Economia

E está de volta a embromação do
Polo Tecnológico em Santo André

DANIEL LIMA - 15/08/2013

Tenho urticária ao ouvir falar em Parque Tecnológico na Província do Grande ABC. Há sempre um cheiro de naftalina ordinária e oportunista no ar. Ainda mais quando acompanhado, venham só, conforme antecipa a Secretária de Desenvolvimento Econômico de Santo André, Oswana Fameli, da rediviva, folclórica e sempre duvidosa proposta de construção de um centro de convenções. Escrevi e editei tantas matérias ao longo dos anos sobre parques tecnológicos que já perdi a conta. Enquanto isso, outras localidades avançam cada vez com esses equipamentos concentradores de tecnologia e inovação.


 


Vou reproduzir no final deste texto uma reportagem publicada na edição de janeiro de 2006 da revista LivreMercado, assinada pelo jornalista Walter Venturini. Passaram-se quase oito anos e praticamente nada se alterou na região. Exceto novas decepções e novas camadas de descrédito que agora o PT de Santo André, impedidor da aprovação da iniciativa ainda recentemente, na Administração Aidan Ravin, lança-se à materialização regulamentar com empenho inusitado. Não se podem perder prazos às contrapartidas de incentivos financeiros do Estado.


 


Além de tudo o que gerou de frustração em quem imagina uma Província reagindo mesmo que espasmodicamente na área econômica, os parques tecnológicos são tratados como pó de pirlimpimpim pelos gestores públicos locais. Não é diferente o que se passa nesta semana em Santo André, onde um Legislativo mais que contraditório decidiu aprovar o projeto do prefeito Carlos Grana que habilita Santo André a recorrer a recursos federais e estaduais.


 


Quer o PT de Carlos Grana dourar a pílula de uma política desenvolvimentista que não passa de fraude. Conta para tanto sempre e sempre com uma secretária, Oswana Fameli, que ficaria bem melhor na área de Educação, da qual jamais arredou pé até que a Acisa (Associação Comercial e Industrial de Santo André) a colocasse como uma das moedas de troca para apoiar o petista na campanha eleitoral do ano passado. O PT de Carlos Grana não honra a trajetória do PT de Celso Daniel quando se coloca desenvolvimento econômico como referência -- apesar de condições técnico-políticas e orçamentárias muito acima do sonho. 


 


Inscrição automática


 


Não preciso esperar para dizer aos leitores que a proposta do Parque Tecnológico de Santo André, a supostamente ser implantada em no máximo dois anos, já está inscrita no Observatório de Promessas e Lorotas da Província do Grande ABC. Quando o assunto é compartilhado entre instâncias de poder, no caso a Administração Carlos Grana e a Administração Geraldo Alckmin, a distribuição de pontos relativos ao novo passivo é distribuída integralmente às duas partes. Vou colocar a proposta no âmbito de lorotas, o que equivale a 20 pontos de passivo para cada um dos dois administradores públicos.


 


O conceito do Parque Tecnológico de Santo André é um chute no traseiro da regionalidade tratada em cerimoniais de hipocrisia no Clube dos Prefeitos. Revela até que ponto o divisionismo dos gestores públicos locais está na razia da falta de novas embocaduras produtivas além do protegidíssimo setor automotivo e do agora não tão seguro Polo Petroquímico, pressionado pelo gás de xisto americano.


 


A individualização de uma proposta com cromossomos de regionalidade é uma mescla de descuido, despreparo improdutividade e egocentrismo administrativo. Independentemente dos pontos físicos em que se instalaria o polo tecnológico, a configuração coletiva de gestão a salvo de intempéries politicas e eleitorais deveria ser cláusula pétrea do projeto. A realidade econômica da região, de vasos comunicantes, de atividades que se entrecruzam porque a separação existe apenas na formalidade cartográfica, inventada em meados do século passado com as chamadas emancipações, isso tudo é inerentemente compulsória.


 


Respostas pragmáticas


 


Quando um ou outro leitor se manifesta dedo em riste para condenar o ceticismo deste jornalista em relação aos prenúncios de que os novos administradores municipais não passam de replicantes da maioria dos antecessores na volúpia com que vomitam projetos e propostas, imediatamente envio como resposta algumas matérias publicadas ao longo dos tempos. Não preciso adensar uma linha sequer para que prevaleça o mutismo do interlocutor. 


