Só agora me dei conta de que estou a dever pelo menos mais um capítulo desta série. Se devo, se a dívida é minha e de mais ninguém, então pago. E pago com prazer. Vou recorrer à segunda parte do parecer do engenheiro Benedito da Conceição Filho, assistente técnico do CAEX (Centro de Apoio Operacional à Execução) do Ministério Público Estadual sobre o empreendimento Residencial Ventura, em Santo André, denunciado por mim e que quase me custou ordem de prisão, incurso que fui, indevidamente, em primeira e segunda instâncias, como infrator do Código Penal.
A segunda parte do relatório enviado pelo promotor criminal do Meio Ambiente de Santo André, José Luiz Saikali, completa o serviço que coloca os empreendedores daquele condomínio residencial de 320 apartamentos de classe médio alto no banco dos réus da ética e de outros quesitos mais.
O que quase me levou à prisão foi o que chamo de assimetria entre as reportagens publicadas neste espaço e a cronologia da ação criminal movida pela Cyrela, construtora e incorporadora responsável pelo empreendimento juntamente com a família De Nadai, mais propriamente com Sérgio De Nadai, empresário em maus lençóis na Máfia da Merenda. O Residencial Ventura foi construído em terreno que durante 70 anos sediou uma empresa do setor químico. Um período tão longo quanto negligente com as normas ambientais.
Acompanhem a investigação
Depois de reproduzir em sete de agosto último a primeira parte do questionamento do promotor José Luiz Saikali ao engenheiro do Ministério Público Estadual, vamos à etapa final. Vale a pena prestar atenção total a cada palavra impressa:
Promotor ambiental – Os elementos constantes deste procedimento investigatório são aptos a indicar a existência de contaminação na área do imóvel, que torne incompatível seu uso para fins residenciais?
Engenheiro do MP – Sim. Há necessidade de um estudo adequado sem as graves limitações do último estudo, onde a empresa de consultoria procura justificar a emissão de um relatório limitado por vários fatores inaceitáveis. O uso residencial somente seria aceitável em áreas sem quaisquer restrições ou monitoramento. Em quanto tempo se dará a “atenuação natural” adotada como solução? Trata-se de situação em que não há o equilíbrio ambiental, direito constitucional. A qualidade ambiental da área deveria ser restaurada até igualar os níveis de qualidade do entorno e para ser habitada não poderia haver contaminação.
Promotor ambiental – Os elementos contidos neste procedimento investigatório são aptos a indicar a irregularidade da expedição das licenças ambientais e urbanísticas?
Engenheiro do MP – Qualquer obra, e principalmente sua comercialização, somente poderia ter início após a restauração da área nos termos citados no item anterior. Expedir Parecer Favorável (Cetesb) e Licença de Operação (Semasa), eventos a confirmar, com base em estudo limitado e precário não nos parece correto, principalmente para ocupação residencial estimada em 1.300 moradores, prestadores de serviços e funcionários.
Promotor ambiental – Outros esclarecimentos, a critério do assistente técnico, que forem relevantes para a conclusão acerca da mencionada contaminação?
Engenheiro do MP – Adicionalmente às necessidades e esclarecimentos apresentados, temos a colocar: a) as condições ambientais do lote foram averbadas em cartório, como exige a legislação?; b) Quais são as condições atuais do odor em relação às populações interna e externa? Causaram incômodos? E o forte odor de solvente das drenagens?; a revitalização de áreas para reuso pressupõe, além da proteção à saúde, a proteção ao meio ambiente, o que não foi contemplado; considerando-se tratar de região sujeita a inundações caberia análise regional do solo para descaracterizar a Zona como ZUPI. O que impede que plumas de outras fontes migrem para a área em estudo?; colocamos, finalmente, a necessidade de auditoria e fiscalização da Cetesb, com coletas de amostras e análises.
Compromisso cumprido
A primeira parte desse relatório do especialista do Ministério Público do Estado está no link abaixo. Creio que não existe mais a menor sombra de dúvida: este jornalista cumpriu rigorosamente o papel que a sociedade lhe outorgou em forma de confiança de que a Imprensa representa os anseios gerais na construção de um tratado moralmente saudável.
Da mesma forma que investi na denúncia do Residencial Ventura como um atentado ao bolso e à saúde dos adquirentes, também o fiz em relação à Cidade Pirelli, industrializadora de impunidades, e, entre outros casos, ao escândalo do Marco Zero, do empresário e dirigente do Clube dos Especuladores Imobiliários Milton Bigucci.
Tudo isso e muito mais – é preciso bater nessa tecla principalmente para atingir aqueles que, inúteis, sugerem que jornalismo é ferramenta de perseguição a eventuais desafetos. Nada mais tolo.
No caso específico deste jornalista, os desafetos que coleciono são um pequeno grupinho do Exército de Brancaleone de contravenções, o qual, por conta disso, vira-se para se vingar de várias maneiras, entre as quais, especificamente no caso de Milton Bigucci, recorrendo a um Ministério Público e a um Judiciário nem sempre capazes de decifrar o que se passa nas quatro linhas dos gramados esburacados desta região.
Sem sustentação técnica minimamente estruturada, porque contra fatos não há argumentos, o exercício preferido dos delinquentes sociais é tipificar meus textos personalizados como supostos ataques pessoais. Uma argumentação absurda, mas espertamente preparada por advogados experientes na arte da manipulação.
Resultado esperado
O Ministério Público do Meio Ambiente de Santo André, com o suporte técnico do MP Estadual, confirmou praticamente em todos os pontos o que este jornalista escreveu ao longo do tempo sobre o Residencial Ventura.
Como o Ministério Público Estadual, por decisão que aguardo do Corregedor-Geral, desvendará com muito mais facilidade, diante de tantas provas e documentos incontestáveis, que o empreendimento Marco Zero da Vergonha não ganhou esta denominação neste espaço por qualquer outro motivo que não seja a indignação de quem, ao ter conhecimento das irregularidades, jamais se furtaria a denunciá-las.
Se não querem ver CapitalSocial com o tom de revelações desagradáveis, me afastem do teclado. Milton Bigucci está tentando com deturpação desavergonhada da Constitucional Federal. Talvez tenha desistido de outra saída menos ortodoxa e mais radical, porque lhe custaria bem mais caro em potencial de risco ou os parceiros que procurou não lhe tenham dado a resposta que imaginava.
Não tenho coragem de morar no Residencial Ventura é uma série sem definição antecipada à finalização. Pelo menos mais um capítulo vou preparar nos próximos dias. Vou escrever sobre a sentença de prisão em primeira instância por ter denunciado aquela falcatrua, inclusive com a manifestação à época de um promotor criminal.
E pensar que Milton Bigucci utilizou-se daquela sentença, na emissão de correspondência eletrônica a grupos que ele acredita que lhe tenham algum respeito, para denegrir a imagem deste jornalista. Desespero puro.
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21/11/2024 QUARTO PIB DA METRÓPOLE?