Imprensa

Caso Semasa: por que propina
virou extorsão? Perguntas ao MP

DANIEL LIMA - 01/06/2015

Vamos enviar amanhã, terça-feira, ao promotor criminal de Santo André, Roberto Wider Filho, uma série de indagações que compõem nova Entrevista Indesejada desta revista digital. Está em pauta, como prometido, o escândalo do Semasa, denunciado há três anos nas páginas do Diário do Grande ABC e encerrado na fase de diligências do Ministério Público com um parecer inacreditável: foram denunciados à Justiça apenas um dos lados da moeda de trocas delinquenciais, o ex-prefeito Aidan Ravin e uma série de servidores públicos e executivos que atuavam naquela autarquia de saneamento básico de Santo André.


 


Por que uma investigação seguidamente tipificada pelo promotor criminal como caso de propina se transformou em caso de extorsão, poupando-se os empresários que participaram das malandragens?


 


Não existe por parte deste jornalista outro objetivo senão representar a sociedade no questionamento ao promotor público de Santo André. A denúncia de que apenas um time participou do jogo de safadezas que se instaurou no Semasa durante a gestão de Aidan Ravin precisa de explicações e, mais que isso, de um contraditório fértil, ao qual este jornalista não se furtaria a promover, por mais que indigesto o trabalho possa ser avaliado.


 


Interesses cruzados


 


Temos certeza de que o promotor Roberto Wider Filho não se furtará a responder aos questionamentos que serão transpostos aos leitores desta publicação digital. Afinal, depois de quase três anos de investigações, Roberto Wider Filho provavelmente terá força de argumentos para demover este jornalista e milhares de leitores de uma dúvida cruel: como é possível que num jogo de interesses mútuos e de malandragens recíprocas, compartilhadas em silêncio porque o silêncio convinha a todos até que surgiu um denunciante, como é possível que apenas um time de uma determinada camisa seja colocado na zona de tiro da Justiça?


 


Acreditar que o escândalo do Semasa tenha tido apenas uma mão de direção ou de contramão de direção é o mesmo que sugerir que as roubalheiras na Petrobras não teriam a participação tanto de executivos da maior estatal brasileira como de representantes de empreiteiras, fornecedores de empreiteiras e de poderosos ou raia miúda da política denunciados pela força-tarefa do Ministério Público Federal e da Polícia Federal.


 


Também pode ser rebocado como um caso semelhante ao do Semasa a Máfia do ISS em São Paulo, denunciada pela Controladoria-Geral do Município e pelo Ministério Público Estadual pouco tempo depois do estouro do escândalo em Santo André.


 


Aperfeiçoamento delituoso?


 


O esquema desbaratado, que envolve tanto servidores como empresários que assaltaram os cofres públicos no pagamento do Imposto Sobre Serviços do setor de construção civil, tem coreografia de ilegitimidades sem grandes contrastes com o escândalo do Semasa. Inclusive com alguns servidores públicos denunciados na Capital que -- coincidência ou consequência? – atuaram durante algum tempo na gestão de Aidan Ravin. Há quem afirme que eles prepararam o terreno das falcatruas por conta de acordo político, mas não se deve levar a informação ao extremo da compulsoriedade. Roubalheiras nas conexões entre o setor imobiliário e servidores públicos são tão antigas quanto a prostituição. Possivelmente eles apenas tenham oferecido uma contribuição ao aperfeiçoamento das operações.


 


A conclusão do caso Semasa, na versão da denúncia do promotor Roberto Wider Filho, é um ponto fora da curva da lógica desse tipo de contrabando que atingiu diretamente a legislação de uso e ocupação do solo por servidores desonestos e empresários imobiliários que estão longe de serem vítimas, como sugeriu o representante do Ministério Público.


 


É uma falácia a ideia cultivada pela maioria dos acomodados, quando não dos acovardados, de que o parecer de um promotor criminal é algo que não se deve confrontar. Somente se admitiria a renúncia ao debate em regimes ditatoriais, quando os poderosos de plantão são ou se pretendem intocáveis. Certamente o promotor criminal Roberto Wider Filho não se oporá a responder aos vários pontos considerados nebulosos da denúncia oferecida à Justiça.


 


Mudanças de rota


 


O principal desses pontos, aliás, motivou o título deste artigo e, alerta aos leitores sobre o grau de dificuldades que se opõe ao promotor criminal. Ou alguém é capaz de garantir que é sustentável a posição de uma autoridade ministerial que durante todo o processo de investigação disse à imprensa que o escândalo do Semasa se tratava de um caso de propina e ao final da jornada apresentou conclusão completamente antagônica, de extorsão.


 


O que isso significa? Significa que o árbitro do jogo envolvendo duas camisas diferentes estava decidido a mostrar o cartão vermelho para grande parte dos jogadores das duas equipes e, inexplicavelmente, só contemplou uma das agremiações. Os empresários ficaram livres de qualquer acusação do MP, como se o passado de declarações públicas do promotor não tivesse importância alguma – e muito menos nexo.


 


Afinal, o que fez o promotor Roberto Wider Filho mudar de trajeto denunciatório? Este jornalista tem informações suficientes, de fontes insuspeitas, que as declarações do denunciante Calixto Antônio Júnior, advogado instalado no Semasa para representar o então prefeito Aidan Ravin, são completamente seguras. Ou seja: a contraface do dinheiro de propina para a liberação das chamadas licenças ambientais eram o manancial de irregularidades no uso e ocupação do solo em Santo André, cujo rito delituoso teve origem na Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação, então sob o comando de Frederico Muraro. 


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