Lamentavelmente, não sou mais o mesmo. Estou a perder a embocadura crítica, e não me tenho dado conta disso. Estou cansado de escrever nos últimos tempos que a situação econômica da Província do Grande ABC é grave. Errei redondamente. A situação é gravíssima. Querem mais um exemplo, não bastassem tantos à vista, minimizados pela mídia e escamoteados pelos gestores públicos? O comércio eletrônico da região desabou.
Os números impressos no jornal Valor Econômico de hoje são aterradores. Será que depois desses dados, que, repito, se somam a tantos outros, vamos continuar a contemplar à paralisia generalizada dos tomadores de decisões e das supostas forças de pressão da região?
As vendas na Província do Grande ABC por meio de sites especializados sofreram queda em valores monetários de 26,1% neste ano. Sabem lá o que é isso? Seria difícil saber se não houvessem dados a comparar. A cidade de São Paulo, por exemplo, obteve incremento de 0,6%. Uma ninharia perto de outros tempos, mas uma fortuna se a Província for a referência.
Outras regiões do Estado de São Paulo também apontaram números positivos, alguns até extravagantes. A situação regional tem nome e sobrenome: dependência automotiva. E várias ramificações, como inapetência dos gestores públicos, anorexia intelectual das instituições econômicas e sociais, entre outras sequelas de anos e anos de empobrecimento econômico e raquitinização da cidadania.
Capital ainda resiste
A pesquisa sobre o andar da carruagem do comércio eletrônico no País foi anunciada pela FecomercioSP, Federação do Comércio do Estado. Uma pesquisa inédita, segundo o Valor Econômico. Pela primeira vez na história nacional o comércio eletrônico -- que nos últimos anos cresceu a taxas de dois dígitos e apresentou desempenho descolado do varejo com um todo -- começou a sentir mais fortemente os efeitos da crise econômica no País.
A queda real de 10,1% nas vendas do comércio online no Estado de São Paulo, em agosto último, dá a ideia do que anda acontecendo no País. O mercado paulista, sempre segundo o jornal, responde por 22% das vendas feitas pela internet no País. Em agosto de 2014 o setor havia apresentado crescimento de 17,9% no Estado. No acumulado de janeiro a agosto deste ano, o varejo online ainda apresentou crescimento de 1%, movimentando R$ 9 bilhões.
Vamos nos deter sobre a perda de 26,1% do comércio da internet na região nesta temporada. É uma barbaridade de preocupante. Isoladamente, o resultado já causaria tremores. Quando se entrelaçam outros dados sobre o comportamento da economia regional, dados mensurados, então a coisa fica ainda mais feia.
Rumo ao tetra
Imaginem os leitores quando ao final de 2017 saírem os números do PIB (Produto Interno Bruto) dos Municípios nesta temporada. Sim, não há erro de digitação. Há um período de respiro de dois anos entre o PIB anual dos municípios brasileiros e a divulgação pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas). Quando em dezembro próximo saírem os números de 2013, acumularemos, certamente, a quarta temporada seguida de perdas gerais. Vamos para o penta e para o hexa sem erro.
Enquanto isso, instituições locais estão mesmo é preocupadas com o próprio ego de seus dirigentes. Uma cãominhada aqui, uma corridinha de rua ali, e estamos conversados. E aqueles que, conhecedores do caos, porque o vivem diariamente, saem às ruas com 300 acompanhantes num grito da pequena indústria, são rigorosamente abandonados pela mídia sequestrada pela pauta oficial ou pelo desconhecimento fático da realidade.
Caindo da cadeira
Confesso que ao ler o noticiário do Valor Econômico quase caí da cadeira em que me instalo todas as manhãs -- às 6h30 de la matina, para ser mais preciso. Tenho a mania de ler cada matéria com zelo e meticulosidade de ourives. A atenção é extrema, o foco é total, a caneta esferográfica preta sublinha todas as informações mais importantes, a reflexão é intensa a ponto de retomar a leitura de parágrafos a fim de memorizá-los.
Quando surgiram aqueles 26,1% negativos da região, parei a leitura por alguns momentos, retrocedi o olhar sobre parágrafos anteriores, fiz comparações numerais e perdi o fôlego. Estamos fritos, pensei. A expressão transposta sobre o susto não foi exatamente essa. Foi bem menos educada.
Mais que um novo indicador em si, porque estou diariamente em busca de novos elementos que instrumentalizem reflexões, o que chamou a atenção foi o resultado. É uma queda acentuadíssima demais. Ouso escrever sem parecer maluco como aquele equilibrista que deitou e rolou num cabo de aço ao unir os dois extremos das Torres Gêmeas que o congelamento institucional da região nestes dias é irresponsabilidade total retroalimentada pela covardia do passado. Menos, evidentemente, daqueles empresários malucos que saíram às ruas de Santo André e deixaram claro, até pelo ineditismo da mobilização público, que estão vivendo os piores momentos de suas empresas.
É gravíssima a enfermidade econômica e social da região. O comércio eletrônico é apenas mais um sintoma de uma causa que requer atenção geral: nossa matriz econômica segue a deteriorar-se e só se rivaliza mesmo com o espírito descompromissado dos agentes públicos mancomunados com lideranças privadas de araque.
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21/11/2024 QUARTO PIB DA METRÓPOLE?