A Província do Grande ABC, quarta colocada no Campeonato Brasileiro de Potencial de Consumo, uma das medidas de riqueza, mergulha vergonhosamente no Campeonato Brasileiro de Favelas, ao ocupar o sexto lugar com um total de 414 mil pessoas, ou 17,5% da população. Muito à frente da emblemática Rio de Janeiro, para se ter ideia do caos habitacional.
Pior que a classificação é o descaso histórico com uma questão de fundamental importância à qualidade de vida. O que fazer se a maioria da mídia prefere mesmo bajular os manipuladores do mercado imobiliário?
Mais propriamente do mercado imobiliário conduzido à margem da ética pelo presidente da Associação dos Construtores, o empresário Milton Bigucci.
Vejam o posicionamento dos nove primeiros colocados no Campeonato Brasileiro de Favelas, segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas):
Belém, com 51,9% da população em favelas e ocupações irregulares.
Salvador, com 26,1%.
Grande São Luiz, com 24,5e%.
Recife, com 23,2%
Baixada Santista, com 17,9%
Grande ABC, com 17,5%
Manaus, com 15,0%
Rio de Janeiro, com 14,4%
Grande Teresina, com 13,4%
É muito provável que essa informação exclusiva de CapitalSocial (os jornais da região publicaram números nacionais do IBGE sem qualquer preocupação com o posicionamento regional) cause choque no leitorado.
Vivemos num ambiente histórico de grandiosidade que a própria embalagem do conglomerado regional tratou de mitificar e mistificar. Grande ABC uma ova. Somos mesmo a Província do Grande ABC.
Razões históricas
Por que atingimos níveis tão elevados de favelas e ocupações irregulares em relação ao total da população? Porque ao longo de décadas, a partir de uma industrialização sem planejamento e de ocupações sem o mínimo de cuidados, apenas assistimos ao desenrolar dos fatos.
Mais que isso: não faltaram administradores públicos que lubrificaram as engrenagens de ocupações irregulares com os olhos postos nas próximas eleições, fornecendo aos novos moradores toda série de clientelismo imediatista, sem compromisso algum com o longo prazo. A indústria clandestina de ocupações fez alguns grupos milionários e milhares de deserdados moradores permanentes, com todo o tipo de demanda aos organismos públicos.
Que tínhamos forte passivo social na área habitacional ninguém poderia ignorar. Até porque, não ficaríamos imunes ao acelerado processo de migração do campo para as cidades, que se deu a partir da metade do século passado em proporções jamais vistas no mundo. Superamos todas as expectativas. Seria mesmo impossível equacionar tamanha sobrecarga de investimentos públicos em infraestrutura física e social.
O problema é que ultrapassamos todos os limites. O sexto lugar nacional é um chute na canela do triunfalismo vadio que alguns trombeteiros irresponsáveis esparramam por páginas de jornais insensíveis.
Cadê os representantes (representantes?) do mercado imobiliário da Província do Grande ABC que jamais propuseram qualquer tipo de intervenção associada aos administradores públicos para sensibilizar autoridades estaduais e federais à aplicação de recursos orçamentários que tratassem a questão com um mínimo de responsabilidade com as novas gerações?
Duas cidades livres
Na geografia da Província do Grande ABC, apenas São Caetano e Rio Grande da Serra estão livres dessas ocupações ordinárias. São Caetano por motivos óbvios. Rio Grande da Serra, principalmente, porque fica no fim do mundo. Sei que alguns vão contestar essa adjetivação, mas, em sã consciência, não há como acreditar que com tantas opções espaciais a ocupações irregulares os excluídos sociais escolham a distante Rio Grande da Serra.
A participação relativa da população favelada e de ocupações irregulares na Província do Grande ABC é três vezes superior à média nacional, de 6%. Diadema ocupa a última posição regional, com 22,8% da população inserida nessas áreas. Mauá vem em seguida com 20,2% e São Bernardo um pouco abaixo com 20%. Santo André tem números mais discretos (11,2%) mas mesmo assim acima dos expostos no Rio de Janeiro. Ribeirão Pires, vizinha de Rio Grande da Serra, conta com apenas 2,8% da população em favelas e ocupações irregulares.
Fosse o Clube dos Prefeitos, apesar dos esforços individuais do presidente de plantão, uma entidade focada em pontos nevrálgicos da Província do Grande ABC, e estando como está na estrada da suposta regionalidade há duas décadas, muitos resultados já poderiam ter sido alcançados.
Quem se mobilizará para retirar a Província do Grande ABC desse horroroso ranking nacional? Não acredito em absolutamente nada. A cidadania regional rarefeita ao longo dos tempos há muito está morta. Só falta ser enterrada.
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21/01/2025 PAULINHO, PAULINHO, ESQUEÇA ESSE LIVRO!