Economia

Banco regional
vai a debate

MALU MARCOCCIA - 05/09/2000

A proposta de a região erguer seu próprio banco de fomento, lançada através de LivreMercado pelo economista Paul Singer, abriu um arco de entusiasmo no Grande ABC. Entre opiniões unânimes de que essa espécie de BNDES regional (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico Social) seria motor potente por trás da decolagem da região, o Uni-A (Centro Universitário de Santo André) decidiu arregaçar as mangas e agendou debate sobre o tema para dia 11 deste mês. O diretor de Cursos da instituição, Jaime Guedes, é uma das lideranças regionais animadas: "Vamos agilizar as discussões para, caso seja viável partir da teoria à prática e sair do encontro já com um grupo de trabalho" -- afirma o diretor.


 


O próprio Paul Singer já está convidado para a mesa de debates. Professor da disciplina Moedas e Bancos na USP (Universidade de São Paulo), Singer colocou como modelo inicial de formatação um banco regional lastreado por arrecadação nos sete municípios. Isso garantiria sustentação financeira e autonomia em relação a linhas públicas de crédito estaduais e federais, além de uma gestão compartilhada  -- Poder Público, empresários e sindicatos trabalhistas -- definir o que seriam prioridades.


 


Para animar as discussões também estão programados nomes como do sindicalista Luiz Marinho, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e antigo  defensor da idéia de o Grande ABC ser melhor contemplado por União e Estado pela massa de impostos que arrecada, e Dario Fini, secretário de Finanças de São Bernardo, Município que mais recolhe ICMS em São Paulo após a Capital. Jeroen Klink, especialista em causas regionais, Fábio Vidal, presidente do Fórum da Cidadania, e João Avamileno, prefeito em exercício de Santo André, também são presenças aguardadas.


 


Pessoalmente, Jaime Guedes entende que, se for impraticável estruturar um banco fisicamente, a região poderia pelo menos trabalhar formas de se conveniar com instituição financeira já existente e conquistar carteira exclusiva de crédito. Algo como Carteira Grande ABC semelhante aos portfólios segmentados dos bancos, que têm gerentes e contas específicas para atender grandes clientes, fundos de pensão, exportadores, pequena e média empresa, pessoas físicas de maior poder de investimento, entre outros. "Podemos abrir um convênio com a Caixa Econômica Federal específico para o Grande ABC a partir do que arrecadamos de FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço)" -- exemplifica o diretor do Uni-A, que também vai mobilizar para as discussões no auditório da escola quartanistas do curso de Administração e os professores Luís Carlos Berbel (Economia Brasileira), Karl Schumaker (Macro e Microeconomia), Valdec Castelo Branco (Economia) e Carlos Bernardi, especialista em Finanças. O debate é aberto, mas as inscrições devem ser antecipadas pelo 449-8899, ramal 211.


 


URDES


 


A proposta de criação do BNDES regional é vista por agentes locais como forma de driblar a grande teia de alto custo, burocracia e discriminação a projetos que prevalece no Brasil, inclusive em instituições públicas. Oswaldo Fernandes, mantenedor do Centro Educacional Paineira, de Santo André, sugere inclusive utilização da nomenclatura URDES (União Regional de Desenvolvimento Econômico e Social) em lugar de BNDES. "O nome está desgastado e desacreditado politicamente como instrumento governamental. Não seria de bom alvitre mantermos essa sigla para promoção da região" -- acredita.


 


Fraturar a hegemonia das grandes redes bancárias e estatais também seria vantagem competitiva de um banco regional, na avaliação do empresário César Garbus, diretor da Starseg e titular em São Bernardo do Ciesp (Centro das Indústrias do Estado). "Um BNDES regional sem os vícios do estatismo improdutivo seria possível, primeiro, pela participação no seu comando de representantes das classes empresarial, trabalhadora e do Poder Público. Segundo, pelo fato de que o referido órgão teria atuação específica regional e, portanto, muito mais fácil de ser acompanhado e cobrado de perto" -- expõe.


 


A gestão tripartite prefeituras-empresários-trabalhadores é pré-requisito também defendido por André Luís de Souza, diretor de Marketing e Vendas da Aparecido Viana Imóveis, de São Caetano, e Carlos Augusto César Cafu, diretor do Sindicato dos Químicos do ABC e ex-comandante do Fórum da Cidadania. "A participação conjunta daria a força política necessária à implantação de uma instituição pública com objetivos claros e bem definidos. É preciso romper com a tradição do Estado brasileiro de criação de estruturas burocráticas com objetivos insólitos e obscuros" -- declara Cafu. André Luís emenda: "Massa crítica temos o bastante. Mas pode se tornar nebulosa se interesses individualistas setoriais sentirem-se ameaçados em seus espaços" -- adverte, convidando à arregimentação.


