Economia

Santo André e Mauá têm
indústria mais vulnerável

DANIEL LIMA - 23/11/2023

Santo André e Mauá têm os setores industriais mais vulneráveis na região. Muito acima das sedes de duas das três regiões metropolitanas do Interior do Estado, casos de Sorocaba e Campinas. Esse enunciado poderia ser recomposto e transformar vulnerabilidade em proteção? Depende. Vamos explicar em seguida.

É preciso compreender o sentido de vulnerabilidade e de proteção para que a resposta não seja contraditória, mas é inevitável que a equação seja mesmo contraditória. Entre vulnerabilidade e privilégio há semânticas que podem ser utilizadas de forma enviesada ou não.

Mauá e Santo André sofrem da Doença Holandesa Petroquímica. E são supostamente igualmente vulneráveis e privilegiadas por isso.

São Bernardo e São Caetano, por outro lado, também são vulneráveis com a Doença Holandesa Automotiva. Por isso também podem ser consideradas privilegiadas? Essa é a questão a ser resolvida. 

SE FOSSE PREFEITO 

Se fosse prefeito de Santo André ou de Mauá há muito estaria com a pulga atrás da orelha. Afinal, o passado da Doença Holandesa Petroquímica não é recomendável. 

Agora, se fosse prefeito de São Bernardo ou de São Caetano, também não teria dúvida: o risco da Doença Holandesa Automotiva também incomoda.

O leitor assíduo sabe do que estou tratando. Doença Holandesa, seja qual for, é o predomínio de uma determinada atividade, e atividades em geral desdobradas da principal, como ponto de equilíbrio econômico e social de localidade. 

Quanto mais um endereço municipal depende de produtos e serviços gerados por uma determinada atividade econômica e correlatas, mais vulnerável se torna num horizonte de futuro que sempre chega.

EXEMPLO CLÁSSICO 

Vamos dar um exemplo clássico, pronunciado cada vez que surge especulação de que São Caetano perderia a General Motors. A multinacional norte-americana e as autopeças que a atendem em São Caetano são a Doença Holandesa do Município. 

Em São Bernardo há uma variedade maior de empresas do setor automotivo, mas o grau de vulnerabilidade é semelhante.

Essa análise está baseada em dados oficiais do governo do Estado de São Paulo e em incursões no acervo desta publicação, que já completou 34 anos. 

Santo André e Mauá são numericamente mais vulneráveis com a Doença Holandesa Petroquímica do que São Bernardo e São Caetano com a Doença Holandesa Automotiva. O que diferencia os endereços é que o setor petroquímico é menos suscetível a grandes transformações e evasões industriais. Diferentemente, portanto, do setor automotivo.

Entretanto, a Doença Holandesa de Santo André e de Mauá gera menos emprego industrial e não conta com a capilaridade da indústria automotiva. 

Dessa forma, o que é numericamente mais suscetível à constatação de vulnerabilidade não o é de fato quando se transporta a comparação ao campo da relatividade. Há condicionantes macroeconômicas que mudam a estrutura avaliativa.

DOENÇA PETROQUÍMICA 

Fechar o Polo Petroquímico do ABC Paulista, na divisa de Santo André e Mauá, não passa pela cabeça de ninguém que tenha juízo no lugar. A transferência de uma indústria de tamanho porte e com as especificidades que detém não consta de qualquer pauta sensata. Já o fechamento gradual e inexorável de parque automotivo, que vem numa toada longeva e desgastante,  tornou-se ritual econômico.

Portanto, a vulnerabilidade do Polo Petroquímico é de uma espécie, enquanto a vulnerabilidade do setor automotivo pertence a outra família de complicações. 

O que a Doença Holandesa Petroquímica não impede, porque é menos ramificada, e isso tem-se registrado ao longo de décadas, é a fuga de empresas de outros setores produtivos. 

Santo André e Mauá sofreram grandes debandadas industriais. Principalmente Santo André. Não necessariamente porque compartilhavam espaço com o setor petroquímico. Mas necessariamente porque o ambiente produtivo na região a outras atividades desgastou-se tanto que a saída foi evadir-se.  

ÍNDICE DE VULNERABILIDADE 

Tanto é verdade que todas as demais cadeias produtivas que atendiam principalmente a Santo André desapareceram do mapa de produção. Ou seja: cada vez mais a Doença Holandesa Petroquímica acentua-se nos dois municípios. A dependência se torna crônica. E acomodatícia, porque o setor Petroquímico/Químico gera muito Valor Adicionado, que se transforma em repasse de ICMS (Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), repassado pelo governo do Estado aos municípios.

Chamaria de Índice de Vulnerabilidade Industrial o mapa de predomínio de algumas atividades que configuram  Doença Holandesa.

Santo André e Mauá são mesmo casos inquietantes da Doença Holandesa Petroquímica. 

