Imprensa

Diário: Plano Real que
durou nove meses (16)

DANIEL LIMA - 20/09/2024

Juntamos hoje duas edições de OmbudsmanDiário, a newsletters que criei em 2004, antes de assumir a direção de Redação do Diário do Grande ABC. Há exatamente 20 anos. E 40 anos depois de, em 1984, estar à frente da Redação do Diário do Grande ABC, na função de coordenador de produção editorial, dividindo o controle do departamento mais importante daquela publicação com Ademir Medici (reportagens especiais) e Valdir dos Santos (editora de primeira página).

As duas edições de OmbudsmanDiário disponíveis logo abaixo dão a dimensão do trabalho à frente do Diário do Grande ABC. Um trabalho que durou apenas nove meses de cinco anos por razões que qualquer leitor minimamente inteligente saberia decifrar. Basta ler, por exemplo, o que segue imediatamente abaixo.

Esta série não se encerrará quando se esgotarem as edições de OmbudsmanDiário. Seguirá em frente durante os meses seguintes e por todo o período de comando daquela Redação. Inclusive com a reprodução de uma nova newsletters que criei para acompanhar a trajetória da Redação no período.

Em 21 de junho de 2004, como Ombudsman, encaminhei aos diretores, acionistas e editores do Diário do Grande ABC o que chamei de sinopse do Planejamento Editorial Estratégico que preparei para introduzir uma reforma generalizada naquela publicação.  Leiam o que enviei aos principais responsáveis pelo jornal. Essa sinopse reúne menos de mil caracteres do total de mais de 95 mil do material original, entregue pessoalmente aos destinatários da newsletter OmbudsmanDiário. 

Na sequência, edição de 23 de junho,  OmbudsmanDiário estava recheadíssima de informações e críticas. Prosseguia este jornalista a tarefa de esquadrinhar o jornal mais tradicional da região. Fiz abordagens importantíssimas sobre assuntos então candentes. O Santo André começaria a decidir a Copa do Brasil com o Flamengo, numa disputa da qual sairia vencedor. A Universidade Federal do Grande ABC (ainda UABC, não UFABC) seguia sob o controle estratégico de gente sem preocupação com a economia da região, além de outros assuntos que clamavam por atenção.  

 EDIÇÃO NÚMERO 10

Apresentamos a seguir sinopse do Planejamento Estratégico Editorial que preparamos para a companhia, com previsão de aplicação nos próximos 50 meses, a partir da assinatura do contrato de trabalho. Eis os vetores em que dividimos nosso trabalho: 

APRESENTAÇÃO

"Tem o presente documento o compromisso de delinear conceitos e programas que pautarão nossa atividade na condução operacional, técnica, orçamentária e gestora dos departamentos editoriais do Diário do Grande ABC. Esse material está sujeito a novas incursões do autor, seja por meio de supressões, seja por emendas, dada a possibilidade de a experiência prática no front se comprovar além ou aquém das expectativas aqui traçadas". 

GESTÃO 

"O setor de insumos editoriais do Diário do Grande ABC será gerenciado por este profissional com ampla autonomia quanto à metodologia operacional, técnica, financeira e de conteúdo. Sempre que houver transbordamento de funções, o setor editorial sustentará interface com o outro macrogerenciamento da companhia, que envolve os setores administrativo, financeiro e comercial".

REGIONALIDADE 

"É preciso compreender o sentido de regionalidade que aplicaremos na linha editorial do jornal para que não se caia na armadilha do reducionismo simplificador. Regionalidade não tem nada a ver com provincianismo. Não faremos do jornal uma repetição diária dos veículos semanários que vivem e sobrevivem de releases dos governos municipais e de empresas privadas que contam com assessoria de imprensa. O conceito de regionalidade contemporâneo prende-se ao desafio de vasculhar cada centímetro quadrado do território dos sete municípios do Grande ABC sem perder de vista o encaixe metropolitano". 

CONSELHO EDITORIAL

"Iremos substituir o Conselho do Leitor pelo Conselho Editorial. Não se trata de simples troca de nomenclatura. A mudança é muito mais substantiva, porque invade o terreno do conceito, da especificidade. O Conselho do Leitor é instância estranha no departamento-vitrine da empresa -- o editorial -- porque atinge diretamente quem está envolvido com o público e, consequentemente, com o produto final. A composição e as funções atribuídas aos conselheiros-leitores são uma anomalia porque agridem e impactam a corporação no que provavelmente deve oferecer como principal predicado: a autoestima acompanhada de senso de respeito".

