Uma das perguntas que mais respondo aos leitores desta revista digital refere-se à qualidade do jornalismo diário regional, impresso e digital. Querem saber minhas preferências. Respondo sem pestanejar que a união de todos os veículos locais não é soma zero, mas está muito distante do mínimo que espero como consumidor ávido de informações. O jornalismo diário regional padece do mesmo mal do jornalismo diário municipal e regional do País. Sobra transpiração e escasseia inteligência. E segue rigorosamente o empobrecimento econômico e social.
Menos mal que temos nesta Província a multiplicação de títulos impressos e digitais. É verdade que nenhum veículo individualmente e nem todos os veículos juntos preenchem as lacunas que acumulamos, mas podemos, com a experiência de quem sabe ler as entrelinhas, retirar determinadas interrogações de noticiários contraditórios. Ou, em situação inversa, aumentar ainda mais nossas dúvidas.
Diria também sem parecer cabotino que a aridez qualificativa dos jornais diários impressos e digitais desta Província torna CapitalSocial cada vez mais imprescindível.
Leitores querem muito mais
Mais que informação, os leitores querem reflexões, interpretações, análises. Pelo menos os leitores com ambição de não serem passados para trás. E para serem passados para trás basta ler os jornais da região e de fora da região. Publicações que não respondem aos anseios explicativos dos leitores não têm massa crítica que estimule transformações econômicas e sociais.
O jornalismo bem feito e acabado passa necessariamente pela ação de especialistas. Por mais que o conhecimento agregado seja imprescindível à atividade, os leitores mais valiosos demandam mesmo profundidade. Esse é um dos calcanhares de Aquiles do jornalismo diário impresso e digital da região. Os especialistas em coisa alguma abundam. Por isso as fontes de informações manipulam a torto e a direito.
Na Cova dos Leões
Um dos livros que publiquei sobre minha experiência jornalística data de 2006. “Na Cova dos Leões” reproduziu grande parte dos textos da coluna “Contexto”, que assinei no Diário do Grande ABC entre julho de 2004 e abril de 2005. “Durante os nove meses de Diário do Grande ABC escrevi seguramente mais de 1,5 milhão de caracteres, dos quais quase 900 mil para Contexto. Poucos mais de 200 mil estão neste livro. Os demais foram sacrificados principalmente por causa do planejamento espacial desta obra; outros, em menos quantidade, não reúnem o perfil adequado para reproduzirem-se no formato ao que se segue e cujo escopo é imposição de durabilidade temporal” -- escrevi na apresentação.
Por que tomo “Na Cova dos Leões” como reforço? Simples: para evitar que os desinformados de sempre e os malandros interpretativos de ocasião não confundam a bola. Que bola? A bola de crítica ao jornalismo diário como algo entranhado num profissionalismo que passa ao largo de supostos revanchismos. São apenas uma contribuição à atividade que exerço.
“Vou traduzir o que parece um raciocínio esnobe: as redações, principalmente de jornais diários, são, em larga escala, pontos preferenciais em que os piratas econômicos, sociais, políticos e culturais atracam barcaças de interesses que parecem legítimos a mente e olhos descuidados, supostos reprodutores de uma maioria silenciosa. Por isso que me senti na cova dos leões no Diário do Grande ABC e jamais, em tempo algum, passei pela mesma sensação em 16 anos de LivreMercado” – escrevi naquela obra. Querem mais alguns trechos da apresentação de “Na Cova dos Leões”? Leiam:
“Diferentemente de chefetes de redação que se travestem de cães perdigueiros a acompanhar todos os passos varejistas de subordinados, transformei minha estada no Diário do Grande ABC numa ação de evangelização pró-regionalidade, em vez de lhes impor presença asfixiante no cotidiano de produção editorial. (...) Do dia-a-dia emburrecedor e embrutecedor não tenho saudade alguma. E olhe que não me submeti à ordem unida de permanecer o tempo todo na redação. Preferi um cantinho da Editora Livre Mercado, então no mesmo edifício-sede do Diário, longe do burburinho e da possibilidade de ser interpretado como capataz”.
Decepção que se acentua
Passada mais de uma década desde que estive na Redação do Diário do Grande ABC pela segunda vez, depois de 15 anos entre 1970 e 1085 e de recentemente ali postar minhas trombetas por cinco meses, o que quero dizer hoje é que a decepção com o jornalismo regional se acentua porque o vejo e o leio como se fosse produto que deveria saciar minha sede por informação com valor agregado.
Querem um exemplo, o mais recente, ou um dos mais recentes, sobre o estado de calamidade pública em que se encontram as fontes de informações da região? Milton Bigucci foi apeado do poder no Clube dos Construtores e Incorporadores após 21 anos seguidos de enormes prejuízos à sociedade regional e, dos veículos aos quais me refiro, apenas o Diário do Grande ABC publicou uma matéria a respeito. Mais propriamente sobre a troca de guarda naquela entidade. Uma reportagem que não atendeu aos mínimos requisitos porque se manteve distante de informações relevantes sobre o perfil destrutivo daquele dirigente que deixou uma entidade arrasada, completamente desmoralizada depois da incompetência com que a comandou arbitrariamente e de trambicagens corporativas em que se meteu.
A propósito: tenho uma cópia do discurso patético, quando não risível, que Milton Bigucci ofereceu de cardápio aos convidados principalmente do presidente eleito, o jovem Marcus Santaguita. Trata-se de uma prova incontestável de que Milton Bigucci ultrapassou todos os limites do bom senso, não só pelo conteúdo, mas também pelo atrevimento de tentar capitalizar um evento majoritariamente representado por convidados dos novos dirigentes do Clube dos Construtores.
Finalmente divulgado
Mais sobre o Clube dos Construtores: somente hoje, 17 dias após a eleição de Marcus Santaguita, a assessoria de comunicação distribui o material do evento realizado esta semana. Claro que com a versão edulcorada a léguas de distância da verdade de uma demissão diplomática. Quem acreditar na versão bigucciana de que o dirigente abriu mão do cargo porque encontrou, finalmente, alguém de sua confiança, comete o mesmo erro de interpretar a saída de Marco Polo Del Nero da presidência da CBF como um ato voluntário. O que prevaleceu mesmo foi a constatação de que a fadiga de material já não poderia mais ser contemporizada.
Poderia citar dezenas e dezenas de temáticas aos quais me dediquei nos últimos anos nesta revista digital e que passaram praticamente em branco, quando não completamente deslocadas da realidade pela mídia regional. As instituições da região excedem em inoperância sem que vozes importantes se levantem para denunciá-las.
Há um estado geral de compadrio que ajuda a explicar as razões que levam a Província do Grande ABC a estar completamente fora de qualquer radar mais responsável de investimentos produtivos. Nossa mídia não se deu conta, ainda, de que está cavando o próprio buraco.
A recente pasteurização do Clube dos Prefeitos, perpetrada por um dos jornais diários da região, é passivo editorial que jamais se desmanchará, porque além de acintoso é pronunciadamente subserviente.
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13/11/2024 Diário: Plano Real que durou nove meses (33)