O PIB Industrial de Santo André, que cai seguidamente no ranking estadual, registra que nada menos que 74,3% estão concentrados em dois setores correlatos. Em Santo André, Produtos Químicos (51,2%) e Borracha e Material Plástico (23,1%). Em Mauá, são 75,4% de concentração, dos quais 41,8% nos Derivados de Petróleo e 33,6% nos Produtos Químicos. 

Juntando-se os dois municípios o que temos de prevalecimento são as indústrias petroquímicas, químicas e de pneumáticas. Outros 16 setores industriais ficam com o restante de participação. Quase nada, portanto.

OUTROS MUNICÍPIOS 

São Caetano tem os dois principais setores industriais com concentração de produção muito próximo ao registrado em São Bernardo (64,3%). Veículos Automotores, Reboques e Carrocerias (automotivo) domina com 52,9% do PIB Industrial, enquanto Produtos Alimentícios ficam com a fatia de 11,4%. A atividade de Metalurgia ocupa 10,1% do bolo do PIB Industrial, também por força da produção automotiva.

A vulnerabilidade da São Bernardo automotiva é de 64,8%, ocupados pela conjunção de 51,1% de Veículos Automotores, Reboques e Carrocerias e 13,7% de Produtos Químicos. A Metalurgia vem em seguida com 9,7%.

Diadema tem muitas semelhanças demográficas e sociais com Mauá, mas se salva de vulnerabilidade potencialmente mórbida, por assim dizer. Não há uma divisão clara de concentração do PIB Industrial em apenas dois setores. Os seis primeiros não se distanciam demais entre si: Borracha e Material Plástico (16,0%, Produtos Químicos (15,4%), Máquinas e Equipamentos (12,5%), Metalurgia (12,5%), Veículos Automotores, Reboques e Carrocerias (10,0%) e Produtos de Metal (9,0%). 

DIFUSÃO DE PERDAS 

Entretanto, não custa ressalvar que difusão de produção industrial, ou seja, o contrário de concentração, também pode encontrar obstáculos desagradáveis e destrutivos quando, por conta de uma coleção de fatores, um Município perde o empuxo e o dinamismo econômico. É o caso de Diadema, um dos piores resultados de PIB Industrial neste século do G-22, o Clube dos Maiores Municípios do Estado de São Paulo. 

Em Diadema, a difusão industrial virou dispersão e enfraquecimento diante de concorrentes. Sem uma Doença Holandesa para chamar de sua, para o bem e para o mal, Diadema entrou em parafuso. 

Com Doença Holandesa ou sem Doença Holandesa, está mais que claro e definido pelo mapa do G-22 deste século que os municípios da região não conseguem escapar da degola industrial. Estão muito aquém da concorrência instalada no Interior do Estado.

SÃO JOSÉ CONCENTRADA

Entre as três sedes das regiões metropolitanas no Interior Paulista, apenas São José dos Campos depende demais de uma determinada atividade industrial e de seus desdobramentos. São José dos Campos conta com Índice de Vulnerabilidade Industrial de 68,0% -- portanto abaixo apenas de Santo André e de Mauá. 

São José dos Campos depende do PIB Industrial de 54,0% do setor de Derivados de Petróleo (refinarias) e outros 14, 0% de Outros Equipamentos de Transporte, no caso da indústria aeroespacial. O setor de Veículos Automotores, Reboques e Carrocerias não passa de 14,0% do PIB Industrial. Basta comparar com São Bernardo e São Caetano para se ver a diferença. 

O Índice de Vulnerabilidade Industrial de Sorocaba está bem abaixo dos municípios da região e de São José dos Campos. É de apenas 51,4%, relativos aos 28,8% de Veículos Automotores, Reboques e Carrocerias e aos 21,4% de Máquinas e Equipamentos.

O que existe de forma pronunciada em Sorocaba e praticamente não aparece em qualquer Município da região é o setor de Equipamentos de Informática, Eletrônicos e Ópticos, que participa com 11,2% do PIB Industrial. Santo André e São Bernardo não contam com o setor, enquanto São Caetano registra participação de 1,4% no bolo industrial. Em Diadema o total é de 1,7%.

O Índice de Vulnerabilidade Industrial em Campinas, outra sede de Região Metropolitana, também é baixo, de 49,7% de tudo que é fabricado. Esse é o resultado somado dos 28,3% de Veículos Automotores, Reboques e Carrocerias e dos 21,4% de Máquinas e Equipamentos. O setor de Equipamentos de Informática, Eletrônicos e Ópticos também é expressivo em Campinas, com participação de 11,2% no PIB Industrial. 

Garanto que essa temática não está esgotada. Voltaremos ao assunto na semana que vem. Doença Holandesa é Doença Holandesa. Se fosse positiva, não seria enfermidade econômica. 



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