Economia

Afinal, para onde
estão nos levando?

MALU MARCOCCIA - 05/03/2004

Cenário praticamente padrão nos grandes encontros da Câmara Regional, geralmente com o governador do Estado ou algum ministro convocado por Brasília: apertos de mão, tapinhas nas costas, Sua Excelência para lá, companheiro prefeito para cá, sorrisos simpáticos e, pronto, a liberação de algumas dezenas de reais para o Grande ABC ou o velho truque de elogiar e apoiar as reivindicações, que devem, porém, ser melhor avaliadas e adequadas ao sempre deficitário caixa governamental. Políticos, técnicos e agentes sociais terminam o encontro com abraços e beijos e a sensação do dever cumprido.


 


Outra vez a história se repetiu em fevereiro último, e em dose dupla: na visita da ministra Dilma Rousseff ao Pólo Petroquímico de Capuava e em mais um encontro da Câmara Regional com o governador Geraldo Alckmin para renovar a pilha de compromissos sob a qual as instituições locais estão enterradas e que caminham em ritmo de marcha-lenta para a velocidade de trem-bala que os problemas do Grande ABC exigem.


 


O governador liberou R$ 25,2 milhões para construção de 920 unidades habitacionais entre São Bernardo, Santo André, Mauá e Diadema -- um pingo diante do déficit de 100 mil moradias na região --, além de R$ 9,5 milhões para os dois hospitais estaduais de Serraria e Mario Covas, que operam a meia carga desde que foram inaugurados. De resto, assinou outros 22 acordos de intenção, a maioria assuntos reeditados de termos anteriores porque não foram atendidos. Pelo balanço da Câmara Regional, desde que foi criada, em 1997, foram assinadas 55 intenções de cooperação e 22 se concretizaram.


 


A grande questão é que, na torcida para que o motor do Grande ABC pegue logo, a Câmara Regional tem se movido mais por vontade política e menos por ações concretas que diminuam a ebulição das várias panelas queimando no fogo da região. Assuntos pontuais -- como políticas contra desigualdade social, de gênero e raça que trouxeram a ministra Matilde Ribeiro para o encontro -- acabam fazendo sombra a pautas emergenciais como o trecho sul do Rodoanel , que mais uma vez ficou na promessa de solução.


 


Pelo projeto original, 2004 seria o ano de entrega do ramo sul, depois adiado para 2007 e agora sem data em vista. O secretário estadual dos Transportes, Dario Rais Lopes, anunciou desta vez que vai priorizar os 16 quilômetros que ligam a Jacu-Pêssego na Capital com a Papa João XXIII em Mauá e sua interligação com a Anchieta-Imigrantes -- na verdade um antigo projeto da região como rota alternativa para unir o Aeroporto de Cumbica ao Porto de Santos.


 


O restante dos 53,7 quilômetros previstos para o ramo sul do Rodoanel continua um ponto de interrogação no horizonte que ligaria o Grande ABC à Regis Bittencourt, junto ao trecho oeste já concluído e pelo qual a região acessaria grande parte do Interior paulista. Falta de dinheiro continua sendo a montanha no caminho. A União liberou apenas R$ 20 milhões em 2003 e reservou somente R$ 17,7 milhões em 2004, nem 1% dos R$ 1,9 bilhão orçados para a obra. O Estado garante que está prevendo R$ 768 milhões para o Rodoanel Sul no PPA (Plano Plurianual), que traça a perspectiva de obras e investimentos até 2007. Em 2004 estariam reservados R$ 50 milhões do Estado para desapropriações e começo da obra. Dario Lopes se declara ainda esperançoso de autorizar este ano as licitações e faz figa para a adesão financeira dos municípios, que já bateram em retirada alegando a situação-limite dos cofres com os enquadramentos da Lei de Responsabilidade Fiscal.


