Os números são históricos e integram o maior banco de dados de potencial de consumo do País, controlado pela Consultoria IPC, dirigida por Marcos Pazzini e referência no mercado. Esses dados não são nada satisfatórios. A pedido de CapitalSocial, a Consultoria IPC produziu o ranking atual dos 300 municípios com maior concentração de riqueza nacional, contrapondo-se às informações consolidadas em 1995, quando a empresa realizou o primeiro levantamento da a geografia de consumo no País. A Província do Grande ABC só não conta com Rio Grande da Serra entre os 300 maiores municípios. E o principal, a Capital Econômica da região, São Bernardo, vai mal na fita: sofreu queda relativa de 49,3% no período. Somente a Capital do Estado (-52,4%), a fluminense Nova Iguaçu (-63,5%) e a goiana Luziânia (54,0%) superam o desastre de São Bernardo.
Não é de hoje que somos parceiros de Marcos Pazzini na devassa de riquezas no País. Potencial de consumo é um medidor mais confiável e preciso que o PIB (Produto Interno Bruto) porque afere a acumulação de riqueza da população de cada Município brasileiro. O PIB mede a geração de riqueza, que, como se sabe, nem sempre ou quase nunca fica integralmente no Município em que é gerada. Não faltam casos de endereços poderosíssimos no ranking do PIB mas frágeis em potencial de consumo. Pequenos municípios que são sedes de setores industriais altamente geradores de valor adicionado destacam-se como estrelas do PIB, mas desaparecem no ranking de potencial de consumo.
Acima dos limites
Perder participação relativa no ranking de potencial de consumo é normal no remelexo dos números de mais de cinco mil municípios brasileiros, principalmente num período tão longo, de duas décadas completas. Entretanto, quando se perde potencial de consumo acima dos limites médios, é sinal de que algo está fora dos trilhos.
Caso de São Bernardo e também de outros municípios da Província do Grande ABC, quase todos impactados acima de 40% de vazamento de riqueza. A perda média de participação de consumo dos 300 maiores municípios brasileiros ao longo de 20 anos foi de 22,3%. Ou seja: São Bernardo e quase todos os demais municípios da região viram riquezas se exaurirem em quantidade superior ao dobro da média nacional.
Como esquadrinhar que o rombo no índice de potencial de consumo de São Bernardo e de outros municípios da região está acima do suportável?
Vamos diretamente ao caso de São Bernardo. Em 1995, base de comparação, a participação do Município no potencial de consumo do País era de 1,00400%. Vinte anos depois caiu para 0,50942%. Resultado? Queda de 49,3%. Décima-quinta colocada na classificação geral do País, São Bernardo está atrás de outros dois municípios paulistas, além da Capital, líder do ranking brasileiro. Campinas está em 10º lugar e perdeu um pouco menos que São Bernardo no mesmo período de comparação: 43,2%. Contavam os campineiros com participação relativa de 1,46700% em 1995, ante 0,833381% em 2015. A queda de Campinas foi, portanto, inferior a de São Bernardo.
Melhor exemplo
Campinas, entretanto, não é o melhor exemplo para se contrapor às perdas relativas de São Bernardo. Está na Região Metropolitana de São Paulo um caso bem mais próximo da realidade regional, porque envolve Guarulhos, igualmente na vizinhança da Capital paulista, da qual tanto usufrui vantagens inerciais como sofre concorrência. Guarulhos e São Bernardo são diferentes de Campinas.
A cidade do interior é o centro de uma metrópole com quase duas dezenas de municípios. Isso significa que o potencial de consumo de Campinas é na prática superior ao registrado no ranking nacional dos 300 maiores municípios. Os municípios da Região Metropolitana de Campinas consomem atividades de comércio e de serviços daquela espécie de capital regional. Caso de São Paulo, igualmente com potencial de consumo muito superior ao exclusivamente representado por seus moradores. São Paulo é o centro nevrálgico da economia da maior metrópole sul-americana.
