Economia

Aumento do IPTU de Santo
André é mais um tiro no pé

DANIEL LIMA - 12/09/2023

Se você não prestar muita atenção nesta análise, mas muita atenção mesmo, estará na mesma situação dos vereadores de Santo André. Eles acharam, ou foram obrigados a achar, que o aumento do IPTU na semana passada, numa operação imperialista, a toque de caixa, na calada da mídia, e muito além da inflação, foi uma medida certa do prefeito Paulinho Serra.  

O aumento do IPTU em Santo André com Paulinho Serra agrava um roteiro do custo de morar e de ter negócios na cidade neste século. Como o leitor verá na sequência, quanto mais o IPTU avança no bolso dos contribuintes, menos competitiva a cidade se apresenta. Soluções fáceis para tapar buracos administrativos jamais dão certo. Mais dias, menos dias, os estragos aparecem.  

Todo mundo bem-informado e que não cai no conto da quase totalidade da mídia regional que fechou os olhos à operação do mandachuva maior da cidade sabe que o aumento é um estupro financeiro que atingiu em cheio os moradores de Santo André. 

BAIXA COMPETITIVIDADE  

Para escrever o que estou escrevendo, nos termos ácidos que estou utilizando, a melhor explicação é uma mistura de indignação, irritação, prostração e tudo que tenha alguma relação com o fim da picada.  

O assunto de que trato agora é muito sério. A decisão do prefeito e dos vereadores fragiliza ainda mais a competitividade econômica de Santo André, que, segundo estudos sérios, cai pelas tabelas.  

O mais recentemente Ranking de Competitividade dos Municípios Brasileiros, integrado por cidades de no mínimo 80 mil habitantes, colocou Santo André na 73ª posição quando se levam em conta as três dimensões do estudo. Quando se retiram questões fiscais e sociais, e vai direto na veia econômica, Santo André desaba à 148ª colocação.  

Nada disso é novidade. É o que estou cansado de escrever desde que lancei a revista LivreMercado, que virou CapitalSocial. Já se foram 34 anos.  

MENOS É MAIS  

Acabei de fazer um primeiro estudo minucioso para mostrar a legisladores e mandachuvas do Paço de Santo André que eles cometeram uma bobagem com o ajuste além da inflação do imposto que mede a temperatura de negócios e de custos com moradia dos municípios. 

Fossem mais atentos, o prefeito Paulinho Serra, secretários e tudo o mais poderiam estar reestruturando a cobrança do IPTU de forma a torná-lo menos oneroso.  

Não vamos nem entrar em detalhes sobre o pacote de aumento, que também envolve o ITBI, que é o custo de transações imobiliárias, e tampouco taxas do setor. O IPTU basta. 

Entre 10 endereços que selecionei e que integram o G-22, o Clube dos Maiores Municípios do Estado de São Paulo, constatei exatamente o seguinte:  o que entra nos cofres de Santo André por habitante e em forma de repasse do ICMS é escassamente superior ao que a Prefeitura recebe em forma de IPTU.  

Ou melhor dizendo, mais apropriadamente: o que a Prefeitura recebe em forma de IPTU é muito superior relativamente ao que recebe em forma de ICMS. Quanto mais os valores se aproximam, mais se registra baixa competitividade. Afinal, um é imposto sobre propriedade, outro é um dos indicadores que revelam a temperatura econômica.  

IPTU VERSUS ICMS  

Viu como você precisa prestar atenção máxima para entender que o prefeito de Santo André acabou de tornar ainda menos competitiva uma cidade que há 40 anos iniciou processo de desindustrialização insidioso -- o maior no Estado de São Paulo, inclusive maior que o da vizinha São Caetano? 

