Economia

Pequeno negócio
reage em bloco

ANDRE MARCEL DE LIMA - 10/04/2002

O aprofundamento das dificuldades do comércio de rua gerou um fenômeno inusitado no universo terciário regional: o surgimento de associações comerciais de bairro que, diferentemente de entidades tradicionais e de capilaridade abrangente como Facesp (Federação das Associações Comerciais do Estado de São Paulo) e CDL (Câmara dos Dirigentes Lojistas), são tipicamente distritais e foram criadas para dar conta de demandas locais específicas.


 


Mais importante do que discutir eventuais sobreposições de atribuições entre as associações mais recentes e as tradicionais -- até porque muitas das novas entidades contam com suporte das mais antigas e pretendem atuar em complementaridade --, desponta o significado da mudança de mentalidade embutido nas iniciativas. Em vez de se preocupar em disputar clientes com comerciantes e prestadores de serviços da vizinhança, empreendedores de bairros como Santa Terezinha, Jardim e Parque das Nações, em Santo André; Rudge Ramos, em São Bernardo; e Serraria, em Diadema, resolveram deixar a competição de lado para unir esforços contra adversários muito mais perigosos: os grandes shoppings e redes varejistas que desembarcaram em massa no Grande ABC nos últimos anos, além da violência que assola os centros urbanos e o risco de evasão de consumidores para outras praças.


 


A Aesbc (Associação Empresarial de São Bernardo) foi criada há pouco mais de um ano para fortalecer as atividades comerciais do Rudge Ramos, cuja população de 44 mil habitantes é superior à da maior parte das cidades brasileiras. O fundador e presidente Gilberto Nastri conta que dois aspectos levaram os comerciantes a criar uma entidade para fortalecer a economia do bairro: a redução do poder de consumo da população e a necessidade de fidelizar os consumidores locais. "Muitas indústrias do Rudge Ramos e de São Bernardo enxugaram quadros, encerraram atividades ou se transferiram para outras regiões nos últimos anos. A redução dos empregos afeta negativamente o comércio" -- afirma Gilberto Nastri, que mora no bairro há 30 anos e há 23 dirige a Show Luz, empresa especializada em iluminação instalada na Avenida Dr. Rudge Ramos.  


 


"Além disso, é preciso estimular a comunidade a consumir no próprio bairro para que não haja deslocamento até São Paulo como aconteceu com São Caetano, cujo único shopping foi transformado em centro de escritórios por falta de demanda comercial" -- lembra o presidente da Aesbc. Gilberto Nastri afirma que o exemplo de São Caetano serve de alerta para Rudge Ramos porque a cidade vizinha guarda duas características comuns ao bairro: poder aquisitivo relativamente alto, consubstanciado na ausência de favelas e na relativa valorização imobiliária, além da proximidade com a Capital paulista, maior e mais sofisticado centro de consumo da América Latina, facilmente acessada pela Via Anchieta.


 


"A migração do consumo é um risco que precisamos eliminar com oferta de atrativos e um comércio à altura do nível de exigência da comunidade" -- destaca Gilberto, que expressa a grandiosidade do Rudge Ramos com números: o bairro tem 1,5 mil estabelecimentos comerciais, 290 indústrias, dois hospitais, 16 agências bancárias, duas universidades e três supermercados de bandeiras famosas (Pão de Açúcar, Coop e Barateiro).


 


Rede de vantagens


 


A primeira ação adotada para estimular o consumo em Rudge Ramos foi o lançamento de uma rede de vantagens recíprocas que envolve o público diretamente relacionado aos 150 associados da Aesbc, entre estabelecimentos comerciais, industriais, prestadores de serviços e profissionais liberais. Diretores, funcionários e familiares de empresas ligadas à Aesbc desfrutam de condições especiais ao adquirir produtos e serviços dos integrantes da associação. A Show Luz comandada por Gilberto Nastri, por exemplo, acena com desconto de 5% na compra de qualquer produto, até mesmo para pagamentos parcelados. "Há posto de gasolina que oferece lavagem grátis e médicos que não cobram por determinados exames. O importante é o conceito segundo o qual o associado sempre desfruta de vantagem em relação ao consumidor comum" -- explica.


