A temperatura não baixa na Avenida Kennedy, em São Bernardo. Desde o início da década, quando foi descoberta como corredor alternativo ao esgotado centro comercial do Município, a Kennedy vive em frisson e não pára de receber investimentos, transformando-se em nova e vigorosa fronteira de negócios e badalação do Grande ABC.
Seus 1.500 metros de extensão nunca foram tão disputados como ultimamente por empreendedores de atividades variadas, de olho no potencial do endereço, onde o metro quadrado já custa entre R$ 1,2 mil e R$ 1,5 mil, comparável aos pontos mais nobres das veteranas ruas Marechal Deodoro e Jurubatuba, no centro.
De dia, a avenida assiste ao corre-corre do movimentado centro de comércio e serviços que passou a sediar. De noite o tom ganha informalidade e bom-humor nos bares, choperias, cafés e sorveterias que atraem frequentadores aos milhares. Tanto, que raros estabelecimentos obedecem a ditadura do relógio comercial. A maioria só fecha depois do último freguês.
"A localização é privilegiada, pois está no bolsão residencial mais nobre da cidade: corta bairros como Jardim do Mar e Parque Anchieta, além de dar acesso à Chácara Inglesa e Parque das Américas" -- cita Edgard Fernandes, diretor da Montemor Imobiliária, conhecedor como poucos de cada rincão de São Bernardo e ele próprio estabelecido na Kennedy, onde chegou há 15 anos já farejando o sucesso do corredor.
Joga também a favor da avenida o fato de estar colada à Via Anchieta, para onde escoa o tráfego de saída para São Paulo e Baixada Santista, além de ajudar a distribuir o movimento da principal porta de entrada do Município, no km 18. Serve ainda de veia de ligação com Santo André.
A ocupação da Kennedy foi tão rápida nos anos 90 que não há mais área disponível para prédios comerciais, mesmo liberada como zona para altos espigões. As construções têm de dois a quatro andares, em média, fato atribuído por Edgard Fernandes ao alto custo do terreno.
Os maiores empreendimentos em metragem são o pioneiro Uemura, home-center que chegou há cerca de 30 anos e hoje se espalha por cinco quarteirões aos fundos e na lateral, além do Golden Shopping, inaugurado há uma década e que esgarça suas dimensões com 160 lojas e 350 vagas de estacionamento até a Avenida Senador Vergueiro.
Foram os dois, aliás, os principais chamarizes do pólo econômico e de lazer que ali se formou e que também despertou redes financeiras como o Banco Itaú, o primeiro a desembarcar com uma agência, há cerca de dois anos. Foi mais ou menos quando a Kennedy passou por cirurgia plástica que revitalizou seu perfil urbanístico, ganhando mais charme com canteiros centrais arborizados e passeios mais largos para pedestres, além de iluminação especial.
Há dois anos também aterrissou nas imediações outra marca reluzente, o Carrefour, cujas obras exigiram novo traçado de tráfego na confluência com a Vergueiro, onde a Kennedy termina. "É uma referência comercial importante, de fácil localização em todo Grande ABC" -- comenta João Francisco Moraes, da RRM Assessoria, Consultoria e Planejamento Empresarial, que há três anos mudou-se das proximidades do Paço Municipal, na Avenida Índico, devido à infra-estrutura saturada.
Melhor acesso
Atuando na área de consultoria de gestão administrativa e assessoria financeira, com intermediação inclusive de créditos do BNDES, Finep e Sebrae, a RRM vê na Kennedy melhor logística de acesso para sua sofisticada clientela de indústrias, escolas, hospitais e outros serviços.
Está, inclusive, dobrando as instalações para seis salas e estacionamento próprio, além de implantar novos equipamentos de informática, num investimento próximo de R$ 20 mil. "Os clientes aumentam com os muitos projetos na região de investimentos em máquinas, novas tecnologias e busca de certificados de qualidade" -- testemunha Moraes. Só no início deste ano, a RRM mediou 20 contratos com linhas do Sebrae, três da Finep e outros dois -- em montante acima de R$ 5 milhões -- do BNDES.
