Imprensa

Promotor prefere silêncio como
resposta à Entrevista Indesejada

DANIEL LIMA - 26/06/2015

A imagem precisa ser reiterada para que se cristalize o tamanho da barbeiragem: o que se consumou durante muito tempo como sexo consensual virou estupro. Ou seja: o escândalo do Semasa, ou Máfia do Semasa, que há três anos envolveu dezenas de empresários e servidores públicos durante a gestão do prefeito Aidan Ravin, em Santo André, só teve um lado do balcão denunciado pelo promotor criminal Roberto Wider Filho. Os empresários ficaram de fora. E Roberto Wider Filho respondeu aos questionamentos desta revista digital, no compartimento editorial de “Entrevista Indesejada”, com o silêncio de quem prefere não prestar esclarecimentos indispensáveis. 


 


Provavelmente o promotor Roberto Wider não tenha se manifestado às indagações deste jornalista porque não teria informações consistentes para justificar a denúncia que elencou tão-somente o ex-prefeito Aidan Ravin e outros 10 servidores públicos. Depois de colhido no contrapé de um deslize que precisaria remediar, Roberto Wider preferiu o caminho do desinteresse em se apresentar aos leitores.


 


Quando afirmou, como consta do grupo de perguntas, que o escândalo do Semasa era tipicamente uma ação em que propinas foram a moeda de troca para a liberação das chamadas licenças ambientais, e quando ofereceu a denúncia dizendo que se tratou de extorsão, Roberto Wider Filho deu uma guinada conclusiva que não condiz com a segurança e coerência informativas que a sociedade esperava.


 


Acidez explícita


 


Por que será que o promotor criminal de Santo André que atuou no caso Celso Daniel, no qual ainda hoje responde de forma enfática à mídia sempre que aquele crime volta à pauta, optou pelo silêncio no caso do Semasa? Por que Roberto Wider Filho preferiu fugir de um debate fértil em potencial de esclarecimentos? Este jornalista, que colocou nas cordas o promotor criminal, não tem compromisso com a unilateralidade de informações. Por isso se dedicou a ouvir o outro lado de forma profundamente contraditória, não adocicada como, ao que parece, ele preferiria. Entrevista Indesejada é isso mesmo.


 


O silêncio embaraçador do promotor criminal Roberto Wider Filho incomoda exatamente por isso, porque não oferece aos consumidores de informações um apanhado de justificativas que o levaram a retirar da lista de pecadores os bandidos do setor imobiliário que se locupletaram da proximidade com o Poder Público municipal.


 


Num caso semelhante ao do Semasa, a Máfia do ISS de São Paulo ganhou impulso completamente diferente. Os dois lados do balcão de facilidades, tradição sem retoques quando se trata de negociatas entre mercadores imobiliários e gestores públicos, estão sendo devidamente enquadrados nos rigores da lei. Vários servidores já estão às voltas com a Justiça enquanto os empresários começaram a pagar multas e outros ônus pela parceria à margem da lei. Só não foram presos ainda, mas é possível que a Operação Lava Jato estimule essa possibilidade.


 


Mais roubalheira


 


Tudo está a indicar que, além da carência de infraestrutura física e de recursos humanos, o Ministério Público instalado na Província do Grande ABC precisa fazer um curso com quem entende do ramo imobiliário para não só detectar como punir os transgressores. Só os casos denunciados por este jornalista seriam suficientes para colocar ordem no galinheiro de contravenções cujos resultados das apurações, pífios, estimulam novas jornadas de roubalheiras.


 


O caso do Residencial Ventura, em Santo André, e do Marco Zero, em São Bernardo, são tão escrachadamente sólidos em maracutaias que a pergunta mais sensata é saber por que o que era tão evidente e monolítico se tornou fantasioso na interpretação de mal traçadas linhas do MP.


 


A realidade de que máfias imobiliárias tomaram conta do tecido econômico da Província do Grande ABC não diverge do que se encontra na vizinha Capital. A diferença, menos quando se contrapõem as investigações da Máfia do ISS ao escândalo do Semasa, ao escândalo do Ventura e ao escândalo do Marco Zero, está na apuração do MP.


 


Monotrilho de vantagens


 


Uma força tarefa do MP, cujo resultado seria estrondoso e compensaria largamente os escorregões mencionados, seria uma tomada geral e devassadora do movimento de compra e venda de imóveis que antecedeu a promulgação da nova lei de uso e ocupação do solo no entorno do previsto itinerário do monotrilho. O esquadrinhamento das áreas mais preciosas de São Bernardo, catapultadas a uma valorização extraordinária com os novos dispositivos legais de ocupação, possibilitaria a confirmação de que a Administração Luiz Marinho, em combinação com o Clube dos Especuladores Imobiliários chefiado pelo empresário Milton Bigucci, deitaram e rolaram na obtenção de resultados mais que fantásticos na projeção de retorno dos investimentos.


 


O Ministério Público Estadual precisa dar um exemplo para o Brasil a partir da Província do Grande ABC ao criar uma divisão específica de investigações no setor imobiliário. Os bandidos serão trancafiados e a concorrência no setor será muito mais promissora. O Clube dos Especuladores Imobiliários, por exemplo, poderia até voltar a se utilizar, sem constrangimento, da denominação com que você concebido, embora de mau gosto atroz.


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