Economia

Marinho precisa explicar projeto
da Petrobras em São Bernardo

DANIEL LIMA - 19/11/2014

A Administração Luiz Marinho precisa vir a público e explicar em detalhes os desdobramentos da campanha iniciada em agosto de 2011 num evento em São Bernardo. O prefeito prometeu que a Petrobras -- então aparentemente inviolável a falcatruas que agora congestionam as páginas de jornais -- estava abrindo as portas a fornecedores locais. Constava da mira da diversificação produtiva da Capital do Automóvel a inserção de uma extensa rede de fornecedores da Petrobras, mais especificamente do pré-sal. O prefeito quer acabar com a Doença Holandesa regional, mas não pode ficar apenas nas intenções.


 


Há mais de um ano o assunto virou pó na pauta da Secretaria de Desenvolvimento Econômico da Prefeitura de São Bernardo. Anunciou-se então que o posto avançado de cadastramento da Petrobras encerrava o ciclo de captação de potenciais subcontratadas, fechando um agrupamento de 500 empresas.


 


Um gestor público responsável e transparente não abdicaria de prestação de contas à sociedade. Da mesma forma que fez estardalhaço no lançamento do projeto.


 


Até a então diretora de Gás e Energia da Petrobras e atual presidente, Graça Foster, participou em 2011 como convidada de honra de uma programação que contou com representantes da economia e da academia regional. O mínimo que se espera é que não se soneguem informações sobre os resultados obtidos até agora.


 


Falta de gerenciamento


 


Há informações de bastidores de que o projeto fracassou. Teria faltado capacidade de gerenciamento da Prefeitura de São Bernardo. Lançar um projeto é uma coisa, coordená-lo é um passo seguinte, monitorá-lo é algo mais avançado e, numa etapa seguinte, administrá-lo é ainda mais complexo.


 


A gestão de Luiz Marinho não está preparada para preencher as quatro etapas. As empresas cadastradas ficaram órfãs no meio do caminho. E agora com a sequência de escândalos, a Petrobras pode virar uma miragem às empresas locais que pretendem um rearranjo estrutural para cair na rede de fornecedores dos fornecedores da estatal. Até porque, fornecedores graduadíssimos da estatal e os respectivos subfornecedores estão sofrendo o diabo com novas políticas corporativa da empresa, após os indícios de que a mídia se ocuparia de transmitir à sociedade o quanto aquela corporação sofre nas mãos dos ladrões.


 


O petista Luiz Marinho tem tudo para passar à história econômica da região como alguém que, na condição de sindicalista, fez o possível para manter-se fiel aos metalúrgicos que presidiu nos anos 1990, mas, como gestor público, tornou-se um elo perdido entre a classe trabalhadora, a sociedade e os empresários.


 


O projeto do pré-sal é um tiro no pé de Luiz Marinho porque nada é pior que a frustração de um empresário levado a acreditar que lhe descobriram e lhe abriram as portas a uma nova investida capitalista. Aliás, há sim algo pior que essa frustração: é a constatação de que apenas foi usado como instrumento de um delírio do principal gestor público do Município. Marinho só deixará de ser tipificado na categoria de ilusionista se oferecer à sociedade respostas consistentes ao fracasso do pré-sal regional.


 


Hora para explicações


 


Convenhamos que ficar 14 meses pendurado num mutismo desencorajador, após três anos de oba-oba do lançamento do projeto, não é uma herança das mais agradáveis. Por isso tanto o prefeito quanto o secretário Jefferson da Conceição precisam vir a público para explicar os desdobramentos da iniciativa. Sem mistificação e sem transformar exceção em regra. Ou seja: jogando limpo e apontando as empresas e os produtos que passaram a ligar a produção de São Bernardo à maior empresa do País.