 


O próprio traçado encurtado do Rodoanel Sul está ameaçado pela inviabilidade da Jacu-Pêssego, já que no orçamento da União foram aprovados apenas R$ 10,9 milhões dos R$ 200 milhões pleiteados para seu prolongamento pela Capital, ABC e Guarulhos. O custo total desse viário é de R$ 356 milhões e interessa sobretudo pelo impulso que dará aos planos de reindustrialização da zona leste da Capital.  Por enquanto, a Prefeitura de São Paulo investe R$ 40 milhões no 1,8 quilômetro de prolongamento norte da Jacu-Pêssego já existente com a Rodovia Ayrton Senna. Os 8,6 quilômetros em direção a Mauá e à saída sul do Rodoanel são outra incógnita, já que precisam de R$ 70 milhões em investimentos.


 


Outra obra logística essencial ao Grande ABC, o Ferroanel foi contemplado pelo governo do Estado com R$ 6,7 milhões para adequação ao Rodoanel Sul, já que os traçados correrão paralelos. Também esse projeto, porém, encontrou má-vontade de Brasília, que disponibiliza no orçamento de 2004 somente R$ 8,75 milhões,  frente a uma demanda regional de R$ 80 milhões. A chamada bancada do ABC, aliás, mais uma vez não conseguiu levar o eco das tensões do Grande ABC até Brasília.


 


As emendas individuais dos quatro deputados federais para este ano vão render à região apenas R$ 6,9 milhões do orçamento da União aprovado pelo Congresso. O valor tem como destino basicamente as áreas de saúde e educação. Em 2003 o Grande ABC, que responde por 9% do PIB do Estado e 2,3% do Brasil, conseguiu emplacar apenas R$ 4,4 milhões no Congresso Nacional e mesmo assim, até janeiro deste ano, só viu a cor de um terço desse dinheiro.


 


Metas e metas


 


É por isso que reuniões com ministros, governador e secretários de Estado têm se transformado cada vez mais em encontros para amontoar diagnósticos e metas, sem que o horizonte de incertezas se desfaça. Vários indicadores vão em direção contrária ao otimismo das cerimônias da Câmara Regional, do Consórcio de Prefeitos e mesmo da até agora mais ativa Agência de Desenvolvimento Econômico. O  desemprego no Grande ABC patina em preocupantes 20,3% da População Econômica Ativa, conforme índice de 2003 apurado pelo Dieese.


 


Programas isolados de combate à violência não resistem à matemática inflexível dos números e o Grande ABC continua tombando frente às ocorrências de criminalidade. Dados do IEME (Instituto de Estudos Metropolitanos) indicam que a região ocupa os últimos lugares no ranking de segurança pública dos 55 municípios mais importantes do Estado. São Bernardo está na 51ª pior posição,  Santo André na 52ª e Diadema na 53ª. Até a festejada primeiromundista São Caetano desceu no ano passado do 10º para o 14º posto, conforme levantamentos que tomam como base a Secretaria de Segurança Pública do Estado e levam em conta três conjuntos de ocorrências: homicídios dolosos, roubos e furtos de veículos, além de roubos e furtos diversos.


 


Em São Caetano, os roubos e furtos diversos subiram de 2,6 mil ocorrências em 2000 para 3,4 mil no ano passado. Em São Bernardo ainda são assassinadas 250 pessoas em média por ano, e em Santo André mais de 10 mil motoristas continuam sendo vítimas todos os anos de bandidos.  Sem falar que a situação carcerária da região é pavorosa. Cadeias superlotadas e palcos de fugas quase diárias põem em risco a vida de policiais e da população. Mauá e São Caetano estão há tempos com cadeias interditadas, São Bernardo simplesmente não tem cadeia e Diadema só está transferindo seus presos para outras cidades da Grande São Paulo por ordem expressa da Justiça, após o colapso total denunciado pelo delegado João Alves Almeida. Ele foi afastado do cargo porque teve coragem de denunciar a omissão do Estado.


 


Os prometidos CDPs (Centros de Detenção Provisória) se arrastam em obras e em pendências sobre localização, uma ironia que também afeta as unidades da Febem. O ABC esbravejou tanto contra o depósito de menores em que se transformou a entidade, pôs na pauta da Câmara a necessidade de serem erguidas unidades mais compactas e serem editados programas socioeducativos para infratores com liberdade assistida, conseguiu o OK do Estado para construção de três unidades, mas as contempladas São Bernardo, Santo André e Diadema simplesmente não disponibilizam terrenos para as construções.


