Economia

Modernidade
chega às urnas

DA REDAÇÃO - 05/05/1999

Depois de alargar as preocupações para além dos holerites com mobilização para salvar empregos e deter a evasão industrial, o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC estende às urnas o processo de modernização de postura. Um ano e meio de discussões reformularam o estatuto da entidade e o resultado começou a surgir no mês passado, com novo modelo de eleição. Trabalhadores de 69 empresas da região elegeram 192 dirigentes para os recém-nominados comitês de base. Dessa lista sairão as chapas, ou chapa única, com 27 integrantes com indicação de presidente.  "Queremos com os comitês construir sindicatos dentro da fábrica" -- pontua o presidente Luiz Marinho, candidato à reeleição. Nos próximos dias 26, 27 e 28 a categoria escolhe a direção executiva e também o presidente para o triênio 1999/2002. O novo comando toma posse em 19 de julho.


 


A mudança estatutária rompe a organização vertical dominante na lógica oficial do sindicalismo brasileiro e admite pluralidade, liberdade e mais autonomia na base. Isso permite a organização sindical a partir do local de trabalho. "Os comitês não excluem as comissões de fábrica" -- garante Marinho. Mas, certamente, terão mais poder de fogo nas negociações específicas de cada empresa. O presidente explica que a função dos comitês é ser canal pelo qual os trabalhadores possam criar condições internas de trabalho.


 


Os comitês foram eleitos por 80 mil metalúrgicos, 76,5% da categoria. Durante o processo de escolha, a liderança de Luiz Marinho foi arranhada em seis empresas, entre as quais Scania e Volkswagen, onde houve chapas de oposição. "Não acreditamos que houve oposição sistemática em nenhuma fábrica, pois os comitês acabaram formados proporcionalmente" -- considera Tarcísio Secoli, diretor administrativo-financeiro da entidade. Na Volks, reduto de Marinho, a oposição conquistou 42,5% da preferência e a chapa vencedora, 57,5%. Marinho, praticamente reeleito, deixa claro que dará continuidade ao trabalho de buscar alternativas para a geração de emprego e renda. "O sindicato não deve somente fazer oposição aos modelos de governo, mas lançar propostas" -- conceitua.


 


Novas pautas


 


Um dos primeiros sinais de expansão das preocupações sindicais materializou-se com a Câmara Automotiva, em 1991 e 1992. Hoje as discussões incluem renovação da frota nacional e reciclagem de veículos com mais de 15 anos, o destino das verbas do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador) e a reedição do acordo emergencial que reduziu alíquotas do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) e do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) de automóveis, entre outras. Com 105 mil trabalhadores na região, 40% da base do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC estão nas montadoras de veículos, 30% nas indústrias de bens de capital e 30% na indústria de autopeças. "Em toda a cadeia de produção o sindicato conseguiu repor perdas salariais" -- orgulha-se Luiz Marinho.


 


Nos últimos três anos, Marinho viu esmagada a oferta de trabalho. De 1994 até hoje, 30 mil postos de trabalho foram extintos na base da entidade. Poderia ser pior. Em dezembro de 1997, a Volkswagen anunciou 10 mil demissões, evitadas em parte com o desligamento voluntário de quatro mil, e nova ameaça de cinco mil demissões em dezembro de 1998, diluídas pelos próximos cinco anos. Sem falar do Natal da Ford, em 1998, quando 2,8 mil funcionários foram dispensados, 1,3 mil dos quais temporariamente revertidos. No setor de autopeças, o achatamento da produção desencadeado pela queda abrupta da alíquota de importação e pelo esfriamento das vendas de veículos no ano passado não provocaram dor de cabeça menor aos sindicalistas.


 


Racha Sindical


 


Além da conjuntura econômica que desde o início da década provocou ondas de demissões, férias coletivas, jornadas e salários reduzidos, entre outros transtornos trabalhistas, confronto político desaguou em racha da entidade. Dissidentes recriaram o Sindicato dos Metalúrgicos de Santo André. "O Marinho não era de muita expressão na mídia como o Guiba Navarro, o Vicentinho e o Meneguelli" -- lembra o diretor Tarcísio Secoli.


 


Mesmo sem a visibilidade dos antecessores, Marinho conseguiu driblar os efeitos verificados na própria entidade. Para isso foi preciso rediscutir a forma de administrar a casa. As demissões na base atingiram em cheio os cofres do terceiro maior sindicato do País -- em número de associados perde para a Apeoesp, dos professores do Estado de São Paulo, e Sindicato dos Bancários -- e os gastos tiveram de ser revistos. "O Marinho dispõe de cultura descentralizada, trabalha coletivamente e possui eloquência verbal. Isso facilita o trabalho" -- pontua Secoli.


 


Dos R$ 18 milhões arrecadados em 1995, a receita do sindicato desceu para estimados R$ 14 milhões este ano. O quadro de funcionários foi reduzido em 27%. Todos os contratos de terceiros foram reavaliados e a tiragem da Tribuna Metalúrgica, jornal diário da categoria, caiu de 60 mil para 45 mil. O jornal consome mensalmente R$ 50 mil só de gráfica, já que a mão-de-obra está incluída na folha de pagamento da entidade.


 


Salários e encargos de toda a máquina sindical absorvem 50% da receita. O Clube de Campo requisita R$ 30 mil por mês. Outros 10% do bolo vão direto para a CUT (Central Única dos Trabalhadores). Além da receita gerada pelas mensalidades, o sindicato obtém recursos extras por meio de repasses de acordos firmados com empresas. Esses percentuais são cobrados de trabalhadores não sindicalizados que usufruem dos benefícios conquistados pela entidade em favor da categoria, como a participação nos lucros.


 


O sindicato não influi na vida dos metalúrgicos somente nas relações capital-trabalho. Seminários periódicos de qualificação e formação constam da agenda da entidade. "Temos especial preocupação com as Cipas (Comissões Internas de Prevenção de Acidentes)" --  expõe Secoli. Convênio firmado com o Sesi (Serviço Social da Indústria) abriu classes de formação noturnas, consolidando trabalho de incentivo à conclusão do Ensino Fundamental. Também o Mova ABC (Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos) mostra-se aliado no fomento ao aprimoramento profissional. Cursos de especialização e diversidade de conhecimentos são programados. "Os trabalhadores do Grande ABC ainda não têm excelente nível de qualificação profissional, mas estão quase lá"  -- afirma o diretor.


 


A entidade oferece ainda atendimento jurídico e dispõe de Departamento de Saúde dedicado a doenças profissionais. Os associados contam com invejável rede de convênios com academias, clínicas e consultórios médicos, dentistas, escolas, farmácias, funerárias, cooperativas habitacionais, hospitais, clubes e colônias de férias, óticas, papelarias e seguradoras. 


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