 


É para jogar corporativismos e estrelismos para escanteio que o consultor Wilson Rosa, de Santo André, propõe formação de comando técnico-operacional para o almejado BNDES regional. Uma administração suprapartidária em termos políticos teria o campo do olhar estendido para o que chama de prioridades das prioridades do Grande ABC. "Precisamos encontrar a identidade regional através de um plano diretor que trace prioridades de cada cidade cotejadas entre si. A diversidade e a quantidade de problemas são tão grandes quanto a escassez de recursos regionais, causada de um lado pela política econômica federal e, de outro, pelo descaso no trato da coisa pública pelos políticos locais" -- espeta.


 


Wilson Rosa é cáustico quanto ao perigo de o banco público de fomento da região cair num estatismo improdutivo: "Sem uma gestão técnica e suprapartidária, teremos mais um banco público administrativamente ineficiente, em estado quase falimentar, um cabide de empregos e em benefício de projetos personalistas. Enfim, um cemitério da arrecadação municipal".


 


O empresário Reinaldo Malandrin, da Cor & Sabor de São Caetano e dirigente do Sehal (Sindicato das Empresas de Hotelaria e Alimentação do Grande ABC), prefere dar um voto de confiança às lideranças regionais: "Acredito que começaram a amadurecer para suas responsabilidades para com o futuro. É cada vez maior o número de pessoas conscientes da importância de viver em uma sociedade menos desigual" -- acredita. Para Malandrin, um organismo financiador exclusivo teria como grande vantagem o foco dirigido: "Com isso, podemos acelerar a velocidade da correção dos rumos de nossas cidades" -- afirma.


 


Para o sindicalista Luiz Marinho, o grande desafio é pressionar a União a conter o apetite fiscal e centralizador, a fim de deixar nos municípios, onde as pessoas efetivamente vivem e produzem, o fruto do que geram. São números de encher os olhos. Dados do Dieese (Departamento Intersindical de Estudos e Estatísticas Socioeconômicas) utilizados pelo presidente dos Metalúrgicos do ABC indicam que em 1996 os trabalhadores formais da região produziram R$ 490 milhões em FGTS e anualmente são gerados R$ 217 milhões em FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador). No mesmo 1996, o Grande ABC teria sido contemplado com apenas 159 imóveis custeados com R$ 3,1 milhões do SFH (Sistema Financeiro da Habitação), lastreado pelo FGTS, entre outros.


 


Também entusiasta do BNDES regional, o economista Jeroen Klink cita que esse modelo de organismo é comum na Europa para fomentar o planejamento e obras locais. O modelo preencheria espaço vago entre o BNDES propriamente dito, que financia megaprojetos, e o Banco do Povo, que ampara empreendimentos de microcréditos. Para sustentar a viabilidade de um organismo financiador dessa envergadura, Klink institucionalizaria inclusive a criação da Região Metropolitana do Grande ABC. Seria uma instância formal para dar vida jurídica e financeira à união pouco categórica das sete prefeituras no âmbito da Câmara Regional e do Consórcio Intermunicipal de Prefeitos.


 


Com ele concordam em gênero, número e grau os entrevistados. "A Região Metropolitana do Grande ABC supriria com vantagens a falta de representantes regionais no Legislativo estadual e federal" -- crê André Luís de Souza, da Aparecido Viana. "Com status de RM, seriam maiores as possibilidades de criarmos um banco de fomento exclusivo" -- acrescenta César Garbus, do Ciesp. "A Região Metropolitana do ABC traria mais sinergia para contemplarmos as dificuldades regionais" -- aposta Oswaldo Fernandes, do Centro Educacional Paineira. "Seria mais um fator de valorização, união e orgulho para nós" -- defende Oswaldo Malandrin, da Cor & Sabor. Só discorda Carlos Augusto Cafú: "Na verdade, precisamos é de vontade política para viabilizar nossas propostas e termos uma gestão compartilhada com as regiões da Grande São Paulo e Baixada Santista" -- argumenta, equivocando-se que o ABC se isolaria se ganhasse autonomia.


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