A retirada da Petrobras do quadro acionário da Braskem, empresa-mãe do Polo Petroquímico de Capuava, entre Santo André e Mauá, não é uma notícia qualquer. Mas também pode ser uma notícia qualquer. Tudo vai depender do que virá. Mais importante até que a empresa ou o conglomerado de empresas que vai ficar com os 49% de participação da estatal abatida por corrupção é saber o que acontecerá com a Organização Odebrecht, controladora da companhia e igualmente enredadíssima no escândalo da Petrobras.
O prefeito Donisete Braga, de Mauá, fez um discurso diplomático nas páginas do Diário do Grande ABC. Provavelmente faria o mesmo se estivesse no lugar dele, porque a responsabilidade do cargo é um peso e tanto. Donisete Braga disse que a notícia é um fato importante, porque a empresa terá independência e vai consolidar os negócios na cidade.
Não é bem assim, sabe o prefeito. A questão não é apenas a saída da Petrobras da companhia. É a permanência da Odebrecht na companhia. Quem seriam os potenciais investidores nacionais ou internacionais que topariam dividir a mesa com um conglomerado privado cujo presidente está engaiolado na Operação Lava Jato?
Quando um assunto como o presente e o futuro do Polo Petroquímico da região está em jogo, o melhor mesmo é ouvir especialistas. Até porque as respostas de agentes políticos são mais que óbvias. Os especialistas desidratam interesses nem sempre claros e praticamente destroem explicitudes verbais previsíveis. O jornal Valor Econômico deixou de lado autoridades públicas e foi ouvir quem de fato tem peso e conhecimento ao esclarecimento da situação.
Momento é desfavorável
Caso da consultoria MaxiQuim que, resumidamente, informou o seguinte: a entrada da Braskem no mercado norte-americano tornou a companhia petroquímica brasileira um ativo valorizado, mas a intenção da Petrobras de vender sua participação de 49% na companhia se dá num momento desfavorável. (...) O anúncio de que o governo da Arábia Saudita pretende abrir o capital da Saudi Aramco deve levar o Oriente Médio a dominar o fluxo de investimentos.
Leiam as declarações de Luiz Zuñeda, diretor da MaxiQuim: “A venda da Braskem não é um processo simples, o momento é complicado. A Petrobras terá que concorrer com a Arábia Saudita, que fará o IPO da Saudi Aramco e é um dos principais mercados petroquímicos do mundo. As grandes empresas do setor passaram a olhar para o Oriente Médio novamente”.
O diretor da consultoria também faz referências ao escândalo da Petrobras na reportagem publicada no Valor Econômico de hoje. “Outro fator que pode preocupar potenciais investidores é um processo judicial nos Estados Unidos, onde investidores estão propondo uma ação coletiva contra a Braskem. A empresa e seus executivos são acusados de violação das leis americanas no mercado de capitais”.
Também há olhares mais positivistas sobre a venda da participação da Petrobras na Braskem. Um executivo ouvido pelo Valor Econômico, cuja identidade não foi revelada, avalia que a Braskem pode render um bom dinheiro. “Acho que é fácil vender a Braskem, ainda mais sem a Petrobras. É um monopólio petroquímico, a maior empresa do setor na América Latina. Deve atrair investidores do setor petroquímico e fundos”, afirmou a fonte.
Questões regionais
Se há dúvidas sobre o desenlace econômico da Braskem, cujas decisões se prendem a esferas extraterritoriais da região, situações locais precisam ser consideradas. Há certezas e interrogações também.
Uma certeza é que haverá rebaixamento da influência política e sindical da região no Polo Petroquímico de Capuava. Quem vai perder nacos de poder é o PT. Luiz Marinho, principalmente, porque é o principal braço regional de influência do governo federal na Braskem. Dependendo dos novos controladores da empresa, o poder político-partidário poderá ser diluído consideravelmente. Sem a Petrobras, já o será.
Possivelmente o futuro vai demonstrar até que ponto a unidade da Braskem na região é competitiva. Um novo contrato de suprimento de matéria prima foi assinado recentemente entre a Petrobras e a companhia. Houve favorecimentos no passado que ajudaram a construir resultados da Braskem. Até que ponto a empresa está aparelhada tecnicamente para competir com gigantes internacionais? Essa resposta levará tempo. O jogo jogado da produtividade no setor é bastante encardido. Não comportaria benesses nem protecionismos típicos de empresas sob o controle político do Estado.
Distanciamento histórico
Há aspectos institucionais desprezados tanto pelo Diário do Grande ABC quanto pelo Valor Econômico. Está certo que o jornal paulistano não tem necessariamente que se meter no assunto. Mas o Diário do Grande ABC poderia ter mobilizado questões nesse sentido. A pergunta-chave é simples: se com o formato atual e os formatos anteriores de participação acionária -- dominantemente estatal, depois misturado e em seguida privado para, de novo, num misto entre privado e estatal -- o Polo Petroquímico de Capuava jamais mereceu atenção para valer de gestores públicos, o que será após eventuais novas mudanças?
Vou traduzir tudo isso de forma que acredito simples: se a região, especificamente Santo André e Mauá, jamais atuou em conjunto, para valer, com planejamento bem orquestrado, para ter o Polo Petroquímico como parceiro de investimentos e valorização econômica, o que será do futuro?
Não custa lembrar que em vários períodos o Polo Petroquímico da região contou com interlocutores ávidos por aproximação produtiva com agentes públicos. Até mesmo participaram da Agência de Desenvolvimento Econômico. Mas sempre o fizeram, esses executivos do Polo Petroquímico, por decisão corporativa, de aproximação com as instâncias locais.
A recíproca geralmente não era verdadeira. O Polo Petroquímico sempre foi tratado pelos agentes públicos como vaca leiteira de tributos e vaca sagrada de financiamento eleitoral. O Polo Petroquímico de Capuava é estratégico ao equilíbrio econômico da região, com influência de abastecimento de matéria-prima industrial em todos os municípios, mas institucionalmente jamais contou com grau semelhante de importância.
Não se devem confundir ações individuais ou mesmo grupais sazonais com política institucionalizada de aproximação de agentes com atuação na região. Houve durante as últimas décadas alguns movimentos esparsos de valorização do Polo Petroquímico, inclusive com pressões para o aumento da capacidade de produção, mas nada sistematizado como operação estratégica de longo prazo.
Mesmo esse desenho precário poderá ir para o beleléu num futuro não muito distante, na medida em que novos controladores da Braskem enxergarem exclusivamente o mundo competitivo do capitalismo privado ou de Estado, como o chinês.
Intimidade perdida
Executivos do Polo Petroquímico que no passado exercitavam incursões em ambientes políticos e econômicos da região, inclusive porque mantinham raízes familiares aqui, se tornaram raridade. Não se conhece, por exemplo, um nome sequer da Braskem com alguma relevância fora das quatro linhas da companhia, mais precisamente em instâncias decisórias locais.
Fosse minimamente organizado e planejado – e essa tarefa caberia ao Clube dos Prefeitos e à Agência de Desenvolvimento Regional – o universo do setor químico-petroquímico da região, em variados ângulos econômicos, trabalhistas, tributários, entre outros – estaria a um click do computador. Bem como a relação dos executivos privados-chave para desencadear reações nesse momento em que a chutometria sobre as consequências das negociações que envolvem a Braskem toma o espaço da racionalidade.
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