É uma pena que a festa de ontem à noite de entrega do Prêmio Master Imobiliário, promovida pelo Secovi-SP (Sindicato da Habitação do Estado de São Paulo) não tivesse o contraponto crítico do Prêmio Abacaxi Imobiliário. Tenham certeza que a MBigucci, do empresário Milton Bigucci, presidente da Associação dos Construtores do Grande ABC, seria candidatíssima a subir ao palco. Ganhar é outra história. A atividade imobiliária está recheadíssima de problemas de ordem ética, entre outras ordens.
É claro que o Secovi não vai embrenhar-se em terrenos que possam deslustrar a atividade imobiliária, até porque foi criado para encher a bola do setor, como todas as instituições corporativizadas, aquelas que só olham o próprio umbigo de vantagens a todo custo, embora não faltem discursos maltrapilhos de inquietação social e até mesmo algumas ações pontuais e dissimuladoras dos pecados capitais cometidos ao longo de cada ano.
Mesmo com a perspectiva de alheamento do Secovi com o que ocorre de deletério com a classe dos construtores, não custa sonhar com o dia em que a sociedade corporativizada em vários segmentos se enxergará mais responsável e passará a tratar o conjunto da sociedade não engajada em corporativismos com mais respeito e, por que não, exercerá a autocrítica com grandeza de espírito.
Afinal, o que faria com que a MBigucci, empreendimento de grande sucesso da família Bigucci, concorresse com amplas possibilidades de receber o Prêmio Abacaxi Imobiliário? Pela obscuridade, ausência ética, descaso, infringência das regras de competição sadia no mercado e mais alguns condimentos negociais que, por serem menos importantes, podem deixar de ser listados.
Para a MBigucci deveria valer sim a máxima romana de que não basta que o relacionamento comercial com os poderes públicos seja honesto. É preciso que pareça honesto.
A aquisição de área pública de 17 mil metros quadrados na esquina privilegiadíssima da Avenida Kennedy com a Avenida Senador Vergueiro, em São Bernardo, foi uma operação a enfeixar todas as restrições que a concorrência sadia impõe, que o respeito à sociedade exige, que o relacionamento entre empresas privadas e organizações estatais requerem.
Repetimos: a MBigucci deveria concorrer ao Prêmio Abacaxi Imobiliário em condições de amplo sucesso — apesar de não faltarem adversários com cases espetacularmente tenebrosos — porque atuou de forma no mínimo desleal ao conquistar em licitação pública aquele terreno valiosíssimo.
Por que desleal? Porque à frente da Associação dos Construtores muito antes de o Muro de Berlim vir abaixo, Milton Bigucci teria de no mínimo convocar todos os associados da entidade e também os não associados, que são a maioria.
Um edital, que poderia ser publicado nos principais veículos de comunicação da região, como faz com as peças publicitárias dos empreendimentos de sua empresa, abriria as portas a uma concorrência saudável inclusive aos cofres públicos. Ou seria miragem a tradição de maracutaias nas licitações?
Se a operação em si tem todas as características de escândalo ético, porque Milton Bigucci e a MBigucci têm fortes relações com os administradores públicos, o passo seguinte foi então um desastre: todas as árvores plantadas naquele terreno há algumas dezenas de anos foram derrubadas na calada da noite de um final de semana, como denunciou ainda outro dia uma leitora desta revista digital indignada com a surpresa de voltar de viagem e encontrar aquele terreno sem qualquer revestimento verde.
Isso mesmo: a MBigucci zerou o índice de verde daquela área num piscar de olhos. Mais que isso: não deu a devida publicidade à empreitada, explicando a chamada compensação ambiental que, para os moradores vizinhos ao empreendimento, não tem valor algum, porque não serão diretamente recompensados com a reposição aleatória daquele pedaço de filtro ambiental.
Vou insistir na pregação agora mais sistemática de que o setor imobiliário da Província do Grande ABC precisa dar uma lição aos congêneres de tantos outros endereços ao entregar-se menos à sanha do corporativismo aniquilador da qualidade de vida, jogando-se de corpo e alma nas águas da socialização de informações e compromissos.
Milton Bigucci não sabe o bem que me fez ao ingressar na Justiça para tentar a ditadura da censura ao meu trabalho, adotando linha de ataque desconectada não só do legado constitucional, mas principalmente de comprometimento social.
Se me conhecesse de fato e minimamente saberia que levo minha profissão tão a sério, mas tão a sério, que não foi por acaso que me passaram a perna na da Editora Livre Mercado. Entreguei-me integralmente a produzir aquela que foi ao longo de duas décadas a melhor revista regional do País (os textos que estão sendo transplantados para esta revista digital são a prova material do que afirmamos) sem me dar conta das algazarras nos interiores da empresa, em setores fora de minhas atribuições legais e funcionais.
Paguei um preço elevado em defesa de um regionalismo contemporâneo que nunca chega, mas não me arrependo. Estou disposto a pagar qualquer outro preço suplementar, aliás como venho pagando por adotar uma linha independente. Entretanto, não seria Milton Bigucci eventual credor, porque a Justiça saberá distinguir quem é quem nessa história.
Espero que o Secovi um dia saia do casulo corporativista que gerou entidades como a Associação dos Construtores do Grande ABC (Acigabc) e se dê conta de que a sociedade merece empreendedores menos açodados, mais determinados a enxergar além dos muros do próprio bolso. Como, aliás, já temos vários empreendimentos privados com essa ossatura.
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21/01/2025 PAULINHO, PAULINHO, ESQUEÇA ESSE LIVRO!