FORMAÇÃO PROFISSIONAL

"A exemplo do que organizamos entre 1982 e 1983, quando ocupamos posto equivalente ao de chefe de redação, embora a nomenclatura fosse de coordenador de produção, vamos introduzir um mecanismo de seleção e preparação de recém-formados para, mediante necessidades, contratá-los para substituir ou eventualmente reforçar nosso quadro de redação". 

ESPECIALIZAÇÃO 

"É uma jornada longa, complexa, trabalhosa, mas precisa ser iniciada o quanto antes. Estamos nos referindo à constituição de quadros profissionais de redação que serão especialistas nas mais diferentes matérias. O jornalismo mais contemporâneo exige que os profissionais conheçam tanto as técnicas de interlocução com os leitores como uma bateria de questões específicas relatadas pelas fontes de informação". 

MULTIFUNCIONALIDADE

"A especialização é parente muito próximo da multifuncionalidade. Sem especialistas não se alcança a diversidade funcional. Com vagar, é mais que possível, é certo, que um profissional de jornalismo absorva várias atribuições que o convencionalismo editorial subdivide entre vários colaboradores. As diversas fases que caracterizam a linha de montagem editorial podem ser compactadas com evidentes vantagens de tempo e recursos financeiros". 

PARCERIA

"As relações corporativas entre Editora Livre Mercado e Diário do Grande ABC vão depender também de áreas além do setor de insumos, mas no que estiver sob nosso gerenciamento não há dúvidas de que prevalecerão medidas cooperativas para racionalizar custos e implementar receitas. O Prêmio Desempenho, realizado há 10 anos pela Editora Livre Mercado e poucas vezes tratado como produto da companhia Diário do Grande ABC, será pela primeira vez compartilhado dentro dos limites redacionais que esperamos frutíferos". 

OPERACIONALIDADE

"Somente um diagnóstico que leve em conta o dia-a-dia de produção conseguirá aferir sem maiores riscos o grau de eficiência, de eficácia e de ineficiência do jornal. A diferença entre eficácia, eficiência e ineficiência é a mesma entre um goleador que marca gols em profusão mas inúteis contra adversários de baixo nível e sempre nega fogo quando se vê confrontado com a imperiosidade de decidir; um goleador que distribui artilharia harmoniosamente, sempre nos momentos mais delicados, sempre quando um gol faz a diferença de pontos preciosos; e um goleador em fim de carreira, incapaz de recuperar a velha forma e que, portanto, vive única e exclusivamente do passado". 

RELACIONAMENTO EXTERNO

"O relacionamento com público externo é uma equação que requer desprendimento. Nem sempre é possível detectar, mas geralmente é viável abortar inescapáveis problemas. Basta querer. Trata-se do distanciamento mínimo entre os formuladores editoriais e os responsáveis acionários pelo produto que vai às ruas e as fontes de pressão. O apadrinhamento de pessoas e entidades é o desvio mais rápido para a acomodação editorial, seguida da desmoralização nem sempre impactante, mas sem dúvida suficientemente danosa". 

VALOR AGREGADO

"Um dos maiores desafios do jornalismo moderno -- e essa batalha tem sido frequentemente um terror para os editores -- é escapar das armadilhas preparadas pela associação do despreparo crítico da maioria dos jornalistas e o apurado senso oportunístico de fontes de informação. É inconcebível que as redações estejam tão vulneráveis para o enfrentamento -- é mesmo enfrentamento, tantos são os interesses -- do jogo de sedução, de manipulação, de esquisitices que permeia o cotidiano informativo". 

DIARIO50ANOS

"O Projeto Diário50Anos é o grande mote que pretendemos introduzir como estratégia para amalgamar o que chamaríamos de nova fase não só dos insumos editoriais sob nosso controle, mas da companhia como um todo. Já imaginaram o que representaria às finanças do Diário do Grande ABC a conexão entre o editorial e o comercial no lançamento do Projeto? Que tal negociarmos a partir de março agora, numa mega-ação, cotas de patrocínio envolvendo o jornal e a revista do grupo? São cotas resgatáveis em 50 parcelas mensais -- o período que demarcará o início e o ápice desse definidor do reconhecimento do valor histórico do jornal e da consecução de sua nova política editorial".

