Economia

Quem tem coragem de investir na
Província com esse sindicalismo?

DANIEL LIMA - 19/02/2016

Li nas páginas digitais do Diário Regional e do ABCD Maior declarações imperdíveis, embora lamentáveis, do presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, um dos discípulos da dinastia iniciada com Lula da Silva ao final dos anos 1970. Rafael Marques é alguém sobre o qual não se podem desgrudar os olhos como anteparo a proteger o cérebro. Ele é o antimarqueteiro da região. Com ele, que não é diferente dos antecessores, o mínimo que se pode esperar num regime capitalista é que os capitalistas fujam da Província. Ou alguém em sã consciência topa colocar dinheiro num empreendimento e ser controlado por gente que não entende bulhufas de produtividade e competitividade, quanto mais de macroeconomia?

 

Ao Diário Regional Rafael Marques disse que levará a situação de penúria da autopeça Arteb à próxima reunião do Conselhão, grupo de quase 100 notoriedades e notabilidades do País que supostamente auxiliaria a presidente da República a colocar a casa em ordem. Rafael Marques faz parte dessa confraria chapa-branca.

 

Ao ABCD Maior Rafael Marques declarou que, mesmo que se todas as modalidades de proteção ao emprego forem esgotadas, não aceitará cortes das empresas, sobretudo das montadoras. Se alguém disser que Rafael Marques pratica algo como chantagem não seria exagero. Mas a exacerbação já se tornou tão comum entre as lideranças sindicais que ninguém ousa criticar os agentes do emprego vitalício, sem compromisso com produtividade. O que interessa é a vitrine sindical em defesa dos trabalhadores, quando, de fato, defendem-se trabalhadores de determinadas empresas, em detrimento da grande maioria. Os números do PPE (Programa de Proteção ao Emprego) são emblemáticos. 

 

Argumentação enviesada

 

Sobre o caso Arteb, Rafael Marques diz que vai levar ao Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, em Brasília, a situação de várias autopeças da região, que, segundo afirmou, sofrem com a crise no setor automotivo. Na semana passada a empresa com sede em São Bernardo demitiu cerca de 300 trabalhadores e, também, entrou com pedido de recuperação judicial ao alegar falta de crédito para saldar dívidas com fornecedores e bancos.

 

“Vamos levar ao CDES a situação da Arteb e de outras empresas da base, que estão sendo penalizadas pela falta de crédito, o que tem afetado diretamente os trabalhadores”, afirmou Rafael Marques ao jornal Tribuna Metalúrgica, segundo transcrição do ABCD Maior. Disse mais: “O que está acontecendo na Arteb é reflexo do papel negativo que o sistema financeiro tem desempenhado na crise econômica, negando créditos às empresas”, criticou Marques. Para o dirigente, sempre segundo a notícia do ABCD Maior, a situação da Arteb não é diferente de outras empresas da base que necessitam de capital para continuar seus negócios.

 

O que mais impressiona nas declarações de Rafael Marques é que, mesmo tendo à mão os números da última temporada do setor automotivo, com queda de produção e de vendas de veículos, e também das empresas de autopeças, ele ousa declarar que o problema é de crédito, não de demanda. Confunde alhos com bugalhos. E, mais que isso, tira da reta da responsabilidade compartilhada os estragos sindicais no tecido produtivo da região, com atuação ancorada nas chamadas conquistas trabalhistas que, em vários pontos, não passam de mordomias quando contrapostas à realidade da indústria nacional.

 

Gastança estatal

 

É muito mais fácil e cômodo para esse integrante do Conselhão despejar um caminhão de melancia de responsabilidade no sistema financeiro que, se carrega passivo, e carrega de fato, a situação se deve historicamente à gastança estatal que, por razão ideológica, é simplesmente descartada pelo sindicalista filiado à CUT (Central Única dos Trabalhadores), organização que não passa de um monumento em defesa do Poder Público, por mais deficiente e corrupto que seja.