 


Para desfrutar dos benefícios na rede associada basta apresentar o cartão personalizado da Aesbc ou qualquer documento que comprove tratar-se de funcionário ou parente de funcionário das empresas. Gilberto explica que os mais de 20 mil estudantes das universidades Metodista e Uniban também compõem o contingente de beneficiários potenciais na condição de alunos das associadas. Seria de se esperar que o ritmo das atividades das empresas associadas tivesse crescido aos saltos graças ao impulso da rede de vantagens, mas Gilberto Nastri não dispõe de percentual sobre o incremento do faturamento. "Sabemos de forma empírica que o movimento melhorou com base na apresentação de documentos de funcionários dos associados no balcão" -- explica.


 


A ausência de resultados concretos em se tratando de idéia vantajosa tanto para empresas como para usuários deve-se provavelmente a falhas de aplicação que a Aesbc pretende corrigir nos próximos meses. É preciso massificar o uso de cartões personalizados e de guias com a listagem dos estabelecimentos credenciados, instrumentos acessíveis por enquanto apenas aos diretores das empresas associadas.


 


Também é necessário investir mais em propaganda e divulgação, além de envolver os moradores de Rudge Ramos, e não apenas quem está direta ou indiretamente relacionado aos associados. São buracos que a Aesbc projeta preencher com lançamento de um boletim informativo, além de carteirinhas personalizadas específicas para moradores do bairro. O informativo mensal terá tiragem de 10 mil exemplares e será distribuído em residências e nas duas universidades, que serão trabalhadas ainda com propaganda em murais. "O informativo servirá para propagar as realizações da Aesbc e veicular cupons de desconto" -- comenta Gilberto Nastri.


 


Bolsa de empregos


 


Outra iniciativa programada é a bolsa de empregos. A Aesbc vai estimular moradores de Rudge Ramos a enviar currículos profissionais para a entidade. Os currículos formarão reserva de mão-de-obra local à qual as associadas recorrerão diante da necessidade de contratar. "A bolsa de empregos trará benefícios às empresas e à comunidade" -- acredita Gilberto Nastri. "O funcionário que trabalha perto de onde mora tem mais qualidade de vida, gasta menos tempo e dinheiro com transporte e essas vantagens são convertidas em mais disposição e produtividade no ambiente de trabalho. Sem falar que a desocupação é uma porta aberta para a marginalidade e a criminalidade, que afugenta consumidores" -- raciocina o presidente da Aesbc. A bolsa de empregos será inserida no site www.aesbc@aesbc.com.br.


 


Evitar a evasão do consumidor e atrair clientes de outras praças é a principal atribuição no escopo da Aesbc, mas não a única. A ampliação da representatividade dos empresários e profissionais liberais junto ao Poder Público é outro ponto alto destacado por Gilberto Nastri, que já participou de reuniões com lideranças da Prefeitura de São Bernardo para discutir assuntos relacionados ao trânsito e iluminação pública.


 


Aliás, não é apenas o Poder Público que está na mira da associação. Gilberto afirma que a união das 150 empresas e prestadores de serviços pode ser útil também em negociações com fornecedores de serviços financeiros, casos de bancos e administradoras de cartões de crédito. "Vamos pleitear descontos em serviços bancários, bem como reivindicar a redução do percentual cobrado pelas administradoras de cartões, que é muito alto" -- afirma.


 


A diretoria da Aesbc é formada por 31 voluntários que se reúnem quinzenalmente para definir os rumos da associação. "A diversidade é a marca da direção, formada por advogados, dentistas, médicos, comerciantes de vários segmentos e representantes do setor industrial" -- destaca Gilberto Nastri. Além das reuniões de diretoria, a associação promove encontros gerais a cada mês. Paga-se mensalidade de R$ 30 para fazer parte da Aesbc. "O valor cobre despesas operacionais como o aluguel da sede" -- explica o presidente.


 


Como o fortalecimento do comércio depende não apenas de vantagens explícitas mas também do nível de atendimento prestado aos consumidores, a Aesbc promoveu ciclo de palestras voltadas aos funcionários dos associados em outubro do ano passado. Foram seis apresentações sobre temas como direito do consumidor e como abrir cadastro para concessão de crédito.


