Invadiram ontem de manhã esta casa digital, meu abrigo editorial. Sei quem foram. Foram gentes da política. Tudo por conta do que escrevi anteontem sobre as eleições do ano que vem em Santo André e em São Bernardo. Eleições casadas com direito a um prêmio milionário em forma de gestão orçamentária.
Acho que não querem que escreva mais sobre isso. Vão perder tempo querendo. Espero que o Ministério Público e a Polícia Civil não se esqueçam de, numa eventualidade qualquer, pegar estas pistas como fonte de elucidação de qualquer crime que venha a ser vítima este jornalista.
Crime bem-engendrado, sabem todos, é crime que parece um acidente no cotidiano. Uma suposta discussão no trânsito, um assaltozinho na calçada. Essas coisas. Ninguém vai matar um jornalista e deixar recado de que o jornalista morreu porque contrariou interesses de grupos instalados.
O embrião de supostos desdobramentos está na edição de ontem de CapitalSocial. Meteram uma placa virtual de “F4keLive –F4Live” para desqualificar o conteúdo temporariamente suspenso de CapitalSocial. Soube da invasão depois que a invasão foi superada, com a expulsão do invasor.
MADRUGADA INSONE
Os responsáveis técnicos pelas edições de CapitalSocial preferiram omitir de mim a barbárie. Não queriam estragar minha manhã. É de manhã que costumo escrever o que você está lendo agora.
Só soube da agressão digital depois do almoço, quando tudo já estava superado. Acho que meu pessoal técnico sabe que depois daquele tiro preciso ser preservado até onde é possível ser preservado de más notícias.
Somente na madrugada de hoje, mal dormida, é que me dei conta de que o hacker foi enviado por políticos que estão na arena das disputas em Santo André e em São Bernardo. Não existe outra explicação razoável.
Invadir minha casa editorial pode ser mais que uma discordância sobre o que escrevi. Pode ser um recado. Tenho horror a recado. Gosto de enfrentamento verbal civilizado. Detesto que o outro lado, por machismo ferido pela mulher, reaja com um Taurus 38 fumegante e irresponsável.
GATO ESCALDADO
Sei que sei que não devo ser catastrofista, vitimista ou paranoico, mas gato escalado de tiro no rosto tem medo de água fria de anomalia editorial.
Acho que acho -- e ninguém vai tirar de minha cabeça -- que querem me degolar profissionalmente. Faz tempo que tem gente louca para isso.
Alguns até festejaram aquele primeiro de fevereiro de 2021 que imaginaram derradeiro para mim. Faz parte do jogo enfrentar o contraditório de interesses, mesmo o contraditório bandido. Mas há limites para tudo.
Fico pensando em qual seria o ponto nuclear do texto que escrevi sobre as eleições em Santo André e em São Bernardo que teria levado o bárbaro invasor a meter a colher na minha sopa de letras bem arranjadas sobre as possibilidades do que poderemos ter nos dois municípios na próxima temporada. São bilhões de reais orçamentários em jogo.
Peguem o orçamento de Santo André. Peguem o orçamento de São Bernardo. Somem os dois. Dá uma barbaridade de dinheiros públicos a serem administrados por grupos diferentes ou por um mesmo grupo. Tudo vai depender do que acontecer em outubro do ano que vem.
PURA REALIDADE
Foi exatamente isso que escrevi ou quis dizer no texto de anteontem, subjugado por uma placa invasora de um mercenário da Internet.
Vivemos num mundo de interesses tão escandalosamente aviltantes que a simples razão de oferecer informações ao distinto público se torna um crime diante da bandidagem organizada.
Não tenho a menor ideia de quem partiu a decisão de invadir minha casa editorial. Embostearam-na com a plaquetinha mequetrefe na tentativa de desqualificar o indesqualificável.
O que escrevi é a mais pura realidade que outros não escrevem porque não querem, não podem ou não é conveniente. Principalmente não é conveniente.
TRECHO FATAL
Particularmente acho que há um trecho naquele texto censurado pelo invasor que poderia estar na raiz da própria invasão. Desconfio de que seja mesmo aquele trecho. Mas isso é apenas um chute, porque há vários trechos incômodos.
Resumindo aquela obra, escrevi que há tantos candidatos a prefeito de Santo André vestindo camisas semelhantes, porque estão sob o controle do mesmo grupo de mandachuvas, que a disputa não passa de dissimulação com viés de amistosidade.
