Doença Holandesa de Santo André é um passaporte à tranquilidade. 

DOENÇAS DIFERENTES  

Está confirmado nos números que comandar uma cidade, a Capital Econômica do Grande ABC, que sofre da Doença Holandesa Automotiva, é muito mais complexo do que cuidar de uma cidade, como Santo André, portadora da Doença Holandesa Petroquímica.  

Como se sabe, o centro de operações do equilíbrio socioeconômico de São Bernardo é a indústria automotiva, o setor mais competitivo do mundo, sujeito a chuvas de crises internas e a temporais de competitividade externa.  

Já em Santo André o que fornece mais combustível, principalmente fiscal, é a indústria petroquímica e seus ramais petroquímicos. 

MENOS CHUVAS  

A vantagem de Santo André e sua Doença Holandesa é que o setor petroquímico é muito menos sujeito a chuvas e trovoados que caracterizam o setor automotivo. Até porque não se transfere uma planta químico-petroquímico de um dia para o outro, por dizer assim.  

Já uma Ford pode ir se preparando para debandar porque há mecanismos de deslocamento ou simplesmente de supressão que não causam tantos danos financeiros e corporativos.  

Mas vamos ao que interessa. E às conclusões a que cheguei, subordinadas ao contraditório de quem interessar possa.  

São Bernardo é muito mais vulnerável aos sacolejos macroeconômicos do que Santo André porque o setor automotivo é o que disse acima, ou seja, um convite a crises.  

PERÍODOS QUADRIENAIS  

Dividi em seis períodos quadrienais o desempenho de Santo André e de São Bernardo no que mais interessa, o Valor Adicionado, ou tudo aquilo que se acrescenta na economia produtiva de um Município.  

Seis períodos quadrienais a partir de 1996 dão sustentação a qualquer proposta informativa.  

Traduzindo em miúdos: defini os seguintes períodos para chegar ao conjunto do mosaico: de 1997 a 2000, de 2001 a 2004, de 2005 a 2008, de 2009 a 2012, de 2013 a 2016 e de 2017 a 2020.  

Coincidentemente, quadriênios que contaram com novos prefeitos dos dois municípios, ou com prefeitos reeleitos.  

CÁLCULOS CONJUGADOS  

Nesse período não houve nenhum prefeito reeleito em Santo André e, em São Bernardo, tivemos apenas o petista Luiz Marinho. Orlando Morando foi reeleito em 2020, e assumiu novo mandato em 2021, por isso não consta da lista de reeleitos.  Paulinho Serra seguiu a mesma trilha.  

Divididos então em seis períodos subsequentes de quatro anos cada, acrescentei o Valor Adicionado de cada um desse quadriênio.  

Calculei tanto os valores nominais (sem inflação) como os valores reais (deflacionados pelo IPCA do IBGE).  

Tratei, portanto, cada quadriênio, como se fosse uma competição à parte, envolvendo os dois municípios. O resultado final, ou seja, a soma de ganhos e perdas dos dois municípios, apresentou variação positiva de 32,23 pontos percentuais favoráveis a Santo André e 42,96 pontos percentuais negativos para São Bernardo.  

QUATRO A DOIS  

Anotem bem: números positivos para Santo André e números negativos para São Bernardo. Isso, em última instância, para compreensão imediata, é o tamanho da estabilidade de quem ganhou e da instabilidade de quem perdeu.  

Santo André contabilizou quatro dos seis quadriênios de resultados positivos e os outros dois de resultados negativos. São Bernardo somou quatro quadriênios negativos e dois positivos.  

O leitor mais simplificador e enviesado diria que a diferença não é tanta assim, ou seja, dois quadriênios ruins de Santo André ante quatro de São Bernardo.  

Não é bem assim: os quadriênios negativos de São Bernardo foram muito mais profundos, complicadores, destruidores, do que os três quadriênios negativos de Santo André. 

Ou seja: o balanço do navio de São Bernardo no que se refere ao desempenho econômico a reboque do setor automotivo é muito mais comprometedor do que balanços análogos de Santo André. Aliás, Santo André sofreu balanços discretos, por assim dizer.  

