Estou indo para uma instância de direção a ser acrescentada ao organograma do Diário do Grande ABC porque uma guinada histórica da mais que cinquentenária publicação aparece num horizonte próximo e cujos resultados de curto, médio e longo prazo estão atrelados à própria reação e mobilização da sociedade regional. Eis o resumo da resposta que estava a dever aos leitores desde a edição de ontem.
A convite de um de meus principais alvos críticos durante o período em que dirigiu o Esporte Clube Santo André, o empresário Ronan Maria Pinto, presidente daquela companhia, estou integrando um projeto de transformações. Vou ser uma peça importante, mas jamais única do planejamento estratégico que será revelado em momento oportuno.
Talvez se fosse outro o histórico de relacionamento com o ex-dirigente esportivo Ronan Maria Pinto, dificilmente aceitaria voltar ao jornalismo diário, mesmo que decidido como estou a preservar-me do cotidiano asfixiante de edição. Mas sobretudo porque a proposta partiu de Ronan Maria Pinto me senti na obrigação de aceitar. A grandeza do gesto do empresário que, comungando comigo, assegura estar preocupadíssimo com o futuro da região, impediu-me de dizer não. Se recusasse, me sentiria intimamente devedor junto à sociedade.
Uma reforma conceitual, filosófica, da atuação do Diário do Grande ABC, que já se ensaia nestes dias de combate à falta de transparência da Pirelli, é tudo com o que sonhei como jornalista. Sonhei, não, é tudo que procurei executar à frente desta revista digital, mais do que no período de duas décadas no comando editorial da revista LivreMercado.
Se tudo se desenvolver como o que já está delineado como percurso editorial, o Diário do Grande ABC dará uma guinada extraordinária como veículo de comunicação mais importante da região e, acreditem, servirá de espelho a tantas outras publicações que igualmente se perpetuam apenas como fornecedoras de informações jornalísticas. A interatividade com representações da comunidade regional será o mantra do Diário do Grande ABC.
Entretanto, nada será possível desenvolver para retirar a Província do Grande ABC do estado de anomia em que se encontra há muito tempo se não houver engajamento das instituições e da sociedade como um todo.
E é nesse ponto que o Diário do Grande ABC se tornará muito mais que um intermediador de informações. O jornal vai agir vigorosamente para ajudar a aquecer a temperatura de cidadania e de responsabilidade social, principalmente daqueles que estão estacionados em postos chaves na administração pública, nas instituições empresariais, nos sindicatos e em instâncias sociais.
Local versus global
O fortalecimento do jornalismo impresso regional – com desdobramentos de socialização das informações nas plataformas digitais – é a única saída à crise internacional que ainda atinge esse segmento da mídia. Magnatas estão atomizando projeções de que o jornalismo impresso regional não teria futuro na Era da Tecnologia Digital. Eles investem milhões em aquisições de marcas nos Estados Unidos e na Europa porque descobriram que comunidades locais têm demandas específicas que a globalização não atende, quando não as agrava, especialmente em busca de qualidade de vida.
Os problemas locais que nos afetam e nos sensibilizam não podem ser resolvidos em larga escala senão com mobilizações. Uma constatação tão óbvia quanto preciosa depois do fetiche de que o mundo sem fronteiras seria a salvação da lavoura para a humanidade. Muito pelo contrário, como se vê, sintomaticamente, no caso da Pirelli de Santo André, cujo controle acionário foi adquirido por chineses ávidos por competitividade a qualquer custo.
O futuro que já começou a ser construído no Diário do Grande ABC das duas últimas semanas é apenas um ensaio do futuro que virá como resultado do somatório de experiência e conhecimento dos profissionais que participarão da força-tarefa direcionada a novas premissas editoriais com os protagonistas da vida econômica e social da região.
Errará feio, muito feio, quem projetar o desenhar da nova política editorial e corporativa do Diário do Grande ABC como algo simplesmente inquietante às cidadelas corporativas, casos das entidades de classe empresarial, sindicatos de trabalhadores, Clube dos Prefeitos, Agência de Desenvolvimento Econômico, parlamentares, Executivos, unidades da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e tantas outras agremiações.
Engajamento geral
Por que errará feio? Quem estiver a imaginar eventuais cenários de constrangimento público decorrente de negligência a uma agenda de desenvolvimento regional que emergiria da nova postura do Diário do Grande ABC provavelmente só estará enxergando fantasminhas camaradas. O que todos terão mesmo pela frente serão barricadas de reflexão a lhes cobrar engajamento compulsório e permanente no macroprojeto de recomposição de forças da região.
Aos preguiçosos por natureza ou esperteza provavelmente não restará saída senão irem à luta para valer. Ou então, em suas respectivas classes, enfrentarem as consequências de pressões daqueles que querem contribuir.
A Província do Grande ABC está inadimplente em cidadania e em responsabilidade social entre outras razões porque historicamente os mandachuvas e mandachuvinhas jamais deixaram de olhar para o próprio umbigo. O que o Diário do Grande ABC pretende apresentar de forma planejada e duradoura a cada agente econômico e social em atividade não é outra coisa senão um imenso espelho de articulação reformista.
Ao Complexo de Gata Borralheira acrescentamos histórica e contraditoriamente o Complexo de Narciso. Essa esquizofrenia cultural não passa mesmo de desculpa esfarrapada para fugir à responsabilidade de encarar novas realidades que transformações principalmente econômicas nos impuseram sem que houvesse reação de forma corajosa, afirmativa e prospectiva. Finalmente, chegou a hora de acertar as contas com o futuro.
O empresário Ronan Maria Pinto está criando uma oportunidade de ouro para deixar um legado inesquecível à sociedade regional. Não estarei de volta ao Diário do Grande ABC depois de 10 anos (e após 16 anos naquele endereço, divididos em duas etapas) por outra razão senão como portador coletivo de uma demanda reprimida e nem sempre detectada do conjunto da sociedade carente de representatividade para valer em várias instâncias de poder.
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13/11/2024 Diário: Plano Real que durou nove meses (33)