O Fundo de Solidariedade de Santo André, que reúne 117 entidades do universo de pobres e miseráveis, é muito importante para o varejismo tático do prefeito Paulinho Serra. Muito, mas muito mais, que o inexistente atacado estratégico da marqueteira Secretaria de Desenvolvimento Econômico.
A explicação é simples: o Fundo abastece ininterruptamente os ativos políticos e eleitorais, incluindo-se na operação a candidatura a deputada estadual de dona Carolina, mulher do prefeito.
Santo André de “Viveiro Industrial se transformou em “Viveiro Assistencial”.
CIDADANIA SACRIFICADA
Acho que essa troca mais que desvantajosa para a cidadania como um todo não pode ficar apenas subjetivamente nas páginas de jornais impressos e digitais que atuam como assessoria de imprensa da quase totalidade dos prefeitos de plantão.
Deveria essa aberração político-administrativa ser claramente expressada no Hino Oficial de Santo André, com mais que providenciais alterações na letra.
Tudo que remeter a “Viveiro Industrial” deveria passar por atualização e se enquadrar no conceito de “Viveiro Assistencial”.
Indistintamente, a mídia regional dobra-se ao disfarçado proselitismo político-eleitoral de enaltecimento acrítico ao assistencialismo de Santo André (a manchetíssima de hoje do Diário do Grande ABC trata disso e vem tratando disso faz tempo) e omite, quando não subverte, o longo inferno de depauperação econômica não só de Santo André –mas do Grande ABC como um todo.
PREMIO DESEMPENHO
Não pensem os leitores apressados que está a escrever alguém insensível com a agenda social.
Vou ter de deixar a modéstia de lado e dizer o que vou dizer em seguida, para que não me tratem com fake news que remetam a suspeições ou mesmo a sentenças deploráveis.
Embora fosse uma revista impressa originalmente voltada à Economia, a LivreMercado que fundei em 1990 e segurei as pontas éticas e programáticas da redação durante duas décadas numa região que se empobrecia sem parar, a pauta social sempre foi prioridade. Nada diferente de CapitalSocial, publicação digital que a absorveu.
Tanto era prioridade que, entre inúmeras iniciativas, criei e comandei o Prêmio Desempenho. Foram 15 edições sucessivas que, entre também inúmeras inovações, era duplamente auditada nos resultados meritocráticos.
RIGORES ESTABELECIDOS
Primeiro, submetia-se à avaliação do Conselho Editorial, que chegou a contar com 250 representantes da sociedade.
Segundo, entregava-se à auditoria externa o controle adicional da apuração. E essa nova curadoria era remetida em seguida aos mesmos conselheiros e também aos participantes da disputa.
O procedimento de transparência total mantinha a identidade dos julgadores com o uso de codificações individuais, tornando-os, portanto, seguros quanto ao sigilo dos respectivos nomes.
Dentre as novidades que se acrescentaram ao Prêmio Desempenho, introduzimos as modalidades de “Madres Terezas” e os “Freis Galvão”, a partir de 2000.
MADRES E FREIS
Foram cerca de 100 troféus entregues nas noites mais festivas que o Grande ABC já conheceu. Festivas é forma de dizer: o Prêmio Desempenho era uma alegoria de festa que remetia à responsabilidade social.
O Editorial que expunha diante de milhares de convidados e de improviso a cada evento reproduzia o centro editorial da publicação. Levava uma cola no bolso do paletó apenas como resguardo psicológico. Raramente fazia uso dos apontamentos de navegabilidade cognitiva. Quem tem coerência não precisa ter memória privilegiada.
Uma noite do Prêmio Desempenho foi particularmente inesquecível. Num Tênis Clube de Santo André completamente lotado, entregamos o troféu de “Madres Terezas” ao inaugural grupo de mulheres que atuavam e continuam a atuar nas periferias do Grande ABC.
CHORO NO TÊNIS
Tivemos uma edição tão catártica de apresentação das heroínas que não faltaram choros copiosos dos convidados. Afinal, jamais até então ninguém teve a ousadia de levar excluídos a um palco supostamente apenas de incluídos.