Outro forte prestador de serviços que hasteou bandeira na Kennedy é a Dimensão Turismo, atrás de endereço à altura do público elitizado que atende, como justifica o diretor Luiz Antonio Cotrim de Barros. A agência de viagens, maior operadora de grupos de excursão do Brasil para a Disneyworld, já atuava em rua secundária, a Baffin, próxima dalí, "mas sem o plus que a Kennedy passou a nos oferecer", diz o diretor.
Há nove anos em São Bernardo e há três no novo espaço, a Dimensão ganhou não só mais visibilidade com sua imensa logomarca exposta à entrada, mas também melhores acomodações, que incorporaram estacionamento e foram duplicadas para 400 metros quadrados distribuídos em dois andares.
A equipe foi igualmente dobrada para 10 vendedores, encarregados de não deixar cair o troféu de maior operadora brasileira também para o Caribe e balneários paradisíacos como Cancun, St. Martin e Curaçao. Só para a Disney, a Dimensão embarcou sete mil brasileiros entre janeiro e fevereiro últimos, repetindo a marca das férias de julho do ano passado, diz Cotrim, que comanda as franquias de São Bernardo e São Caetano.
Um estabelecimento veterano da Kennedy em serviços é o Zé Taquara Escapamentos, erguido por José Francisco de Souza há mais de três décadas, antes mesmo do velho Valdemar Uemura e esposa começarem a atender no balcão e de o asfalto invadir o antigo fundo de vale e cobrir o córrego que percorria toda a extensão da avenida. Duas pequenas pontes de madeira faziam ligação entre as margens.
José Francisco mudou-se para Pouso Alegre, em Minas, e há cinco anos passou para o filho Élcio José de Souza o bastão do empreendimento que virou tradição na cidade. "A clientela é antiga e fiel. Mas nosso público sem dúvida cresceu depois da reurbanização e do maior tráfego de pessoas atraídas pelo novo comércio e pelos bares" -- comenta Élcio, que atende entre 600 e 700 veículos por mês, cerca de 30% mais do que em anos anteriores.
Mais serviços
O aumento do número de vizinhos e fregueses levou o Zé Taquara a incrementar os serviços, instalando, por exemplo, quatro elevadores automáticos no lugar das antigas duas valetas, um investimento de cerca de R$ 20 mil. O escritório foi informatizado e máquinas eletrônicas para pagamento com cartão de banco ou cartão de crédito substituíram os procedimentos manuais de funcionários e clientes.
A Digicad é testemunha fiel de como a Kennedy foi promovida a importante eixo comercial do Município. Em fins de 1994, quando abriu a filial e dividiu os cursos de informática com a sede da rua Frei Gaspar, na região central, observou verdadeira revoada de alunos para a nova unidade. As duas salas da Frei Gaspar, que deram origem à Digicad em 1991 com os pioneiros cursos de CAD/Engenharia, acabaram desativadas e foi na Kennedy que a escola alavancou seu crescimento, a partir de investimentos na época de R 110 mil.
São hoje 40 cursos, cinco salas de aula com até cinco computadores em cada, além de espaços com equipamentos especiais para cursos como de computação gráfica. No prédio de três andares, o térreo é ainda ocupado com loja de artigos de última geração, a Digishop.
"Estamos procurando área vizinha para aproximar as atividades" -- comenta o diretor Fernando Leça do Nascimento, que se divide entre três endereços na Kennedy: a central de cursos ao lado do Uemura, a sala para curso de hardware em frente ao Corpo de Bombeiros e a administração na Rua Espérico, uma transversal. Isso sem falar na nova filial da Rua Consolação, nos Jardins, na Capital. São ao todo 420 alunos, dois terços na Kennedy. Outro exército de 700 alunos devem ser formados pelas aulas in company. A Digicad é a única escola da região com o título de Autodesk Trainning Center conferido pela fabricante do software Autocad.
A avenida dos serviços sofisticados, do comércio diversificado, transformou-se também em reduto de animados pontos de encontro da juventude e de adultos em busca de descontração. "É a nova referência da vida noturna da região, não só de São Bernardo" -- comenta Robinson Alves Pereira, proprietário do mais novo point de lazer da Kennedy, a Mr. Einstein Choperia, que está abrindo as portas este mês para saciar a sede dos mais exigentes apreciadores de chope.
