O prefeito Paulinho Serra é um populista tipicamente latino que não encontra barreiras de contenção. Mas que isso: é incentivado a aperfeiçoar a arte da enganação. Muitas mídias e instâncias sociais cooptadas pelo Kremlin Regional lhe servem de bandeja o elogio fácil e nenhuma crítica.
O que está nos jornais de hoje em forma de Feirão do Emprego é um acinte, uma agressão desumana. Vou explicar detalhadamente, com dados históricos sobre a Economia de Santo André.
Esse passado tenebroso é a razão de o exibicionismo midiático do prefeito ganhar conotação de deboche, quando não de ofensa social. Vá dizer isso a seus áulicos. Eles se contraporão com sarcasmo.
NOTÍCIA FALSA
Ao festejar o lançamento do programa Feirão do Emprego, com milhares de inscritos e uma fração deles ocupando presencialmente o Ginásio Pedro Dellantonia, Paulinho Serra sugere que Santo André está em período de recuperação. Devem ter-lhe feito lobotomia.
Os marqueteiros do Paço Municipal retiraram aquela pecinha preciosa do cérebro metafórico, caso do bom-senso, e fizeram o prefeito acreditar que está num território paradisíaco. Dilma Rousseff não faria pior.
Essa é a única explicação que encontro para ver um prefeito da cidade mais desindustrializada do Estado de São Paulo nas últimas quatro décadas, e 168ª colocada no ranking de PIB per capita, festejando a avalanche de pretendentes a uma vaga de trabalho.
FRACASSO CONTINUADO
O que é um escândalo de fracasso de políticas públicas locais ao longo de temporadas é vendido numa suposta embalagem de competência e sensibilidade.
A pirotecnia midiática de Paulinho Serra é a extensão cruel e terraplanista do oportunismo político escancarado há muito tempo, mas cada vez mais insidioso para quem pensa no futuro de Santo André.
Um futuro que não precisa estar vinculado aos 500 Anos do Município. Bastariam os próximos anos, porque o fracasso é contínuo.
Definido conceitualmente o programa lançado Paulinho Serra como oportunismo puro (não necessariamente pelo projeto em si, mas pelo discurso do chefe do Executivo de Santo André e da dona Carolina Serra agora deputada mais que disposta a ocupar os holofotes fora de sua especialidade socialista), vamos à razão básica dessa sentença.
CADEIAS DESMONTADAS
Anote aí a razão básica dessa sentença. Trata-se do seguinte: as cinco principais cadeias de geração de emprego e riqueza de Santo André foram praticamente dizimadas desde 1985, conforme dados oficiais do Mistério do Trabalho. Há três anos foram revelados esses dados em estudos da USCS (Universidade Municipal de São Caetano). Metabolizei e destrinchei os dados gerais da região.
Antes de revelar o tamanho do prejuízo, e diante da possibilidade de um contra-argumento que supostamente tentaria justificar os holofotes em direção ao Feirão do Emprego, não custa lembrar o seguinte: exatamente por ser Feirão, numa confissão tácita dos marqueteiros de que sabem qual é o público-alvo da empreitada, os empregos de remuneração razoavelmente compatível com os sonhos de mobilidade social são escassos.
Para uma cidade que jamais se preparou para o futuro que sempre chega (apenas Celso Daniel o fez, mesmo assim sem completar a iniciativa) Santo André só tem média salarial real superior a Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra no Grande ABC. A desindustrialização deixou um rastro de empobrecimento. Matéria-prima da qual Paulinho Serra tanto se nutre agora de forma festiva, eleitoral e propagandística.
FALTA PLANEJAMENTO
Paulinho Serra faz tanto proselitismo em cima das desventuras de Santo André (não se pode esquecer que contou com a genialidade dos marqueteiros ao elegerem Carolina Serra graças ao Bolsa Exclusão) que é incapaz de compreender que qualquer coisa que realize, mesmo varejismo como o Feirão do Emprego, teria de passar necessariamente por Planejamento Estratégico.
Sem Planejamento Estratégico Econômico, o que os demandantes por empregos vão sentir será frustração em larga escala. Afinal, não há base de sustentação a grandes sonhos em Santo André. Não é por outra razão que mais de 30% da População Economicamente Ativa da cidade desloca-se a outros municípios para sustentar a família. O metrô que um dia vai chegar só incrementará a fuga de cérebros e mão de obra.
Mas vamos ao que interessa e que dinamita qualquer tentativa de incluir essa análise num compartimento de idiossincrasia ou falsidade informativa. Aqui não há espaço a fake news.