 EDIÇÃO NÚMERO 11

Está mais curta a edição da newsletter desta quarta-feira de futebol decisivo e também de debates no Legislativo de Santo André sobre o perfil da Universidade Federal do Grande ABC. Mas nada que seja substantivo deixou de ser analisado por este ombudsman. Minha rotina de leitura atenta dos jornais foi sensivelmente adensada desde que assumi este cargo. A exposição intrauterina deste trabalho me coloca diariamente em confronto saudável com leitores do jornal, da revista e da newsletter Capital Social Online. A pergunta que mais ouço é sobre a democratização dessas informações. Respondo que, se depender exclusivamente do ombudsman, não demorará. 

Aliás, se formos aplicar um mínimo de sensatez comparativa, se o jornal publica a coluna do Conselho do Leitor, nada o impediria, também, de uma coluna do ombudsman. Entretanto, um erro não justificaria outro. Aliás, um baita erro não justificaria uma cautela, para ser mais preciso. 

Como ombudsman, espero que o público-alvo deste trabalho se manifeste sobre comentários eventualmente contestáveis ou procedentes. Outro dia tivemos a colaboração de Irati Motta, decorrente de observação sobre um estranho desenho gráfico no Cultura & Lazer. Dias depois, voltei a registrar o que considerei inconformidade gráfica, mas a profissional não se manifestou. Quero crer que não há em qualquer escala hierárquica da organização restrições à interlocução com o ombudsman -- ou mesmo qualquer outra iniciativa que conflite com os objetivos de melhoria do produto. 

Nem passa pela minha cabeça a possibilidade de que alguém que eventualmente se julgue acima do bem e do mal se interponha como obstáculo à consolidação de mecanismos que catapultem a publicação a novo patamar de qualidade. Aliás, quando essa meta for alcançada, qualquer interpretação que venha a ser exposta e que exclua o conceito de coletivismo se consagrará como egocêntrica e devastadora à perpetuação dos avanços. 

CASO CELSO DANIEL (I)

O jornal foi econômico e impreciso sobre mais um desdobramento do caso Celso Daniel, agora envolvendo o ex-secretário municipal Klinger Sousa e empresários de Santo André. Não há qualquer informação que relacione a cronologia do julgamento e o encurtamento do cabresto investigatório do Ministério Público que está na mira do Supremo Tribunal Federal, em Brasília, previsto para agosto. É impressionante como o jornal não consegue enxergar além dos limites do imediatismo. A atenuar o erro, também o Estadão e a Folha de S. Paulo, por motivos não necessariamente semelhantes, não têm o alcance do aspecto político e institucional que está por trás da questão. Independentemente de juízo de valor sobre a suposta participação dos denunciados pelo Ministério Público Estadual. 

CASO CELSO DANIEL (II)

A cobertura do Diário foi, mesmo assim, mais cautelosa e responsável que a do Estadão, que, inclusive em primeira página, encaminha editorialmente uma decisão que à Justiça pertence. Trata-se, como se sabe, de um jornal alinhado às forças políticas que pretendem detonar o governo federal e cuja trajetória de lambeção ao governo FHC chegou ao ponto da irresponsabilidade. Palavra de quem é só jornalista, ou seja, não tem vínculo partidário com qualquer agremiação. 

TELECOMPLICAÇÕES

A abertura da matéria "Horizon adquire operadora de TV a cabo no Grande ABC", da Economia, página 2, é a consagração de entrecruzamento de informações que deixa os leitores atônitos. Reparem: "A operadora de serviços múltiplos Canbras, que iniciou as operações em Santo André em 1996, com a oferta de serviços de TV a cabo -- pertencente à Bell Canada International e ao Grupo Abril -- foi adquirida recentemente pela Horizon Serviços Digitais, com sede em Americana (SP), formada por capital nacional e norte-americano, e se transformou na segunda maior operadora de TV a cabo do país". 

Tudo isso, tudo isso mesmo, num único e intrincadíssimo parágrafo. Não vou me dar ao luxo de, em 30 segundos, refazer esse manancial de informações e transformá-lo em texto compreensível. Afinal, esse não é filho único da estrutura editorial do jornal. Trata-se, na verdade, de lugar-comum. Há entre as deficiências estruturais da redação um vácuo imenso no controle da qualidade editorial. Nenhum jornalista é obrigado a escrever integralmente correto porque, sabemos, o dia-a-dia muitas vezes nos pega de calça curta. 