A casa equipou-se com duas câmaras frigorificadas com capacidade para 20 barris cada, uma das quais para estoque e outra instalada sob a chopeira. A bebida é mantida a zero grau e chega à mesa do freguês a dois graus. Robinson investiu cerca de R$ 150 mil até agora no ponto, que tem capacidade para 360 frequentadores sentados às mesas e outros 20 no balcão. Abre de segunda a segunda a partir das 16h até o último cliente. Sua expectativa é atrair legiões de jovens a partir dos 20 anos com atrações como pratos mexicanos e japoneses, além dos tradicionais lanches e petiscos. Aos sábados, a feijoada é acompanhada de música ao vivo.
Diversificando ações
Quem também apostou na Kennedy como roteiro gastronômico de ponta foi o casal Paulo Pinheiro e Eliana da Silva Cruz, de Santo André, onde atuam com corretora de seguros e despachante e que resolveram diversificar abrindo em São Bernardo a sorveteria por quilo Ice Ace. Eliana tomou a frente dos negócios, investindo mais do que os cerca de R$ 90 mil no projeto. Sua grande aposta foi na qualidade dos produtos e do atendimento. "Com apenas um ano de atividades, 80% de nossa clientela é cativa" -- diz ela.
Em dias quentes são vendidos até 120 quilos de sorvetes e em finais de semana ensolarados esse volume mais do que dobra, atingindo 300 quilos e um público rotativo de até duas mil pessoas, que chegam geralmente em família. A Ice Ace oferece 30 sabores e quatro diets, fornecidos pela Latechy. Os mais disputados são os sorvetes pavê e branca de neve, segundo Eliana, que faz da inovação seu grande alicerce: crianças são presenteadas com bexigas e no inverno que se aproxima a novidade será o sorvete quente. Na temporada de frio do ano passado ofereceu vinho quente e chocolate cremoso.
Um dos luminosos mais recentes da Kennedy é a franquia do Frans Café, que chegou com a proposta de dar mais uma alavancada no corredor, transformando-o em espaço aberto 24 horas. Pelo menos é que o gostaria a diretora Gláucia Rodrigues dos Santos, ao desafiar atuais e novos empreendedores. "Meu movimento de madrugada é de gente que antes ia para a Capital em busca de espaços nesse horário. Portanto, há público para tornar a Kennedy um grande shopping que não fecha e que ainda não conta com outro atrativo forte, que são as danceterias" -- propõe Gláucia, que investiu cerca de R$ 150 mil na casa e foi atraída para a avenida justamente pelo público classe A e B que busca alternativa de diversão.
Em funcionamento desde novembro último, o Frans de São Bernardo só fecha às segundas-feiras pela manhã até às 15h. Já fez respeitável público de frequentadores, sobretudo entre a noite de sexta-feira e madrugada domingo. Nesse período, chega a servir 950 cafés e 130 sopas, vedetes no cardápio da franquia.
Os primeiros a iluminar a noite da Avenida Kennedy foram os amigos Antonio Carlos Sellan, Rivail de Carvalho e José Miranda, sócios em um dos mais prestigiados endereços da badalação do Grande ABC, o Liverpool. Há cinco anos o bar é parada obrigatória, de segunda a segunda, não só da moçada atrás de paquera, mas de executivos apreciadores de happy-hour entre amigos.
Não é a toa que seu pioneiro Clube do Uísque reúne mais de 700 garrafas personalizadas e que a Antarctica só tem mimos para com a casa: em novembro passado, o Liverpool registrou o segundo maior consumo de chope da marca na Grande São Paulo, com 12 mil litros. A média continua admirável: entre oito e 10 mil litros mensais, consumidos por um público giratório entre 480 e 500 pessoas por noite.
Entre mesas e bar, a capacidade é para 200. "Criamos um espaço agradável e serviços de qualidade" -- justifica Rivail, que sugeriu o nome Liverpool em homenagem à cidade dos legendários Beatles e onde morou por três anos. A cozinha do estabelecimento está sendo modificada, ganhando perfil industrial para conferir mais agilidade ao atendimento. O menu estilo snack-bar incorporará novos lanches, que são carro-chefe da casa, responsáveis por 10% dos pedidos.
Extensão da Kennedy
Outro ambiente que não perde a pose da animação é o Pollo D´Oro, que conquista público a cada dia pelo inusitado cardápio: churrasco de carnes nobres como picanha, miúdos e galeto. Tudo regado a muita cerveja: são cerca de 20 caixas por noite, calculam os sócios Paulo Rogério Borella e João Maria Medeiros Bezerra. Só de picanha, são três toneladas por mês, consumidas a partir das 16h até meia-noite de terça a sexta-feira e das 10h às 18h aos sábados e domingos.
