O ministro do Trabalho Luiz Marinho concedeu uma entrevista no mínimo contraproducente ontem ao jornal Valor Econômico. Deu e continua a dar um bafafá monumental nas redes sociais. Especialmente porque sugeriu que os Correios façam a tarefa do Uber para botar ordem na casa da regulação trabalhista, que é um tormento mundial. Marinho, como todo esquerdista, adora regulação.
A maioria dos críticos (e seguem muitas críticas nas redes sociais) não percebeu que Luiz Marinho expôs muito mais que uma estatal sem experiência na área como substituta de uma empresa privada, operação para lá de duvidosa quando se sabe, entre outros pontos, dos efeitos grevistas quando o Estado decide conter os gastos.
O Grande ABC do passado está no retrovisor dos planos do ex-sindicalista e ex-prefeito de São Bernardo. E isso não é bom para o Brasil. Tampouco para os trabalhadores. Muito menos para a biografia do autor da proposta.
DE SALTO ALTO?
Luiz Marinho sempre pareceu melhor que o Luiz Marinho das páginas do Valor Econômico. Talvez esteja num momento de encantamento. Essa é uma palavra-chave nestes dias extremistas.
A esquerda verde e amarela (ou seria exclusivamente vermelha?) parece estar de salto alto.
A vitória eleitoral, numa disputa pouco democrática (como se sabe, porque antes, durante e depois das eleições várias ocorrências obrigatoriamente não constam de referenciais de um País civilizado) e por isso mesmo conturbadíssima.
Mas isso não parece pesar no comportamento dos vitoriosos. Luiz Marinho sugere estar contaminado por um ambiente da metade do País que olha para a outra metade e simplesmente a despreza. A recíproca é verdadeira.
LOUCURA AMBIENTAL
Vivemos num pandemônio político ambiental. Transpira-se beligerância.
Pior mesmo só nos tempos de cinismo de negar o que se exala hoje. Encontrar o meio-termo vai demorar. A terceira via é uma falácia. É como dar cebola aos leões.
Mas vamos ao que interessa e o que interessa mesmo é a entrevista reveladora do ministro do Trabalho e primeiro-amigo do presidente Lula da Silva.
Li a entrevista do ministro Luiz Marinho muito antes de as redes sociais descobrirem que Luiz Marinho ministro do Trabalho falou como Luiz Marinho sindicalista.
É natural que o faça, mas não é natural, também, que o faça. O sindicalista publicamente moderado que durante muitos antes participou do futuro do Grande ABC estaria sendo pressionado por facções esquerdistas que aumentaram a calibragem natural De preferência ideológica que jamais deixou de praticar.
PAUTA ESTATISTA
Luiz Marinho está sendo levado a voltar ao passado. O retrovisor imantado o escravizaria ao Grande ABC.
O corporativismo e o anticapitalismo, sustentados por forças políticas, não são e jamais seriam as soluções para um País que não cresce há quatro décadas. Ficamos para trás no ranking internacional.
Precisamos de menos Estado, mas os estatistas estão na praça barulhentos como nunca. Luiz Marinho foi um porta-voz deles todos. E se deu muito mal.
E o Brasil se dará pior ainda se a pauta estatista nas relações trabalhistas for vitoriosa. A reforma da legislação trabalhista, como pretende a esquerda, é um tiro no pé.
FRACASSO PEDAGÓGICO
O fracasso econômico do Grande ABC desde que o Brasil passou a patrocinar competitividade entre municípios e Estados com a guerra fiscal e mais atenção a alguma dezenas de quesitos de atratividade deveria pautar a atuação de Luiz Marinho como ministro do Trabalho, já que não foi possível que o fizesse na plenitude como sindicalista e prefeito.
O Brasil não precisa de um Estado pantagruélico além do que já é, consumindo 40% de tudo que é produzido pela sociedade. E muito menos de regulamentação draconiana para reduzir a carga de equívocos nas relações trabalhistas.
Luiz Marinho deveria ir devagar com o andor de transformações e, mais que isso, execrar o retrovisor chamado Grande ABC. Reproduzir o passado seria o pior dos caminhos.
EQUÍVOCOS ACUMULADOS
O Grande ABC, bem sabe Luiz Marinho, é uma fonte de equívocos institucionais e operacionais que teve no sindicalismo, sem sombra de dúvidas, um dos 10 maiores obstáculos ao desenvolvimento sustentável.
Diria mais: o sindicalismo puxa a fila de impropriedades cumulativas ao crescimento econômico e à mobilidade social do Grande ABC.
Somos um campo de batalha arrasado, conforme estou cansado de provar nesta revista digital.
Só a perda de 20% do PIB Geral nos dois anos de recessão de Dilma Rousseff, ante menos da metade disso na média nacional, diz bem ao ponto que chegamos.
