Economia

O que o discurso de Levy tem a ver
com o sindicalismo da Província?

DANIEL LIMA - 14/05/2015

Tem tudo, tudo a ver. O que o ministro da Fazenda disse ontem em Londres é o que tenho repetido à exaustão sem que decibéis de indignação reverberem em outras mídias locais. Afinal, criamos uma cultura de respeito exagerado (e de medo ainda muito maior) ao sindicalismo trabalhista regional, tido como revolucionário lá atrás, quando emergiu Lula da Silva e sua turma, mas que ao parar no tempo se tornou fardo pesadíssimo ao conjunto da sociedade desta Província.


 


O ministro imposto ao governo Dilma Rousseff porque o governo Dilma Rousseff estava indo à bancarrota disse em Londres, segundo manchete de página do Estadão, que a alta dos salários depende de produtividade.


 


Falem algo semelhante aos sindicalistas, principalmente das montadoras e das autopeças em São Bernardo, e o que terão de resposta é alguma coisa que lembre reacionarismo, direitismo, essas esquisitices ditas por gente sem cultura, muitas vezes sem vergonha na cara e preocupada apenas com a sobrevivência da imagem de revolucionários e de defensores dos pobres trabalhadores.


 


O ministro do governo petista que não é governo petista porque o governo petista desarrumou a economia em nome de um social que já não se aguenta em pé disse em Londres que o Brasil não pode continuar a oferecer reajustes de salários sem aumento de produtividade. “Sem um forte ganho de produtividade, não podemos apoiar salários mais altos”, disse o ministro durante a abertura do “Brazil Capital Market Day”, na Bolsa de Valores de Londres.


 


Provavelmente os mais de mil participantes do encontro ficaram assustados com a declaração do ministro brasileiro porque é inconcebível neste mundo sem fronteiras econômicas que algo tão elementar ganhe destaque num discurso. Mas é assim que funciona mesmo a economia verde e amarela.


 


Maquiavelismo justificado


 


Na Província, então, sob o jugo de sindicalistas carreiristas por excelência, gente que disputa a ferro e fogo um lugarzinho de destaque na hierarquia de instituições mantidas pelos poderes públicos, tudo é superlativo. E sempre sob o embalo da indústria automotiva, protegida pelo governo federal em nome do espalhamento de riquezas socioeconômicas e também por conta de ser uma vaca leiteira de impostos.


 


De vez em quando, quando emperra a roda do equilíbrio fiscal, como agora, por conta de abusos prolongados, há um aperto geral e os dramas de nossa baixa competitividade premida também pela excessiva carga tributária emergem nas manchetes com o anúncio de uma diversidade de casos de afastamento do trabalho, preliminares do que acaba se convertendo em fluviais demissões.


 


Sonho com o dia em que o desmonte da indústria de demagogia e corporativismo de sindicalistas graduados da região se fará realidade. É verdade que é um sonho quase maquiavélico, porque tem tudo para se tornar um pesadelo a milhares de trabalhadores. Talvez seja a única saída no labirinto em que nos metemos ao acreditar que o universo conta com apenas os 840 quilômetros quadrados de território da Província e, com isso, portanto, não temos de dar a menor bola ao que se passa tanto nas proximidades de municípios paulistas e em outras geografias estaduais como no mundo que consta de cadeias de produção.


 


O grau de entendimento de que a crise econômica da Província do Grande ABC está assentada na baixa competitividade, subproduto da quebra contínua de produtividade, ainda não está enraizado na sociedade em geral. A mesma sociedade que, imersa na bobagem cultivada pelos oportunistas de sempre, acha-se mais importante do que é porque contamos com participação expressiva na indústria automotiva.


 


Mal sabe a maioria que esse setor que representa o que chamo de Doença Holandesa contamina o restante da economia regional com vícios corporativo-trabalhistas dos quais os sindicalistas não abrem mão nem mesmo ante a constatação de que os excessos minam também a resistência local desse mesmo setor.


 


Conciliar responsabilidades


 


Longe de mim propagar uma ideia tola de que precisamos acabar com o setor automotivo. Seria insanidade completa. O que devemos é conciliar interesses e responsabilidades. As montadoras e as autopeças que estão na região e que sobraram da desindustrialização que já completou duas décadas só sustentarão investimentos locais na medida em que deformações ditadas pela ausência de critérios de competitividade não extrapolem o equilíbrio dos negócios.


 


A pauta sindicalista de uma esquerda com pouca responsabilidade social e exacerbadamente corporativista, jamais sugeriu como ponto de negociação algo que lembrasse o sentido abrangente de produtividade.


 


O enxugamento nas linhas de produção de montadoras e autopeças da região é uma longa jornada iniciada há muito tempo, com períodos de recuos, e que agora ganha impulso estridentemente anunciado nas manchetes de telejornais. Geralmente quando escapamos de uma sequência de perdas no setor é porque encontramos a mão visível do Estado a proteger empresas e trabalhadores num processo cuja conta a pagar não custa a chegar porque não há almoço grátis.


 


O empobrecimento contínuo da Província do Grande ABC, expresso principalmente nos dados do índice de potencial de consumo, em essência muito mais apetrechado que o PIB (Produto Interno Bruto), tem nome e sobrenome em primeiro grau: corporativismo sindical. Outros vetores, como a ausência de macroinstitucionalidade, só agravam o quadro de arbitrariedades e egoísmo. 


 


O que isso significa? Significa que para os dirigentes sindicais, sobremodo do setor metalúrgico, o que interessa é a tropa empregada sob sua orientação, nada mais.


 


Enganando a plateia


 


Ainda recentemente, para se ter ideia mais próxima do quanto se manipulam informações, o Sindicado dos Metalúrgicos de São Bernardo comemorou ruidosamente suposto recuo da Volkswagen em demitir 800 trabalhadores e, logicamente, se calou em seguida, quando aquela lista de demissões foi confirmada com a utilização do instrumento chamado PDV (Programa de Demissões Voluntárias).


 


Ou seja: a suposta fragilização da atividade sindical que teria se dado com a posição unilateral da Volkswagen, sempre na visão dos sindicalistas, ganhou roupagem de poderio de negociação, também na visão sindicalista, cujo resultado final foi a confirmação do resultado anterior. Durma-se com uma malandragem dessa. 


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