Economia

Inacreditável: Província gerou 30
mil empregos em serviços em julho

DANIEL LIMA - 01/09/2015

Toda a Imprensa da região comprou informação que parece completamente fora de tempo e lugar. A notícia, divulgada na semana passada, ganhou destaque nos jornais impressos e digitais. Disseram as publicações, com base em emissário oficial de uma das instituições que trata do assunto, que foram criadas 30 mil vagas aos trabalhadores do setor de serviços que residem na Província do Grande ABC. Ou seja: não são vagas criadas necessariamente no território regional, mas ocupadas por gente que mora na região.

 

O resultado não se ajusta ao mosaico da Região Metropolitana, que integra a PED, Pesquisa de Emprego e Desemprego da Fundação Seade e do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos). Não existe a menor possibilidade de a região ser exceção à regra na escalada metropolitana de desemprego -- entre outros motivos porque a debacle automotiva é comprovadamente tormentosa.

 

Além disso, todas as demais fontes de estudos asseguram que a crise regional é complicada em grau muito maior que a crise metropolitana. Como, então, surgiram esses 30 mil empregados de serviços como saldo de julho? Faltou aos jornalistas uma pergunta básica durante a exposição do representante do Dieese: como explicar tamanho salto diante de números metropolitanos completamente opostos e, mais ainda, ante outros indicadores de emprego igualmente danosos?

 

Saldo anual é inferior

 

Os números anunciados são ainda mais surpreendentes quando se constata no boletim da Fundação Seade e do Dieese que, nos 12 meses encerrados em julho, o saldo de empregos de serviços alcançou 28 mil postos de trabalho. Ou seja: até junho deste ano a Província contava com déficit de dois mil postos de trabalho em serviços. Até aí, tudo mais ou menos dentro da normalidade. A imensidão das 30 mil vagas num único mês num período em que o PIB, que mede o tamanho da geração de riqueza do País, perdeu 1,9% no trimestre encerrado em julho, é que chama a atenção.

 

O boletim informa que em julho deste ano a taxa de desemprego total na Província do Grande ABC (12,7%) ficou acima da observada no mesmo mês do ano passado (10,6%). Em termos absolutos, o contingente de desempregados de todos os setores ampliou-se em 31 mil pessoas, como resultado da redução do nível de ocupação (eliminação de 21 mil postos de trabalho, ou -1,77%) e do aumento da População Economicamente Ativa-PEA (entrada de 10 mil pessoas na força de trabalho da região, ou 0,7%). Diz também o boletim que em julho de 2014 a julho de 2015 o nível de ocupação diminuiu pelo décimo-primeiro mês consecutivo na região. A indústria de transformação perdeu 11,7% de trabalhadores, ou eliminação de 36 mil postos de trabalho, com destaque para o segmento da metalomecânico (-13%, ou 21 mil), na construção e, em menor proporção, no comércio e reparação de veículos automotores e motocicletas (-0, 55%, ou um mil), não compensados pelo crescimento nos serviços (4,4%, ou geração de 28 mil postos de trabalho).

 

Metrópole perde 103 mil

 

Expostos os números da PED na Província, vejam agora se não é motivo para dúvida: na Região Metropolitana de São Paulo como um todo foram eliminados 73 mil postos de trabalho nos serviços. Como pode a Província criar 30 mil empregos no mesmo período em que a região metropolitana, São Paulo incluída, perdeu 73 mil? Essa pergunta está apenas metade correta. De fato, fora a Província do Grande ABC, a Região Metropolitana de São Paulo perdeu 103 mil empregos no setor de serviços. Desse total, desconta-se o saldo de 30 mil vagas criadas na Província, porque integra a metrópole.

 

Qual é a mágica estatística da Fundação Seade e do Dieese? Antes de tentar cercar o frango de potencial equívoco com a cerca elétrica do encalacramento analítico fundamentada em outras fontes de informações, convém explicitar resumo da metodologia aplicação pela Fundação Seade/Dieese.

