Economia

São Caetano vive na corda
bamba como São Bernardo

DANIEL LIMA - 10/07/2023

O que você vai saber em seguida, em linhas gerais, é o seguinte: São Bernardo e São Caetano são endereços que apresentam maiores dificuldades de gestão pública que Santo André porque a concentração industrial é mais suscetível a sacolejadas que afetam o PIB Geral e o orçamento. Vamos explicar em detalhes.  

Essa é uma nova edição de abordagem inédita de um temário desconhecido, negligenciado ou simplesmente varrido do mapa regional porque incomoda os mandachuvas e mandachuvinhas. Eles detestam a realidade dos fatos. Informações incômodas sempre provocam aversões. Quem usufrui dos poderes quer mesmo é o controle da informação --independentemente dos passivos sociais latentes que, mais dia, menos dia, afloram.    

A concentração vulnerável do setor industrial de São Bernardo e também de São Caetano é numericamente inferior quando comparada à registrada por Santo André. A diferença principal é que a gravidade econômica dos dois municípios que sofrem de Doença Holandesa é muito superior a do vizinho. Santo André conta com baixa participação automotiva, mas é muito maior em dependência de dois setores que também caracterizam Doença Holandesa. 

Santo André é um endereço em que novas explosões transformadoras no setor industrial não passariam pelo filtro de conformidades lógicas.  

São Bernardo e São Caetano vivem acossados por ataques intermitentes que empalidece a atividade numa escala de tempo relativamente longa 

A explicação é que Santo André sofre de outro tipo de Doença Holandesa -- no caso químico-petroquímica, mais resiliente que a do setor automotivo.    

A Doença Holandesa de São Bernardo e de São Caetano gera, mas também perde mais emprego formal relativo, em sincronia com a capacidade de produção.  

MAIS RESTRITIVA  

A Doença Holandesa de Santo André é restritiva e também menos impactada em empregos, mas fortemente impulsionadora de Valor Adicionado que, em última instância, engorda a arrecadação. 

O que distingue os três municípios, portanto, é que Santo André gera menos emprego no centro de controle industrial, mas está menos suscetível a trepidações.  

São Bernardo e São Caetano estão no centro do furacão macroeconômico chamado indústria automotiva. Plantas concorrenciais se espalham no território nacional e mundo afora. A guerra fiscal verde e amarela foi implacável no setor automotivo. O ABC Paulista não conta nem mesmo com 10% da produção nacional, que nos anos 1960 ultrapassava 90%. 

RECEITAS PÚBLICAS  

Enquanto Santo André perde viscosidade industrial, mas de alguma forma se segura nos trinta em forma de receitas públicas menos sujeitas a rebaixamentos contínuos, São Bernardo e São Caetano sofrem duramente com oscilações de emprego nas fábricas.  

Santo André já chegou aparentemente ao fundo do poço no mercado de trabalho industrial. Não teria mais o que perder de tanto que perdeu nos últimos 40 anos. Há apenas 12 trabalhadores industriais para cada grupo de 100 trabalhadores formais de todas as atividades.  

No caso de São Bernardo e São Caetano, salvo grande reviravolta na produção industrial, bastante improvável, ainda se tem muito a perder, mesmo depois de ter perdido bastante.  

São Bernardo conta com 22 trabalhadores industriais para cada grupo de 100 no total de atividades. Em São Caetano são 18 trabalhadores.  

PERFIL INDUSTRIAL  

Essa é a segunda edição que trato do perfil de produção industrial dos municípios do ABC Paulista (ainda chegaremos a comparações com outros territórios industrialmente fortes).  

Como foi possível observar na primeira edição, Santo André é o caso numericamente mais grave da região.  

Afinal, 78,9% da produção industrial está vinculada ao setor de produtos químicos, de borracha e de material plástico. Resumidamente, quase tudo que gira no entorno econômico do Polo Petroquímico de Capuava. São dois batalhões que restaram do exército industrial abatido nas últimas quatro décadas.  

JOGO EMPATADO  

São Bernardo e São Caetano praticamente empatam no índice de concentração vulnerável. Em São Bernardo as atividades conectadas diretamente a veículos automotivos, reboques e carrocerias (52,5%) e de produtos químicos (15,5%) elevam a 68,1% a dependência econômica.  

Em São Caetano, as atividades de veículos, reboques e carrocerias (52,7%) e de produtos alimentícios (18,3%) levam o patamar de concentração vulnerável a 71,0%.  

Transportando a situação econômica de São Bernardo e de São Caetano para o mundo do futebol, o que os dois endereços registram é uma dependência excessiva de apenas dois craques de bola.  