PRIMEIRA RESPOSTA
Aquela hecatombe não é exceção à regra de rebaixamento de riquezas. O que foi exceção à regra e mesmo assim de forma artificial, porque a gastança irresponsável ditou o ritmo de alucinação eleitoral, foram os quatro anos do segundo mandato de Lula da Silva.
A sabedoria popular das redes sociais não pode ser mitigada. A pedra de toque de zombarias às declarações de Luiz Marinho ao Valor Econômico foram as declarações especificas sobre o aplicativo de transporte.
À pergunta do jornal (“Sobre a regulamentação do trabalho por aplicativos, já há um ponto de partida?”), Luiz Marinho respondeu exatamente o seguinte:
“As empresas estão dispostas a discutir. Na Espanha, no processo de regulação, o Uber e mais alguém disseram que iam sair. Esta rebeldia durou 72 horas. Era uma chantagem. Me falaram: “”E se o Uber sair””. Problema do Uber. Não estou preocupado”.
SEGUNDA RESPOSTA
Na sequência, o jornal voltou a perguntar: “A saída de uma empresa como Uber, por exemplo, não criaria um problema para a economia?. Veja a resposta de Luiz Marinho:
“Cria outro (aplicativo). Posso chamar os Correios, que é uma empresa de logística e dizer para criar um aplicativo e substituir. Aplicativo se tem aos montes no mercado. Não queremos regular lá no mínimo detalhe. Ninguém gosta de correr muito risco, especialmente os capitalistas brasileiros. Mas qual a regulação para proteção do trabalho e das pessoas?
Luiz Marinho simplifica uma situação complexa que vai muito além de relações trabalhistas. É um universo econômico e social em transformações constantes. A digitalização e a produtividade geral dos fatores impõem mudanças constantes. A Espanha só colecionou fracassos com as medidas restritivas avocadas por Marinho.
OUTROS TEMPOS
Vivem-se hoje tempos muito diferentes do Brasil autárquico dos anos 1980, quando surgiu o movimento sindical no Grande ABC, liderado por Lula da Silva, e do qual Luiz Marinho foi um dos sucessores no Sindicato dos Metalúrgicos.
Os dados acumulados da movimentação das pedras na região condenam a atuação sindical que desconsidera o presente, tratando-o como passado.
Os custos das chamadas conquistas trabalhistas (muitas das quais obrigações constitucionais do Estado que as empresas custeavam, mas recuperavam com adicionais no preço dos veículos e prejuízo dos consumidores) se provaram muito maiores que os ganhos.
O chão da fábrica valorizado não se espalhou pela sociedade regional. Diferentemente disso. Criou-se o Grande ABC dos trabalhadores de primeira classe, protegidíssimos pelo Estado de então, e o Grande ABC repudiado pelo sindicalismo.
REGRESSIVIDADE SOCIAL
O Grande ABC é um exemplo de regressividade social. Cada vez mais há proporcionalmente menos ricos, menos classe média e mais pobres e miseráveis – mesmo com a abundância de programas de inclusão social dos governos federal, estadual e mesmo municipal.
Outras questões centrais abordadas na entrevista do Valor Econômico com Luiz Marinho reforçam a inquietação de que o retrovisor do Grande ABC embala os sonhos do Brasil do futuro no esquadrinhamento do ministro do Trabalho.
Reforma trabalhista e salário mínimo projetados pelo governo federal ignoram a situação fiscal do País que, desde a redemocratização, acentuou necessidade de financiamento crescente para dar conta das demandas públicas movidas por interesses nem sempre saudáveis.
A carga tributária do País ultrapassou todos os limites do suportável e parece não ter freios suficientes sem o basta da sociedade, agora mais atenta nas redes sociais.
PIOR QUE BRASIL
O único consolo de quem vive no Brasil é que, por pior que esteja a situação geral com o esfarelamento da capacidade de investimentos do Estado, ainda há espaços a reconfigurações que resultem em crescimento econômico sem depender tanto das commodities que fizeram a farra dos 14 anos dos mandatos petistas.
Trata-se de um quadro bem melhor do que o do Grande ABC, encapsulado pela desindustrialização e pela falta de perspectivas de nova modelagem econômica. E que, embora menos intensa, ainda sofre com um sindicalismo ideologicamente militante nas fábricas que restaram.
Luiz Marinho possivelmente tenha se arrependido de dizer o que disse ao Valor Econômico e quem sabe chegue à conclusão de que o Brasil atual repleto de fanfarronices extremistas, à direita e à esquerda, precisa parar um pouco para colocar a casa do pragmatismo em ordem.
Total de 1889 matérias | Página 1
12/09/2024 Vejam só: sindicalistas agora são conselheiros