No caso de Guarulhos, em 1995, base do banco de dados da Consultoria IPC, a participação relativa de 1,04500% significava superioridade de 3,92% em relação a São Bernardo, de 1,00400%. Já na ponta da pesquisa, de 2015, Guarulhos registrava índice de potencial de consumo de 0,70495%, ante 0,50942% de São Bernardo -- uma diferença de 27,73%. Guarulhos perdeu participação relativa nacional de 32,5% no período, contra 49,3% de São Bernardo. O potencial de consumo registrado por Guarulhos no ano passado totalizou R$ 26,293 bilhões, ante R$ 19 bilhões de São Bernardo.
Perdas generalizadas
Como houve descentralização de consumo no País nos últimos 20 anos, porque a riqueza acompanha os investimentos em produção, principalmente, a grande maioria dos 300 municípios apresentou perda relativa de participação. Além de São Bernardo, que lidera o ranking negativo na região e ficou em quarto lugar pelo mesmo critério no ranking nacional gerado pela Consultoria IPC, também os demais endereços da região se deram mal no período.
Santo André, 18a colocada no ranking, três posições abaixo de São Bernardo, perdeu 43,9% de participação relativa. Diadema, 56a do ranking, perdeu 26,4%, índice muito próximo da média de refluxo das 300 maiores cidades. São Caetano, 97a colocada, caiu 40,1%. Bem mais que Mauá, antecessora na classificação geral, em 51o lugar, com perda relativa de 16,8%. Completando a relação da região, Ribeirão Pires, 220a do ranking, teve queda de 35,6%. Rio Grande da Serra não consta da lista dos 300 maiores municípios em potencial de consumo do País.
Na contramão da grande maioria dos municípios do ranking da Consultoria IPC que perderam participação relativa em potencial de consumo no País, um grupo de 19 endereços alcançou crescimento de três ou mais dígitos no período de duas décadas. Não há destaque em acumulação relativa de riqueza comparável a Mesquita, no Estado do Rio de Janeiro, 210a colocada na classificação geral e que aumentou o índice em 3.461,9%. Não é o único caso de crescimento de quatro dígitos. Também Ananindeua, no Pará, deu grande salto em potencial de consumo com avanço de 1.774,3% em 20 anos, impulso que a coloca em 71o lugar na classificação geral.
Competitividade comprometida
Embora PIB e Potencial de Consumo sejam metodologicamente diferentes e até mesmo antagônicos em determinados municípios, no caso da Província do Grande ABC há uma sintonia fina entre os desfalques colecionados ao longo das últimas décadas. A economia regional passou nesse período -- e segue a passar -- por processo de fragilização industrial. Sustenta-se no setor automotivo, principalmente, uma enorme fonte de preocupações porque tem o mundo como referência de competitividade e internamente, no País, vários Estados como concorrentes incômodos.
Montadoras e autopeças da região sofrem com os custos relativamente maiores de produção, em forma de salários e benefícios trabalhistas bem superiores à média nacional. Não bastasse a dificuldade de superar os entraves sindicais, arraigadamente contrários a um dinamismo que leve em conta quesitos como produtividade, as empresas do setor acusam pressões permanentes.
Para os sindicalistas, especialmente vinculados às montadoras e autopeças, a vitrine do trabalhismo de primeira classe em conquistas históricas sem compromisso com produtividade, é o que mais interessa nas relações com as empresas. Gradualmente a economia da Província do Grande ABC vê o cinto apertar na forma de perda de competitividade.
Os números de potencial de consumo se somam a outras provas estatísticas que exploramos há mais de duas décadas como testemunhos de que no período de 20 anos, mais que a descentralização da riqueza acumulada pelas famílias, estabeleceu-se crise latente de empobrecimento na região. E nada indica que passará por mudanças. Entidades empresariais não têm força de representatividade dos sindicalistas que, por sua vez, adoram mesmo, em momentos de crise, usar esparadrapos de dinheiro público e benesses privadas para adiar indefinidamente a reestruturação que tarda.
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21/11/2024 QUARTO PIB DA METRÓPOLE?