O Diário do Grande ABC, na ânsia de industrializar fatos supostamente positivos da Província do Grande ABC, sugeriu em dezembro do ano passado -- inclusive em Editorial, espaço oficial de opinião do jornal -- que apólices de seguro de veículos da região deveriam ser enquadradas em novos valores, com viés de baixa. Alegava o jornal que o índice de furtos e roubos caíra fortemente. No dia seguinte àquela matéria alertei nesta revista digital (“Ainda falta muito para Província reduzir custo de seguro de veículos”) que o melhor mesmo era esperar pelos números da temporada inteira. Como se sabe, sazonalidade não é boa companheira. Um período intenso de vendas, por exemplo, não pode ser extrapolada além da conta do bom senso. Não deu outra. Continuamos de mal a pior no ranking dessa modalidade criminal. O referencial é o G-20, o grupo dos 20 maiores municípios do Estado de São Paulo.
Dito isto, não vou adiante nas revelações. Deixo para a edição de amanhã todos os detalhes sobre a operação que realizei contando com dados oficiais da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo.
Mais uma vez sou obrigado a dizer que, mesmo quando apresenta alguma melhora – e apresentou uma melhora pífia nesse indicador de criminalidade – a Província do Grande ABC não se desgarra da concorrência. Vamos continuar pagando caro para ter veículo a salvo da bandidagem.
Custos que avançam
Quando se fala em Custo ABC, que se sobrepõe ao Custo Brasil tão difundido em passado recente mas agora pouco lembrado pelos economistas, quando se fala em Custo ABC, dizia, não se pode esquecer também da proteção ao patrimônio privado. Contar com veículo próprio é estar preparado para estocada direta no bolso, porque o que está aparentemente definido hoje pode estar pior amanhã.
Dou um exemplo pessoal: o veículo do qual faço uso sofreu cavalar aumento de custo na renovação do seguro. Descobri no bolso, após um ano de uso e um assalto estranho, que a marca e o modelo estão na rota de interesse prioritário dos bandidos. Conta o veículo com alguns acessórios de fábrica que jamais fiz questão de adquirir. O vendedor foi mais ágil no convencimento sem me alertar sobre a potencialização de me defrontar com alguém de arma em punho.
Não vou me dar ao trabalho de pesquisar o quanto o mesmo veículo de que faço uso custa em termos de apólice de seguro em outro Município fora da órbita da região e mesma da metrópole paulistana, mas é certo que os valores são bem menos salgados fora daqui. E nada é mais lógico, como cansei de escrever enquanto o Diário do Grande ABC, lá atrás, nos anos 1990 e começo dos anos 2000, defendia uma equalização de valores sem considerar as diferenças territoriais de riscos.
É natural que o valor da apólice flutue de acordo com os índices de incidência de furtos e roubos. Aonde os veículos desaparecem com mais rapidez e intensidade em ações criminais os valores contratuais são mesmo maiores. É a versão criminal da lei da oferta e da procura. No caso, a suprema lei que garante que a ocasião faz o ladrão. A Província do Grande ABC não tem enxurradas de ladrões apenas nas esferas públicas.
Bom-mocismo editorial
A precipitação da mensagem do Diário do Grande ABC em levar inclusive ao Editorial uma esfuziante perspectiva de que a Província do Grande ABC estava trafegando em direção a uma drástica redução dos custos de seguros de veículos não surpreende.
A mídia em geral e o jornal da Rua Catequese em particular assumiram posturas de conveniência para atender às expectativas dos leitores que supostamente preferem as boas notícias às más, num clamoroso erro de avaliação de pesquisas mal-ajambradas preparadas por gente que adora vender ilusões. O que o leitorado quer mesmo é mídia de qualidade.
Mais que isso: o que os leitores querem é o confronto de ideias e análises, de modo que possam também avaliar até que ponto estão em dia com a realidade dos fatos e o contexto social. A força do argumento deve prevalecer sempre em detrimento do bom-mocismo jornalístico.
Enquanto insistirem em tentar retratar a Província do Grande ABC como oásis em meio ao inferno metropolitano, e, descuidadamente, caírem em contradição ao oferecer aos leitores mazelas das quais não nos livramos, os jornais da região encontrarão cada vez mais barreiras para superar os obstáculos. Como estancar os hemorrágicos índices de desconfiança do leitorado que permeiam a mídia em geral? -- eis o grande desafio.
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13/11/2024 Diário: Plano Real que durou nove meses (33)