 


Desde o princípio tive dúvidas sobre o futuro do projeto do pré-sal expandido à região. Toda vez que o Poder Público adiciona instâncias acadêmicas a iniciativas econômicas as possibilidades de fracasso são enormes. Foi assim no passado dos anos 1990. Faculdades e universidades locais têm aversão crônica ao empresariado. Mesmo as vocacionadas à produção raramente saem dos respectivos quadrados convencionais porque também não apreciam aproximação com a classe política.


 


Não bastassem os problemas locais, a mastodôntica Petrobras também se move a passos de elefante quando pretende inovar no campo de relacionamento com os fornecedores. Há guetos cristalizados em torno do poder da estatal. As narrativas sobre  o jogo de interesses guarda uma relação muito estreita com o escândalo desses dias. A Petrobras é um campo minado em ética e moralidade porque cresceu desordenadamente.


 


Influência federal


 


A proximidade de Luiz Marinho com o poder central, em Brasília, gozando do recall de ex-ministro da Saúde e da Previdência Social durante o mandato do protetor e presidente Lula da Silva, é um elemento que não pode ser esquecido. Mais que isso: precisa ser lembrado como fator favorável ao desmonte mesmo que parcial das amarras hierárquicas da Petrobras. Como se sabe, Lula da Silva manda  muito ainda naquela empresa. Se mesmo assim a gestão petista de São Bernardo não dá respostas efetivas, é melhor esquecer.


 


Seria mesmo melhor esquecer? Para esquecer é preciso lembrar. E quando se lembra, quem sabe se retoma uma atuação. A pergunta que insisto em fazer é sobre o destino das anunciadas 500 empresas que correram eufóricas ao pote de ouro das contas bilionárias da Petrobras.


 


Ganhar uma fatiazinha qualquer do orçamento da estatal pode significar a diferença entre a vida e a morte de uma empresa metalúrgica e também do setor químico. Ainda mais que as metalúrgicas da região estão no bico do corvo, atingidas em cheio pelo recuo da produção automotiva. Mais ainda: cada vez mais estão pressionadas pela competitividade, de fornecedores que se espalham na esteira de montadoras de veículos que coalharam o território brasileiro de opções de marcas e modelos de veículos.


 


Doença Holandesa


 


A Administração Luiz Marinho transmite cada vez mais a certeza de que está sem foco no setor econômico. Provavelmente o secretário Jefferson da Conceição e equipe de reduzidos colaboradores não se deram conta do tamanho da encrenca em que se meteram ao prometerem retirar de São Bernardo o rótulo de Doença Holandesa.


 


Depender demais do setor automotivo, gerador de positividades mas também de complicações não só municipais como regionais, é um tremendo risco. Além de uma atividade extremamente competitiva, as montadoras e as autopeças vivem em outra estratosfera de realizações e obrigações trabalhistas.



Apenas a título de exemplo: São Bernardo não perdeu apenas por obra do destino a condição de maior produtora de móveis no Brasil, dobrando-se às forças de outros Estados e se transformando em importadora. A trajetória do setor moveleiro e de tantos outros tem tudo a ver com os impactos de reivindicações trabalhistas do setor automotivo, insuportáveis a atividades menos protegidas, menos rentáveis e menos acessíveis ao governo federal.


 


Aonde hoje se vê um shopping no Bairro Ferrazópolis, por exemplo, constava no passado uma fábrica efervescente da Brastemp, que gerava milhares de empregos. Quando se escafedeu ao sul do País o presidente da companhia não resistiu: criticou duramente os desequilíbrios provocados pela pauta de conquistas e reivindicações dos metalúrgicos ligados à cadeia automotiva, à qual a empresa estava subordinada nas negociações trabalhistas.


 


A reconfiguração industrial de São Bernardo é uma iniciativa louvável da Administração Luiz Marinho, embora esteja longe de ganhar o prêmio Cristóvão Colombo de inventividade, mas está sendo submetida a um regime de descasamento entre iniciativas e respostas. O projeto de fornecedores do pré-sal está à deriva tanto quanto uma pipa atacada por cerol.


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