 

Fico a imaginar a cara de desdém dos banqueiros no encontro do Conselhão quando Rafael Marques sacar dessa pistolinha de argumentação técnica, por assim dizer, em defesa da recuperação econômica com o combustível do crédito fácil para alimentar ainda mais a fornalha da inflação gerada pela incompetência governamental. Crédito fácil que as instituições bancárias estão a negar porque o nível de inadimplência flerta com a precariedade da imagem da classe política do País.

 

Ao ABCD Maior o sindicalista Rafael Marques disse exatamente o seguinte: “Não podemos permitir que essas medidas (de contenção de demissões) virem pretexto para demissões mais à frente. A missão do sindicato este ano é administrar enquanto o mercado é retomado. Não vamos aceitar demissões”. Rafael Marques, como se observa, é o CEO geral da indústria da Província do Grande ABC. Ele manda e desmanda conforme o figurino protecionista do sindicato que comanda.

 

Chantagem explícita

 

Mais algumas declarações do dirigente sindical ao ABCD Maior são esclarecedoras: Enquanto ficar em licença remunerada, lay off, a gente vai administrando. Vamos lutar, fazer mobilização com os trabalhadores para manter as medidas como estão, mas, se é para preparar demissão mais para a frente, vamos resistir. Estamos preparando uma série de opções e vamos trabalhar junto ao governo para acelerar essa retomada. Sabemos que estamos num momento muito sensível, mas não podemos permitir que essas medidas virem pretexto para demissões mais à frente. A missão do sindicato é administrar enquanto o mercado é retomado. E eles sabem que o mercado retoma, todas as montadoras mantiveram o plano de investimento o Brasil. O momento de insegurança tira um pouco o ímpeto de vendas, mas o desejo de compra da população existe, e isso indica retomada. As empresas têm capacidade de achar alternativas junto ao sindicato. Não vamos aceitar demissões de jeito nenhum. Se demitirem, vão ter a devida resposta – disse o sindicalista.

 

É preciso dizer mais alguma coisa que caracterize chantagem? O desfile de bobagens de Rafael Marques engloba duas possibilidades interpretativas: o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo esteve viajando durante algum tempo à Lua ou o consultor de economia que o abastece de informações vive numa redoma na qual qualquer observação crítica sobre a realidade nacional é chutada à escanteio.

 

Imaginem os leitores o quanto uma liderança sindical do tamanho de Rafael Marques representa como antimarketing regional. Façam os cálculos. Se o caro leitor fosse investidor ou empreendedor interessado em plantar uma empresa na região, qual seria a reação ante informações de assessores que depositariam em sua mesa de trabalho as afirmativas do sindicalista ao jornal sediado em São Bernardo e que, em outros veículos, ganham repercussão nacional.

 

Acionista mandão

 

Quem está interessado em ter como acionista de uma empresa um dirigente sindical que expressa com nitidez absoluta o caráter arbitrário de enxergar o desenvolvimento econômico? Quem quer ter Rafael Marques e sua turma como agentes de decisões empresariais? Ou essa premissa não está mais que identificada nas seguintes frases: “As empresas têm capacidade de achar alternativas junto ao sindicato. Não vamos aceitar demissões de jeito nenhum. Se demitirem, vão ter a devida resposta” – disse Rafael Marques.

 

O modo de gerenciamento do capitalismo privado imposto pelo presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, deformação que vem do passado, é expressamente claro: se não for do nosso jeito, não tem jeito. Quem tem capital, nacional ou internacional, seria maluco ao investir na região ante essa comissão de frente de imposição de metodologias. Quem está na região e resiste bravamente tem alguma razão para continuar?

 

É esse tipo de decantada liderança regional – agora alçada ao Conselhão, que não passa de baboseira – que goza de suposto prestígio de uma mídia omissa, quando não conivente, enquanto os empreendedores, sobretudo de pequeno porte, comem o pão que o diabo amassou entre outras razões porque têm de aceitar calados e submissos as vontades dos patrões metalúrgicos que se fazem de vítima. De fato o são, mas de um governo federal desavergonhadamente incapaz.  



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