 


Presidente da entidade comercial mais tradicional da cidade, a Acisbec (Associação Comercial e Industrial de São Bernardo), com dois mil filiados, Valter Moura não faz restrições ao surgimento da Aesbc. "Toda iniciativa que amplia a representatividade e fortalece a classe dos empreendedores é bem vinda" -- confia o dirigente, que também é vice-presidente da Facesp (Federação das Associações Comerciais). Valter Moura não vê na nova entidade concorrente ou adversária. "Pelo contrário. No futuro poderemos atuar em conjunto, aproveitar o que cada uma tem de melhor" -- considera. De acordo com a lógica da especialização citada por Valter Moura, é muito pouco provável, por exemplo, que qualquer nova associação se preocupe em desenvolver Serviço de Proteção ao Crédito nos moldes do oferecido há tempos pelas associações ligadas à Facesp. Seria como reinventar a roda num mundo repleto de novas demandas.


 


Shopping aberto


 


A  Abaja (Associação do Bairro Jardim) é outra entidade de bairro criada para dar conta de demandas específicas de empreendedores locais. Dos planos da associação, formada em setembro do ano passado e que conta com 55 adesões entre estabelecimentos comerciais e prestadores de serviços, figuram a criação de uma revista mensal com as opções gastronômicas do bairro e montagem de uma central de compras para ampliação das condições de negociação. Constam ainda da agenda coletiva interferências urbanísticas como padronização do calçamento, tratamento paisagístico, instalação de câmeras de tevê, instituição de zona azul e até instalação de um portal na Avenida D. Pedro II.


 


Em outras palavras, comerciantes e prestadores de serviços pretendem transformar o Bairro Jardim em verdadeiro shopping a céu aberto, com as facilidades de comodidade, segurança e estacionamento oferecidas pelos centros planejados de compras. "Já que as indústrias foram embora, precisamos segurar o comércio e os serviços aqui" -- argumenta Marco Debellis, presidente da Abaja e há 23 anos proprietário da Pizzaria San Marco, instalada na Rua das Bandeiras. Ele afirma contar com apoio da Acisa (Associação Comercial e Industrial de Santo André), do Sehal (Sindicato das Empresas de Hospedagem e Alimentação do Grande ABC) e da Coordenadoria de Fomento ao Comércio da Prefeitura de Santo André.


 


A idéia de criar a Abaja foi sugerida pelo ex-prefeito Celso Daniel em reunião com empreendedores do bairro durante a última campanha eleitoral. "Celso Daniel falava da importância de se montar vigilância ostensiva nos bairros e recomendava a criação de associações para participar da gestão do processo" -- recorda Marco Debellis. 


 


A segurança dos consumidores ocupa o topo na lista de prioridades dos associados. A associação quer negociar com o Poder Público a instalação de câmeras de monitoramento pelas ruas para inibir crimes e evitar que a violência comprometa a imagem do bairro mais charmoso de Santo André, que atrai público de todo o Grande ABC devido à vida noturna intensa. "A criminalidade cresceu sensivelmente nos últimos meses. Temos de evitar que o bairro se torne perigoso, senão os frequentadores desaparecem" -- raciocina o presidente Marco Debellis.


 


Além de estabelecimentos dos ramos alimentício e gastronômico como as pizzarias San Marco e Vero Verde e os restaurantes Questo Pasta, Baby Beef e Mazza, a Abaja representa empresas de vários outros setores. Integram a associação colégios como Stocco e Arbos, estabelecimentos médicos como Grupo Saúde ABC, Laboratório Oswaldo Cruz e Clínica Picarelli, além da Padaria Brasileira e Lavanderia 5 à Sec, entre outros. "O foco é geográfico, não setorial" -- afirma Marco Debellis.


 


A Abaja prioriza o quadrilátero formado pela ruas Catequese e Padre Vieira, Avenida Padre Anchieta e Alameda Francisco Alves. "Delimitamos uma região dentro do Bairro Jardim para poder controlar melhor" -- comenta Marco. Existem 180 estabelecimentos comerciais e de prestação de serviços no raio de atuação da Abaja, que se dará por satisfeita com adesão de 100. O estatuto da entidade está em fase de elaboração. "Depois que o documento estiver aprovado e registrado, partiremos para cobrança de mensalidades para cobrir despesas comuns e subsidiar projetos" -- afirma Marco Debellis.


