Economia

Demografia exige
desenvolvimento

ANDRE MARCEL DE LIMA - 12/02/2007

A Fundação Seade apresenta carga extra de preocupação para quem se debruça sobre os rumos da Região Metropolitana de São Paulo e especialmente do Grande ABC: de acordo com a Fundação Seade (Sistema Estadual de Análise de Dados), a Grande São Paulo de 39 municípios saltará dos 19.355.818 habitantes registrados no ano passado para 22.184.523 em 2020. Significa que o território mais caótico do Brasil agregará 2.828.705 moradores em 13 anos -- mais do que a soma atual das sete cidades da região. E a contribuição do Grande ABC para o crescimento desordenado está garantida. As sete cidades somarão 2.901.375 residentes em 2020, 361.643 a mais que os 2.539.732 atuais. Com isso, o Grande ABC deve ganhar praticamente uma Diadema. Somente São Bernardo somará uma São Caetano de novos residentes em 2020, ou 140 mil habitantes.


 


Se a situação da Grande São Paulo ou do Grande ABC fosse semelhante à de certos países europeus que atraem imigrantes para combater taxas negativas de fecundidade, as notícias da Fundação Seade mereceriam comemoração. Mas a posição deste lado da linha do Equador é diametralmente oposta. A mescla de trânsito caótico, habitações precárias, desemprego, informalidade, violência, poluição e baixa qualidade de vida transformou a Grande São Paulo em prato cheio para especialistas em desafios urbanos. Mas as condições de vida reconhecidamente difíceis só tendem a piorar com o incremento populacional superior a 14%.


 


Principalmente porque o inchaço se concentra em áreas periféricas cronicamente carentes de serviços públicos. Se é verdade que a evolução demográfica nem se compara ao surto de décadas passadas, na esteira da industrialização, é igualmente verdadeiro que o ritmo ainda se dá em escala muito superior ao recomendável.


 


Duas sugestões


 


Se a pressão demográfica é inevitável, como relaxar e tornar o fenômeno menos doloroso? Há duas sugestões obrigatórias. A primeira diz respeito à necessidade de conferir novo arranjo jurídico-institucional à Região Metropolitana de São Paulo. O ideal seria criar o Estado da Grande São Paulo, conforme sugerido há alguns anos pelo brasilianista norte-americano Norman Gall, presidente do Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial, sediado na Capital. Só com maior representatividade política e financeira garantida no bojo do novo ente federativo o aglomerado de 39 municípios teria condições concretas de sair do buraco socioeconômico em que se meteu -- a alusão explicita à cratera do metrô é mais que pura coincidência. Porém, a missão é impossível ou pelo menos improvável, já que nem o projeto prometido pelo ex-governador Geraldo Alckmin antes de se candidatar à presidência da República consegue romper a barreira da virtualidade.


 


O projeto aparentemente perdido dos escaninhos do Legislativo estadual inseriria a Grande São Paulo no molde das Regiões Metropolitanas de Campinas e da Baixada Santista. O problema é que a gestão dessas duas regiões metropolitanas formalmente constituídas está longe de remeter ao paraíso, apesar de ainda não embutirem complexidade social da Grande São Paulo.


 


A segunda resposta obrigatória para o drama da Grande São Paulo sob o foco do incremento populacional é outra cláusula pétrea de LivreMercado: desenvolvimento sustentado. Somente o desenvolvimento econômico em bases sólidas poderá atenuar os efeitos colaterais do adensamento humano. Em bom português, é preciso atrair novas empresas para gerar postos adicionais à PEA (População Economicamente Ativa) em expansão. Neste campo a situação também é angustiante. Inúmeros estudos comprovam a transfusão de riquezas da Grande São Paulo para o Interior e outros Estados pelo simples motivo de que a iniciativa privada não suporta conviver com altos custos locacionais, insegurança e entraves logísticos típicos da metrópole. Diferentemente dos indivíduos, que permanecem em regiões caóticas ou decadentes por laços sentimentais, empresas se deslocam sem cerimônia por questão de sobrevivência no panorama da globalização.


 


Situação mais grave


 


No Grande ABC a situação é ainda mais grave porque foi a região brasileira mais atingida pelo misto de guerra fiscal, globalização sem salvaguardas e estímulo governamental à pulverização de plantas automotivas durante o governo Fernando Henrique Cardoso. Conforme LivreMercado mostrou na edição de janeiro último, o PIB (Produto Interno Bruto) do Grande ABC caiu 44,85% desde 1970. O estrago só não foi maior porque o fechamento maciço e a evasão de micro, pequenas e médias empresas, sobretudo autopeças, foram parcialmente compensados por ganhos de produtividade das montadoras no panorama da globalização -- o que custou cerca de 100 mil empregos com carteira assinada nos anos 1990.


 


Dos 361.643 residentes adicionais projetados para o Grande ABC em 2020, São Bernardo responderá por 140.816 -- a população deve saltar de 780.512 em 2006 para 921.328, aumento de 18%. Há acréscimos mais expressivos em termos relativos. A população deve crescer 22,2% em Mauá, de 405.038 para 494.992; 20,5% em Ribeirão Pires, de 117.171 para 141.235; e 24,7% em Rio Grande da Serra, de 41.814 para 52.157. Em Diadema, que já ostenta uma das maiores densidades demográficas do País, o incremento populacional será de 15,8% -- de 385.031 para 445.960 habitantes.


 


Já em Santo André, cidade que mais perdeu Valor Adicionado em São Paulo nos últimos 30 anos, o aumento projetado é de 5,9%: de 672.889 para 712.616. São Caetano desponta como exceção ao indicar encolhimento de 3%, de 137.277 para 133.087. É fácil entender por que São Caetano se comporta como estranha no ninho regional e metropolitano. Como LivreMercado já mostrou em reportagem histórica, as dimensões reduzidas salvaram o Município da explosão demográfica. Com apenas 15 quilômetros quadrados, é a antítese das vizinhas cujas áreas de mananciais se traduzem em obstáculo para instalação de indústrias e fertilizam núcleos habitacionais.


 


Sob a perspectiva de desafios impostos pelos 360 mil habitantes adicionais em 2020, fica mais fácil compreender a importância de algumas batalhas atuais: a Universidade Federal recém-instalada pelo governo Lula precisa se comprometer com a geração de riquezas na região em que está instalada para evitar o agravamento do quadro socioeconômico; o trecho sul do Rodoanel, cujas obras estão paralisadas, deve ser materializado no prazo mais curto possível, mesmo à custa de pedágio; a criação de 12 mil empregos em empresas de terceira geração plástica é uma questão de honra especialmente para Mauá e Santo André, que acolhem as companhias de primeira e segunda geração petroquímica; a manutenção da indústria automobilística inserida em competitividade vertiginosa deve ser obsessão de qualquer ocupante do Paço de São Bernardo; o fortalecimento do segmento de cosméticos é meta igualmente atemporal em Diadema, bem como a consolidação do setor de Tecnologia da Informação e a atração de indústrias para terrenos desocupadas ao longo do Rio Tamanduateí.


 


O levantamento da Fundação Seade mostra ainda que a população do Estado de São Paulo deve ser ampliada de 40.484.029 para 47.220.009 em 2020, aumento de 16,6%. O índice é superior aos 14,61% da Grande São Paulo e aos 14,23% do Grande ABC. Ou seja, o crescimento populacional fora da região metropolitana é um pouco mais intenso como efeito da desconcentração industrial. 


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