 


Esse pode ser tomado como exemplo clássico da falta de planejamento e de foco numa pauta seletiva de soluções para a região. O que se vê é uma sequência de propostas fragmentadas e desarticuladas, que reduzem o poder de fogo de temas realmente prementes. As 920 moradias autorizadas pelo governador para quatro cidades do ABC são modestíssimas diante da periferização crescente de uma região com 2,3 milhões de moradores e déficit calculado em 100 mil habitações.


 


Campinas sozinha, com um milhão de moradores, tem 1.320 construções em andamento este ano pela CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional Urbano). Ribeirão Preto, outra importante cidade paulista, está sendo contemplada com 1.339 unidades. No total do Estado, a CDHU anuncia 55.306 moradias em obras em 2004.


 


A verdade é que a vida pouco mudou com as instâncias regionais que deveriam conduzir o Grande ABC a novas altitudes. Consórcio de Prefeitos, Fórum da Cidadania, Câmara Regional e Agência de Desenvolvimento têm falhado no papel de sacudir a debilitada economia regional, expressa sem dó na queda perpendicular das receitas com ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), cada vez mais magras com a desindustrialização que marcou a fogo o território regional.


 


No mapeamento do Instituto de Estudos Metropolitanos, nos últimos oito anos entre janeiro de 1996 e dezembro de 2003, o repasse do ICMS ao Grande ABC cresceu apenas 48,8% diante de uma inflação IGP-M de 129% no período. Isso significa que os R$ 465,6 milhões que os sete municípios receberam de ICMS em 1995 deveriam representar R$ 1,066 bilhão em 2003. Entretanto, vieram R$ 359 milhões a menos por conta da fuga de empresas e da reestruturação produtiva exigida pelo furacão globalizante. O Índice de Potencial de Consumo da região nos últimos sete anos até 2002 desabou 25,5%, o que fez o Grande ABC descer do terceiro para o quarto lugar no País, segundo estudos da Target Marketing e Pesquisas.


 


O Grande ABC precisa, portanto, de ofensivas fulminantes contra os problemas econômicos -- o que resolveria grande parte das chagas sociais que pautam as instâncias regionais -- em vez de ver seus políticos baterem continência e dizerem-se satisfeitos e agradecidos com o que o Palácio dos Bandeirantes e da Alvorada têm feito até agora.


 


Tanto José de Filippi Júnior, que se despediu da presidência da Câmara Regional, quanto Maria Inês Soares, a nova comandante da entidade neste ano, engasgaram-se em elogios às autoridades no encontro do mês passado, em que Geraldo Alckmin se fez acompanhar de oito secretários de Estado e Brasília mandou para cá seus ministros extraordinários Nilmário Miranda e Matilde Ribeiro, respectivamente dos Direitos Humanos e de Promoção da Igualdade Racial.


 


Também marcou presença um volumoso séquito de deputados da região e de secretários municipais que, no dia anterior, igualmente trocaram declarações de amor com uma ministra Dilma Rousseff contida na aprovação dos planos de ampliação do Pólo de Capuava. Driblando o entusiasmo da maioria dos prefeitos, deputados e sindicalistas unânimes em enxergar aceso o sinal verde da Petrobras à demanda por gás da Petroquímica União,  Dilma preferiu dizer que gostou do que viu e ouviu, mas precisa submeter o projeto à serenidade de uma solução técnica -- que, afinal, é para onde se encaminha essa antiga demanda da empresa transformada em palanque político.


 


Nem mesmo Luiz Tortorello, novo vice-presidente da Câmara Regional,  prefeito de São Caetano e um expoente em se tratando de vaidade política, suportou tantos afagos em governos que fazem vistas grossas ao Grande ABC. Deixou a mesa no início da fala de Geraldo Alckmin sem se despedir de ninguém. Notório crítico da baixa produtividade das instâncias regionais e inquieto durante todo o cerimonial, Tortorello se explicou através do filho e deputado estadual Marquinho Tortorello, no dia seguinte: São Caetano não foi contemplada em nada pela avareza da caneta do governador no encontro do mês passado.