Em valores absolutos de 2021, Santo André só supera em arrecadação do IPTU por habitante três municípios dos 10 analisados. Até aí, os incautos ou apressados vão imaginar que o prefeito Paulinho Serra acertou em cheio. Afinal, se está em quarto lugar entre 10 concorrentes como recebedor médio per capita, Santo André está bem na fita. Quanto menos uma Prefeitura custa a cada morador, muito melhor, não é mesmo?  Não é bem assim. Muito diferentemente disso. 

O cálculo correto ou mais apropriado do IPTU pode ter variantes, e uma das quais é o repasse do ICMS. Qualquer imposto municipal que não seja cotejado por outros impostos, preferencialmente com a tradução dos dados em per capita, é o caminho da perdição analítica.  

UM EXEMPLO CLARO  

Não é porque está em quarto lugar nos valores absolutos do IPTU por habitante entre os 10 municípios selecionados que Santo André teria folga para aumentar o imposto. De fato e verdadeiro, Santo André afunda cada vez mais quando aumenta o IPTU per capita. Afinal, perde competitividade locacional para outros municípios. 

Vamos para um exemplo prático entre dezenas que poderiam ser rebocados com os números de que disponho.  

Responda sem pestanejar: quem tem o menor IPTU por habitante entre Santo André e Jundiaí? Santo André arrecadou em 2021 R$ 477,30 por morador em forma de IPTU e Jundiaí R$ 486,71. Ora, Santo André ganha a disputa por vantagem mínima, mas ganha. Ganhar a disputa significaria que Santo André teria mais folga para aumentar o valor por habitante que recolhe em forma de IPTU do que Jundiaí.  

Traduzindo tudo isso: como gosta de embromar o distinto público, o prefeito Paulinho Serra e os vereadores que o apoiaram poderiam dizer que Santo André precisava mesmo aumentar o IPTU porque recebe menos por habitante do que Jundiaí.  

ENGANAÇÃO PURA  

Foi mais ou menos isso, sem esse direcionamento específico, que tanto o prefeito quando vereadores costuraram o ataque ao bolso dos contribuintes na semana passada. 

Se até nesse momento o leitor acredita piamente que Santo André teria motivos de sobra para aumentar o IPTU nessa comparação com Jundiaí (e não se esqueça que os confrontos com quase todos os demais municípios analisados seguem a mesma concepção), o que o faria mudar de ideia? 

É nesse ponto que entram as explicações. Embora tribute por habitante menos valor absoluto que Jundiaí, Santo André de fato tributa muito mais. Basta comparar o que Santo André recebe de repasse do ICMS e o que Jundiaí também recebe. Os dados são de 2021.  

Antes de aprofundar no exemplo, não custa lembrar que o ICMS é um imposto que o governo do Estado distribui aos 645 municípios paulistas de acordo com alguns indicadores. O principal, e decisivo, porque representa 76% do peso definidor, se refere ao Valor Adicionado, que é uma medida econômica muita próxima do PIB.  

O ICMS é um imposto poderosíssimo porque infiltra-se na temperatura de cada Município em forma de circulação de mercadorias e serviços, como a própria denominação determina. Ou seja: larga porção da movimentação de riqueza frequenta os cromossomos do ICMS. 

MUITA DIFERENÇA 

Agora, voltemos ao confronto entre Santo André e Jundiaí. Atenção máxima. Santo André é supostamente menos onerosa aos moradores porque o IPTU por habitante é inferior ao que ocorre em Jundiaí. Repetido e confirmado? 

É agora que entra em campo a elucidação do crime tributário e econômico cometido por Paulinho Serra e vereadores parceiros.  

Quando se compara o que os cofres de Santo André recebem por habitante em forma de IPTU e o que os mesmos cofres recebem do governo do Estado em forma de ICMS, o bicho pega. 

