Neste último texto que produzo nesta temporada não resisto a um desabafo dirigido aos vagabundos sociais que infestam a Província do Grande ABC e cujo esporte preferido é, para esconder a própria covardia, dizer que sou cronista das lamentações: leiam atentamente o que disse ontem no Vaticano o papa Francisco sobre as “15 doenças graves” que afetam a Cúria Romana. Leiam e reflitam. Não sou papa, mas, guardadas as devidas proporções e contextos, o que escrevo sobre este território é o mínimo que um jornalista tem a fazer ante, principalmente, o desdém e o acumpliciamento da maioria das mídias locais com os mandachuvas e mandachuvinhas de plantão. O papa Francisco nem sabe que me deu um presente especial de Natal, ou seja, subscreveu meus artigos. Aleluia!.
As contundentes críticas do papa Francisco veiculadas ontem à noite no Jornal Nacional (e hoje reproduzidas nos principais jornais) me levaram ao orgasmo espiritual. Até parecia que meu time acabara de fazer um gol em final de campeonato. Adorei. Por mais convicção que tenha como devassador dos costumes políticos e sociais desta Província dominada pelo Assalta Grande ABC e pelo Festeja Grande ABC, sempre é bom correlacionar o trabalho desenvolvido com acontecimentos apenas aparentemente distantes do conceito de lutar por uma sociedade menos sórdida.
O papa Francisco causaria constrangimento caso eu fizesse do jornalismo exatamente o que querem meus inimigos de plantão -- ou seja, uma estratégia profissional para me dar bem entre os corruptos e distribuir bananas à comunidade que, a bem da verdade, pelo silêncio, desmobilização e covardia, não merece este formato de jornalismo contestador, explicativo, revelador de nuances regionais plugadas num universo que vai além das fronteiras locais.
Vadios glorificados
Como tenho feito no último dia de trabalho de cada temporada, eis que chego ao final deste 2014 com um balanço quantitativo que é um autodesafiador à superação: com este texto são 448 no total. Convém lembrar que artigos de CapitalSocial não são artigos de outros veículos. São textos autorais, relativamente grandes. Não são notícias, apenas. Não tenho inclinação a atingir recordes de clicagens. Prefiro o leitor intelectualmente mais preparado que saiba distinguir na sociedade regional quem é bandido e quem é mocinho. Bem diferente, portanto, de outras mídias industrializadoras de vadios bem posicionados, alguns dos quais a vender imagem de filantropos quando bastaria a troca da primeira consoante para designá-los apropriadamente.
No ano passado foram 446 artigos. A diferença é mínima nesta temporada. São, os artigos, equivalentes a quatro livros de 400 páginas cada um. Entretanto, mais que quantidade, o desafio que me imponho é outro: encontrar sempre uma forma capaz de traduzir a insatisfação de quem não está neste mundo preocupado com o próprio umbigo, como a maioria dos bandidos sociais aos quais me refiro permanentemente nestas páginas.
Nesta temporada, criei algumas expressões que procuram encaixar a essência de nichos comportamentais da região. Surgiram Assalta Grande ABC, Festeja Grande ABC, Omita Grande ABC, Dissimula Grande ABC e Defenda Grande ABC. Desculpem a falta de modéstia, mas é sociologia pura. Como Complexo de Gata Borralheira, Doença Holandesa e tantas outras expressões que criei para tornar mais didático o entendimento das coisas regionais. Além de “Província”, como se sabe.
Mais aprendizado
Possivelmente o melhor de tudo que aconteceu comigo nesta temporada foram os encontros presenciais e virtuais para a formação do Defenda Grande ABC, uma organização revolucionária que, exatamente por ser revolucionária, avança, estanca e recua ao sabor de interesses individuais de alguns e da determinação coletiva de outros.
Ainda em fase de estudos e sem a formalização que permitiria ações no mar de morosidades e arranjos mais que manjados da institucionalidade regional, o Defenda Grande ABC mostrou na oficialidade dos encontros e na informalidade dos bastidores que existe subjacente na sociedade regional um elevadíssimo grau de vagabundagem institucional.
A proximidade física e virtual com determinados formadores de opinião da região que ensaiaram participação no Defenda Grande ABC, e outros que cristalizariam a inscrição com ações práticas, tornou-se um aprendizado e tanto. A identificação de personagens que não ficam nada a dever aos políticos profissionais e aos dirigentes empresariais pusilânimes que infestam a região, bem como espertíssimos sindicalistas, tornou mais fácil a interpretação dos fatos acumulados ao longo das temporadas.
Não somos uma obra institucional falida por conta do acaso. Tudo está mais que consumado porque nosso déficit de homens qualificados vem do passado.
Traduzindo sem rodeios: o nível de vagabundagem social justifica e também explica a condição de Província que ostentamos. Somos uma sociedade decadente em todos os sentidos, mas, principalmente, na engenharia de se indignar, de botar para correr os bandidos da praça que usufruem dessa paralisia coletiva.
O papa Francisco com as cacetadas distribuídas à Cúria Romana só não me reabilitou como jornalista porque jamais abandonei o barco da contestação fundamentada, esmiuçada, explicada e indignada. Mas a mensagem de final de ano do papa bem que poderia ser levada a sério pelos vagabundos sociais que infestam a Província e que se julgam espertíssimos porque procuram esconder suas intenções e atos ao apontarem o dedo para quem os denuncia.
Feliz Ano Novo a todos. Volto no começo de janeiro. O papa é pop, o papa é o máximo, o papa é leitor de CapitalSocial.
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13/11/2024 Diário: Plano Real que durou nove meses (33)