E mesmo assim esses craques de bola têm histórico de complicações porque sofrem muitas contusões, de vez em quando são expulsos de campo e vivem assediados por empresários mal-intencionados.  

SETOR AUTOMOTIVO  

Embora numericamente tanto São Bernardo quanto São Caetano registrem menos dependência dos dois principais setores industriais quando comparados a Santo André, a realidade é que a fragilidade de quem depende demais do setor automotivo é maior.  

Nesse caso, Santo André é menos impactada, porque apenas 4,3% do PIB Industrial está atrelado ao setor automotivo. Muito menos, portanto, que São Bernardo e São Caetano. 

Além disso, a Doença Holandesa de Santo André é menos suscetível a grandes perdas porque as empresas de maior porte que as integram são muito menos permeáveis a transferência de endereço. As atividades químico-petroquímicas e pneumáticas contam com unidades de elevadíssimos investimentos, estruturas robustas e estão menos sensíveis à guerra fiscal. 

MAIS COMPETITIVIDADE 

Já a indústria automotiva, riqueza e complicações de São Bernardo e São Caetano, é menos resistente a mudanças de localidade ou mesmo de desativação. Sem contar (e isso é na verdade o principal) que o setor é o mais competitivo do mundo e, por isso mesmo, sempre está na alça de mira de produtividade a qualquer custo.  

Em matéria de participação do PIB Industrial dos dois municípios em relação ao PIB Geral, os dados de 2017 colocam São Caetano um pouco à frente.  

Os dados desta análise se referem a 2017 porque os índices de participação do PIB Industrial no conjunto do PIB Geral de cada Município estão atualizados até aquela data. Salvo exceções, estruturalmente não há modificações significativas desde então.  

Enquanto o PIB Industrial de São Caetano tem peso de 22% na composição geral, em São Bernardo são 20%. Mas o PIB Industrial de São Bernardo é muito maior: eram R$ 9.186.786 bilhões em 2017 ante um PIB Geral de R$ 44.680.389 mil. Já o PIB Industrial de São Caetano correspondia a R$ 2.904.912 bilhões, ante PIB Geral (de todas as atividades) de R$ 13.106.959 bilhões.  

TODOS OS SETORES  

A produção industrial envolvendo São Bernardo e São Caetano tem semelhanças e distinções que não podem ser desconsideradas. Não se tratam, portanto, de cidades-gêmeas na geração de PIB Industrial, mas também não são profundamente distintas.  

Veja todos os setores e as respectivas participações relativos dos dois municípios: 

1. Veículos automotivos, reboques e carrocerias – São Bernardo conta com 52,6% e São Caetano com 52,7% de participação interna 

2. Produtos químicos – São Bernardo conta com 15,5% e São Caetano com 18,3%. 

3. Máquinas e Equipamentos – São Bernardo com 8,6% e São Caetano com 2,3%. 

4. Metalurgia – São Bernardo conta com 5,3% e São Caetano com 4,8%. 

5. Borracha e material plástico – São Bernardo conta com 3,2% e São Caetano com 1,8%. 

6. Minerais não-metálicos – São Bernardo conta com 2,6% e São Caetano com 2,6%. 

7. Produtos alimentícios – São Bernardo com 2,4% e São Caetano com 18,3%. 

8. Produtos de metal – São Bernardo com 1,8% e São Caetano com 1,2%. 

9. Impressão e reprodução de gravações – São Bernardo com 1,1% e São Caetano com 0,2%. 

10. Móveis – São Bernardo com 1,1% e São Caetano com 10,2%. 

11. Máquinas, aparelhos e materiais elétricos – São Bernardo com 1,1% e São Caetano com 0,4%. 

12. Manutenção, reparação e instalação de máquinas e equipamentos – São Bernardo com 1,0% e São Caetano com 0,4%. 

13. Celulose e produtos de papel – São Bernardo com 0,9% e São Caetano com 0,7%. 

14. Produtos farmoquímicos e farmacêuticos – São Bernardo com 0,7% e São Caetano sem registro específico. 

15. Bebidas – São Bernardo com 0,5% e São Caetano sem registro. 

16. Vestuário e acessórios – São Bernardo com 0,4% e São Caetano sem registro. 

17. Produtos diversos – São Caetano com 1,2%.  

18. Outros equipamentos de transporte – São Caetano com 0,3%. 

 

OUTROS MUNICÍPIOS 

Numa próxima edição sobre esses dados inéditos de participação da indústria de transformação dos sete municípios do ABC Paulista trataremos de Diadema, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra. Outras abordagens estão igualmente previstas. Serão observados alguns dos maiores municípios do Estado de São Paulo.  



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