Entretanto, nessas horas o trabalho de equipe aparece. Ninguém erra sozinho. Meus textos são revisados pelo menos duas vezes por mim e passa, também, por copidescagem de pelo menos mais um profissional. Pobre do jornalista que não tenha humildade de reconhecer que comete falhas estruturais ao sabor dos acontecimentos muitas vezes incontornáveis. Pobre do jornalista, também, que não escorrega em concordâncias, em excesso de apostos. Quem não errar estará denunciando um perfil de burocrata cuja capacidade de sensibilizar os leitores provavelmente será a mesma de um corpo anestesiado reagir a um corte cirúrgico. 

UNIVERSIDADE PÚBLICA

O jornal volta ao assunto hoje à página 4 de Setecidades com o título "Pesquisa tornaria UABC mais útil". Francamente, é de lascar a insistência com que o jornal se dobra às fontes de informações e não consegue se agarrar minimamente à ancoragem do assunto. Basta uma leitura da revista LivreMercado (Reportagem de Capa de junho) para constatar que o Consórcio de Prefeitos contratou há quatro anos uma empresa que levantou todos os dados sobre a indústria do plástico no Grande ABC. O trabalho está levemente defasado, mas é a porta de entrada para a aplicação inicial de recursos com cursos dirigidos à atividade. 

Há acadêmicos sem qualquer intimidade com desenvolvimento econômico que transformarão a UABC numa Torre de Babel. Basta o jornal continuar entregando a terceiros a iniciativa de manipular os cordéis da informação. 

COPA DO BRASIL

Dos jornais que li hoje -- Diário, Folha e Estadão --, a matéria mais interessante sobre as finais da Copa do Brasil entre Santo André e Flamengo está nas páginas da Folha. Um texto criativo, com abordagem providencial que, sem dúvida, poderia ter algo semelhante nas páginas do Diário. O tom do Diário encaminha-se vertiginosamente para um evento épico quando seria sim possível combinar a importância do acontecimento para a região e os valores intrinsecamente esportivos. 

EXEMPLO DE INTERPRETAÇÃO

Quando martelo sobre a importância de interpretação das matérias provavelmente há aqueles derrotistas ou contraventores éticos que procuram desclassificar a ponderação. Eles são incapazes de entender que interpretação e opinião são pontos distintos de um trabalho jornalístico, embora se situem em limites tênues. Vejam um exemplo, no Estadão de hoje, do estilo de qualificação editorial que defendo:

"A Guarda Civil Metropolitana (GCM) de São Paulo virou polícia de fato. Seus homens não se limitam mais a tomar conta de escolas, parques e praças municipais. Eles estão fazendo rondas nas ruas e até prendem ladrões armados. Isso tudo antes de o Congresso votar a emenda constitucional que a tornaria polícia municipal".

Na sequência do texto, uma série de informações que dão sustentação ao chamado lide (abertura) da matéria. Fosse no Diário, o texto estaria recheado de "de acordo" ou de "segundo ele", entre outros vícios de apuração e de análise. É por essas e outras que insisto em dizer que o jornal perdeu a capacidade de chamar para si a responsabilidade de transmitir aos leitores a segurança de informações rigorosamente apuradas. 

CRIMINALIDADE

Corroborando com o que escrevemos ainda outro dia sobre o triunfalismo de um editorial do jornal que transformou um acontecimento isolado da área policial em regra de vitalidade da área de segurança, o Estadão de hoje, à página A4, publica interessante matéria. Sob o título "Para a maioria, violência está fora de controle", o texto é dinamitador: "A maioria absoluta (80,6%) dos entrevistados pela Sensus acha que a violência no Brasil está fora de controle e 35,5% entendem que a forma de violência mais ameaçadora são os assaltos, em casa ou na rua; 29,6% temem especialmente o tráfico de drogas. Já 64,6% dos entrevistados acham as ações das polícias inadequadas ou ineficazes. Só 29,1% as consideraram adequadas e eficazes". 

Imaginem se a metodologia aplicada tivesse apenas o Grande ABC como campo de análise. O jornal está bastante leniente na abordagem das questões criminais que atingem a região. 


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