Sociedade

Complicações à vista: Diário quer
assumir a presidência da Acisa

DANIEL LIMA - 31/08/2011

Nem mesmo a escandalosa derrocada do diretor-presidente do Diário do Grande ABC, Ronan Maria Pinto, à frente do Saged, empresa que terceirizou o futebol praticamente tetrarrebaixado da cidade, parece servir de lição. Há nova empreitada da direção da empresa da Rua Catequese: agora é outro diretor, Evenson Dotto, filho de Maury Dotto, um dos fundadores da empresa, que pleiteia a presidência da Acisa (Associação Comercial e Industrial de Santo André), nas eleições que se aproximam.


O constrangimento é geral, quase na exata dimensão e profundidade do temor de enfrentamentos que se avizinham.


Quem estaria disposto a puxar o tapete das pretensões de Evenson Dotto?


Quem vai amarrar o guizo do bom senso no pescoço de projetos de Evenson Dotto?


Quem vai cercar o frango da sensibilidade institucional no campo aberto de ambições de Evenson Dotto?


Sabe-se que cardeais da Acisa não querem nem ouvir falar na possibilidade de o Diário do Grande ABC meter-se na entidade, mas sabe-se também que nada obstaria os sonhos do enviado especial de Ronan Maria Pinto.


Sim, para os dirigentes da Acisa que não caminham nos mesmos passos do Diário do Grande ABC a participação eleitoral de Evenson Dotto é uma deliberação de Ronan Maria Pinto. Seria o próprio Ronan Maria Pinto o ponta-de-lança da empresa na Acisa, não fosse a cotação baixa em que se encontra entre outros motivos porque o Ramalhão deu com os burros nágua.


Admitem alguns menos reticentes dirigentes da Acisa que valeria a pena um grito de independência, mas são poucos que levam a sério essa prerrogativa democrática. Ronan Maria Pinto não é observado na Acisa como alguém que pratique em ambientes reservados as gentilezas que abundam em contatos públicos.


Por isso este jornalista é utilizado como espécie de porta-voz de quem optou pelo silêncio de reprovação ao plano de Evenson Dotto.


Não me importo com a possibilidade de sofrer mais represálias por não me alinhar à política expansionista do Diário do Grande ABC, empresa que deveria concentrar-se na qualidade do produto editorial, cada vez mais problemática. Assumo a condição de boi de piranha porque ainda acho que vale a pena, senão no presente mais imediato, no futuro mesmo que mais prolongado. Haverá sempre alguém que ao estudar a dinâmica regional encontrará textos que apontarão pelo menos um polo de resistência à perpetuação de modelos arcaicos de representatividade, grudados em meados do século passado. Modelos que se divorciam dos objetivos mesmo que difusos da sociedade.


Não tenho restrição a Evenson Dotto para me posicionar contrário ao projeto embalado na Rua Catequese pelo mesmo empresário que está levando o Ramalhão à Quarta Divisão do futebol brasileiro. Mais que isso: nada o impede constitucionalmente de pretender o que bem entender.


A restrição é de ordem conceitual: da mesma forma que no passado condenei Fausto Polesi,  então diretor de Redação, e Wilson Ambrósio, diretor comercial por meterem-se presidência adentro da Acisa, também entendo que ali não é o lugar adequado no presente para um representante da empresa de comunicação assumir posto de mando principal.


É preciso, entretanto, contextualizar situações para que não se coloquem no mesmo saco as razões que levaram Fausto Polesi e Wilson Ambrósio à direção máxima da Acisa e o que se antevê em relação a Evenson Dotto. São situações diversas.


Nos casos dos dois primeiros, apesar de as eleições terem-se constituído também em esticamento do braço de interesses do Diário do Grande ABC, vivia-se situação menos intromissoras.


Fausto Polesi e Wilson Ambrósio dirigiram a Acisa em momentos de certo consenso daquela entidade quanto à importância de contar com eles no comando. O Diário do Grande ABC agregava força social e econômica, além de política, que poderia acrescentar ganhos de escala à Acisa. Tanto que a instituição se consolidou durante anos como a mais importante entre as congêneres da Província do Grande ABC.


Havia sim vocação a um certo imperialismo do Diário do Grande ABC, cujo centro de gravidade da vida regional era disseminado a partir do sexto andar do edifício da Rua Catequese com um certo desdém às demais forças ou supostas forças institucionais. Ou seja, o Diário do Grande ABC até metade dos anos 1990, esticando-se até mesmo ao final dos anos 1990, reunia massa crítica que lhe possibilitava jogar com todas as cartas que pudessem fortalecê-lo.