 


A cultura sobre a regionalidade da Província em vários aspectos, obrigação de quem vive de produzir informação, não é necessariamente um atributo da maioria dos consumidores de jornalismo. Houve tempos em que me irritava com admoestações. Agora ajo diferente e de forma pragmática: os próprios propagandistas de obras que jamais saem do papel, quando chegam ao papel, praticam haraquiri. Polo Tecnológico, como verão os leitores nos links abaixo, é uma esculhambação total.


 


Esculhambação da qual o governo do Estado é o principal agente. Vive-se da grife seletiva da marca polo tecnológico enquanto os paulistas como um todo, e mesmo as regiões que mais se desenvolveram nas duas últimas décadas, estão muito aquém do crescimento médio anual da indústria de transformação no País.


 


Perdas paulistas


 


Vivemos um processo histórico de emagrecimento e de depauperamento ditado não só por políticas enviesadas do governo federal, prostituído por interesses regionais de guerras fiscais autofágicas, mas também por omissões escandalosas. Os governantes que se sucederam no Palácio dos Bandeirantes praticaram completo ou quase completo desprezo à importância da dinâmica econômica como centro catalizador e propagador de riquezas. Perdemos sistematicamente participação absoluta e relativa no bolo produtivo nacional e, no interior desses ataques, a Província do Grande ABC se destaca negativamente. Há fartos textos-documentos nesta revista digital sobre o assunto.


 


Agora com o suporte do governo federal, Carlos Grana tem a possibilidade de deixar de legado para Santo André, ao final de um ou dois mandatos, pelo menos as sementes de um polo tecnológico que sirva a alguma coisa de forma emblemática, de ressuscitamento da sede de crescimento econômico de um Município esquartejado pela desindustrialização. Só não pode como parece insinuar tornar a proposta porta-estandarte de uma política orgânica de suporte às atividades industriais, porque aí seria abusar da paciência. A Prefeitura de Santo André, como as demais da região, não tem a menor queda gerencial para oferecer medidas abrangentes que tornem o território regional uma arena atrativa aos gladiadores empresariais mais que desconfiados sobre a viabilidade do plano.


 


A segmentação do polo tecnológico de Santo André em duas alternativas físicas, a primeira na Avenida dos Estados e a segunda em Campo Grande, para lá de Paranapiacaba, é um convite ao desafio de conciliar interatividade, logística, praticidade e racionalidade – como se já não bastasse o caráter exclusivista num ambiente fadado à interação.


 


Desenho complicado


 


O desenho do projeto geral, que contempla inclusive incentivos fiscais, não pode subestimar a possibilidade de virar uma baita dor de cabeça. É impossível deixar de considerar que os supostos novos investimentos não poderão concorrer com empreendimentos já consolidados mas que não gozam de vantagens fiscais. Dar tratamento isonômico é a saída única, que pode ser interrompida ante a eventualidade de a renúncia orçamentária sofrer objeções previstas na Lei de Responsabilidade Fiscal.


 


A Administração Carlos Grana aprovou agora o que a campanha eleitoral de Carlos Grana impediu na gestão de Aidan Ravin no ano passado. O que parece um bom negócio político poderá ganhar a forma de bumerangue se a cronologia de implantação do polo tecnológico recusar-se a seguir o ritmo da próxima eleição. Porque é isso que interessa à classe política. O resto é figuração.


 


Voltaremos ao assunto porque pululam exemplos de polos tecnológicos que nos passaram a perna desde que começaram a propagar as vantagens do programa. Estamos rigorosamente fora dos radares dessa que deve ser observada como uma das peças do xadrez de dinamismo econômico, não o tabuleiro de xadrez como tentam nos vender. A inútil (regionalmente) Universidade Federal do Grande ABC, deveria ser o ponto nuclear de qualquer movimento que pretendesse reconfigurar e fortalecer a economia regional, mas, como se sabe, foi concebida como incubadora romântica de cérebros a serviços do que se pretende vitrine à respeitabilidade verde e amarela no acadêmico internacional.  Tudo muito interessante se não estivesse fora de hora e de lugar.


 


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Pólo de Intenções (1)


 


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