 


Marta na dianteira


 


As festejadas e geralmente pouco frutíferas visitas de autoridades ao Grande ABC foram tema de um crítico editorial da newsletter CapitalSocial. No mesmo dia em que dirigentes da Câmara Regional renovavam promessas de acordos de cooperação, Sertãozinho esbravejava por causa de prosaicos buracos nas ruas que dinamitam a  logística e a produtividade desse importante pólo industrial de Mauá. A Aepis, associação dos empresários locais, diz que há nada menos que um ano reivindica melhorias no sistema viário.


 


Em São Bernardo, a fábrica da Rolls Royce agendou a visita de ninguém menos que a prefeita Marta Suplicy para o início deste mês, quando apresentará seu ambicioso plano de revitalização da zona oeste. São Paulo quer implantar uma fábrica de termo-geração da Rolls Royce que aproveite o tesouro de gás natural recém-descoberto em Santos.


 


"As ruas esburacadas de Sertãozinho são simbolicamente a regra dos descuidos com empreendedores no Grande ABC porque não há estruturas técnicas e operacionais das prefeituras que mirem o atendimento imediato de quem constrói riqueza e gera receitas tributárias. Faz parte da cultura dos agentes públicos locais o desdém ao empresariado"  -- escreveu o editor Daniel Lima, alertando: "A disputa (entre cidades) por investimentos produtivos ganhou perfil de combate sangrento a ponto de se sustentar sem medo que o crescimento da vizinha zona leste fatalmente impingirá novos reveses ao Grande ABC, como se já não bastasse a evasão de riqueza em direção ao Interior mais próximo e também, mais recentemente, na trilha do Rodoanel que chegou à Grande Osasco. Com dona Marta Suplicy na parada, visitando pessoalmente os prováveis novos investidores, a disputa torna-se ainda mais discrepante. Simplesmente não temos cacife político, cultural e econômico para um embate  com a Cinderela do nosso Complexo de Gata Borralheira".


 


Não é de hoje que LivreMercado e mais recentemente CapitalSocial  alertam para a dificuldade de a Câmara Regional e Consórcio de Prefeitos conciliarem discurso e prática. "Sobram temários nem sempre emergenciais e muito menos restauradores das energias econômicas e sociais perdidas, e rareiam propostas factíveis" -- resumiu a newsletter de 19 de fevereiro sobre o descompasso dos discursos politicamente corretos e o chumbo grosso da realidade regional.


 


Uma resposta e meia


 


No balanço de despedida do cargo de presidente da Câmara Regional, o prefeito de Diadema, José de Filippi Júnior, enumerou alguns temas que considera vencedores em sua gestão, entre os quais a liberação de R$ 5 milhões para o coletor-tronco de esgotos de Ribeirão Pires, Rio Grande e Mauá, os 30 veículos-resgate para urgência na saúde da região, o posto do BNDES e a Carta do ABC entregue ao presidente Lula da Silva há exatamente um ano, quando esteve na fábrica da DaimlerChrysler em São Bernardo.


 


Das oito reivindicações ao presidente, pode-se dizer que uma e meia foi atendida: verbas para o coletor-tronco e o posto do BNDES, um remendo para o pleito original de uma agência de verdade do banco estatal na região, com autonomia para impulsionar as vocações locais com aprovações e liberação de crédito. De resto, o emissário que trouxe a resposta de Lula 90 dias depois, o ministro José Dirceu, não passou de boa vontade, conforme rendeu-se até o sempre otimista Diário do Grande ABC em manchete dia 10 de junho.


 


"O caminho mais curto é fazer uma ponte com a Universidade Federal de São Carlos, que tem perfil mais próximo da problemática e da vocação natural da região. Podemos começar a conversar para ver onde a gente pode avançar" -- respondeu um escorregadio José Dirceu a respeito do pedido de uma universidade pública regional. Sobre o Rodoanel-Ferroanel, outro item da Carta do ABC a Lula, o apoio é sempre incondicional, mas só na retórica: "Vamos ver como a gente pode liberar recursos. É um grande e grave problema da Região Metropolitana, gravíssimo por causa da safra que entra agora. Temos de enfrentar essa questão urgentemente" -- discursou Dirceu. Sobre as cadeias produtivas, mais promessas: "Vou conversar com o ministro do Desenvolvimento e Comércio Exterior, Luiz Fernando Furlan, para resgatar a memória de tudo o que foi desenvolvido em relação ao adensamento da cadeia produtiva na região. Precisamos não de apenas uma coisa acadêmica, mas de algo que se transforme em políticas efetivas". E sobre a autonomia legal do Consórcio de Prefeitos, uma instância de voluntariados, o ministro escapou: "É uma questão nova que temos de estudar. Já solicitei, porque está na minha área, para que trabalhemos sobre a questão de planejamento e gestão de políticas públicas regionais".


