A diferença entre empresário e empreendedor é que o primeiro é essencialmente materialista e o segundo é razoavelmente idealista. Mais ainda: o primeiro considera o materialismo garantia do futuro do próprio negócio, enquanto o segundo não enxerga futuro sem pressupostos éticos. Mais, mais ainda: o materialista considera-se acima da própria organização que dirige, enquanto o idealista observa com toda atenção o ambiente que o rodeia e sabe que se não for preservado, ou mesmo melhorado, não haverá horizonte para o próprio negócio.
Engana-se quem acredita que apenas os convencionalmente empresários devem ser rotulados de empresários e os convencionalmente empreendedores devem ser considerados empreendedores. A insistência em repetir os dois verbetes de subjetividades amplas e distintas, porque muitos imaginam que significam a mesma coisa, tem o objetivo explícito de martelar e martelar tanto uma coisa quanto outra.
O que quero dizer com isso? Quero dizer que não é preciso ser formalmente empresário para sentir-se empresário de fato, da mesma forma que é indispensável se sentir espiritualmente empreendedor para atuar como empreendedor de fato. Tanto donos de negócios quanto seus colaboradores podem ser modelos ou não de empresários e empreendedores. Há colaboradores de companhias que se sentem empresários, exclusivistas como os empresários que lhes pagam os salários, e há os que não abdicam do empreendedorismo, porque se sentiriam muito mal na pele de empresários que lhes garantem o sustento.
Explicando a situação
Para quem ainda não entendeu, diria simplificadamente que há trabalhadores de empresas de empresários que se sentem igualmente empresários, ou seja, olham apenas para o próprio umbigo, enquanto há empreendedores de empresas de empresários e também de empresas de empreendedores que se sentem integralmente empreendedores. O jogo de palavras pode confundir o leitor, mas uma dose maior de atenção distinguirá o sentido dessa exposição.
Ouço aqui e ali referências imprecisas a empresários que não ultrapassam mesmo os limites territoriais da semântica empresarial e há empresários que de fato são empreendedores. A maioria não sabe distinguir um do outro. Mais ainda: a maioria generaliza a identificação tradicional que se dá a empresário a todos aqueles que têm negócios próprios e praticamente ignora a vereda do empreendedor, de negócio próprio alinhado com doutrinas humanistas.
Diria sem medo de errar que empresário é algo que carrega uma carga extraordinariamente perigosa de individualismo sem responsabilidade coletiva, exceto à confraria diminuta mas ruidosa daqueles que o cercam de bajulações, intrigas e desinformação.
Da mesma forma, afirmo que empreendedor transporta em sua gênese o compartilhamento escancarado de quem sabe que sem as raízes do capitalismo responsável, de espalhamento da riqueza material e do sentido ético de produzir, não haverá um amanhã garantido porque exemplos dessa perniciosidade são tão fluviais quanto chocantes.
Verde-amarelismo empresarial
O capitalismo verde-amarelo é profundamente empresarial e escassamente empreendedor. O empresarial não mede esforços e traquinagens para manter-se incólume não só às circunstâncias macroeconômicas, cada vez mais complexas, como, principalmente, às entranhas de seu próprio negócio.
Capitalismo avesso ao empreendedorismo não se importa se seu negócio derrama-se em problemas consolidados ao longo dos anos nem se dá conta de que a contabilidade insistentemente no vermelho geralmente é reflexo da desídia acumulada. Pior: na medida em que aperta a corda dos efeitos colaterais do capitalismo empresarial, mais se contrai a jugular de eventuais rescaldos do capitalismo empreendedor, consagrando-se o autofagismo gradual e inexorável.
O capitalista nacional de viés empresarial coloca-se à frente do próprio produto ou serviço que põe no mercado. Acha-se mais importante que todo o ativo de recursos humanos que dá sustentação ao negócio. Por isso, não os valoriza e, inapelavelmente, os vê esvaírem-se em deserções constantes. Os concorrentes agradecem penhoradamente. Mesmo que sejam concorrentes do mesmo matiz empresarial, embora mais poderosos.
Recursos humanos em quinto
A cultura patrimonialista do capitalismo tupiniquim extraída de um colonialismo que colocou o Estado de joelhos diante dos empresários-empresários desloca os recursos humanos das companhias ao quinto plano. Não lhes são interessantes. Chegam alguns a subestimá-los. Idolatram os investimentos tecnológicos, como se máquinas, processos e toda a parafernália acessória fossem cérebros que dispensassem profissionais qualificados.
Por isso, num momento em que o maior conglomerado de comunicação eletrônica do País, a Rede Globo, comemora 40 anos de atuação, não é possível subestimar a importância do holofote que a emissora colocou sobre seus ativos profissionais, enaltecendo-os acima de todos os demais fatores que contribuíram para torná-la líder absoluta de audiência.
Sabemos que há outras organizações de comunicação no País que seguem os passos da Globo, mas, infelizmente, são exceções. Viceja a erva daninha da comunicação de resultado, que vem a ser o dinheiro em primeiro, em segundo e em terceiro lugares.
Como essa é uma filosofia dos tempos de antanho, quando bastava plantar para dar, os resultados positivos são cada vez mais improváveis porque a mediocridade espalha-se e, dada a importância social desse negócio, ramificam-se modelos de oportunismos no seio de parcela da comunidade acrítica que, igualmente oportunista, resolve apostar no empresarial e não no empreendedor.
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21/11/2024 QUARTO PIB DA METRÓPOLE?