Economia

Diário alça desativação da Basf
à manchetíssima. Novos tempos

DANIEL LIMA - 02/06/2015

Para os leitores terem uma ideia do quanto minhas funções no Diário do Grande ABC como espécie de ombudsman e consultor são uma ponte estreitíssima em que a ética deve prevalecer sempre, voltei àquela redação após 10 anos e ali permaneci durante uma hora e meia. Tempo suficiente, fosse meu trabalho o que imaginam muitos, para tomar conhecimento antecipado da manchetíssima do dia seguinte. Mas, assim como todos os leitores, só tive acesso ao assunto quando recebi um exemplar em minha residência, hoje de manhã.


 


Estar com a cúpula da Redação – Sérgio Vieira, Evaldo Novelini e Beto Silva – e também com a diretora Elaine Matheus, não me autoriza a ser abelhudo. Só tomo conhecimento do que vai sair nas páginas do Diário do Grande ABC como assinante da publicação. E isso é ótimo. Estou naquela empresa como agente cultivador de maratonas, não de corridas curtas.


 


Escrevi tudo isso para dizer que sai da redação do Diário do Grande ABC ontem no começo da noite disposto a escrever mais um capítulo sobre desindustrialização na região. Primeiro, abordando uma verdade que precisa ser repassada a todos sem malabarismos semântico ou factual: a introdução do temário “desindustrialização” na agenda de 10 pontos viscerais que o Diário do Grande ABC imprimiu em supereditorial de primeira página em 11 de maio último, quando completou 57 anos de circulação, foi do diretor de redação Sérgio Vieira. Ele assim o propôs durante uma reunião no sétimo andar daquela empresa juntamente com o presidente Ronan Maria Pinto e a doutora Elaine Matheus, além deste jornalista. Embora nenhum outro profissional de comunicação tenha se metido tanto na selva da raquitinização da indústria de transformação da região, subi às alturas quando ouvi da boca de Sérgio Vieira a pronúncia de um verbete maldito durante décadas naquele jornal.


 


Rompendo grilhões


 


Embora não fosse a primeira vez sobre o controle acionário de Ronan Maria Pinto e o controle editorial de Sérgio Vieira que o Diário do Grande ABC registrava o verbete, já que apareceu em algumas matérias antes daquela reunião, e também em editoriais, a proposta de inserir de forma tão explícita aquela vicissitude econômica numa espécie de carta-compromisso da publicação foi surpreendente.  A iniciativa de Sérgio Viera foi aprovada primeiro com a troca de olhares dos interlocutores, depois manifestadamente. O Diário rompia, naquele instante, grilhões que o prendiam ao passado ditado por forças estranhas à redação e à direção corporativa.


 


A manchetíssima da edição desta terça-feira do Diário do Grande ABC (“Crise faz Basf acabar com unidade em São Bernardo”) seria impensável em outros tempos. Principalmente durante o longo período em que a influência publicitária na linha editorial do jornal era pronunciadamente nociva à credibilidade da informação entre leitores mais exigentes.


 


O que quero dizer com isso, ao me referir à manchetíssima de hoje, como se outras manchetíssimas já não dessem esse indicativo de fertilidade moral e ética, é que o Diário do Grande ABC não parece recuar da decisão de engrenar uma quinta marcha em busca de uma regionalidade que não depende somente de suas páginas, é claro. É a sociedade desorganizada – que o jornal ainda insiste em chamar de sociedade organizada, quando de fato há apenas grupos organizados e na maioria dos casos maliciosamente mancomunados entre si – que terá de, mais que dar um aval de confiança total aos insumos da publicação, colocar a mão na massa e ajudar na reconstrução da institucionalidade regional.


 


Centenas de textos


 


Quando sai da redação do Diário do Grande ABC ontem quase noite voltei ao meu escritório para cavoucar a expressão “desindustrialização” no acervo digital desta publicação. Queria saber quantas das matérias que constam dessa montanha invisível de textos, que o mecanismo de busca desvenda, referiam-se ao tema de forma substantiva ou tangencial. Posso estar redondamente enganado, mas duvido que esteja e sou até capaz de apostar: nenhuma mídia impressa ou digital da região coleciona número tão expressivo de matérias que pelo menos cita o termo “desindustrialização” quando se trata do território desta Província.


 


Com este texto, nada menos que 310 se referem ao assunto. Isso mesmo: 310. Desse total, quase a metade está na editoria de “Economia”, com 142 matérias. A primeira das quais, aliás, simboliza uma luta de décadas deste jornalista para convencer a sociedade regional de que a pujança industrial que veio do passado, principalmente como a chegada das montadoras de veículos, estava a desmoronar. “Que mentira que lorota boa...”, de 5 de março de 1998 (portanto há quase duas décadas) é a mais antiga da rubrica de “Economia”. Trata de uma das muitas escaramuças nas quais me envolvi com agentes públicos falastrões, contratados para enfeitar um pavão que já não tinha tantas penas. O leitor que pretenda acessar o texto em questão deve direcionar o clique para o mecanismo de busca desta revista digital e digitar todo ou apenas parte do título mencionado.


 


Reconstruindo a história


 


Embora aquela matéria tenha simbologia especial, entre outras razões porque é antiquíssima na abordagem do esfarelamento contínuo da indústria regional, descubro mais abaixo no resumo do verbete “desindustrialização” que a tecnologia me oferece que um pouco antes disso, na editoria de “Regionalidade”, em marco de 1997, sob o título “Futuro do Grande ABC pertence à sociedade”, uma Reportagem de Capa da revista LivreMercado, produzida por este jornalista. A palavra amaldiçoada está ali várias vezes para espicaçar comodistas, triunfalistas e vagabundos sociais, políticos, econômicos e sindicais que fizeram de tudo durante muito tempo para esconder os troços mal-cheirosos que a debandada de empresas, quando não o sucateamento e o desparecimento, provocou no tecido regional.


 


Convém lembrar que a origem do termo “desindustrialização” no sentido de enfraquecimento da economia regional, não como negação desse fenômeno, como sempre o fizeram principalmente os acadêmicos, remonta a tempos ainda mais idos, mas cujas matérias de LivreMercado, que dirigi por duas décadas, ainda não foram integralmente transpostas a esta revista digital.


 


A manchetíssima do Diário do Grande ABC de hoje representa, portanto, mais que um voto de confiança dos leitores mais exigentes, como eu, a uma publicação quase sessentona e que, nos últimos tempos, decidiu rasgar a fantasia da enrolação que forças estranhas à redação, localizadas em esgotos éticos e morais, procuraram estender aos seus domínios editoriais, alcançando certo sucesso, para desgraça da sociedade desorganizada.


 


O Diário da manchetíssima da fuga de mais uma empresa da região é o Diário que todos esperam encontrar a cada dia na soleira da porta de casa ou na banca de jornal. Somente o choque anafilático de realidade nua e crua poderá recolocar a região na trilha do desenvolvimento econômico. Outras publicações locais, que fingem que nada está a encharcar o barco à deriva, que saiam do imobilismo.


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