 


Como já disse o tarimbado advogado trabalhista Drauzio Rangel, que durante anos defendeu o Sindipeças nas abrasivas campanhas metalúrgicas do Grande ABC e suas incontáveis pautas, quando não se quer resolver algo, cria-se um grupo de trabalho. Os grupos temáticos da Câmara Regional continuam revisitando acordos dos municípios do Grande ABC com os governos federal e estadual. Os novos 22 que vão desafiar a habilidade da prefeita de Ribeirão Pires prevêem:


 


 R$ 100 mil para cursos de qualificação profissional em Ribeirão e Rio Grande.


 


 Grupo para discutir compensações financeiras das áreas de mananciais.


 


 Pressão por uma legislação específica para as bacias Billings e Tamanduateí.


 


 Criação de um conselho gestor do programa ambiental da Billings.


 


 Organização conjunta do Rodoanel-Ferroanel.


 


 Duplicação da Rodovia Índio Tibiriçá.


 


 Negociações com a Sabesp para coleta e tratamento de esgoto.


 


 Criação de sistema de alerta contra enchentes.


 


 Criação de zona industrial para incentivar cadeia petroplástica no Pólo de Capuava e apoio político à expansão do pólo.


 


 Criação de um centro regional de convenções, estimado em R$ 20 milhões com recursos privados.


 


 Viabilizar o eixo ferroviário até Paranapiacaba.


 


 Divulgação dos roteiros turísticos.


 


 Implementação do Pólo Ecoturístico Caminhos do Mar.


 


 Políticas contra desigualdade racial, de gênero e raça.


 


 Ampliação dos dois hospitais estaduais regionais.


 


 Programa de apoio ao paciente com câncer.


 


 Programa de capacitação dos profissionais de saúde.


 


 Criação de rede para a saúde mental.


 


 Implementar as três unidades aprovadas da Febem.


 


 Programa de prevenção da violência nas escolas.


 


Como se vê, chovem idéias. O excesso de agenda foi inclusive criticado por um especialista em metropolização, Jean-Pierre Caffet, vice-prefeito de Paris que cuida do planejamento urbano e que aconselhou selecionar os temas para ir por etapas. "Não se deve colocar a carroça na frente dos bois. É melhor começar a gestão metropolitana de maneira informal, pela discussão de projeto por projeto, do que criar logo de início uma instituição"  - afirmou no mês passado em mesa-redonda São Paulo 450 -- Paris, promovida pelo Sesc Vila Mariana. A Grande Paris assemelha-se à Grande São Paulo em termos institucionais, pois a Capital despreza ações integradas com cidades vizinhas, ao contrário da gestão intermunicipal existente em todo o restante da França, onde há inacreditáveis 36 mil cidades.


 


PQU espera Petrobrás


 


"Não temos plano B" -- decretou ao final da conversa com LivreMercado o presidente da Unipar, Roberto Garcia, entre satisfeito e apreensivo com a visita da ministra das Minas e Energia, Dilma Rousseff, ao parque industrial da Petroquímica União em Capuava, em fevereiro. O Grupo Unipar está pendurado na liberação de gás de refinaria da Petrobras para poder duplicar a capacidade e não foi desta vez que obteve resposta afirmativa da estatal, sem a qual se inviabiliza em competitividade.


 


Dilma Rousseff se declarou simpática aos projetos de expansão da PQU -- central-mãe de matérias-primas do pólo --, encorajou com palavras de apoio os políticos, prefeitos e sindicalistas presentes em massa ao encontro, mas a guilhotina continua armada sobre Capuava sem um sim formal da Petrobras. Há seis anos a estatal promete uma manifestação, desde quando as prefeituras da região se uniram ao pleito da empresa -- que data de quase uma década -- e foram até a sede da estatal no Rio de Janeiro pressionar o então presidente Joel Rennó.