O Pollo D´Oro é identificado à distância, já que o ambiente descontraído transborda pelas mesas e cadeiras esparramadas pelas calçadas da rua João de Azevedo Marques, com a qual a Kennedy faz esquina, ao lado do Golden. O antigo bar que servia só almoço ganhou personalidade de point há sete anos, quando Paulinho e Jonny, como são conhecidos, compraram o estabelecimento, criaram o happy-hour e incrementaram os churrascos. "Foi a Kennedy que pegou carona no nosso sucesso" -- brinca Paulinho, ao comentar seu endereço em rua transversal.
A mudança radical da Kennedy já a colocou no mapa de prioridades do Departamento de Engenharia de Tráfego. Junto com as avenidas Prestes Maia e Caminho do Mar, Dr. Rudge Ramos e Marechal Deodoro, acaba de receber lombadas eletrônicas e radares que controlarão o fluxo do tráfego e a velocidade dos mais apressadinhos, inaugurando a era das multas eletrônicas no Município. Segundo o DET, a Kennedy recebe hoje em média cinco mil veículos/dia.
Com todo esse potencial, o vereador Edinho Montemor já espichou o olho para melhorar o aproveitamento comercial. Cerca de 500 metros do corredor, ao final, estão ocupados por prédios públicos como Secretaria de Finanças, Seção de Parques e Jardins, Arquivo, entre outros. A proposta de Edinho é privatizar essa área frontal e transferir os departamentos da Prefeitura para terreno vizinho que se estende até a Via Anchieta, ladeando o Parque Anchieta.
O Poder Público poderia, com os recursos da privatização, erguer um centro administrativo mais moderno, combinado com áreas de lazer e convivência, como um teatro. "Seria possível construir um grande centro cultural e cívico" -- propõe o vereador, fazendo referência ao novo Fórum Municipal, cujas obras -- paradas desde 1994 -- serão finalmente retomadas este mês, segundo promessa do Centro de Engenharia da Secretaria da Justiça do Estado. O prédio de 16 mil metros quadrados na confluência com a Avenida Senador Vergueiro abrigará os Fóruns Criminal e Cível e somará, sem dúvida, um novo status ao local. Iniciado em 1991, foi sucessivamente paralisado por falta de pagamento à construtora CGK. Seu custo é previsto em R$ 7,5 milhões.
Setor imobiliário
A diversificação de atividades que se esparramam pela Kennedy impede caracterizar-lhe um perfil. Mas, além dos bares, concentram-se por ali grandes nomes do ramo imobiliário. Casos da Montemor, Casari, Pinotti, Gonçalves e Gomes. Edgard Fernandes, aliás, já tem aprovada planta para avançar a frente da Montemor, alargando o espaço de 600 para mil metros quadrados. A construção será modernizada, somando investimentos de cerca de R$ 200 mil. Edgard fecha os olhos quando se trata de valorizar seu endereço. Instalado no estratégico número 1.000, não vacilou, anos atrás, em pagar três vezes mais pelo telefone com final 1.000. Um marketing que garante a fidelidade dos 10 mil nomes em cadastro conquistados ao longo de 20 anos de carreira.
Quem também deu status à Kennedy como corredor de prestigiadas imobiliárias foram os irmãos e sócios Antonio Carlos e Roberto Francisco Gonçalves, com tradição de um quarto de século na área. A Gonçalves Imóveis e Condomínios instalou ali sua primeira filial, para atender a região de Rudge Ramos, Paulicéia e Jardim do Mar.
Com menos de um ano e meio de atuação, a unidade já responde por 15% da movimentada carteira da Gonçalves, que administra duas mil locações, três mil condomínios, realiza 55 vendas/mês e dispõe em cadastro de 600 imóveis para alugar. "Dentro da estratégia de levar a empresa para perto do cliente, a unidade da Kennedy fazia falta para alavancar e conectar nossos negócios naquela localidade" -- sublinha Antonio Carlos, sediado na avenida Prestes Maia e com a segunda filial, de apenas seis meses, aberta no Bairro Assunção.
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