Se for considerada a margem de erro de três pontos percentuais para baixo e para cima (por que não posso reivindicar a medida?) acertei praticamente em cheio na Loteria Imobiliária de Milton Bigucci, presidente do Clube dos Especuladores Imobiliários do Grande ABC, entidade conhecida oficialmente por Acigabc.
O empresário anunciou ontem à mídia regional os supostos resultados do mercado imobiliário da região na temporada passada. Deu 33,5% de queda em relação a 2013. Um pouco menos que os 35% da Capital. Acredite quem quiser. Apostei em redondos 30% de rebaixamento de vendas em relação à temporada anterior. Não se trata de número que acredite, mas de resultado que considerava ser a base da divulgação de Milton Bigucci. Uma tremenda diferença. Acredito que a queda foi por volta de 50%.
Eu não acredito nos números de Milton Bigucci porque não há disponibilidade de planilhas auditadas para comprovar as declarações do dirigente, um vendedor de imóveis por excelência e competência. Sem contar que o Clube dos Especuladores Imobiliários não conta com infraestrutura de recursos humanos e de materiais para sustentar cientificidade mesmo que rudimentar às informações.
Até prova em contrário que há muito desafio apresentação, as pesquisas do Clube dos Especuladores Imobiliários são uma fraude que fortalecem a certeza de que não adotei uma nova nomenclatura à entidade por birra ou qualquer bobagem, mas como uma voz da consciência profissional que não aceita prestidigitadores travestidos de estudiosos.
De qualquer modo, sabendo que estamos vigilantes, o dirigente classista teve o ímpeto de grandiloquência numérica contido. Em outros tempos Milton Bigucci sairia a campo para minimizar ainda mais os estragos macroeconômicos e microeconômicos sobre o mercado imobiliário regional. O passado o condena e me consagra.
Realidade é outra
No ano passado a queda de vendas de imóveis verticais novos na região foi muito maior que os 33,5% apontados pelo Clube dos Especuladores Imobiliários. É impossível sob qualquer ponto de vista econômico, exceto em situação de calamidade pública ou guerra civil localizada, que a grandiosa Capital vizinha exponha números mais elevados que os da região. Não somos Gata Borralheira e a Capital não é Cinderela por acaso. Nosso PIB desabou no ano passado (os números só sairão em dezembro de 2016) em proporções muito mais acentuadas do que o da Capital. Nosso nível de emprego com carteira assinada também. É só esperar para conferir. Então, o movimento do mercado imobiliário necessariamente seguiria um balanço diferenciado do que foi apresentado por Milton Bigucci.
Acertei no resultado final da Loteria Imobiliária de Milton Bigucci porque conheço essa peça da engenharia de triunfalismo e individualismo da região. Bigucci não dá ponto sem nó. Na hora em que veste trajes corporativos, não faltarão argumentos para tentar levar aos interessados a lógica transversa de que somos mais resistentes às sacolejadas da economia do que a Capital, por isso perdemos menos na venda de imóveis no ano passado e também em anos anteriores. Coisa típica de vencedor, não de liderança classista com responsabilidade social. Nada contra o vendedor, porque cada um responde por suas especificidades. Tudo contra a transposição do modelo à função institucional.
Vou preparar como ombudsman não autorizado um texto específico sobre o noticiário dos jornais da região cujos profissionais compareceram à coletiva preparada pelo Clube dos Especuladores Imobiliários. É sempre interessante confrontar as abordagens e, sobretudo, o tom. Antecipadamente afirmo que o Diário Regional fez a melhor cobertura.
Dados condenatórios
O que salta dos números é que o dirigente Milton Bigucci não teve como esconder alguns dados que dão a dimensão do tamanho da encrenca imobiliária. Por exemplo: as construtoras diminuíram drasticamente o ritmo de produção no ano passado (imaginem então neste ano!). Foram 41,7% de queda (5.077 unidades em 2013 contra 2.760 em 2014). Como as vendas superaram os lançamentos (foram 6.680 unidades no ano passado contra 10.054 no ano anterior), o estoque foi reduzido em 34,3%.
Apesar de o mercado imobiliário oferecer todos os contornos possíveis de que vive situação dramática não só na Província do Grande ABC mas principalmente na Província do Grande ABC, arrimo do setor automobilístico, o dirigente Milton Bigucci insistiu na coletiva de imprensa numa pregação ilusionista sobre a realidade do preço do metro quadrado médio na região. Existisse a Lei de Responsabilidade Informativa, Milton Bigucci seria duramente penalizado e quem sabe a Justiça o obrigaria a adquirir um determinado lote de imóveis ao preço sugerido por ele. Afinal, disse Bigucci que o metro quadrado em Santo André e São Bernardo está cotado entre R$ 5 mil e R$ 6 mil, enquanto em São Caetano fica entre R$ 7 mil e R$ 8 mil. Diadema e Mauá, outros municípios que constam da pesquisa, oscilam entre R$ 4,5 mil e R$ 5,5 mil.
A projeção do valor do metro quadrado é uma das manobras por quem quer levar no bico os potenciais compradores de imóveis. A simples enunciação dos valores sem correspondentes ponderações é um atentado. A média sugerida esconde fundas diferenças entre o mínimo e o máximo, de acordo com localização e o padrão dos imóveis. Não é por outra razão que os jornais de circulação nacional repassam semanalmente aos leitores tabelas completas desses valores levando-se em conta as nuances de cada bairro.
Na Internet
Fosse o Clube dos Especuladores Imobiliários do Grande ABC uma instituição que primasse pela seriedade nas informações e, principalmente, pela transparência pública, sua página na Internet exporia com riqueza de detalhes os cromossomos do setor na região, com amplo detalhamento de dados específicos sobre áreas geográfica socioeconomicamente semelhantes. Seria demais esperar tamanha iniciativa. A medida simplesmente conflitaria com a essência do Clube dos Especuladores Imobiliários -- ou seja, a especulação a serviço de determinados grupelhos que controlam o mercado regional. Os lobos cuidam das galinhas.
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