 


Parque das Nações


 


No chamado segundo subdistrito de Santo André, empreendedores de um centro comercial com características totalmente diferentes do Bairro Jardim também se unem para vencer os desafios dos tempos modernos. A Acecopan (Associação Comercial dos Empreendedores do Parque das Nações) foi criada há dois anos para representar comerciantes e prestadores de serviços que adensam basicamente as ruas Suíça e Oratório, entre a Igreja do Bonfim e a agência da Caixa Econômica Federal.


 


"O éle formado pelos dois corredores reúne 298 estabelecimentos comerciais e de prestação de serviços, segundo cadastramento realizado pela associação" -- conta Ivan Travaini, presidente da Acecopan e proprietário da Fiomil, comércio de lãs, fios e artigos de papelaria instalado há 20 anos na Rua Oratório. O centro comercial do Parque das Nações tem como ponto forte o varejo popular voltado às comunidades próximas. A Rua Oratório é considerada porta de entrada do Grande ABC para a zona leste de São Paulo, sobretudo por causa da passagem dos trólebus que ligam Santo André e São Bernardo à São Mateus. Muitos consumidores vêm da região leste paulistana.


 


A implantação da zona azul em trechos da Rua Oratório e transversais é considerada a primeira grande vitória da Acecopan. "Reunimos mais de 300 assinaturas em abaixo-assinado e sensibilizamos a Prefeitura a implantar o estacionamento" -- comenta Ivan Travaini. O comerciante assegura que o movimento do comércio melhorou desde que a zona azul foi implantada porque comodidade ao estacionar é atributo fundamental para atender aos consumidores motorizados, que antes disputavam vagas com os próprios funcionários e proprietários dos estabelecimentos de comércio e serviços.


 


A rotatividade dos veículos já rende frutos. "Alguns comerciantes providenciaram reformas das fachadas porque os consumidores passaram a permanecer mais tempo diante das lojas" -- nota Ivan. A ampliação de vagas aos consumidores deveu-se também à liberação, para estacionamento, de recuos que eram de utilização exclusiva dos trólebus.


 


Comerciantes e prestadores de serviços do Parque das Nações têm agora outras duas reivindicações junto ao Poder Público: instalação de um cartório de notas e implantação de ônibus circular para o segundo subdistrito. "A falta de um cartório no bairro obriga ao descolamento até Santa Terezinha ou ao Centro de Santo André" -- afirma o presidente da Acecopan. A implantação de um coletivo circular que interligue os bairros do segundo subdistrito é considerada ainda mais urgente. Hoje quem quer se deslocar do Parque Jaçatuba ao Parque das Nações precisa tomar ônibus até o Centro de Santo André para depois voltar. A associação já encaminhou a reivindicação à Prefeitura.


 


A Acecopan surgiu das cinzas de outra entidade que representava o centro comercial do bairro, a Unicopan (União dos Comerciantes e Profissionais Liberais do Parque das Nações), criada em 1974. "A Unicopan desmantelou-se por falta de mobilização. Criamos então uma nova associação para começar de novo" -- explica Ivan Travaini. A associação envolve média de  40 comerciantes em reuniões gerais realizadas a cada dois meses.


 


Êxodo industrial


 


Como Gilberto Nastri da Aesbc (Associação Empresarial de São Bernardo), Ivan Travaini aponta a queda do poder aquisitivo regional como uma das principais motivações em busca do fortalecimento econômico do bairro. "O que afetou muito o comércio em geral foi o êxodo industrial" -- constata o comerciante, que vai mais longe na análise. "Quem pagava bons salários eram as indústrias que se foram. Representantes públicos estão querendo repor as perdas industriais a qualquer custo, atraindo grandes redes de varejo para a região. Ficam seduzidos pela idéia de criação de milhares de empregos, mas se esquecem dos outros milhares de postos de trabalhos ceifados nas pequenas lojas como consequência da competição muitas vezes desleal. Esse modelo deveria ser repensado com base na experiência européia. Em países da Europa os hipermercados são proibidos de se instalar no raio do pequeno comércio" -- observa o empreendedor.