Em 2021, Santo André recebeu de ICMS do Estado de São Paulo o valor médio de R$ 608,29 por habitante. Jundiaí recebeu muito mais: C$ 1.060,65 mil. Traduzindo tudo isso: a diferença monetária entre o que Santo André impôs aos moradores em forma de IPTU (R$ 477,30) e o que recebeu em forma de ICMS (R$ 608,29) está 77,18% abaixo do que Jundiaí impôs a cada morador (R$ 486,71) com o IPTU e os R$ 1.060,65 que recebeu também por morador de ICMS) que é exatamente R$ 442,95.  

Ou seja: o saldo dos cofres públicos de Jundiaí, mesmo com carga do IPTU acima de Santo André, é mais de sete vezes superior ao adversário, por conta do dinamismo econômico ditado pelo ICMS.  

Perceberam que nem sempre o menor é mesmo o melhor? No caso do IPTU de Santo André, quando comparado ao imposto de riqueza circulante do ICMS, o valor menor é muito maior do que deveria, porque perde feio para o valor maior do ICMS do concorrente.  

De todos os nove concorrentes de Santo André nessa batalha de IPTU versus ICMS, o único derrotado pela truculência processual e econômica do prefeito Paulinho Serra é Campinas. E mesmo assim por diferença mínima. Enquanto o saldo favorável ao repasse de ICMS a Santo André frente a arrecadação de IPTU foi de R$ 130,99 em 2021, em Campinas a diferença foi de R$ 117,26. Agora vejam quais foram os saldos dos demais município na mesma temporada: 

 Guarulhos, saldo por habitante de R$ 466,63, resultado de IPTU médio de R$ 457,46 e de ICMS médio de R$ 924,09. 

 Sorocaba, saldo por habitantes de R$ 490,32, resultado de IPTU de R$ 314,61 e de ICMS de R$ 804,93.  

 Osasco, saldo por habitante de R$ 256,14, resultado de IPTU médio de R$ 520,25 e de ICMS médio de R$ 776,39. 

 Piracicaba, saldo por habitante de R$ 669,03, resultado de IPTU médio de R$ 391,62 e de ICMS médio de R$ 1.060,65.  

 São Bernardo, saldo por habitante de R$ 259,99, resultado de IPTU médio de 589,88 e de ICMS médio por habitante de 849,87.  

 São Caetano, saldo por habitante de R$ 1.128,46, resultado de IPTU médio de R$ 1.128,46 e de ICMS médio de R$ 2.598,33.  

 Ribeirão Preto, saldo por habitante de R$ 286,33, resultado de IPTU médio de 597,49 e de ICMS médio de 883,82.  

 Campinas, saldo por habitante de R$ 117,26, resultado de IPTU médio de R$ 864,40 e de ICMS médio de R$ 981,66.  



Leia mais matérias desta seção: Economia

Total de 1895 matérias | Página 1

22/11/2024 SÍNDROME DA CHINA AMEAÇA GRANDE ABC
21/11/2024 QUARTO PIB DA METRÓPOLE?
12/11/2024 SETE CIDADES E SETE SOLUÇÕES
07/11/2024 Marcelo Lima e Trump estão muito distantes
01/11/2024 Eletrificação vai mesmo eletrocutar o Grande ABC
17/09/2024 Sorocaba lidera RCI, São Caetano é ultima
12/09/2024 Vejam só: sindicalistas agora são conselheiros
09/09/2024 Grande ABC vai mal no Ranking Industrial
08/08/2024 Festejemos mais veículos vendidos?
30/07/2024 Dib surfa, Marinho pena e Morando inicia reação
18/07/2024 Mais uma voz contra desindustrialização
01/07/2024 Região perde R$ 1,44 bi de ICMS pós-Plano Real
21/06/2024 PIB de Consumo desaba nas últimas três décadas
01/05/2024 Primeiro de Maio para ser esquecido
23/04/2024 Competitividade da região vai muito além da região
16/04/2024 Entre o céu planejado e o inferno improvisado
15/04/2024 Desindustrialização e mercado imobiliário
26/03/2024 Região não é a China que possa interessar à China
21/03/2024 São Bernardo perde mais que Santo André