Economia

Grande ABC econômico é
diferente de outros blocos

DANIEL LIMA - 04/06/2004

Deixemos para a semana que vem a análise que me leva a apontar o governo do Estado, entre outros agentes públicos e privados, como responsável pelo enfraquecimento da indústria paulista no confronto com outros Estados. Desdobro a análise da pesquisa inédita que produzi na edição de ontem sobre dois aspectos importantes que envolvem o G-7 regional (Grande ABC), o G-3 paulistano (São Paulo, Osasco e Guarulhos) e o G-3 interiorano (São José dos Campos, Campinas e Sorocaba), que representam parte significativa dos municípios mais industrializados do Estado.


 


Conforme mostramos ontem, no período de 60 meses entre dezembro de 1998 e dezembro de 2003 esses 13 municípios perderam 21.336 unidades industriais no Estado, de um total de 34.786. Ou seja: o restante do Estado de São Paulo viu desaparecerem 13.451 indústrias de variados tamanhos, conforme dados do Ministério da Fazenda. Mais especificamente do CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica).


 


Alertamos ontem, mesmo sem os números que repassaremos hoje, que a realidade prática do setor industrial dos três universos pesquisados era diferente. O Grande ABC apresentou ao longo desses 60 meses performance própria que conflitava com São Paulo, Guarulhos e Osasco que, por sua vez, também se diferenciavam do trio interiorano, composto por Campinas, Sorocaba e São José dos Campos.


 


Quando se observam esses mesmos municípios sob dois outros vetores -- de desempenho do emprego industrial formal e de geração de riqueza em forma de Valor Adicionado, sempre no mesmo período pesquisado -- os matizes se caracterizam por especificidades. O que parece desindustrialização generalizada é apenas algo parcial a determinados territórios. Desindustrialização é um fenômeno que se configura muito além do número de empresas do setor. Já construí arrazoado sobre o assunto. O espaço disponível não comportaria manobras mais aprofundadas.


 


Perdas completas


 


Embora tenha perdido proporcionalmente menos unidades industriais que parte dos municípios dos dois blocos pesquisados (17,54%, contra 24,45% de São Paulo, 8% de Guarulhos, 15,44% de Osasco, 18,76% de Campinas, 7,56% de São José dos Campos e 19,42% de Sorocaba), o Grande ABC perde feio na geração de empregos na indústria de transformação nos 60 meses e também no Valor Adicionado.


 


Conjuntamente, o Grande ABC perdeu, segundo dados do Ministério do Trabalho, 7.212 empregos no setor entre dezembro de 1998 e dezembro de 2003. Enquanto isso, São Paulo, Guarulhos e Osasco, também conjuntamente, tiveram a destruição de 4.116 carteiras de trabalho. Já o trio formado por Campinas, Sorocaba e São José dos Campos comemorou a geração de 11.185 empregos formais.


 


Em termos de Valor Adicionado (diferença da transformação de matéria-prima em produto acabado), diante de inflação de 98,51% (IGPM) no período pesquisado, o conjunto dos municípios do Grande ABC apresentou avanço nominal de 38,52%, contra 55% da Capital e de suas duas principais vizinhas industriais e 62,70% do trio interiorano. Isso mesmo: crescemos nominalmente quase a metade de Campinas, Sorocaba e São José dos Campos juntos, e 24 pontos percentuais abaixo de São Paulo, Guarulhos e Osasco.


 


Quando cruzado com os dados publicados ontem, de quebra de unidades industriais nesse Grupo dos 13 municípios expressivamente fortes na economia paulista, o somatório dessas informações é francamente desinteressante às cores pouco alegres do Grande ABC. Fosse uma competição em que se computassem pontos negativos e positivos, estaríamos fatalmente na lanterninha. Afinal, perdemos unidades industriais, empregos formais e Valor Adicionado, enquanto o G-3 paulistano sofreu os mesmos reveses mas num plano menos intenso e o G-3 interiorano driblou a quebra de unidades empresariais com mais empregos formais.


 


Invasão nos pequenos


 


Embora se fixem diferenças entre os três blocos analisados e mesmo entre municípios desses mesmos blocos, uma constatação irrevogável transparece quando, também, se verifica que o restante do Estado de São Paulo contabilizou nos 60 meses pesquisados saldo de 117.949 empregos industriais formais de um total de 601.545 em todo o território nacional. A interiorização industrial dos paulistas e, mais que isso, a invasão de pequenos e médios municípios que oferecem qualidade de vida são acolchoados que minimizam a queda da participação relativa do setor produtivo paulista quando confrontado com os indicadores nacionais. A migração é latente.


 


Poderia avançar análises em direção a outros faróis de milha que iluminariam ainda mais eventuais debates, acrescentando, por exemplo, o desempenho desses 13 municípios (e dos três blocos em que os acondicionei) no quesito Potencial de Consumo, especialidade da Target Marketing e Pesquisas. Entretanto, acredito que seja desnecessário. Esse novo desenho temporal de estatísticas e análises que envolvem quatro anos do governo Fernando Henrique Cardoso e o primeiro ano do mandato de Lula da Silva confirma evoluções anteriores de períodos mais longos. O consolo que o Grande ABC poderia ter de ter perdido unidades industriais em proporção menor que a Capital, por exemplo, não ganha fôlego porque não passamos pelas sabatinas de empregos formais e de Valor Adicionado.


 


Confesso surpresa ao destrinchar esses dados porque pelo menos no critério de quantidade de unidades fabris esperava que o Grande ABC mantivesse tendência de elevar o universo, com a multiplicação de pequenos negócios de subsistência como se deu nos primeiros tempos pós-abertura econômica, quando os desempregados industriais se lançaram em empreitadas modestas, muitas de fundo de quintal. Se nem isso mais está-se sedimentando, como mostram os 1.665 empreendimentos que abalaram o saldo de unidades da região, é sinal que chegamos à exaustão no setor.  


 


Os números oficiais do Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica acabam também com a demagogia de alguns agentes públicos que desfilam estatísticas irreais do empreendedorismo. Utilizam para tanto, sem o menor pudor, banco de dados superados pela atualização que, por força do cipoal de responsabilidades tributárias, o Ministério da Fazenda mantém em permanente conexão com a realidade formal. A informalidade, como se sabe, não está sob o controle do Estado e, sobretudo na área industrial, é residual.


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