Não é esse o caso destes tempos de multiplicidade de veículos de comunicação impressos e digitais associada ao rebaixamento do Diário do Grande ABC no Campeonato Brasileiro de Qualidade Editorial.


Sempre me opus a operacionalidade de marketing envolvendo veículos de comunicação em ambientes estranhos à finalidade com que foram concebidos. Empresa do setor deve se limitar a produzir conteúdo que mobilize a sociedade em busca de projetos de resolutividades. Descobrir novos talentos sociais, expondo suas ideias e ações, é uma forma de o jornalismo prestar enormes serviços à comunidade.


Quando se ocupam postos principalmente de comando, dá-se processo inverso, porque inibe-se a ascensão de profissionais de áreas diversas. Por isso mesmo, aliás, jamais me integrei a qualquer instituição regional. Nem associado do Esporte Clube Santo André, agremiação que no passado me fez perder muitos cabelos, sequer sou. Presidente de alguma coisa, então, nem pensar. Participei ativamente do Fórum da Cidadania como representante da sociedade. Jamais sequer sugeri disputar a coordenação-geral.


É preciso, em resumo, estimular a abertura de espaço à mobilização de representantes da sociedade regional. Quando um empresário/executivo da mídia regional ocupa função de destaque em qualquer instituição, o custo-benefício é um desastre. Normalmente os parceiros de direção se acomodam. O centralismo é tão automático quanto desastroso.


A presidência-tampão de Fausto Polesi nos anos 1980 no Esporte Clube Santo André, chamado que fora para uma situação de emergência, é um dos exemplos dessa crônica anunciada de infortúnio. Fausto Polesi foi seduzido porque tinha fortes relações históricas com o clube, principalmente como torcedor. Jamais ele costurou o controle do clube. Foi-lhe praticamente imposto o cargo.


Já o caos do Ramalhão destes tempos tem outra tipologia. Ronan Maria Pintou entrou num negócio chamado futebol, que nos tempos de Fausto Polesi era principalmente romantismo, e quebrou a cara em todos os sentidos. Menos literalmente. Pelo menos enquanto torcedores organizados não o encontrarem nos corredores do Estádio Bruno Daniel, porque ameaças não faltam.


O adversário de Evenson Dotto nas primeiras prévias informais à presidência da Acisa é o empresário do setor imobiliário Flávio Martins, herdeiro de um dos fundadores da CTBC (Companhia Telefônica da Borda do Campo). Tudo indica que, se não houver recuo do dirigente do Diário do Grande ABC, a entidade vai pagar um preço alto pela carteirada. Ou então, se acomodará num conformismo deplorável.


Leia mais matérias desta seção: Sociedade

Total de 1097 matérias | Página 1

21/01/2025 PAULINHO, PAULINHO, ESQUEÇA ESSE LIVRO!
20/01/2025 CELSO DANIEL NÃO ESTÁ MAIS AQUI
19/12/2024 CIDADANIA ANESTESIADA, CIDADANIA ESCRAVIZADA
12/12/2024 QUANTOS DECIDIRIAM DEIXAR SANTO ANDRÉ?
04/12/2024 DE CÃES DE ALUGUEL A BANDIDOS SOCIAIS
03/12/2024 MUITO CUIDADO COM OS VIGARISTAS SIMPÁTICOS
29/11/2024 TRÊS MULHERES CONTRA PAULINHO
19/11/2024 NOSSO SÉCULO XXI E A REALIDADE DE TURMAS
11/11/2024 GRANDE ABC DOS 17% DE FAVELADOS
08/11/2024 DUAS FACES DA REGIONALIDADE
05/11/2024 SUSTENTABILIDADE CONSTRANGEDORA
14/10/2024 Olivetto e Celso Daniel juntos após 22 anos
20/09/2024 O QUE VAI SER DE SANTO ANDRÉ?
18/09/2024 Eleições só confirmam sociedade em declínio
11/09/2024 Convidados especiais chegam de madrugada
19/08/2024 A DELICADEZA DE LIDAR COM A MORTE
16/08/2024 Klein x Klein: assinaturas agora são caso de Polícia
14/08/2024 Gataborralheirismo muito mais dramático
29/07/2024 DETROIT À BRASILEIRA PARA VOCÊ CONHECER