O ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE), Mangabeira Unger, passou pelo Clube dos Prefeitos do Grande ABC na última segunda-feira, discorreu sobre uma região que só existe na fantasia dos triunfalistas, quando não dos oportunistas, e saiu aplaudido. A região que o ministro desenhou para uma plateia tão embevecida quanto autoenganadora é o melhor dos mundos. Vivemos num paraíso. O ministro foi pautado provavelmente por algum estúpido de sempre sobre nosso gataborralheirismo crônico: detestamos ouvir a verdade e nos entusiasmamos com bajuladores. Unger não foi o primeiro e muito será o último figurão da República a aqui desembarcar carregadíssimo de enrolação. Depois desaparecem e continuamos a comer poeira econômica e social.
O desconhecimento do ministro Mangabeira sobre a realidade da Província do Grande ABC se manifestou em tal magnitude que chegou ao extremo de encher a bola sempre murcha do Clube dos Prefeitos, essa inutilidade em termos práticos se for considerada a emergência de uma agenda sobretudo voltada à dinamização de nossa desestruturada base industrial.
Quem tiver curiosidade de verificar o comportamento da economia regional nas duas últimas décadas, ou um pouco mais, e para isso basta acionar mecanismos de buscas desta revista digital, vai constatar que o discurso de Mangabeira Unger destoa de nossas inquietações. Um ministro de Estado de uma área dita estratégica que vem à região sem se dar conta de que ao invés de flores de desenvolvimento econômico encontrará espinhos de fragilização social provavelmente seria personagem de algum programa de humor negro. O Ministro Trapalhão seria um codinome que se adaptaria à perfeição a Mangabeira Unger.
Leiam as barbaridades
Se duvidam das declarações do homem da área de Segurança Estratégica do governo Dilma Rousseff, leiam alguns trechos de matérias publicadas pela mídia regional que, para variar, integrou-se à turma do gargalo para apreciar um executivo público inteligente, preparado, mas completamente fora d’água quando se trata de regionalidade, principalmente de regionalidade desta Província. Leiam, portanto:
As estratégias explanadas pelo ministro podem colocar, segundo ele, o “ABC na linha de frente do Brasil, mostrando o caminho para o país”. (...) Na Avaliação do ministro, o Brasil constrói o novo modelo de desenvolvimento baseado em fortalecimento de capacitações educacionais e oportunidades produtivas. Nesse sentido, a cooperação federativa horizontal, entre estados e municípios nas grandes regiões do país, seria um instrumento “poderoso” para a construção dessa estratégia. “Entendo que o Consórcio do ABC é um dos maiores exemplos que temos no país dessa construção federativa em prol dessa estratégia de desenvolvimento”. (...) Aos prefeitos do ABC, Unger traçou três agendas possíveis de trabalho: produtivista – que estimule empreendedorismo de vanguarda na região, dentro e fora do complexo industrial da defesa; capacitação – educação de vanguarda no ABC direcionada inicialmente ao novo modelo de Ensino Técnico; e de gestão pública – uma nova maneira de atuar do governo que permita o experimentalismo na produção de serviços públicos e experimentalismo de construção da produção de vanguarda em parceria com a iniciativa privada. “A primeira delas é que o país constrói uma estratégia de desenvolvimento voltada para a produção e à capacitação. Nós vamos qualificar o recurso produtivo do país e construir o modelo de desenvolvimento que assegure a primazia dos interesses do trabalho e da produção sobre os interesses financeiros. A segunda mensagem é que um instrumento privilegiado da construção dessa estratégia é a cooperação federativa horizontal, e essa cooperação está exemplificada pelo Consórcio do ABC. A terceira mensagem é que o ABC tem todas as condições para desempenhar um papel de vanguarda. É isso que queremos. Um ABC que ultrapasse os limites do modelo anterior da indústria automobilística e exemplifique aqui o vanguardismo produtivo com a participação das pequenas e médias empresas dessa região”, afirmou o ministro.
Tudo se repete
Reproduzi ao longo dos tempos, sempre com inconformismo, declarações semelhantes envolvendo a Província do Grande ABC e convidados especiais sempre prontos a passarem-se por bonzinhos e competentes. Por isso nem sei se vale a pena me estender sobre as declarações de Mangabeira Unger. Aqueles que lhe dão assessoria para que visite regiões do País com um mínimo de informações locais de modo que não passe por vexame provavelmente estavam de folga. Se não os tem, o ministro é um imprevidente. E aqueles que o recepcionaram no Clube dos Prefeitos perderam uma boa oportunidade para manter uma conversa preliminar alertando o convidado a não fazer o papel de otário. Colocar a Província do Grande ABC na ponta de uma nova etapa desenvolvimentista tendo o passivo de ineficiências o Clube dos Prefeitos como força-motriz é, decididamente, um sofrível gol contra.
O Grande ABC que o ministro Mangabeira Unger acredita ter visitado não passa de uma província desbotada, alquebrada, extorquida e saqueada durante décadas e que ainda não encontrou sequer o cheiro, quanto mais à brilhantina da reinvenção. Estamos presos a meados do século passado, quando a indústria automotiva começou a chegar e já tínhamos praticamente consolidada a divisão regional em sete partes territoriais. Seguimos a imaginar que nossa galinha de ovos de ouro já não esgotou parte do estoque de potencial de desenvolvimento econômico no tecido regional.
Há duas décadas o Clube dos Prefeitos não dá um passo sequer em direção à reconfiguração econômica da região, embora nesse período não tenham faltado planos, propostas, projetos e tudo o mais que é especialidade de políticos que só pensam na próxima eleição e se utilizam da credulidade popular para vender bobagens que um ministro de Estado, incauto, avalizou com ares de sabetudo.
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