Não é preciso mudar de ramo nem de nome. O Grande ABC pode continuar a ser uma celebridade industrial nos setores automotivo, petroquímico e moveleiro, suas estrelas mais reluzentes, se mudar - isto sim - seu padrão de competitividade. A palavra mágica para transformar o perfil industrial da região chama-se Parque Tecnológico, se tudo correr como imagina o governo do Estado, mentor da idéia. Aliás, não só o Grande ABC, mas o próprio Estado de São Paulo ganhará diferencial sedutor para atrair e segurar empresas diante da guerra fiscal com outros locais do País, interpreta o secretário de Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico, Emerson Kapaz.
"Vamos competir não com renúncia de impostos, mas com uma forte base tecnológica no Estado. É a terceira revolução industrial do mundo e vamos fazer nossa revolução tecnológica" -- falou um entusiasmado Emerson Kapaz em meados do mês passado em São Bernardo, para seleta platéia de políticos, prefeitos, empresários e membros da Câmara Regional do Grande ABC, que conheceram em primeira mão a mais nova arma para anabolizar o pólo produtivo da região. Pelo projeto, urna grande aliança tecnológica entre empresas, Poder Público e universidades ergueria no Grande ABC um centro de pesquisas e desenvolvimento de produtos de vanguarda. Isso tiraria a região da sombra de outros pólos tecnológicos do Pais e também do exterior, já que a maioria das multinacionais pratica políticas de P&D nas empresas-mãe. "É assustador um pólo industrial como o Grande ABC desenvolver as tecnologias de que precisa fora de seu território" -- assinalou o secretário.
O Parque Tecnológico tem como missão fazer com os cérebros o que a região já faz com as mãos: disponibilizar para as indústrias gente produtiva e treinável, como ocorre nos grandes centros de desenvolvimento e pesquisa do mundo. O secretário Emerson Kapaz quer unir o útil ao agradável: dar novo padrão de competição ao Grande ABC com empresas de ponta e absorver o contingente de desempregados com cultura industrial.
Nessa imensa área, algo inicialmente previsto entre 1,750 milhão e 2,5 milhões de metros quadrados, de 35 a 50 empresas instalariam seus laboratórios, as universidades entrariam com pesquisadores e mão-de-obra treinada ou cursos técnicos, enquanto os municípios garantiram espaço físico e toda infra-estrutura de acesso, logística de comunicação inclusive com fibra óptica, energia e determinados incentives fiscais, entre outros. O Estado será o órgão fomentador, trazendo braços dos cursos e pesquisas da Politécnica da USP (Universidade de São Paulo) e financiamentos ou apoios a fundo perdido através do BNDES, Banespa, Finep e CNPq, entre outros. Pequenas empresas, que serão incentivadas através de incubadoras e projetos cooperados de ensaios e protótipos, terão "injeção na veia", como disse Kapaz, no se referir aos fundos não reembolsáveis da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo).
Dúvidas
O Parque Tecnológico do Grande ABC já animou alguns, mas franziu a testa de outros. Empolgaram-se de pronto com a idéia a indústria química Solvay de Santo André, que ofereceu área de 11 mil hectares de sua planta, e a Prefeitura de Ribeirão Pires, que quer levá-lo para seu espaço protegido de mananciais com uma derivação temática para Parque de Tecnologia Ambiental, inclusive trazendo para a região um centro de pesquisas da estatal Cetesb. Também a Câmara Regional entusiasmou-se e já aposta em um primeiro inquilino: o polo de moldes que reivindica junto a Abimaq (Associação Brasileira da Indústria de Máquinas) para atender os complexos automotivo, químico e de transformação de plásticos e metais. As Prefeituras de São Bernardo, Santo André e Mauá dispuseram-se a ceder terrenos.
Mas houve interrogações, por exemplo, do prefeito Celso Daniel, de Santo André, quanto a verbas disponíveis nos apertados orçamentos municipais, e sua secretária de Educação, Selma Rocha, a respeito de priorizar formação de pessoas de alto potencial quando a região ainda se debate com analfabetos e requalificação de mão-de-obra desempregada ou simplesmente sem nenhuma habilitação. Fausto Cestari, diretor-titular do Ciesp Santo André, foi além nas dúvidas ao citar exemplos de referências tecnológicas da região que, por não estarem organizadas, "não têm onde se pendurar" — casos de centros acadêmicos como Instituto de Tecnologia Mauá e FEI (Faculdade de Engenharia Industrial). Também mencionou lutas regionais sem êxito em torno de modernização tecnológica, como a criação de um centro de estamparias na KarmannGhia, a vinda de uma franquia do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas) e o desenvolvimento de um carro totalmente brasileiro através de uma cooperação autopeças-montadoras.
Mais que pólo
De qualquer forma, todos reconhecem que a indústria está em crise porque o modelo contemporâneo de produção está em crise. Hoje a tecnologia comanda o jogo e o Grande ABC, na linha de tiro dos novos processos, precisa renovar-se para não perder a sintonia fina com a globalização. Pelo projeto, esse centro de excelência científico-tecnológico terá abrangência e organização superior aos pólos tecnológicos de Campinas, São Carlos e São José dos Campos, assim chamados porque o tripé empresa-universidade-Poder Público está disperso. São pólos, não parques, porque suas estruturas organizacionais são informais, ora porque as indústrias se implantaram em torno do centro de pesquisa, ora porque o centro de pesquisa não tem qualquer vinculo formal com as empresas nem projetos estimulados pelo governo. Isso sem falar no desinteresse de algumas Prefeituras ou na disputa entre os centros acadêmicos que tornou inviável no passado, implantar o parque em Jundiaí unindo por fibra óptica aqueles três pólos.
O grande teste será amarrar tudo isso na região. A existência do Consórcio Intermunicipal de Prefeitos, da Câmara Regional e do Fórum da Cidadania é, para Emerson Kapaz, meio caminho andado na convergência de interesses para que o Parque Tecnológico não seja um investimento mal sucedido. A outra metade depende do despertar das empresas e da comunidade acadêmica.
Pelo projeto, o parque teria centros de pesquisa e desenvolvimento de empresas puxadoras, ou seja, grandes organizações que instalariam seus próprios laboratórios, casos de automobilísticas, petroquímicas de primeira e segunda gerações; além de setores de ponta associados as comunicações, como informática, multimídia, desenvolvimento de softwares e redes. Depois haveria centros de apoio para modernização e capacitação tecnológica de empresas menores, como moveleiras, de plásticos, químicas, fundições, de embalagens e metalúrgicas, entre outros.
Neste 9 de março acontece a segunda reunião da Secretaria com agentes da Prefeitura e entidades de classe para dar formas finais ao projeto e agendar série de palestras junto aos maiores alvos: indústrias e universidades.
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