 


Os estragos provocados pelas grandes redes são tema há muito alertado por LivreMercado, primeira publicação brasileira a apontar as agruras do pequeno varejo familiar no embate com gigantes nacionais e internacionais. Reportagem de Capa intitulada Quem Salva os Pequenos Negócios, na edição de fevereiro de 1998, já alertava para o problema. LivreMercado voltou a tratar do tema em outra Reportagem de Capa publicada em maio de 2000: Varejo Familiar Grita por Socorro. A matéria denunciava que seis mil estabelecimentos varejistas de pequeno porte desapareceram no Grande ABC nos últimos cinco anos. Como o passo dos gigantes só fez avançar nos últimos dois anos, é pouco provável que a situação tenha melhorado para os pequenos. 


 


Em recente entrevista ao jornal Folha de São Paulo, a Fecomércio (Federação do Comércio do Estado de São Paulo) alertou para o perigo socioeconômico representado pela atuação indiscriminada das grandes redes varejistas. "Cada emprego gerado por uma grande loja do Wal-Mart, Pão de Açúcar ou Carrefour acarreta o corte de uma vaga e meia nos pequenos estabelecimentos" -- afirma Manuel Ramos, vice-presidente da entidade, que representa principalmente pequenos e médios comerciantes.


 


A federação tem projetos de lei na Câmara Municipal de São Paulo e na Câmara dos Deputados para impor barreiras ao avanço das grandes redes. A proposta federal diz respeito à criação de lei que exija estudo prévio do impacto causado pela instalação de grandes lojas no pequeno comércio da vizinhança. Já o projeto estadual trata da montagem de conselhos para analisar empreendimentos comerciais com área superior a mil metros quadrados.


 


Reação articulada


 


A Associação dos Lojistas do Bairro Serraria, de Diadema, é outra iniciativa de resistência nestes tempos de competição exacerbada. A associação começou a se formar há dois anos para representar empreendedores das avenidas Rotary e Lico Maia e de ruas transversais. Reúne proprietários de mercados, açougues, padarias, floriculturas, farmácias, imobiliárias e dentistas, entre outros prestadores de serviços. "Com a crise, fomos obrigados a nos unir para trocar idéias em busca de soluções" -- sintetiza o vice-presidente Paulo Hagiwara, proprietário da Floricultura Flor de Liz, instalada há três anos na Avenida Rotary.


 


A crise apontada pelo comerciante diz respeito a vários aspectos regionais citados por Gilberto Nastri, de Rudge Ramos, e Ivan Travaini, do Parque das Nações, e incluem a chegada de redes médias e grandes em espaço anteriormente exclusivo do pequeno comércio familiar. "O Supermercado Joanin e a Drogaria São Paulo se instalaram no Serraria no ano passado" -- comenta Paulo Hagiwara.


 


A Associação do Bairro Serraria já realizou algumas promoções para vitaminar o comércio local. No Natal de 2001 sorteou aparelho de DVD, máquina de lavar, fogão e duas cestas natalinas entre consumidores de 45 lojas, que trocaram notas de compras por cupons. No Dia das Crianças cada loja sorteou três cestas de bala aos consumidores mirins, que coloriram desenhos retirados nos pontos-de-venda do bairro.


 


Além de tonificar o movimento nas lojas, a associação procura reduzir custos com ações conjuntas. Os tradicionais calendários oferecidos gratuitamente aos consumidores ao fim de cada ano foram produzidos em conjunto. "Antes cada loja encomendava pequena quantidade e o preço era alto. Nos últimos dois anos concentramos a demanda de vários estabelecimentos em um lote só. Ganhamos tanto financeiramente como em marketing, já que as folhinhas trazem o nome e o endereço de todos os participantes, multiplicando a exposição das lojas" -- acredita Paulo Hagiwara. "Trinta lojistas encomendaram oito mil folhinhas para 2002"  -- quantifica. A Associação do Bairro Serraria é apoiada pela Acid (Associação Comercial e Industrial de Diadema).


 


Representatividade ampliada


 


A mobilização de empreendedores de bairro também desperta políticos, interessados em aglutinar forças em favor dos locais que representam. Exemplo é a Associação Comercial do Jardim Cristiane, criada e articulada pelo vereador petista Raulino Lima, que mora no bairro há 30 anos. Raulino conta que motivou comerciantes locais a unirem-se em torno de uma entidade para que a representatividade da comunidade fosse ampliada junto ao Poder Público. Cita o recapeamento da Avenida Rangel Pestana -- a principal do Jardim Cristiane -- e o pequeno anel viário entre as ruas Juquiá e Javaés como frutos diretos da aliança dos comerciantes. "O apoio dos empreendedores foi fundamental" -- comenta o político, cuja associação é formada por açougues, padarias, lojas de automóveis, depósitos de material para construção e posto de gasolina.