 

A Pesquisa de Emprego e Desemprego é um levantamento domiciliar que capta, através de amostragem probabilística informações sobre o mercado de trabalho urbano. Realizada mensalmente desde outubro de 1984 na Região Metropolitana de São Paulo, a pesquisa fornece dados para o acompanhamento da evolução conjuntural e para a análise das características e transformações na estrutura do mercado de trabalho regional.

 

Diz um documento oficial da Fundação Seade que, embora o universo pesquisado pela PED compreenda todos os moradores dos domicílios visitados, a caracterização da inserção no mercado de trabalho é feita somente para os indivíduos de 10 anos e mais, que compõem a População em Idade Ativa (PIA).

 

Três mil domicílios

 

Os dados utilizados pela PED são obtidos através de entrevistas em três mil domicílios por mês, distribuídos nos 39 municípios da Região Metropolitana de São Paulo. Apesar da periodicidade mensal dos levantamentos, as informações de vários meses podem ser acumuladas para construir indicadores mais precisos em análises estruturais, procedimento extremamente útil quando o fenômeno em estudo é pouco comum, afirma o documento.

 

O que pergunto como ferramenta de sustentação a, por exemplo, dar um destaque editorial imenso à PED, é se há termos de comparação com os estudos do Ministério do Trabalho e Emprego que, mensalmente, apresenta o retrato do mercado de trabalho com carteira assinada em todos os empreendimentos brasileiros, além dos setores públicos. Ou seja: o chamado Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) é uma peça de engenharia econômico-trabalhista muito mais confiável entre outras razões porque o universo laboral não segue regra probabilística, mas sim dados mensuráveis e obrigatoriamente sistematizados pelas empresas e instituições contratantes.

 

Pois os dados do Ministério do Trabalho são flagrantemente diferentes do que é apresentado na PED. Enquanto a PED registrou saldo de 30 mil empregos de trabalhadores de serviços residentes na região nos 12 meses completados em julho, o Caged contabilizou perda de 6.939 postos. No mesmo período, em todo o Brasil, o saldo de empregos de serviços não passou de 33.150 carteiras assinadas. Só em julho, no balanço de mais de cinco mil municípios, foram descartados 58.010 trabalhadores de serviços, sempre com carteira assinada. A Província do Grande ABC é um fenômeno de 30 mil trabalhadores adicionais no mercado nas contas do Dieese e da Fundação Seade. Mesmo se considerando o vale-tudo dos números das duas instituições, porque o mercado informal consta das numeralhas, falta consistência àqueles dados.  Não há metodologia que explique tamanho disparate ou se existir é preciso destrinchá-la à exaustão.  De repente descobrimos que somos um paraíso, mesmo que de informalidade, em meio à tempestade, inclusive informal, da Região Metropolitana de São Paulo.

 

Estado também perde

 

Continuando com os números do Caged: sabem quantos empregos em serviços foram contabilizados nos 12 meses encerrados em julho em todo o Estado de São Paulo? Desaparecerem 25.346 postos, 11.528 dos quais em julho último.

 

Quem eventualmente considera a comparação com os dados do Ministério do Trabalho e Emprego ainda insuficientes, não custa lançar mão de números do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) anunciados na última sexta-feira: a taxa de desemprego geral continuou a subir em julho, abriu distância dos níveis registrados em 2014 e chegou a 7,5%. Das 662 mil demissões líquidas sobre igual período do ano anterior, o total de desempregados aumentou 56%, a maior elevação da série histórica. Os dados são da Pesquisa Mensal de Emprego (PME) e se referem a seis regiões metropolitanas do País.

 

Não existe, até onde salta o bom senso, qualquer razão técnica que justifique o saldo de 28 mil empregos de serviços na Província do Grande ABC nos últimos 12 meses, entre outros motivos porque não faltam dados que nos colocam no olho do furacão da recessão verde e amarela que já dura dois trimestres e, também, por caracterizar, segundo a PED, a cristalização de uma ilha de prosperidade empregatícia na área. Por essas e outras os jornalões brasileiros não costumam dar muita corda aos dados mensais da Fundação Seade e do Dieese.  



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