Deve ser grande, muito grande, mas não existe entidade regional para desvendar esse enigma, entre outras iniciativas. Contrariamente ao sindicalismo de trabalhadores, fortemente organizado no setor metalúrgico por conta das montadoras de veículos, nossas autopeças vivem praticamente isoladas entre si, quando não combatendo o duro combate da concorrência fratricida estimulada principalmente pelas mesmas montadoras de veículos e as seletivas sistemistas, que gozam de proximidade especial das grandes empresas.
Sobram às autopeças da região, portanto, os custos de estarem no entorno das montadoras. O sindicalismo já foi pior no tratamento cruel de impor às autopeças os rigores da pauta de reivindicações das montadoras, mas os rescaldos deixaram marcas profundas.
O jornal Valor Econômico de hoje traz matéria providencial sobre o setor de autopeças no País nestes tempos de produção automotiva decepcionante entre outros motivos porque já não é possível viver de fantasias. Não há possibilidade de entender até que ponto vai o buraco regional nas autopeças. Não há quem cuide organizadamente do poço regional, entre outras razões porque não temos autonomia institucional.
Gataborralheirismo
A subalternidade empresarial de setores produtivos é um modelo draconiano de representação, perfil que contribui ao descontrole de mecanismos de abordagens da economia regional como um todo.
Só o fato ao qual chamo atenção no titulo deste artigo seria suficiente para dar contornos de desqualificação estratégica da classe de produtores locais -- sobretudo produtores de pequeno e médio porte. O jogo é duramente favorável aos sindicalistas, com bases locais de atuação. O empresariado industrial depende de entidades sediadas na Capital e que respondem, invariavelmente, de forma pasteurizada a questões que nos são muito especificas.
Nos anos 1970 surgiu a Anapemei (Associação Nacional de Pequenas e Médias Empresas Industriais) com a luminosidade tática e de longo prazo de Cláudio Rubens Pereira -- engenheiro com visão muito além das planilhas. Era uma tentativa de contrapor-se não só ao rolo compressor dos metalúrgicos da região como rebeldia declarada aos grupos empresariais representados na Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).
Disputa desigual
O organograma de representação empresarial centralizado na Avenida Paulista era um acinte para Cláudio Rubens Pereira e empreendedores locais. Eles enfrentavam localmente o jogo duro dos metalúrgicos em início de uma rebeldia que o tempo tratou de abrandar, mas cujo recall se sente até hoje.
O desenlace da Anapemei é conhecido de todos que têm alguma intimidade com a economia da região: não restou praticamente nenhum dos 150 associados que aderiram à empreitada nos momentos mais turbulentos das relações entre capital e trabalho na região. E não restou porque bateram asas em direção a geografias menos hostis, sucumbiram ao peso de dívidas e de obsolescência administrativa e operacional ou porque foram adquiridos muitas vezes na bacia das almas por grupos estrangeiros beneficiados, principalmente durante o governo Fernando Henrique Cardoso, numa combinação perversa de moeda desvalorizada e queda acentuadíssima, além de abrupta, de alíquotas protecionistas. Diferentemente, aliás, das medidas adotadas em benefício das montadoras de veículos. Uma situação que tornou ainda mais desigual o relacionamento entre montadoras e autopeças, cujos estilhados ainda não se dissiparam.
Fico pensando se já não passou da hora de os industriais de pequeno e médio porte da região darem-se as mãos e a alma, antes que as percam definitivamente, em busca de arranjo institucional que coloque como prioridade de avaliações múltiplas as características de estarem instaladas na Província do Grande ABC.
Não desclassifico e tampouco sugiro que as representações do Ciesp na região sejam dinamitadas por um regionalismo radicalizado, mas o que me intriga é o que considero excesso de subserviência ao modelo intocável desde a criação do conglomerado que tem a Fiesp como entidade máxima.
Realidade consolidada
A constatação de que temos indústria de autopeças, mas não podemos afirmar, sem cair no ridículo, que a conhecemos suficientemente para que se organize plano de atuação coletiva com diferentes forças representativas da região, é uma realidade que se impõe há décadas.
A reportagem de hoje do Valor Econômico deixa claro que “o aprofundamento da recessão na indústria automobilística está atingindo em cheio a solvência de empresas da cadeia de suprimentos, levando a avanços na inadimplência, concordatas e quebra de fabricantes de autopeças”. O jornal afirma que levantamento da Serasa Experian mostra que houve crescimento de 32% no índice de inadimplência da indústria de componentes automotivos, comparativamente à igual período do ano passado. A Serasa, explica a reportagem, faz as contas com base nos registros de cheques devolvidos por falta de fundos, títulos protestados e dívidas em atraso com instituições financeiras ou não financeiras.
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