Qualquer um dos concorrentes listados à disputa integra os interesses do grupo que comanda o Paço Municipal de Santo André. Não há no que escrevi nenhuma agressão à lógica de práticas políticas comuns no País, resumida na fórmula do toma-lá-dá-cá.
Há tantos candidatos sob o controle do Paço Municipal de Santo André que qualquer que seja o vencedor da disputa não será ameaça alguma aos acionistas do controle.
Muito pelo contrário: vai ser apenas mais um do grupo. Aliás, já é do grupo, como os outros concorrentes de cores assemelhadas. A diferença é que o vencedor galgará alguns postos na hierarquia de poder compartilhado não necessariamente de pesos semelhantes.
OUTRA REGIONALIDADE
Escrevi mais, com outras palavras, no artigo que levou o hacker a sugerir que CapitalSocial é uma fábrica de mentiras ou meias verdades. Uma acusação que não passa de anedota mesmo aos leitores mais distraídos.
Escrevi mais porque escrevi que a disputa pela Prefeitura de Santo André é tão favas contadas que, de fato, o que interessa mesmo ao grupo que controla o Paço Municipal é ganhar tração para conquistar o Paço vizinho, o Paço de São Bernardo, onde o prefeito Orlando Morando é osso duro de roer, um adversário bem-organizado e poderoso.
Quis dizer naquele texto que a regionalidade do macrogrupo instalado em Santo André é uma regionalidade de poder político, administrativo, orçamentário, porque a regionalidade no sentido que destilo aqui, e que Celso Daniel fez emergir no campo institucional há três décadas, é apenas uma desculpa esfarrapada ou algo tão mal ajambrado que não resiste a qualquer curadoria.
Provavelmente porque fui tão franco, sincero, verdadeiro e comprovadamente certeiro, alguém ou um grupo organizado não tenha apreciado muito aquele texto e, por isso, resolveu subvertê-lo com uma placa digital desclassificatória.
MELHOR ALTERNATIVA
Essa gente é muito ruim de inteligência porque tenta me tatuar com uma mensagem farsesca, sem amparo algum da audiência.
Já recebi muitas ameaças ao longo da vida jornalística, já sofri represálias, já fui levado ao Judiciário por gente especialmente apodrecida em matéria de ética e cidadania, mas sofrer um ataque virtual desses, garanto, jamais imaginei.
A invasão do bárbaro digital não pode ser tratada como algo qualquer. Pensei nisso a noite toda nesta noite que foi uma noite longa a partir do momento em que despertei e comecei a pensar no bárbaro invasor.
Entre ser chamado de paranoico, entre ser condecorado com o pecha de lunático, entre ser conduzido ao nocaute da negligência, entre tudo isso e muito mais, resolvi dar razão à minha intuição e preparar este texto como espécie de desabafo mesclado de investigação para descobrir a raiz da questão.
PRELIMINARZINHA
E a raiz da questão é mesmo o conteúdo daquela análise que torna a disputa eleitoral em Santo André nada mais que uma preliminarzinha diante do grande clássico programado para São Bernardo.
Aliás, usei a expressão “preliminarzinha” naquela abordagem. Acho que a turma ligada ao hacker não gostou porque nada é mais indicativo da grandeza da operação em andamento do que distinguir um joguinho qualquer de um grande clássico.
Espero que essa turma de inconformados com a liberdade de expressão que não lhes interessa porque preferem mesmo a obscuridade das artimanhas, espero que essa turma não agrida demais os quesitos de civilidade.
Nem pensem em me retirar de cena, com eventual e maquiavélica preparação de algo que pareça acidente, mas que teria saído mesmo de uma deliberação radical.
Não tenho saudade alguma, muito pelo contrário, daqueles dias tenebrosos que passei numa UTI, mas essa idiotice de ser jornalista num país em que a própria função de jornalista virou uma esculhambação dos diabos ainda continua nas minhas veias.
Meu cérebro, de cognições ainda a salvo de qualquer fadiga etária ou impacto bélico, diz que não devo desistir jamais de fazer o que sempre fiz. E que, se estou contrariando grupos poderosos, é sinal de que estou caminhando num terreno em que a realidade dos fatos incomodam.
Que o MP e a Polícia Civil não desgrudem os olhos de possíveis desdobramentos. O jogo é pesado. O invasor digital já mostrou as garras e já me fez ligar o sinal de alerta.
Milhões orçamentários estão em jogo num contexto nacional em que operadores da Lava Jato são demonizados enquanto delinquentes ressurgem garbosos e metidos a besta, proclamando-se mais que inocentes, mas principalmente, injustiçados.
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