MAIS DESESTABILIZADOR  

Ou é possível dizer que o balanço do navio de Santo André é aterrorizante quando se chega aos seguintes dados negativos: queda de 11,93 pontos percentuais entre 2005-2008 e queda de 4,09 pontos percentuais entre 2013 e 2016, sempre em relação ao comportamento do Valor Adicionado do quadriênio anterior.  

Querem ver as quatro quedas de São Bernardo no período de 24 anos divididos por seis quadriênios? Queda de 13,18 pontos percentuais entre 1997-2000, queda de 2,17 pontos percentuais entre 2005-2008, queda de 6,11 pontos entre 2009-2012 e queda de 50,55 pontos percentuais entre 2013 e 2016. 

Deve ter chamado a atenção do leitor a perda de 50,55 pontos percentuais de São Bernardo no penúltimo quadriênio deste século, entre 2013 e 2016. O número é espantoso e, aparentemente, teria sido um cálculo insano, redondamente enganado. Mas não é. 

RECESSÃO CRUEL  

Na temporada 2013-2016, que abarca a recessão mais cruel já vista no País, contratada no segundo mandato de Lula da Silva e sacramentada com erros crassos de Dilma Rousseff, o Valor Adicionado de São Bernardo perdeu em valores nominais, ou seja, sem considerar a inflação, nada menos que 17,98%. Quando se acrescenta a esse número a inflação do período, de 32,57%, chega-se aos mais de 55 pontos percentuais.  

Traduzindo: quando Orlando Morando foi eleito e assumiu o Paço Municipal em janeiro de 2017, São Bernardo era uma terra arrasada. O Valor Adicionado correspondia a uma baixa de mais da metade do Valor Adicionado de quando Luiz Marinho encerrou o segundo mandato, em 2016, contraposto a 2013.  

O buraco de geração de riqueza na São Bernardo que Orlando Morando assumiu em janeiro de 2017 era muito, mas muito maior que os apenas 4,09 pontos percentuais encontrados por Paulinho Serra, em Santo André, deixados pelo petista Carlos Grana. Ou seja: as condições de navegabilidade econômica de Santo André eram muitos mais favoráveis, porque não havia rochedos nem correntezas de monta.  

DADOS DE 24 ANOS  

Vamos ao desempenho do Valor Adicionado dos dois municípios nos respectivos quadriênios.  

a) De 1997 a 2000 – Santo André cresceu nominalmente 35,99%. São Bernardo cresceu nominalmente 10,31%. Inflação do período: 23,49%. Salto positivo de Santo André de 12,50 pontos percentuais. Saldo negativo de São Bernardo de 13,18 pontos percentuais.  

b) De 2001 a 2004 – Santo André cresceu nominalmente 69,92%. São Bernardo cresceu nominalmente 65,01%. Inflação do período: 42,50%. Saldo positivo de Santo André de 27,42 pontos percentuais. Saldo positivo de São Bernardo de 22,51 pontos percentuais.  

c) De 2005 a 2008 – Santo André cresceu nominalmente 8,66%. São Bernardo cresceu nominalmente 18,42%. Inflação do período: 20,59%. Saldo negativo de Santo André de 11,93 pontos percentuais. Saldo negativo de São Bernardo de 2,17 pontos percentuais. 

d) De 2009 a 2012 – Santo André cresceu nominalmente 29,85%. São Bernardo cresceu nominalmente 18,42%. Inflação do período: 24,53%. Saldo positivo de Santo André de 5,32 pontos percentuais. Salto negativo de São Bernardo de 6,11 pontos percentuais. 

e) De 2013 a 2016 – Santo André cresceu nominalmente 28,48%. São Bernardo caiu nominalmente 17,98%. Inflação do período: 32,57%. Saldo negativo de Santo André de 4,09 pontos percentuais. Saldo negativo de São Bernardo de 50,55 pontos percentuais. 

f) De 2017 a 2020 – Santo André cresceu nominalmente 19,44%. São Bernardo cresceu nominalmente 22,98%. Inflação do período: 16,43%. Saldo positivo de Santo André de 3,01 pontos percentuais. Saldo positivo de São Bernardo de 6,55 pontos percentuais.  



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