Economia

Quem tem coragem de apostar
na Loteria Imobiliária do Bigucci?

DANIEL LIMA - 26/02/2015

Se a venda de imóveis novos na Capital economicamente exuberante, nossa invejável vizinha, caiu 35% no ano passado, o que teria ocorrido no mercado da Província do Grande ABC? A resposta é uma barbada? Bobagem. Por não ser barbada, faço a seguinte sugestão aos leitores: promovam de brincadeirinha o que chamaria de Loteria Imobiliária Milton Bigucci, em homenagem, entre aspas, ao presidente do Clube dos Especuladores Imobiliários do Grande ABC, também conhecido por Acigabc, entidade mequetrefe que não representa nem de longe os anseios e as responsabilidades da classe de construtores e incorporadores da região.


 


O Clube dos Especuladores Imobiliários é um clubezinho fechadinho, inutilzinho e mentirosinho que, felizmente, aos poucos, vai perdendo a credibilidade de que jamais poderia usufruir, porque é uma fraude quando se trata de responder aos anseios de reformismo da sociedade e, também, de dar vazão às necessidades da própria categoria que representa. O clubinho em questão é assíduo perigo à economia popular na medida em que constrói cenários que elevam os custos de moradia, comprometendo o futuro de gerações penduradas em financiamentos bancários.


 


A Loteria Imobiliária de Milton Bigucci é um jogo de alto risco porque não tem como insumos apropriados estudos que reflitam a realidade dos fatos. Por isso mesmo é a Loteria Imobiliária de Milton Bigucci. Se São Paulo perdeu 35% em vendas no ano passado, frente a 2013, e viu o estoque de imóveis subir às alturas, imagine o que ocorreu na Província do Grande ABC que viveu, pelo terceiro ano seguido, conforme as projeções mais lúcidas e comprováveis, quebra do PIB (Produto Interno Bruto).


 


Universo paralelo


 


Tudo parece muito simples e estaríamos conversados: sofremos um duro e contundente golpe no vácuo da crise econômica que atingiu o País como um todo no ano passado e a Província do Grande ABC movida a indústria automotiva de forma particularmente crítica. Tudo muito simples?


 


Aos apostadores em potencial da Loteria Imobiliária de Milton Bigucci, o mandachuva do setor da construção civil na região, cautela e caldo de galinha são apenas as primeiras recomendações a incômodas dores de cabeça.


 


Segundo o universo paralelo em que vive o dirigente do Clube dos Especuladores Imobiliários do Grande ABC, a possibilidade de os números de vendas de imóveis novos na região serem muito, mas muito mais reconfortantes que os da Capital, é premissa que não pode ser descartada. E sabem por quê? Porque as estatísticas do Clube dos Especuladores Imobiliários têm tanta substância, tanta embocadura, tanta cientificidade, tanta seriedade quanto as últimas declarações da patética presidente Dilma Rousseff sobre o rebaixamento do grau de investimento da Petrobras.


 


Quem acredita que estou a exagerar ante o descortinar de números estapafúrdios do Clube dos Especuladores Imobiliários, produzidos com o propósito exclusivo de enganar o distinto público e, com isso, estabelecer ambiente artificialmente positivo na região, deveria voltar no tempo. Em fevereiro de 2013, portanto há dois anos, escrevi um texto em que explicitava o descontentamento dos pequenos empresários do setor imobiliário com o eterno presidente do Clube dos Especuladores Imobiliários.  “Para esses empresários, chega ao limite do deboche mais uma entrevista coletiva em que Milton Bigucci fez um balanço considerado fantasioso do mercado imobiliário da Província do Grande ABCF. Segundo o dirigente (...) a região superou em 2012 as expectativas ao atingir a venda de 9.407 imóveis, uma alta recorde de 28,74% sobre os números de 2011 e, mais uma vez causar inveja à Capital, que no mesmo período apresentou avanço de apenas 4,8%”, escrevi à ocasião.


 


Gravidade acentuada


 


Reparem nos números discrepantes entre o mercado regional e o mercado comprovadamente muito mais atrativo da Capital vizinha. Se Milton Bigucci teve a coragem ou a desfaçatez de, naquela oportunidade, propagar crescimento da Província de quase 30% enquanto a Capital não chegou a 5%, o que esperar agora que a Capital caiu 35% na temporada passada?


 


Aqueles números de 2012 são mais graves ainda agora que temos em mãos, e publicamos recentemente, que o PIB da Província do Grande ABC naquela temporada sofreu queda de 6,50% em relação a 2011, enquanto a Capital escapou por pouco de dados negativos e cresceu 1%. Como é possível que, naquele 2012, com o PIB Industrial de São Bernardo sofrendo duro revés de 23%, ante 11% do PIB Geral -- o qual considera outras atividades econômicas -- a Província do Grande ABC superou largamente o desempenho imobiliário de São Paulo?


 


Provavelmente até o final deste mês ou começo do próximo algum representante do Clube dos Especuladores Imobiliários aparecerá na praça para divulgar o balanço do ano passado. Não desdenhem de nova agressão à lógica e à realidade.


 


Queda minimizada


 


Milton Bigucci não tem comparecido às entrevistas coletivas em que perguntas indelicadas são proibidas. Desde que provou que ele faz parte da banda podre dos empresários que se locupletam de recursos públicos para benefício corporativo, Milton Bigucci desapareceu dos encontros com a Imprensa. Fossem adotados na investigação da Máfia do ISS da Capital os métodos da força-tarefa que acabou com a farra na Petrobras, Milton Bigucci estaria, a estas altura, sofrendo um bocado para evitar encarceramento. E não estaria usando recursos milionários para tentar criminalizar jornalista independente.


 


Para completar a sugestão sobre a Loteria Imobiliária de Milton Bigucci, diria que se fosse apostar num número que expressasse a situação regional do setor no ano passado (a deste ano, nos dois primeiros meses, é uma calamidade) diria que houve queda líquida de pelo menos 50% de imóveis novos comercializados.


 


Como o Clube dos Especuladores Imobiliários não se dobra à importância de tratar informação econômica com responsabilidade social, é provável que o resultado final apontado não passe de 30% negativos. Pior que isso seria a Imprensa aceitar a fantasia numérica e, bovinamente, apenas repassar as informações oficiais que certamente não serão transmitidas pelo presidente autocensurado. 


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