Economia

DÉCADA DESASTROSA: O
QUE SERÁ DA REGIÃO? (3)

DANIEL LIMA - 18/04/2023

Se você entende que há calibragem exagerada na marca editorial desta minissérie que trata do desempenho do PIB do Grande ABC na última década passível de ser medida, provavelmente não sabe da missa um terço.  

Década Desastrosa é a melhor expressão que pode ser atribuída à região de quase três milhões de habitantes.  

Os números são implacáveis. Perdemos para o Estado de São Paulo, para a cidade de São Paulo e para o Brasil. Não ganhamos de ninguém. Somos uma espécie de Ibis da Economia. Ibis é um time de Pernambuco. Ganhou fama mundial porque teimava em colecionar derrotas. Acumulou três anos e 11 meses sem vencer. Entrou no livro dos recordes. Fez da desgraça, marketing.  

PIOR QUE O IBIS  

O Grande ABC em matéria de PIB parece pior que o Ibis. A diferença entre um persistente derrotado econômico e um persistente derrotado futebolístico é que o segundo tem plena consciência de que perdeu sem parar e até se orgulha da fama conquistada. Já o segundo, o Grande ABC, perde sem parar mas cantarola que está ganhando. Farsantes não faltam nas praças desse bicho-de-sete-cabeças.  

O choque de realidade precisa ganhar tons dramáticos porque em condições de navegabilidade de uma oratória contempladora, quando não enganadora, a barca do Grande ABC já foi para o brejo.  

O período que começa em janeiro de 2011 e termina em dezembro de 2020, tendo como ano-base 2010, é calamitoso. Aliás, esta minissérie também poderia ser chamada de Década Calamitosa.  

2,355% DE QUEDA ANUAL  

Vamos aos números gerais, então? Enquanto o PIB do Grande ABC perdeu em média por ano durante o período da Década Desastrosa 2,355% de Produto Interno Bruto (ou seja, tudo que se transforma em riqueza em produtos e serviços), a cidade de São Paulo caiu bem menos (0,455%) também em média ao ano. 

Mais números? O Estado de São Paulo como um todo cresceu em média ao ano 0,11% (11% no acumulado do período) e o Brasil como um todo chegou a avançar 1,59% em média ao ano.  

Ou seja, se o Brasil com esse resultado se estatelou num avanço médio anual levemente superior ao crescimento demográfico, e cristalizou a Década Perdida na avaliação crítica de especialistas, como encontrar outra definição para o Grande ABC senão Década Desastrosa? 

EXTREMOS AGRAVAM  

Nunca pode ser desconsiderado um fator relevante que torna o período de 10 anos da Década Desastrosa portentoso golpe na mandíbula de frágil resistência regional, dependente em excesso do mercado automotivo. Que fator é esse? 

De fato são dois pontos centrais que ajudam a explicar o desastre. Primeiro, o ano-base da comparação, 2010, foi o último do segundo mandato de Lula da Silva.  

O PIB do Brasil cresceu 7,5% naquela temporada. O governo Lula de segundo mandato mandou às favas a herança fiscal do antecessor, Fernando Henrique Cardoso, naqueles últimos quatro anos. Contratou o desastre chamado Dilma Rousseff. O Brasil de oito anos de Lula da Silva se beneficiou também de commodities. Foi uma farra. E os subsídios então? Foi outra farra.  

Na outra ponta da Década Desastrosa do Grande ABC, como apontamos nos capítulos anteriores, tem-se nome cumprido e estragos enormes: Coronavírus.  

O vírus chinês deixou um rastro de perdição no primeiro ano em que frequentou o ambiente nacional. Aperfeiçoou o castigo mas com números menos agressivos na temporada seguinte.  

PÍOR CENÁRIO  

Então a base de comparação da Década Desastrosa, levando-se em conta sempre o período escolhido, é o ápice da montanha russa deixada por Lula da Silva, passou pelo mergulho de Dilma Rousseff e culminou com o fundo imprevisível do Coronavírus.  

Se a média de perda anual do Grande ABC na Década Desastrosa, de 2,35%, já é agressivamente catastrófica, imagine então o que ocorreu no período com os dois endereços mais dependentes do setor automotivo no Grande ABC, a Capital Econômica São Bernardo e a São Caetano da General Motors.  

Embora São Bernardo seja sede de três montadoras de veículos (Mercedes-Benz, Volks, Scania) a perda na Década Desastrosa equivale aos prejuízos de São Caetano. Enquanto São Bernardo perdeu PIB de 34,35% no período (ou seja, média anual de 3,43%), São Caetano ficou coladíssima, com 34,26% acumulado, o que dá a média anual de 3,42%. Empate técnico.  

MERCADO DE VEÍCULOS  

A produção automotiva em 2010, base de comparação da Década Desastrosa, ultrapassou a 3,64 milhões de veículos de passeio, ônibus e caminhões. Em 2020, ponta dos estragos, mal ultrapassou 2,24 milhões. Uma queda de 38,46%. Um resultado muito semelhante à queda do PIB de São Bernardo e também do PIB de São Caetano. 

Diadema também está no colar de perdas do PIB do Grande ABC na Década Desastrosa. A proximidade geográfica de São Bernardo que leva à complementariedade econômica também tingiu de vermelho a geração de riqueza.  

Diadema conta com parque de autopeças muito próximo de São Bernardo também no sentido de suprimento. Tem uma economia menos centralizada no setor automotivo, mas não o suficiente para escapar dos prejuízos.  