 


A instalação de um posto policial é o próximo passo da Associação Comercial do Jardim Cristiane, cujos planos setoriais não se restringem à interlocução com o Poder Público. "Temos discutido a viabilidade de intensificar o movimento do comércio em datas comemorativas com promoções conjuntas. Sortear bicicletas entre os consumidores do bairro é uma das idéias" -- cita o vereador, que também quer aprovar estatuto e implantar contribuições mensais entre os associados para garantir a sustentabilidade da associação.


 


Fragmentação é caminho


 


O aprofundamento das dificuldades do pequeno comércio suscita manobras de reação, mas também pode gerar o efeito oposto de desestabilizar iniciativas associativistas. Exemplo disso é a Unisante (União dos Comerciantes do Bairro Santa Terezinha), uma das associações comerciais distritais mais antigas do Grande ABC, fundada há 20 anos no bairro do segundo subdistrito de Santo André. A Unisante enfrenta fase aguda de fragmentação institucional depois de muitos anos de êxito em ações conjuntas. Nem diretoria formalizada a associação possui, porque não conseguiu reunir quantidade suficiente de comerciantes interessados na reeleição.


 


"Não diria que a Unisante está em fase terminal porque existem alguns comerciantes tentando reestabelecimento, mas a associação de hoje não é nem sombra do que foi no passado" -- reconhece Roberto Sugano, proprietário da Ótica e Relojoaria Hanada e um dos comerciantes empenhados em reanimar a entidade, cuja representação oficial enlaça cerca de 150 comerciantes e prestadores de serviços da Avenida Viera de Carvalho e corredores transversais.


 


A fragilidade da Unisante pode ser medida pela diminuição da disposição em assegurar a sustentabilidade financeira. Se hoje a associação não cobra mensalidades e se vê engessada pela falta de recursos financeiros, há alguns anos os filiados se mobilizavam para promover grandes jantares com renda revertida para propagandas conjuntas e promoções. "Colocávamos mais de 300 convidados no restaurante Espeto de Prata" -- lembra Roberto Sugano.


 


A fragmentação institucional da Unisante é considerada reflexo direto das dificuldades enfrentadas pelo pequeno varejo nos últimos anos. "Como os comerciantes estão atolados em problemas, não conseguem dispor de tempo para pensar no coletivo" -- raciocina  Roberto Sugano. Com experiência de quem está há 23 anos à frente do balcão da ótica e relojoaria instalada na Avenida Vieira de Carvalho, Sugano afirma que sobreviver no comércio de rua nunca foi tão difícil. "Em mais de 20 anos de história nunca testemunhei situação tão complicada. Há alguns anos vendia 25 relógios por dia e hoje não vendo oito por semana" -- conta o empresário.


 


As perdas comerciais têm fartos exemplos no Bairro Santa Terezinha. Era raro no passado encontrar ponto comercial para alugar na Vieira de Carvalho devido à dinamicidade do comércio local. "Hoje, ocorre o contrário. Um vizinho instalado em área nobre, entre as agências bancárias, tenta passar o ponto há três anos e não consegue" -- relata o presidente da Unisante, que não disfarça frustração com o setor varejista: a ótica e relojoaria que criou em fins da década de 70 agregou clínica dentária e clínica de olhos nos últimos anos sob comando dos filhos recém-formados. "Estamos partindo para outras áreas porque no comércio varejista não acredito mais" -- desabafa Roberto Sugano, que se considera afortunado por ter prédio próprio e não precisar custear aluguel.


 


O principal motivo apontado pelo empresário para o arrefecimento comercial de Santa Terezinha é a chegada de grandes shoppings e supermercados a Santo André nos últimos anos. "Os grandes shoppings deixaram o comércio de rua meio ultrapassado" -- comenta o comerciante de 59 anos. Além do assédio dos centros planejados de compras e das redes supermercadistas junto ao consumidor, ele cita a proliferação de concorrentes na informalidade de fundos de quintal e o desemprego como explicações para a perda de força do comércio do bairro.


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