 


O que incomoda é que Rennó, à época, também foi solícito e hipotecou apoio formal do governo federal à demanda da PQU, como fez a ministra Dilma no mês passado.


 


Pólo Sudeste


 


Talvez por isso os empresários do pólo tenham se contido diante do frenesi político causado com a vinda da ministra, que sobrevoou a região de Capuava. Veterano na área química-petroquímica, o executivo Roberto Garcia se mostra otimista, mas não esconde que a PQU estará em apuros se não crescer, levando de roldão Grande ABC e a própria região Sudeste. Isso porque a expansão da PQU na região cria bases para o Pólo do Sudeste, um projeto da Unipar para unir a Petroquímica União e a Rio-Polímeros, no Rio de Janeiro, em torno de um grande conglomerado de empresas petroquímicas do Sudeste. A RP é um pólo gás-químico que o Rio inaugura em 2005 para produzir 550 mil toneladas/ano de polietilenos a partir do gás natural da Bacia de Campos fornecido pela Petrobrás. Os acionistas são Unipar, Suzano, Petroquisa e BNDESpar, ou seja, os mesmos grupos que estão presentes no Pólo de Capuava através de vários cruzamentos societários.


 


O Pólo Sudeste data da gestão de Paulo Geyer na Unipar e foi formalmente levado à Petrobras dias antes de a ministra Dilma Rousseff vir ao Grande ABC. Presidente do conselho de administração da estatal, ela não havia se aprofundado sobre o tema, mas deixou também prometido que projetos novos na petroquímica são bem-vindos ao plano estratégico da Petrobras de aumentar sua participação hoje minoritária nesse ramo e de avançar no nicho do GLP (gás de cozinha). A Petrobrás detém 17,4% da PQU, 16,7% da Rio-Polímeros, 11,3% na Braskem em Camaçari (BA) e 15,6% na Braskem-Ipiranga da Copesul (RS).


 


Atrás dos grandes


 


Soberana nos anos 70, a PQU detém apenas 18% do mercado nacional e vive com respiração assistida, à espera de um novo momento que permita fazer frente ao crescimento dos pólos petroquímicos da Bahia e Rio Grande do Sul, que dividem de forma igual os outros 82%. Central de insumos para as demais 10 empresas de segunda geração (resinas) de Capuava, a PQU não  tem eteno e propeno para vender porque produz essas matérias-primas usando nafta, esgotada no mercado. Pede, por isso, que as unidades da Petrobrás em Capuava (Recap) e Vale do Paraíba (Revap) lhes venda gás de refinaria, rico em etileno e que a estatal queima para movimentar seus fornos.


 


A idéia é que a Petrobrás adote o gás natural no lugar do gás de refinaria, sobretudo com a recém-descoberta de uma superbacia em Santos. Nos planos iniciais da Unipar estão investir US$ 150 milhões na PQU (que aumentaria a produção de eteno de 520 mil para 720 mil toneladas/ano) e outros US$ 150 milhões na Polietilenos União, que o grupo também controla e que elevaria sua capacidade de produzir resinas de 130 mil para 330 mil toneladas/ano.


 


Se a PQU expandida e a Rio-Polímeros inaugurada se unirem, responderão em 2005/2006 ao poder de fogo de 1,2 milhão de toneladas/ano que os pólos do Nordeste e do Sul fazem cada um. Mas o projeto da Unipar é avançar para 1,7 milhão toneladas de etileno/ano em 2010 e chegar a R$ 6,5 bilhões em receita líquida.


 


A ampliação da PQU tem grandes implicações para o formato de recuperação econômica do Grande ABC. Enquanto não impulsiona novas vocações, o crescimento da região vai continuar dependente de duas principais matrizes: indústria químico-petroquímica (responsável por 25% dos impostos gerados na região) e metal-mecânico, onde estão montadoras e autopeças, que proporcionam 33% das receitas tributárias locais. Só em Mauá, a cadeia petroquímica representa uma montanha de 66% do ICMS e em Santo André, 36%.


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