MERGULHO NOS DADOS
As cinco principais cadeias produtivas de Santo André do passado viraram pó numa trajetória iniciada em termos estatísticos em 1985 e que termina em 2019. Os dados dos três últimos anos não são conhecidos mas, como um transatlântico, dificilmente revelarão qualquer coisa que signifique mudança significativa. Mais que isso: deverão ser ainda mais tenebrosos.
E o que aconteceu com essas cinco cadeias industriais mais relevantes de Santo André desde metade dos anos 1980, quando se iniciou o processo de desindustrialização que atingiu sobremodo as pequenas e médias pequenas do setor?
De um total de 47.852 empregos com carteira assinada, restaram apenas 16.021. Um queda de 66,51%.
As cinco cadeias produtivas que lideravam em número de trabalhadores (e também de geração de riqueza) representavam 89% dos empregos industriais da cidade quando o referencial são as oito principais linhas de produção.
Ou seja, e trocando em miúdos esclarecedores: as grandes redes de produção de riqueza industrial de Santo André foram praticamente dinamitadas no período de quatro décadas ainda incompletas. Sobraram apenas 33,49% dos empregos formais.
CARNIFICINA GERAL
Se diante desses dados você começou a entender o que está em forma de precariedade, desespero, inquietação e tudo mais em cada ficha de inscrição ao Feirão de Empregos em Santo André, é sinal de que está sintonizado com este jornalista e provavelmente vai entender que não é impaciência, tampouco perseguição, muito menos imprecisão os elementos que me movem a reafirmar que Paulinho Serra é um populista improdutivo na área econômica.
Num texto mais apropriado vou dar detalhes sobre a carnificina do emprego industrial em Santo André e do Grande ABC ao longo de décadas, mas não custa revelar os setores aos quais me refiro nessa derrocada.
O setor de metalurgia de Santo André contava com 10.592 trabalhadores formais em 1985, e caiu para 4.102 em 2019. No intervalo de tempo entre 1985 e 2019, Santo André chegou a contar, em 1989, com 12.229 trabalhadores no setor. Dois terços a mais que em 2019.
MAIS DESASTRES
Desastre relativo maior se deu no setor de materiais elétricos e comunicação. Santo André contava com 3.695 trabalhadores formais em 1985 e restaram 437 em 2019. Ou apenas 11,82% daquele total. Também em 1989 contou com estoque maior que o de 1985, com 4.175 carteiras assinadas.
Se você quer algo ainda pior do que ocorreu com o setor de materiais elétricos e comunicação, não perdeu um segundo para ser contemplado pelo setor de materiais de transporte, ou seja, de veículos e autopeças. Em 1985 eram 13.669 empregos formais no setor, ante 1.536 na ponta de 2019. Restaram, portanto, 11,24% do efetivo de metade dos anos 1980. Também em 1989 o estoque foi maior, com 14.420 trabalhadores formais.
O setor de borracha, couro, pele e fumo, também ligadíssimo ao automotivo, viu o estoque de empregos formais em 1985 de 10.338 trabalhadores sofrer duro baque na escalada cronológica, até chegar em 2019, quando restaram 6.689 trabalhadores.
QUINTO DOS INFERNOS
Para completar o quinto dos infernos das cadeias produtivas de Santo André, o setor químico, farmacêutico e veterinário contabilizava 9.558 trabalhadores em 1985 e caiu para 3.257 em 2019. Um terço apenas.
Que se aquietem acadêmicos passadores de pano que usam de artifícios para contemporizar quando não negar a desindustrialização de Santo André e do Grande ABC como um todo.
No caso dessas cadeias produtivas, o que tivemos predominantemente foi a conjugação de perda líquida de postos de trabalho (da atividade que mais gera riqueza) combinada com evasão industrial. Ou seja: duas porções letais da desindustrialização. Os ganhos de produtividade com investimentos em tecnologia apenas mascaram a hecatombe social em forma de desemprego sistêmico.
O Feirão do Emprego lançado pela Prefeitura de Santo André como sinônimo de avanço e progresso é uma operação que seria bizarra não fosse estúpida e desrespeitosa nos termos colocados. Embora a modalidade seja comum entre administradores municipais e tenha revestimento direto e indireto de validade social, não pode ser tratada com tamanho abuso conceitual.
Paulinho, Paulinho, pare com esse populismo irresponsável. Alguém precisa lhe dizer isso. E é o que estou fazendo. Papel de ombudsman. Que deveria ser da sociedade desorganizada de joelhos diante do Kremlin Regional.
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12/09/2024 Vejam só: sindicalistas agora são conselheiros