Economia

Entre a evasão e
a informalidade

DANIEL LIMA - 05/07/1998

Santo André vai perder pequenas empresas do setor de serviços para outros municípios da região e o grau de informalidade vai aumentar. Esse é o efeito em dose dupla da legislação aprovada no final do ano passado pela Câmara Municipal, na avaliação de Humberto Batella, presidente do Sindicato dos Contabilistas de Santo André, uma das categorias mais atingidas pelo aumento do recolhimento de impostos aos cofres da Prefeitura. Batella, que também é membro do Fórum da Cidadania, afirma que nem mesmo o recuo parcial da Secretaria de Finanças de Santo André, mês passado, depois de intensas negociações, vai atenuar os problemas, porque contemplou apenas parte dos agentes envolvidos, no caso os profissionais liberais. "O caminho para muitas microempresas de serviços será a evasão de Santo André e para outros, no caso dos contabilistas, manobras de engenharia tributária que reduzam o excesso de custos tributários e evitem a demissão de trabalhadores" -- projeta Batella.


 


Os escritórios de contabilidade atingidos pela legislação municipal prometem recorrer, segundo o dirigente. Ele argumenta que a Lei 7566/97, aprovada em dezembro último, é inconstitucional porque contraria o princípio de que o ISS (Imposto Sobre Serviços) deve ser recolhido em parcelas fixas trimestrais e não sobre o faturamento. "É o caso de São Caetano e de outros Municípios da região. Menos de São Bernardo, que recolhe passivamente a alíquota de 3%" -- afirma.


 


A Justiça de Santo André entende que a Constituição Federal, em seu artigo 156, confere competência aos municípios para legislar sobre serviços de qualquer natureza, inclusive sobre alíquota e base de cálculo. O argumento principal do Sindicato dos Contabilistas, que entrará com mandado de segurança no Fórum de Santo André por meio do advogado tributarista Emílio Rigamonti, é o Decreto 406/68, que determina a cobrança do imposto com valores fixos, enquanto a Prefeitura de Santo André estipulou 3% sobre o faturamento das empresas com mais de três funcionários. O próprio desmembramento da cobrança do ISS, de um lado com valores fixos para quem tem até três funcionários e de outro com recolhimento sobre notas fiscais emitidas para quem tem mais de três funcionários, instrumentalizaria a defesa por prática discricionária.


 


O acordo feito no mês passado entre representantes de profissionais liberais e o secretário Luís Carlos Afonso contemplou os anseios da quase totalidade de escritórios de médicos, advogados, psicólogos, economistas e dentistas, entre outros. Mas atingiu em cheio 190 dos perto de 300 contabilistas de Santo André. Não foram atingidos os contabilistas autônomos e os pequenos escritórios. Os escritórios de contabilidade e também de médicos, dentistas e advogados, entre outros, que contam com mais de três funcionários vão recolher a alíquota de 3% de ISS. Os demais, com mais de três anos de atividades, que deveriam recolher 600 Ufirs (Unidade Fiscal de Referência) neste ano, tiveram desconto de 50% e recolherão 300 Ufirs, da mesma forma para quem tem menos de três anos. Para 1999 não se sabe ainda como será efetuada a tributação.


 


Sobrepeso


 


A revolta das lideranças dos profissionais liberais e a alternativa encontrada para amenizar o peso do ISS acabaram por esconder o que Humberto Batella considera bastante problemático, ou seja, o sobrepeso do imposto que atinge microempresas de serviços. Até dezembro passado, a isenção de ISS estava garantida para prestadores de serviços com faturamento bruto mensal de até R$ 20 mil. Com a nova lei, a redução foi drástica, porque está limitada a R$ 1,5 mil por mês. "Algo absolutamente fora de cogitação" -- garante Batella. A partir desse patamar há faixas pré-estabelecidas de descontos, cujos valores diminuem à medida que aumenta o faturamento.


 


No boletim informativo de sua empresa, a HS Contábil, Humberto Batella faz duras críticas à administração municipal de Santo André: "Com a edição desta lei (referindo-se à legislação aprovada em dezembro), ignorou-se todo o movimento da sociedade, das entidades representativas e, principalmente, da importância que as micros e pequenas empresas representam em nossa economia. Esqueceu-se até da Constituição, que em seu Artigo 179 determina aos Estados e Municípios que dêem tratamento diferenciado às micros e empresas de pequeno porte.


 


Certamente não será neste momento que iremos atrair mais empresas para nossa cidade ou tirá-las da clandestinidade. O que veremos, sim, é aumentar o êxodo para Municípios vizinhos" -- escreveu Batella antes do insatisfatório acordo com a Prefeitura.


 


O presidente do Sindicato dos Contabilistas de Santo André afirma que os valores fixos cobrados trimestralmente até o ano passado eram ínfimos e que suportariam reajuste, mas que a ganância tributária acabou por prevalecer: "Sugerimos que o ISS para os escritórios de profissionais liberais poderia ser limitado a 600 Ufirs por ano ou até 1% sobre o faturamento, mas o secretário municipal não aceitou" -- lembra Batella. "Aliás, é como funciona em São Caetano e em todos os Municípios que procuram atrair empreendedores".


 


O secretário Luís Carlos Afonso estima a perda de receitas, com o acordo do mês passado, entre R$ 1 milhão e R$ 1,5 milhão, de uma previsão anual de R$ 40 milhões com o ISS. Mesmo assim, alimenta a expectativa de reverter a média de inadimplência e ter recursos compensatórios. No ano passado a Prefeitura de Santo André, segundo Afonso, registrou 46% de inadimplência. Qualquer variação para baixo reequilibraria os números projetados.


 


O que fazer?


 


O tributarista Ary Silveira Bueno, da ASPR Assercon, engrossa o coro de reclamações contra o sobrepeso fiscal do ISS em Santo André. Ele entende que o caminho escolhido por São Caetano parece mais contributivo para o desenvolvimento regional. Cita que no final do ano passado foi editada a Lei 3619, reduzindo mais algumas alíquotas num processo iniciado meses antes. "Sabemos que os municípios precisam efetivamente aumentar a arrecadação, ter novos investimentos, mas o setor de serviços, quando estuda o componente tributário, decorrente do ISS, não tem tido horizonte seguro no Grande ABC" -- afirma. E dá um exemplo: "Em outubro do ano passado, tradicional empresa de serviços de Santo André, nossa cliente, comunicou-nos que mudaria a sede para São Caetano. Arqüimos que a redução do ISS e a uniformidade no Grande ABC eram questão de dias, como foi anunciado fartamente pelos prefeitos e secretários de Desenvolvimento Econômico em reuniões realizadas pelo Consórcio Intermunicipal.  O que posso dizer hoje se a padronização do ISS não aconteceu e o que assistimos, em realidade, é uma guerra fiscal interna?". 


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