Economia

Com qual Pirelli vamos contar em
Santo André? Vamos contar mesmo?

DANIEL LIMA - 30/03/2015

Se a emblemática Pirelli deixa transparecer que virou o fio e não tem maiores compromissos sociais com Santo André, a mesma Pirelli que no passado foi tão visceralmente comprometida com Santo André, o que esperar de outras empresas?


 


A reportagem sobre o Clube Atlético Pirelli de grandes conquistas no esporte, carregando a imagem de Santo André a todos os cantos do mundo, é uma iniciativa bastante oportuna do Diário do Grande ABC desta segunda-feira. Talvez sirva de lição às autoridades públicas -- além evidentemente dos próprios executivos da multinacional agora de controle chinês -- para que não tratem a sociedade regional com desdém do capitalismo de resultados. No fundo, no fundo, o desdém do capitalista de resultados carrega o mesmo mal do desdém do sindicalismo partidário, ou seja, olha para o próprio umbigo de interesses corporativos.


 


Não fossem as entidades econômicas, sociais e sindicais de Santo André e da região simples nomenclaturas em fuga permanente à responsabilidade de contribuir com a população, nestas alturas do campeonato a ameaça que paira sobre a fábrica da Pirelli não ficaria restrita à preocupação dos trabalhadores que lhe servem e também da mídia atenta às notícias.


 


Há limites para que o capitalismo não vire máquina de exclusão social bem como também para que o sindicalismo não sirva exclusivamente a seus dirigentes. E também a interesses político-partidários de mobilidade social privilegiada. Como o que se viu nesses 12 anos do governo petista. A Província do Grande ABC está refém de interesses localizados que se autoprotegem em detrimento do todo.


 


Nada com Dilma Rousseff


 


A Pirelli italiana não fez negócio com os chineses porque supostamente pretende ajudar a presidente Dilma Rousseff a estender a teia de proteção social inaugurada por Lula da Silva e que, nestes dias, se vê que não passou de ilusão temporária à custa de um orçamento que estourou de vez com o escândalo da Petrobras e a constatação de que não se vive apenas de consumo. 


 


A Pirelli está no mercado globalizado agora com chineses e italianos de mãos dadas porque a competição internacional é cada vez maior. Daí a importância de instâncias da sociedade alertarem os executivos da empresa sobre aspectos macrossociais relevantes. Na medida em que uma empresa, qualquer empresa, sente que o terreno de rentabilidade máxima em que pisa é fértil porque não há forças a pressionar por métodos mais civilizados, o fundo do poço social é o destino compulsório.


 


Não e pretende, é claro, qualquer reação que cheire a protecionismo. Mas é preciso jogar com transparência. Se a fábrica de Santo André vier a constar da lista de unidades fora dos parâmetros de competitividade desejada, que as cartas sejam colocadas à mesa de forma clara, objetiva, longe do exclusivismo de grupos fechados e de interesses específicos. Na medida em que socializar informações relevantes a Pirelli chinesa estará mais próxima dos bons tempos de governança social da Pirelli italiana que desembarcou em Santo André no fim da terceira década do século passado.


 


Talvez a notícia que incomoda a todo mundo que pretende ver algo de novo no front da região, sobretudo o estancamento das perdas da indústria de transformação, possa ser o ponto inicial de abordagens multilaterais. Assistir passivamente a saída total ou parcial de empreendimentos industriais se tornou tradição na região, senão com a benção de entidades que se dizem representantes do conjunto de empreendedores, pelo menos com a omissão deliberada. Já os sindicalistas se especializaram mesmo em omitir informações, embora sejam os primeiros a tomar conhecimento sobre a retirada industrial.


 


Os sindicalistas sabem que têm culpa do cartório e por isso mesmo se sentem constrangidos em admitir que as políticas de relacionamento entre capital e trabalho outrora importantes para o desenvolvimento regional se tornaram contraproducentes, quando não agressivamente dissuasivas a novos investimentos do setor, porque exageradamente fundamentalistas em favor de uma minoria de trabalhadores quando confrontada com a população como um todo.


 


Cadê a secretária?


 


Fico mesmo encafifado com a malemolência da secretária de Desenvolvimento Econômico de Santo André diante da inquietação que ronda os trabalhadores da Pirelli e também o comando da própria Prefeitura, porque aquela indústria é uma das maiores geradores de impostos orçamentários do Município. Fosse frondosa de liderança aplicada como é de fluvialidade na verbalização de conceitos rastaqueras, Oswana Fameli já teria se mexido para levar à sede da Pirelli o grupo inteiro de integrantes do chamado Conselho de Desenvolvimento Econômico, instância auxiliar que, até prova em contrário, não passa de repeteco de iniciativas marquetológicas sem embocadura prática.


 


Uma mobilização densa de representantes da sociedade, com ampla divulgação da mídia, poderia alterar os rumos provavelmente já planejados de utilização da unidade da Pirelli em Santo André.  Mas o que se pode esperar de uma secretaria que serviu apenas de troca de favores entre a Associação Comercial e Industrial de Santo André e o então candidato a prefeito Carlos Grana?


 


Troca de favores mesmo, porque fosse a iniciativa coisa séria, de participação daquela entidade na gestão municipal de Santo André, tudo deveria ser consequência de uma agenda de compromissos à qual o prefeito petista estaria vinculado até a medula. 


 


O que está em jogo nesse momento em Santo André não é apenas o futuro de uma fábrica com quase três mil empregos e muitos milhões de impostos recolhidos que alimentam o orçamento municipal. O divisor de águas que se apresenta é cristalino: ou se constrói um conjunto de medidas de relacionamento com o setor de transformação industrial depois de mais de duas décadas de debandada geralmente silenciosa ou enterrem de vez e impiedosamente todas as supostas representações sociais, econômicas e sindicais organizadas em proveito de seus dirigentes.   


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