Mais que isso: sem que a iniciativa contivesse alguma nesga ideológica. Diferentemente disso: a meritocracia dos vencedores juntava-se à imperiosidade de somar-se à solidariedade.
Os títulos de “Madres Terezas” e de “Freis Galvão” tinham, portanto, conotação subliminar de rebeldia deste jornalista, embora nem todos os convidados assim o entendessem.
O pior de tudo que ouvi a respeito do Prêmio Desempenho é que a promoção era mais importante que a própria revista LivreMercado. Ou seja: a negação da incubadora de uma proposta reformista dava espaço ao gataborralheirismo intelectual.
SEM RECIPROCIDADES
No Prêmio Desempenho os principais troféus eram entregues na etapa final de um evento dividido em duas etapas cronológicas a cada ano e num contexto de meritocracia plena, atestada pela capacidade e liberdade outorgadas ao Conselho Editorial.
Como jamais fui candidato a coisa alguma porque entendo que jornalismo e qualquer outra coisa não combinam, ninguém poderá me acusar de proselitismo político e eleitoral -- tanto no passado quanto no presente.
Tampouco estava a serviço de alguém escondidinho ou não atrás da moita de interesses outros. Tenho sobrenome Lima, mas nenhuma vocação à laranja ou a vaquinha de presépio.
DEFORMAÇÃO CONGÊNITA
É essa deformação congênita que estou apontando com clareza meridiana na política assistencialista do prefeito Paulinho Serra.
O tucano a caminho de outra sigla porque representantes de outras siglas o assediam, simplesmente faz do varejo assistencialista o carro-chefe de uma gestão tenebrosa quando vista sob o ângulo impostergável do Desenvolvimento Econômico.
Quem disser que outros prefeitos da região também usam de expediente semelhantemente assistencialista para sensibilizar o eleitorado estará corretíssimo na observação.
A diferença, entretanto, em relação a Paulinho Serra, é que essa é uma prática central, fulcral, quase única, do que o chefe do Executivo pretende para levar a mulher à vitória eleitoral e, também, a se consolidar como político destinado ao esquecimento como agente transformador.
Estava deixando passar em branco que, no nexo administrativo que move o prefeito Paulinho Serra, há outra vertente a mantê-lo na mediocridade de antecessores pós-Celso Daniel, agora de forma abusiva.
É o uso sistemático de sofisma de políticas administrativas que não se sustentam, além claro, de inaugurar o placar de uma inovação que se tornou política de governo: fabricar obscuros e mercantilistas prêmios de terceiros, muitos dos quais de encomenda, quando não inconsistentes.
CABESTRO DO FUNDO
Mais de uma centena de entidades assistenciais no cabresto do Fundo de Solidariedade até outro dia comandando por dona Carolina (deixou o cargo por injunções legais imposta a candidaturas eleitorais) e o posicionamento de 114ª colocado no Ranking do PIB Per Capita dos Municípios Paulistas são metades da mesma laranja de incompetências históricas de prefeitos de Santo André, exceto Celso Daniel.
O que se lamenta antecipadamente, mas com fortes estruturas informativas e analíticas, é que a gestão de Paulinho Serra não se perpetuará apenas pela incompetência de enfrentar os dissabores econômicos longevos do antigo e desestruturado “Viveiro Industrial”.
Haverá muito mais percalços no horizonte, porque esses percalços já foram plantados, adubados e industrializados.
FUNDAÇÃO EMBLEMÁTICA
Só não foram ainda mais expostos diante da ameaça de contragolpes que vão muito além de retaliações à prática de liberdade de imprensa.
O futuro de Santo André a ser legado pela gestão de Paulinho Serra talvez tenha como referencial-base as barbaridades constatadas por auditoria externa na Fundação do ABC, o milionário Clube da Saúde.
As irregularidades cometidas na Central de Convênios e Conveniências, sob a guarda de Paulinho Serra, foram escandalosamente sufocadas inclusive pelo inútil, político e desprezível grupo que forma o Conselho de Curadores daquela instituição. Um apêndice burocrático, depende em larga escala de favores de quem deveria vigiar, mas que, historicamente, dá ares democráticos a uma ditadura de verdades a camuflar.
Total de 1894 matérias | Página 1
21/11/2024 QUARTO PIB DA METRÓPOLE?