Tanto é verdade que Diadema perdeu o acumulado de 19,12% do PIB na Década Desastrosa. Média anual de 1,91%.  

GANHOS LATERAIS  

Mesmo sem depender tanto do setor automotivo, porque tem nos químicos e petroquímicos a maior produção de riqueza fiscal, Santo André também não escapou da Década Desastrosa. Perdeu em média por ano 1,17%, do total acumulado de 11,71%. 

Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra, que mal chegam a 15% do PIB do Grande ABC, colecionaram números positivos na Década Desastrosa. Visto com rigor analítico, poderiam bradar contrariedade à definição do período de 2011 a 2020. Mas não teriam muito o que fazer, porque são dependentes da geoeconomia regional. 

No caso de Mauá, o ganho acumulado de 5,29% no período, ou 0,529% em média ao ano, tem explicação simples: a produção do setor petroquímico influencia sobremodo o comportamento do PIB. Mais que o mesmo setor petroquímico representa para Santo André, Município com o qual divide as benesses da Doença Holandesa Petroquímica.  

MAUÁ PETROQUÍMICA  

Mauá arrecada proporcionalmente mais que Santo André do PIB Petroquímico e, com isso, sofre menos. O setor, diferentemente do automotivo que contempla São Bernardo, São Caetano e Diadema em maior escala, não sofre as mesmas dores concorrenciais e também sazonais de produção.  

Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra obtiveram resultados positivos na Década Desastrosa porque são economias de tamanho pouco expressivo e qualquer movimento positivo provoca a sensação de potencialidade que, no conjunto do Grande ABC, não faz verão.  

Ribeirão Pires acumulou crescimento de 6,07% no período, ou 0,607% em média ao ano, enquanto Rio Grande da Serra avançou 21,07%, com média anual de 2,107%.  

Muito do avanço do PIB de Ribeirão Pires e principalmente de Rio Grande da Serra se deve às políticas sociais do governo federal, em forma de Bolsa Família e outras políticas de renda.  

QUASE R$ 40 BILHÕES  

O resultado da Década Desastrosa corre em sintonia com maiores recursos financeiros aos pobres e excluídos. Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra não contam com qualquer força-motriz produtiva específica que justificaria entusiasmo regional. A participação relativa dos dois municípios no PIB do Grande ABC não chega a 3%.  

No período da Década Desastrosa, o Grande ABC registrou perda de R$ 38.882.473 bilhões. Esse número corresponde à atualização monetária do PIB registrado em 2010 (R$ 96.138.599 bilhões originais e atualizados R$ 167.271.548 quando corrigidos pelo IPCA) e o PIB de 2020 (R$ 128.389.075 bilhões).  

O maior buraco individual do PIB do Grande ABC em 10 anos iniciados em janeiro de 2011 é de São Bernardo, sempre em termos de valores monetários, com um acumulado de R$ 25.431.334 bilhões. O valor é muito próximo do PIB de Santo André em 2020.  

São Caetano perdeu em números relativos tanto quanto São Bernardo, mas em valores monetários, por ser menor, viu o PIB emagrecer R$ 7,275.018 bilhões.  

Santo André perdeu R$ 3,903.854 bilhões no acumulado de 10 anos. E Diadema viu desaparecerem no período R$ 3.559.319 bilhões.  

POUCOS GANHOS  

Os três municípios que tiveram ganhos, ganharam pouco quando se considera o Grande ABC como um todo: Mauá aumentou o PIB em R$ 905.558 milhões, Ribeirão Pires em R$ 202.929 milhões e Rio Grande da Serra em apenas R$ 178.565 milhões.  No total de ganhos, temos R$ 1.287.052 bilhões. Apenas 3,31% do total de perdas.  

Ou seja: onde perdeu, os representantes do Grande ABC (Santo André, São Bernardo, Diadema e São Caetano) perderam em bilhões de reais. Onde ganhou, ganhou em milhões. A conta só poderia mesmo ser deficitária.   

Veja o PIB em números nominais dos sete municípios do Grande ABC em 2010 e em 2020, período da Década Desastrosa: 

1. São Bernardo – R$ 42.557.432 bilhões nominais em 2010 e R$ 48.614.342 bilhões em 2020. Perda real de R$ 25.431.334 bilhões (65,40% do Grande ABC). 

2. São Caetano – R$ 12.205.134 bilhões nominais em 2010 e R$ 13.960.695 em 2020. Perda real de R$ 7.275.108 bilhões (18,71% do Grande ABC). 

3. Santo André – R$ 19.164.510 bilhões nominais em 2010 e R$ 29.440.477 bilhões em 2020. Perda real de R$ 3.903.854 bilhões (10,04% do Grande ABC).  

4. Diadema – R$ 10.699.784 bilhões nominais em 2010 e R$ 15.057.235 bilhões em 2020. Perda real de R$ 3.559.319 bilhões (9,15% do Grande ABC). 

5. Mauá – R$ 9.323.424 bilhões nominais em 20210 e R$ 17.127.383 bilhões em 2020. Ganho real no período de R$ 905.558 bilhões. 

6. Ribeirão Pires – R$ 1.803.800 bilhões nominais em 2010 e R$ 3.341.360 bilhões em 2020. Ganho real de R$ 202.929 bilhões.  

7. Rio Grande da Serra – R$ 384.515 milhões nominais em 2010 e R$ 847.583 milhões em 2020. Ganho real de R$ 178.565 milhões. 



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